— Nitria? Você ainda está aí?

Ouvi Mateus perguntar, parecendo estar se divertindo por eu me perder em meu devaneio.

— Ainda.

— Ei. Não fica assim, tá? Sou seu irmão e mesmo que não goste muito disso, se é o que você quer, estou aqui por você — ele prometeu beijando minha testa, da mesma maneira que costumava fazer em casa, o que me fez fechar os olhos e desejar voltar para o tempo em que éramos crianças e um beijo desses curava todos os meus males. — Tenho que ir. Se precisar conversar, sabe onde me achar.

Então ele se foi, me deixando sozinha com todos aqueles sentimentos em conflito dentro de mim.

Deixei a varanda, voltando minha atenção para o resto do quarto, procurando pela flor do dia. Eu estava guardando todas num caderno que Aliena tinha arrumado para mim, onde eu anotava detalhes sobre cada flor. Era a parte mais relaxante do meu dia. Eu me sentia como eu mesma, a garota que amava plantas, e não essa que convive com a família real e tudo mais. A formiga, e não a futura onça. Só que a flor não estava ali. Thomas tinha se esquecido e com isso tinha roubado a melhor parte do meu dia.

Respirei fundo para não explodir ali mesmo e saí com a intenção de ir para o jardim e arrumar uma flor eu mesma. Peguei o caderno e segui pelo corredor. Lógico que Adam veio atrás de mim, o que me deixou ainda mais irritada. Lancei um olhar mal-educado para ele e quando me virei esbarrei em algo, o que quase me fez cair com tudo no chão.

— Vic?

— Está fugindo de alguém? — perguntou ao massagear seu ombro que ela havia batido em mim.

— Victória, eu...

Só que ela me interrompeu, no momento exato que percebeu o que eu iria dizer. Com sua mão levantada ela queria dar aquilo como assunto encerrado, mas eu não conseguia.

— Desculpa. Mesmo. Eu não queria te magoar. Te juro. Se eu pudesse te explicar...

— Não tem nada para ser explicado. Você vai se casar com ele. Fico contente por você.

— Victória...

Não tinha como ignorar a mágoa em sua voz. A dor era mais transparente que a água. Tão transparente como as lágrimas que resolveram brotar de meus olhos.

— Espero que vocês dois sejam felizes juntos.

Um soco no estômago teria doído menos que suas palavras. Com as lágrimas já escorrendo pelo meu rosto, saí pelo palácio quase correndo, ignorando tudo e todos no meu caminho. Surtar não era uma das liberdades que eu, como peça, poderia ter, mas meu noivado deveria servir pelo menos para isso.

Passei por uma das portas que dava para os jardins e a partir desse ponto realmente saí correndo para o mais longe que eu consegui. Adam deveria ter se perdido de mim ainda dentro do palácio, em meio a tantos funcionários que entravam e saíam com coisas para a grande festa. Então, quando parei, estava realmente sozinha em meio a arbustos e flores, onde me joguei no chão e chorei, com a cabeça apoiada em um banco.

Chorei tudo que queria, tudo que podia. Sentia-me perdida e confusa. Apenas deixei fluir todo o peso que eu andava carregando em minhas costas há muito tempo, tudo de uma única vez.

Não sei quanto tempo passei ali, daquele jeito, e a sensação que tive quando as lágrimas cessaram era de ter sido anestesiada. Meus problemas pareciam terem sido lavados de minha mente e nem mesmo conseguia me sentir zangada.

Olhei para minhas mãos e vi meu caderno, já com algumas páginas amassadas. Sentei-me direito ao lado do banco e o coloquei no colo, na esperança de não ter perdido nenhuma das flores na minha correria. Meu vestido estava todo amassado e pela primeira vez me vi com algo que não era preto, branco ou azul desde que cheguei ao palácio. Um pequeno sorriso me escapou ao perceber que a estampa do vestido era florida, o que combinava com tudo em minha volta.

Jogos da Ascensão - Livro 1 da Duologia Jogos da AscensãoWhere stories live. Discover now