Natan, Pea e o Cálamo

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Ouro, Prata, Bronze, Marfim, Safira, Ônix e Cristal. As sete chaves foram criadas há muito tempo para guardar poderes fenomenais. Os portadores dessas chaves poderiam dominar esses poderes.
Grandes guerreiros, portadores de armas fantásticas e domadores de criaturas incríveis, batalham pelo mundo em busca dessas e muitas outras peças que revelem os segredos da grande e antiga esfera de ferro, a Iron Moon.



Capítulo I


Natan, Pea e o Cálamo


Dia da Bandeira - Festival de Balsa-Mor

Passos leves, porém apressados. O som da longa e fina espada, que sem bainha era presa à sua cintura por uma argola dourada, ecoa pelo corredor, aberto pela esquerda com enormes janelas. Diante de uma grande porta, guardada por dois soldados de aparência forte, ele para. Seu sorriso cínico é descoberto ao levantar com o indicador esquerdo a aba de seu elegante chapéu vermelho-escuro. Retirando a luva branca, ele mostra a mão direita para um dos guardas, que dá duas batidas na porta, aberta no mesmo instante pelos guardas de dentro. O homem pálido - e magro - entra e a porta é fechada.

Do lado de fora, no topo de outro castelo, alguém mascarado, de sobretudo preto, esperava a saída do homem pálido. Numa das pequenas torres do castelo conde entrara o alvo, uma estátua estranha, com asas pontudas e semiabertas, se move, sacudindo o pingente de seu cordão, de onde saía uma suave luz roxa, e dizendo:
- A única saída dele é por onde entrou. Ele vai voltar pela passarela.
Tal passarela ligava os dois antigos castelos, que ficavam de lado um para o outro.
O mascarado também sacode o cordão:
- Certo.
Ao entrar na grande e mal iluminada sala, já fechadas as portas, um homem - que parecia um mordomo - caminha em sua direção e lhe estende a mão. Ao erguê-la ao mordomo, um símbolo aparecia, brilhando, nas costas da mão: um olho com seis tentáculos. A luz era alaranjada.
- "Era". Diz o mordomo, em voz alta, voltando para perto da mesa, no meio da sala.
Atrás da mesa, com apenas uma das mãos fora as sombra - uma mão robusta e cheia de anéis - o aparentemente poderoso diz, em tom de riso:
- "Era"?
- Onde está o Cálamo? Pergunta o magro e apressado visitante.
Após uma breve risada, o nobre retruca:
- Você trouxe o combinado?
- Está aqui.
O magro de chapéu vermelho retira do bolso de seu sobretudo uma pequena caixa de madeira.
O mordomo vem novamente, pega a caixa e a coloca sobre a mesa. Na sombra, o nobre abre a caixa, toca seu conteúdo com o polegar e coloca o dedo na língua. Por alguns segundos, silêncio.
- É, funciona.
Logo em seguida, ele coloca uma maleta sobre a mesa. O mordomo a entrega ao magrelo de sobretudo, que a segura enquanto ele a abre lentamente, mostrando assim seu conteúdo, o motivo de sua vinda: o Cálamo. Uma caneta prateada, com bico-de-pena numa extremidade e uma esfera de vidro na outra, guardando uma tinta preta quase hipnotizante. Ao olhar novamente para a mesa, não viu mais a mão do mercenário misterioso, nem sequer a silhueta do mesmo naquela sala sombria.

Do lado de fora, o "homem-gárgula" e o mascarado estão prontos. A porta é aberta e os dois o veem passar pelo corredor aberto, rumo à passarela.
- Agora! Sussurra o mascarado, fazendo um sinal e saltando sobre a passarela.
O gárgula salta da torre, abre suas enormes asas e voa em direção ao alvo, que para no meio da da passarela ao perceber a emboscada. Com um inimigo correndo em sua direção - com um punhal em cada mão, preso por correntes a algum tipo de mochila em suas costas - e outro voando pela sua direita, ele joga a maleta para longe, fazendo com que o gárgula mudasse de direção e fosse atrás dela. Assim, restara um oponente, que vindo com seus punhais errou por centímetros o rosto do magrelo, dando a ele os milésimos necessários para pegar sua espada.

Lá embaixo, poucas pessoas passavam, já que o festival ocorria a uns três quarteirões. Embaixo da passarela havia uma pequena fonte, decorada com arte clássica, cheia de detalhes, alguns trincados, outros quebrados. Um garoto observava as nuvens, refletidas pela água, que se movia devagar, pela pouca água que saia.
Não muito longe, de cima de uma placa velha com um brasão de um daqueles bares da cidade, outro rapaz o olhava, só por olhar mesmo, assim como olhava para duas ou três pessoas que passavam de vez em quando. Ele vê o gárgula em seu salto da torre, se assusta e quase cai da placa em que estava deitado. Segurando-se na madeira de cima da Placa, ele assiste a luta entre um homem magro com sua espada e um mascarado, com punhais e correntes. Não era possível entender muita coisa. Os dois eram muito ágeis. Desviou então o olhar, procurando o gárgula. Estava em cima do telhado de um dos castelos, abrindo uma maleta.
- Não está na maleta. Está com ele! Diz o "homem-gárgula", após sacudir o pingente roxo em seu cordão.
O mascarado parecia já saber disso e desferia golpes mais fortes, todos defendidos com classe pelo homem de chapéu, que dá alguns passos para trás e tira do bolso de seu sobretudo o Cálamo. Em segundos o mascarado para de atacar, o magrelo sorri, com seus olhos grandes, e quando ele decide levar a caneta em direção à sua própria espada, é surpreendido pelo gárgula, que chegava à passarela num pouso nada delicado.
As garras da criatura passam como flechas perto do rosto do portador da caneta - "portador" até esse momento. O gárgula capota, arranhando o corrimão, e rasgando o teto de lona. A caneta é arremessada, depois do impacto que sofre na barriga o homem do chapéu cor-de-sangue. Eles não percebem o Cálamo e ficam tentando, no chão da passarela, arrancá-lo um do outro. O mascarado, que havia parado antes, vê onde a caneta cai: na fonte onde estava sentado o garoto de camisa azul.

PLUF! O garoto levanta assustado. Estava distraído em algum pensamento de jovem. Ele abaixa e vê o objeto no fundo da fonte, naquela água cristalina. Esticando o braço, retira a caneta, enxuga na camisa e depois rabisca a palma da mão, para ver se estava funcionando. E estava. Mas a tinta evaporou de repente, e como cinzas ao vento, se desfez. O rapaz franze a testa, e quando decide guardar o objeto em sua mochila, o garoto de camisa listrada - aquele da placa, que viu tudo - veio correndo em sua direção e disse:
- Ele está vindo atrás disso. Vem comigo!
O rapaz da camisa azul olha para trás e vê, um pouco distante, um homem lutando com uma gárgula, e outro descendo o castelo, com punhais e correntes, correndo pela rua pouco movimentada. Um barulho ia aumentando até que, quando o homem da máscara branca se aproximou do cruzamento onde estava a fonte, a passeata do festival, com muitas pessoas e máquinas grandes, atravessou em sua frente. Ele se esconde.
Os dois garotos aproveitam e correm para o centro, onde havia mais gente.

- Ah! Até aqui está bom. Diz o rapaz de camisa listrada, ofegante, ao chegarem num beco.
O outro, também cansado, tira da mochila o objeto que achara e senta num caixote de madeira.
- Eu me chamo Pea. E você? Sabe que a gente pode conseguir muito dinheiro com isso aí, não sabe?
O rapaz de azul apenas olha a caneta, ainda respirando pesado.
- Quanto?
- Quanto o que? Era evidente que Pea não era muito inteligente.
- Quanto dinheiro acha que consigo por isso?
- Ah, não sei... O bastante pra comprar um castelo desse. Espera aí! Como assim "consigo"? Eu ajudei você...
- E... como você sabe que vale tanto?
- Como eu sei? Você não viu aquele cara? Ele estava atrás disso aí. Tinha outro com ele. Eles tentaram tomar de um cara com um chapéu vermelho...
- Tá! - O menino de azul interrompe - Onde eu venderia isso?
- No mercado negro, ué!
- Nunca! Ele se levanta e continua: Vou devolver ao dono.
Pea levanta-se indignado.
- Devolver? Você é doido? Aposto que nunca precisou de grana pra nada! Deve ser um filho de papaizinho, que nunca soube o que é morar na rua!
Os dois ficam calados. Por quê aquele objeto tão pequeno era tão importante?

Na rua, gritando como um louco, vinha passando um jovem ruivo com boina e uma camisa cinza, usando suspensório.
- Natan! Natan!
Os dois garotos olham para fora do beco, e veem o rapaz correndo, com caixote cheio de frutas.
- Te achei! Natan, estamos indo. Onde você estava? Te procurei por todo lado... Não ia pegar água pra nós? Quem é o seu amigo?
- Ah.. Oi, Dumont... É que eu me distraí...
Antes que Natan concluísse, Pea entra na frente e dá um sorriso esquisito.
- Eu me chamo Pea! E você?
- Pea?!
- Isso! Pea!
- E como se escreve?
- P-E-A: Pea. Legal, né?
- Mas Pea não é nome de gente.
- O que?? Ira-se Pea: Eu sou Pierre Walter! Esse é o meu nome! Mas eu não gosto. Me chame apenas de Pea. P-E-A.
- OK, então. Responde Dumont, meio desconsertado.
Natan guarda novamente a caneta enquanto eles caminham.
- Pra onde vocês vão? Indaga Pierre.
- Pra casa. Quer vir com a gente? Pergunta Dumont.
Natan dá uma cotovelada e sussurra: Não!
Pierre pula de alegria, gritando:
- Sério?
Dumont pergunta para Natan:
- Por quê não?
- Ele quis dizer "outro dia"... Fala Natan a Pea, tentando se livrar do jovem excêntrico.
- Escuta aqui! Eu que te falei que pode vender isso, eu te ajudei a fugir do homem que parecia a morte... Se não fosse por mim, você teria devolvido isso aí!
Dumont não entende coisa alguma e continua andando. Pierre insiste:
- Você nem sabe quem é o cara. Só eu posso te ajudar a achar esse cara.
Natan finalmente para e concorda:
- Tá bom. E o que vai querer? Metade do lucro?
Ele corre na frente de Natan e grita:
- É! E comida!
- Lá em casa tem bastante comida - ajuda Dumont.
- Hehe! E Pea vai com eles, feliz como uma criança.

Natan, sem imaginar o que estava por vir, abre a bolsa para olhar o Cálamo, e também um outro objeto, dourado, com um detalhe azul como safira: uma chave, que o lembrou das frases que escutara de um velho, meses antes:


"Essa chave que você está segurando não é apenas uma relíquia deixada por seu pai.
Era a sua arma.
Neste momento, todo o poder de seu pai está em tuas mãos.
E agora? O que você vai fazer com esse poder?"

Iron MoonWhere stories live. Discover now