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Richard Rios

Eu não sei exatamente a que horas acordei, só sei que meu corpo gritava por mais cinco minutos de cama. O treino de ontem tinha sido pesado—na verdade, pesado é pouco. Eu saí do campo com a sensação de que minhas pernas eram duas pedras amarradas por cordas finas.

E, mesmo assim, eu sabia que a manhã de hoje seria pior.

Dia de fotos oficiais do clube sempre me deixava meio impaciente. Todo mundo acha que é fácil: só vestir a camisa, sorrir e pronto. Mas a verdade é que é cansativo, demorado, cheio de ajustes e poses que ninguém gosta de fazer.

E pra completar, desde ontem, eu tinha uma pulga atrás da orelha. Na verdade, umas quatro como se fossem irmãos gêmeos: Veiga, Gómez e Rafael.

Os três tinham passado o treino inteiro zoando, rindo e jogando charme pra cima da fotógrafa nova. A Nina.

E antes que alguém pense o contrário, não, eu não tenho nada com ela. Nem pretendo. Nem deveria pensar nisso. Ela é funcionária do clube, é nova na cidade, tem aquela cara de menina que não merece o tipo de tumulto que ronda a vida de jogador.

Mas alguma coisa nela chamava atenção. E o fato do trio do caos estar em cima dela me deixava irritado por um motivo que eu mesmo não sabia explicar ainda.

Levantei, tomei meu banho, vesti uma roupa simples e segui para o clube. Ainda estava escuro; a manhã parecia preguiçosa igual eu. O relógio marcava 06:10. Chegaria lá rápido.

Quando estacionei, quase não havia carros no estacionamento. O pessoal da limpeza estava começando a circular, e a equipe de comunicação ainda nem tinha chegado.

Mas ela já estava lá.

Eu vi quando passei pelo corredor de vidro: Nina estava no estúdio improvisado, mexendo nas luzes, arrumando tripé, testando câmera. Cabelo preso num coque meio bagunçado, camiseta preta, calça jeans, expressão de quem dormiu pouco e já estava na batalha.

Entrei devagar, esperando que ela percebesse minha presença. Mas ela estava tão concentrada que nem notou.

— Bom dia — falei, encostando o ombro na parede.

Ela deu um pequeno salto, como se estivesse vendo um fantasma, e colocou a mão no peito.

— Nossa... — respirou fundo. — Eu não ouvi você entrar.

— Foi mal — dei um meio sorriso. — Não queria assustar.

Ela balançou a cabeça, soltando um riso pequeno, quase tímido.

— Tudo bem. É cedo demais pra eu estar funcionando direito.

Me aproximei só alguns passos. Não queria parecer um dos três palhaços do dia anterior.

— Chegou cedo — comentei.

Ela ajeitou um dos refletores.

— Hoje é dia cheio. E… sei lá, gosto de me organizar antes.

“Gosto de me preparar antes.”

Soava como alguém que não tinha ninguém pra dar suporte, alguém que sempre teve que fazer tudo sozinha. Não sei por quê, mas eu reconhecia aquele tipo de cansaço no olhar dela. Tinha muito de mim, de quando eu era mais novo.

— Quem vem primeiro? — perguntei.

Ela pegou uma prancheta e conferiu.

— O Gómez. Depois Veiga, Rafael… e você por último.

— Me deixou pro final só pra me torturar, né?

— Nada pessoal — ela sorriu de verdade dessa vez. — É só que você tem mais fotos e vídeos.

INFLAMÁVEL Where stories live. Discover now