O Contrato

Prólogo

Francesca

O dia soalheiro de março é convidativo a tomar um cappuccino na esplanada no centro da cidade, pensei eu. Estava à espera uma resposta do meu novo projeto e a minha ansiedade não me permitia ficar em casa. Eu ansiava uma resposta desde que o submeti na sexta-feira passada, ao final do dia.

Hoje era quarta-feira! Tinham apenas passado dois dias úteis desde que o submeti, após beber uma garrafa de vinho tinto com a minha melhor amiga. Este era o meu ritual desde o primeiro que escrevi. Não podia quebrá-lo! Sempre tive sorte e fui uma das autoras mais vendidas por semanas. Isso repetiu-se pelos três livros. Com o que recebia das vendas do meus livros, decidi deixar de trabalhar como enfermeira para me dedicar inteiramente à escrita. Foi uma jogada arriscada? Claro que sim! Mas o que seria a vida sem riscos?

A minha paixão pela escrita começou por um simples acaso. Trabalhava como enfermeira num lar de idosos, quando conheci o Sr. Matias. Um dos nossos utentes mais queridos e carismáticos. Ele andava sempre com um caderno e caneta atrás de si. Em tom de brincadeira, o Sr. Matias desafiou-me a escrever um pequeno conto para apresentar aos utentes. Acontece que o conto ganhou asas e transformou-se num romance. Eu ia apresentando o que escrevia, durante a semana, ao Sr. Matias. Depressa comecei a mostrá-lo aos outros utentes, que me davam a sua opinião e sugestões para continuar a história. Quando terminei, e por sugestão do Sr. Matias, mandei-o para as editoras. Houve logo algumas interessadas. Acabei por escolher, por muita insistência dele, aquela onde o seu neto trabalhava.

Conheci o neto do Sr. Matias, o Liam, num almoço de Natal promovido pelo lar. Ele era editor-chefe da editora e, também, era escritor. Liam tinha vários best-sellers lançados na sua editora, antes mesmo de ser contratado como editor. Desde esse momento que ele deixou de escrever. Ele era arrogante e muito exigente, pelo menos era com o meu trabalho.

Os meus livros sempre foram muito aclamados. Desde a primeira linha que tenho partilhado com o Sr. Matias. Ele foi o meu impulsionador. Sou muito grata aquele senhor, que descobri que foi o fundador da editora com quem tenho contrato. Nunca pensei que este senhor tivesse trabalho com livros na sua vida. Desde o primeiro sucesso que lhe dedico os meus livros. Tenho sempre oferecido uma cópia autografada ao senhor que me inspirou. Ele guarda-os na sua estante improvisada, no seu quarto, ao lado dos do seu neto. Ele diz que somos os seus autores favoritos. Os livros do Sr. Matias estão carregados de notas adesivas e anotações. Todos os meses chegava, pelo menos, uma caixa com os lançamentos desse mês da sua editora. Cada livro que lhe chega, fazia questão de o ler e anotar nos seus exemplares.

O meu cappuccino esperava-me, enquanto me perco nos meus pensamentos. Observo Liam a chegar à esplanada e aceno-lhe. Ele retribui de volta, mas volta a pegar no seu telemóvel. O trabalho de editor deve ser exaustivo, pois está sempre agarro àquele maldito aparelho eletrónico.

O Liam tinha um ar empoderado, sempre muito bem vestido. O seu cabelo escuro contrastava com os seus olhos azuis, de tirar o fôlego. Ele tinha deixado crescer a barba, o que o deixava ainda mais sexy. O seu fato azul-marinho parecia feito à medida pois evidenciava-lhe os seus melhores atributos. Os seus ombros largos e os seus peitorais saltavam à vista. Este homem deveria passar horas no ginásio, porém era agradável à vista.

Calma, Francesca! Não podes pensar assim do teu editor. Alerta-me a minha mente.

O meu telemóvel emite o sinal de notificação – era do e-mail. Desvio o olhar de Liam para verificar o que se passava — um e-mail da editora. As minhas mãos começaram a suar e a tremer. Aquilo acontecia sempre, antes de algum dos e-mails de aprovação da editora. Abro-o com a certeza de que irão querer publicar o meu novo romance. Leio o e-mail na diagonal, porém o que me chama à atenção é: "a editora optou por não avançar com a edição do seu manuscrito".