Cap. 1 - A Família Adams

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Quebrando o padrão dos automóveis comuns naquela autoestrada, veio ultrapassando em disparada o carro da família Adams. Não, não essa família Adams. Eram pessoas comuns, por mais que o filho mais velho, Nathan, tenha comparado os quatro com monstros inúmeras vezes. A van que David dirigia estava vestida de noiva, repleta de placas pedindo para as pessoas buzinarem. É isso que dá perder apostas. Nathalie confiava muito no filho, e quando ele disse que era extremamente popular na escola, ela acreditou, o contrário do restante da família. Nathalie pediu para que Lily e Emily, as caçulas, apoiassem o irmão pelo menos daquela vez. Elas jamais fariam uma coisa daquelas, mas a mãe sabia mimar as duas, requerendo qualquer coisa com gigantes olhos de gato pidão.

Como estavam na seleção de um carro novo, seu pai quis amedrontá-los, testando a falsidade daquela crença. Se Nathan não provasse sua popularidade até o fim do ano letivo, no lugar da Range Rover Evoque ele compraria... Bom. Em todas as tentativas, seus amigos não estavam lá, vezes porque supostamente tinham ficado doentes ou por já terem tirado férias. As gêmeas ficaram furiosas, aumentando ainda mais o grau de bullyng que faziam com o irmão. Até o dia que provasse de fato, seria levado para a escola no Noiva-móvel e jamais perderia a fama de ter apenas amigos imaginários.

Lily apontou que na outra escola as crianças eram levadas em uma van horrorosa, e que as mães pagavam os motoristas. Questionou então se teria que pagar David para serem levadas naquela coisa ridícula. Emily perguntou se poderiam levar outras crianças junto e cobrar a viagem para trocar de carro. Apesar de achar uma ideia muito criativa, David negou. Estava super contente com o carro novo e com a vergonha que os filhos estavam passando.

A viagem ocorreu dois meses depois da compra, tempo suficiente para que simplesmente nem ligassem mais. Começaram a fingir que não se importavam para não dar o gostinho para David, e depois de um tempo realmente não ligavam mais. O carro por fora era feio, mas por dentro era muito bom. Lily e Emily até apelidaram o carro de Nathan-móvel. Feio que nem o cão por fora, mas com um bom coração.

Em relação ao carro não havia discussões sobre lugares, já em relação a todas as outras coisas os três filhos viviam em guerra, sempre tendo reclamações da parte de Nathan. Apesar das feições angelicais que só faltavam pedir uma auréola reluzente em suas cabeças, Lily e Emily eram umas pestes. Sempre quando exploravam sua criatividade, Nathan era o rato de laboratório. Como quando pregaram seu par de tênis no assoalho, no dia que substituíram seu colchão por uma réplica feita de chicletes ou na vez que colocaram minhocas embaixo da sua macarronada.

Nathalie era sempre muito calma e adorável, então resolvia as coisas com pequenas frases, como: Elas são só crianças; Não implique tanto com elas e Aprenda a conviver com as duas. Óbvio que ele se irritava com essas respostas, mas nada comparado com a clássica: Elas não fizeram por querer. Era muito comum mesmo alguém escorregar e ''acidentalmente'' pregar um par de tênis no assoalho da casa. Acontece o tempo todo.

Mas nada pior do que quando reclamava ao outro adulto da casa...

— Pai! A Lily e a Emily colaram meus olhos com cola quente!

— Irru!

Então o melhor era reclamar com Nathalie, mesmo que não adiantasse nada.

Durante a viagem os pais e as gêmeas cantavam Ballroom Blitz com toda a energia que podiam gastar naquele instante. Aquele era o tema da família. As garotas quase se desprendiam dos cintos quando o refrão chegava, e David mal conseguia decidir entre cantar e dirigir. Já Nathan estava emburrado, com a cabeça encostada no vidro entreaberto do carro, fazendo seus cabelos castanhos lutarem contra o vento. Por mais que adorasse viagens e aquela música em específico, no momento não se divertia nenhum pouco. Ele adorava a cidade onde morava, e a ideia de ir embora não entrava em sua cabeça. O garoto estava praticamente esmagando a orelha na borracha do vidro elétrico, porém nem notava o incômodo. Estava distante, imaginando as malas no teto e bagageiro caindo de lá e sendo atropeladas pelos carros de trás, cancelando aquela mudança indesejada. Se desencostou da janela, sentindo só naquele instante o resultado do peso de uma cabeça sobre uma orelha. Apoiou a nuca no encosto do banco e revirou os olhos, extremamente entediado. Pensou que não seria tão ruim assim ser uma das malas do bagageiro no incidente recém criado por si mesmo.

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