Prólogo

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Vale do Oeste, México. 2012

Anahí espiou pela fresta da porta quando seu pai sentou no sofá que ficava no escritório. Suas mãos cobriram seu rosto e sua madrinha sentou ao lado dele. A mão dela cheia de anéis apoiou em seu ombro e apertou.

- Vai ser melhor assim meu irmão, além disso, ela não quer ficar aqui. - Lara suspirou.

Anahí enxugou o rosto ao ouvir falarem dela. No fundo ela não queria ir, mas o que podia fazer? Como ia ficar em Vale do Oeste depois do que aconteceu? Para Anahí não era certo ela ficar, ela tinha que ir embora.

- Eu sei, tentei, mas não consegui convencê-la do contrário, o que aconteceu... Acabou com todos! - Enrique suspirou.

- Vou cuidar dela como se fosse minha filha, ela vai ficar bem. - Laura sorriu. - Além disso a Suíça é um país maravilhoso, lá ela vai ter a melhor educação, vai estudar na Universidade de Zurique, vai ter a chance de aprender alemão, francês, italiano e até romanche* se ela quiser. Tudo isso, essas novidades vão ajudá-la a superar o que aconteceu e se ela quiser, ela volta.

- Tudo bem, você tem razão. Você é a única irmã que eu tenho, preciso que alguém de confiança cuide dela enquanto ela estiver fora. Mesmo ela indo pra tão longe, eu estou de acordo.

- Ótimo! - Lara ficou de pé.

Anahí se afastou da porta e subiu as escadas correndo, parando no corredor. Sua mãe e seu irmão Christopher estavam na sala. Ela ouviu os murmúrios, mas não conseguiu entender o que eles falavam.

Ela ficou parada ali em silêncio tentando acalmar seu coração que batia acelerado.

- Anahí, desça aqui, por favor! - seu pai chamou minutos depois.

Respirando fundo ela obrigou-se a se acalmar e desceu os degraus em passos silenciosos. Quatro rostos sérios a encararam e ela os encarou de volta apreensiva.

- Faça suas malas querida, viajamos pra Suíça amanhã cedo. - Lara era a única na sala que sorria.


* A Suíça possuiu 04 idiomas oficiais: alemão, francês, italiano e romanche.

A maior cidade da Suíça, Zurique tem como idioma oficial o alemão enquanto que em cidades como Genebra, o idioma oficial é o francês. O italiano entretanto é a língua oficial nos vales de Cantão de Ticino. E por último o romanche é uma língua quase extinta falada por menos de 1% da população da Suíça.

Como a história é contada em Zurique ou Zürich em alemão, algumas palavras nessa idioma serão citadas pela Lara e Anahí na história.



Anahí fez o que mandaram, arrumou todas suas coisas nas malas. Como recordação daquele lugar colocou na mala dois porta-retratos: um dela com sua melhor amiga Leticia e outro onde ela estava com toda sua família.

Na manhã seguinte ela levantou cedo e com o coração partido se despediu dos pais. Ao sair pra fora da casa se despediu dos peões.

- Quer ir ao estabulo uma última vez? - Enrique perguntou com esperanças de que há qualquer momento a filha mudaria de ideia.

- Não! - ela respondeu com a voz embargada.

Ao passar pelos peões ela não conseguiu mais segurar o choro ao ver sua melhor amiga. Letícia se aproximou chorando e a abraçou.

- Você mentiu pra mim, disse que íamos fazer veterinária juntas. Você não tem culpa do que aconteceu, não tem que ir embora. - soltou Anahí. - Deixa ela ficar aqui senhora. - suplicou encarando Lara.

- Não sou eu quem a está levando, é ela quem quer ir. - Lara deu de ombros.

- Leeh me escuta! - Anahí a encarou com o rosto sério. - Eu não posso ficar, não é justo eu ficar aqui como se nada tivesse acontecido enquanto...

- A culpa não foi sua! Não é justo você fazer isso, você ama esse lugar.

- Eu vou deixar de amar, meu lugar é com a minha madrinha agora, entenda isso.

- Então eu não sou mais a sua amiga. - a encarou magoada e deu as costas.

Anahí pensou em ir atrás dela, mas talvez fosse melhor ela e Leticia não serem mais amigas, já que pelos planos de Anahí nunca mais iriam se ver.

- Madrinha vamos, por favor! - pediu encarando Lara.

As duas entraram no taxi e Enrique e Christopher acomodaram as malas. Quando o táxi partiu Anahí não teve coragem de olhar pra trás. Tinha medo de fazer isso e desistir de ir embora.

- Eu não quero mais voltar a pisar aqui madrinha.

Lara suspirou não concordando com a afilhada.

- Não pense nisso agora. - respondeu a abraçando e acariciando seus cabelos. - Pense em tudo que ta te esperando na Suíça, como você vai crescer e amadurecer lá.

Anahí assentiu e tentou seguir o conselho da madrinha.



Zürich, Suíça. 2015


Anahí caminhou lado a lado com sua tia pelo parque de Lindenhof (foto no inicio do cap). Havia várias pessoas por ali algumas tirando fotos de um dos pontos turísticos da cidade. Segundo a história que ela aprendera a conhecer Lindenhof no passado foi um ponto de estratégia da cidade. Era uma fortaleza romana e por isso até hoje era possível notar resquícios do estilo medieval, algo que fascinava os turistas.

Suspirando Anahí se sentou em um dos bancos.

- Sei que você está chateada, mas foi seu pai quem me pediu. - sua madrinha argumentou.

- Patin*! A senhora e ele sabe perfeitamente que eu não quero voltar pra Vale do Oeste.

- Any já faz 03 anos que aconteceu e você nunca mais voltou.

- E não vou voltar, não enquanto... - mordeu o lábio sentindo a garganta arder. - Como vocês querem que eu supere, que eu volte pra lá e finja que nada aconteceu se todos os dias eu lido com as consequências do que eu fiz.

- Foi um acidente, ninguém colocou a culpa em você.

- Mas foi minha culpa. - retrucou e enxugou o rosto com raiva, os olhos focados no rio Limmat à frente delas.

- Tudo bem, a única coisa que estou pedindo é que você vá agora que está de férias da faculdade. Um mês Any não é tanto tempo assim. Poxa toda sua família sente sua falta, Dulce está prestes a dar à luz, você não tem o mínimo interesse em conhecer seu sobrinho? - Anahí cruzou os braços e ficou quieta sem responder. - Eu e seu pai nunca te pedimos nada, só estamos pedindo pra você ficar lá por um mês acompanhando as obras de expansão da fazenda. Você não ta fazendo faculdade de Arquitetura? Não diz que quer assumir os negócios da minha empresa? Como vou te passar tudo se você nunca acompanhar um processo de perto?

- Mas justo lá tia?! - suspirou.

- Por favor! Se não quer fazer por você, faça por mim e por seu pai.

- Scheiße! (Merda!) - Any xingou. - Está bem eu vou! Por vocês dois, mas principalmente pela senhora Patin.

- Dank meine tochter! (Obrigada minha querida) - Lara sorriu.



* Zürich: Zurique em alemão, idioma oficial do lugar.

* Patin: madrinha em alemão.

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