Dois Pontos no Universo

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Qual a probabilidade de uma pessoa se apaixonar por outra à primeira vista?

Eu respondo à vocês: nenhuma.

Não existe esse negócio de olhar para uma garota, garoto ou o que for e se apaixonar. A paixão é um conjunto de fatos e ações que fazem as pessoas gostarem uma das outras.

O que existe a primeira vista é uma simples atração, somente pela pessoa ser considerada mera e fisicamente atraente.

Vocês me perguntam se acredito no amor. Eu lhes respondo que sim. Acredito nessas quatro letras, nessa pequena palavra que significa tantas coisas.

Em todas as variações do amor. Em todas as línguas.

Acredito que o amor é uma coisa única.

Amar não se conjuga no passado. Se você ama uma pessoa de verdade nunca vai deixar de amá-la. Quando se ama, ama-se eternamente.

Como este menino que aqui se senta com esta mulher. Ou como uma mãe se senta aqui com seu filho.

Como o amor que existe entre esses dois.

O menino deve ter por volta de cinco anos, de um tom de pele bem escuro. Lindo de se ver.

A mulher que o acompanha é branca. Veste uma saia comprida e uma blusa regata. Ela está segurando a mão do menino.

Um gesto carinhoso de uma mãe.

Um homem com um carrinho de sorvete para por perto. Algumas crianças vão se aproximando.

O menino olha para a mãe com seus olhos esbugalhados de criança.

"Mãe?" Ele diz. A mãe sorri.

"Posso comprar um sorvete?" A mãe abre sua bolsa, que estava escondida sob o casaco do menino, e retira algumas moedas. Entrega-lhe o dinheiro.

"Compre um para mim também." Ela lhe pede.

"Está bem." O menino sai correndo até onde se encontra o sorveteiro.

Muitas pessoas por perto observam o menino e o olham espantadas. Ele atrai muita atencão. Um garoto adorável e sorridente.

Não consigo acreditar em como muitas pessoas ainda têm preconceito. Uma coisa tão antiga e ao mesmo tempo tão polêmica. Agora mesmo me dá vergonha de descrever como aquelas pessoas estavam observando o pobre menininho comprando sorvete e depois virando seu olhar para a mãe, sem poder acreditar que ela seria a mãe do menino. Dá-me nojo de pessoas como essas.

Eu seria muito ruim se descrevesse esta horrível cena. Seria um insulto a tudo o que já descrevi em toda a minha existência.

Sei que coisas como essas existem no mundo. Repugnância. Pessoas que discriminam umas as outras não deveriam existir. Ser diferente é bom, o que é ruim é ser indiferente.

Voltando para o garoto. Ah, que belo e amável garoto. Sua mãe o assiste de longe. É uma mulher cuidadosa.

O menino volta com dois sorvetes, um em cada mão.

"Aqui, mamãe." Ele diz. "É de abacaxi."

"Meu preferido." Sorri a mulher. "De que sabor é o seu?"

"Morango." Afirma animadamente o menino.

"Mamãe, posso te perguntar uma coisa?"

"Já perguntou." O menino sorri.

"Não mãe, outra coisa."

"Tudo bem querido, diga." Ela lambe o sorvete.

"Por que quando saímos todo mundo olha para você?" É uma pergunta tão inocente. O que o menino não sabe é que as pessoas não olham apenas para sua mãe, afinal, ela é apenas mais uma mulher na multidão, olham para o próprio menino. O lindo e pequeno menino negro que anda com uma mulher branca. Ah, inocência de criança.

A mulher demora um momento a responder. O sorvete derrete em sua mão.

"Porque... hum... porque..." Ela não sabe como responder. "Querido."

"É por que você é muito bonita, mamãe?"

"Querido, não se importe com as pessoas, tudo bem?" Ela coloca a mão desocupada sobre a pequena mãozinha do menino. "O que as pessoas fazem não importa." Ela respira. "O que importa é você e eu e nada mais." Ela beija a bochecha toda lambuzada de sorvete do filho.

"E as outras pessoas, mamãe, não importam?"

"Somos dois pontos iguais em todo universo." A mulher diz. "Sabe por que somos iguais?"

"Não." O menino responde a mãe.

"É porque nos amamos." Ela sorri. "E é isso que importa."

Um Lugar Para AmarWhere stories live. Discover now