Contos de Inverno: A Rainha Negra - Thais Oliveira

Bem-vindo a Forton

Seus pais estavam completamente adormecidos, nada escutaram e nem tiveram noção de que os dois haviam despertado. Emmeline acompanhou o animal até a cozinha, onde o perdeu de vista. Ela o procurou lá dentro e depois abriu a porta dos fundos para ver se ele havia saído, o gato não estava mais lá. Mas em um galhinho seco e congelado de uma árvore recolhida próximo a porta, cantava uma cotovia solitária anunciando o amanhecer. Ela deu um passo para fora de casa e ouviu seu irmão atrás de si:

— Onde pensa que está indo?

— Ham... É que... — Ela gaguejou ao tentar se explicar.

— Fique aqui. — Ele disse puxando-a para trás e observando atentamente o jardim.

Ele estava quase entrando quando o som do trinar da cotovia lhe chamou a atenção. Richard olhou para o relógio na cozinha e eram duas da manhã. Duas da manhã, em meio a uma nevasca, aquela cotovia estranha não deveria estar ali. Ele se encolheu em seu casaco e saiu da cozinha para observar melhor, então algo caiu entre seus pés. O rapaz se abaixou e pegou um pergaminho minúsculo que caiu justamente das patas da cotovia. Emmeline ergueu a vela e fez menção se aproximar:

— O que é...?

— Não venha para cá. — Ele sinalizou com a mão para que ela não se aproximasse, havia nervosismo em sua voz.

Ele leu rapidamente, guardou o papel no bolso e olhou para os lados como se procurasse algo ou alguém. Richard entrou novamente, impelindo Emmeline a ir cada vez mais para dentro de casa.

— O que era aquilo? — Ela disse com sua voz suave tremulando de incerteza.

— Nada. Não era nada. — Ela o olhou desconfiada, ele sorriu gentilmente e começou a acariciar seus cabelos — Volte para a cama.

Ela estreitou os olhos para ele, mas obedeceu. Ela se virou para subir novamente e ele ficou um pouco para trás para fechar a porta que permanecia aberta. A menina subia as escadas conjecturando várias coisas quando, ao olhar pela janela ela viu Richard se afastando da casa pelo jardim dos fundos e ele não estava sozinho. Ela deu a volta imediatamente e foi em direção a cozinha correndo. Ao chegar da porta ela olhou e olhou, mas já não via seu irmão.

— Richard! — Ela gritou o mais alto que pode, mas ele não respondeu.

Já em pânico, ela olhou em redor e a única coisa que viu foi a pequena cotovia que encolhida no mesmo galho, se sacudiu e alçou vôo. Como que tomada por instinto, a menina a seguiu, deixando a vela que estava em suas mãos cair ao chão e ser apagada pela neve.

— Richard! — Ela continuava a chamar — Onde você foi?

No meio da névoa densa, ela mal conseguia ver onde estava indo, mas uma sombra lhe cruzou o caminho à distância e ela a seguiu. A nevasca recomeçou e a neve no chão pesava seus passos, mas ela não parou porque sabia que seu irmão estava bem perto, era ele sim, ela tinha certeza. E como antes, ela teve a impressão de que havia alguém com ele. O horizonte enevoado e a escuridão da noite eram obstáculos severos para ambos. Emmeline chamou seu nome diversas vezes, mas ele parecia não escutá-la. No meio do frio e da escuridão, ela percebeu que sua casa já estava muito distante. A menina sentiu como se a névoa começasse a tomar sua mente. A escuridão apagou sua visão, ela só percebeu que a imagem dele desaparecia cada vez que ela o tentava alcançar. Quando ela se deu conta, Richard havia sido conduzido a uma caverna escura e congelada. Ela não sabia o que estava acontecendo, só sabia que precisava alcançá-lo.

Trêmula, levou sua mão a parede gélida da caverna e seguiu se apoiando nela, tropeçando em pedras e pedaços de gelo. O cabelo caía em seus olhos e a escuridão era perpétua. No fim da caverna sentiu a parede de pedra se converter em uma placa maciça de metal. E quando o gigante túnel chegou ao fim, seus olhos divisaram uma coisa inesperada, uma floresta de altos pinheiros congelados e imponentes se revelava. Lá a neve caía entre os galhos e pousavam apaticamente sobre a menina abismada. Era um lugar obscuro e tenebroso, onde não parecia ter nenhuma gota de vida sequer.