para o picareta do espírito pagar as contas dele). Uma vez tendo

sentido medo de que ele esteja dizendo a verdade, você está perdido.

A armadilha é dar a ele uma ponta de credibilidade. Você estará

perdido. Repito para você lembrar de mim na hora em que um desses

picaretas aterrissar a sua frente. Preste atenção no que eu vou dizer.

Existem três grandes áreas de choque na vida. 1) Saúde e

doença, 2) dinheiro e trabalho e 3) amor e família. Quase tudo pode

ser incluído nessas áreas, e elas, pelo menos uma delas, sempre dá

problema, sendo a saúde a definitiva. Esses picaretas do espírito,

assim como os xamãs pré-históricos faziam, anunciam coisas que

sempre podem acontecer: viagem a trabalho, doenças na família,

oportunidades de grana, traições afetivas. Os coitados dos crentes

que os seguem nunca percebem que nada muda na vida que possa ser

provado como tendo sido resultado da ação desses picaretas. Mas

quando algo de fato acontece (sempre acontece, porque essas são

áreas de choque na vida), você, pobre crente, acredita que o aviso foi

uma forma de proteção que os guias desses picaretas lhe deram. Aí,

de novo, você estará perdido. Se algo de ruim acontece, eles

avisaram. Se eles disseram para você gastar uma grana para evitar

que esse algo de ruim aconteça, quando o "trabalho" feito não

funciona, os picaretas do espírito dizem que não funcionou porque

faltou algo em você, ou no material usado (ou seja, você errou em

algo), ou aquilo de ruim tinha de acontecer para a sua evolução

espiritual.

Esse argumento de evolução espiritual serve para tudo,

porque ninguém sabe onde ela começou. Uns dizem que começou

quando erámos pedra, mas como pedras não falam, não temos como

entrevistá-las e checar a informação sobre nosso parentesco com

elas. Talvez seja por isso mesmo que elas servem: porque não temos

como checar a informação! Tampouco sabemos quando a evolução

espiritual acaba. Alguns dizem que viramos luz, mas como luz não

fala... E então todo o ciclo da impossibilidade de checar o que eles

falaram se repete ao infinito.

A chave do picareta do espírito é dizer o que todo mundo

sabe que pode acontecer e capitalizar para si o que de fato acontece ou

terceirizar tudo aquilo que ele errou ao dizer que ia acontecer. O

crente parece esquecer essas coisas óbvias quando cai sob a

"proteção" do picareta do espírito.

E no meio da tal evolução espiritual cabe tudo. É evidente

que temos coisas a aprender na vida, mas isso nada tem a ver com

picaretas espirituais que cobram grana de você e em troca vêm com

historinhas que servem só para você continuar dando grana a eles.

Algumas pessoas sustentam esses picaretas durante anos, compram

casas para eles, carros, roupas, dão viagens. Eles testam você e,

quando percebem que você tem grana e fé neles, o céu é o limite do

abuso que sofrerá. Para ser um picareta do espírito você precisa ter

algum talento especial. No mínimo ser observador, manipular bem

as três áreas de choque às quais me referi e entender um pouco de

psicologia humana para saber que somos uns desgraçados

amedrontados, carentes, abandonados, e que isso se vive no dia a dia,

com os pais, os filhos, os cônjuges, os colegas de trabalho. Um

picareta do espírito, em geral, é uma pessoa minimamente

encantadora e que domina alguma linguagem tradicional, que pode

vir da África (esses são bons porque também metem medo nos

desgraçados por causa de coisas conhecidas como vodu – o que

necessariamente não tem a ver com o nosso aqui no Brasil), da

Austrália (bem na moda) ou mesmo da Amazônia (para os mais

naturebas e que não falam inglês).

Quando você vir uma vítima de um picareta do espírito,

lembre que isso é pré-histórico. E deixe-me perguntar uma coisa:

você já morreu numa grana com um desses picaretas? Que pena,

quem mandou ser bobo.

Ser um pouco cético ajuda nessas coisas. Mas, antes de

tudo, se pergunte: por que esses picaretas não conseguem resolver a

própria vida e sempre precisam da sua ajuda para manter a

picaretagem funcionando?

Filosofia para Corajosos- Luiz Felipe PondéWhere stories live. Discover now