Capítulo 5

Depuis le début
                                    

De qualquer forma, pelo menos sobrou uma filha que carregava apreço por uma das atividades que ela mais repudiava; a caça, selvageria, sangue. Irônico... Essas minhas atividades agora salvavam as filhas de sangue Archeron.

Não havia nada dela no chalé além da cama de pau-ferro, e a promessa que um dia eu fiz. Sempre que eu olhava demais para um horizonte, ou pensava se não devia simplesmente andar e andar para onde tinha vontade e jamais olhar para trás, ouvia em uma parte minúscula dos meus pensamentos, aquela promessa que havia feito anos antes, enquanto ela definhava no leito de morte. Cuide delas. Não algo como: fiquem juntos. E sim: proteja elas.

E eu prometi, talvez jovem demais, na juventude dos meus 19 anos de idade, chegando na vida adulta. Ali eu prometi que ficaria com minhas irmãs, as protegeria de tudo e de todos. Nestha, Elain e Feyre eram suas filhas de sangue, apesar de que na época a Senhora Archeron não demonstrava muita importância, ainda sim a prioridade eram as meninas e não eu. Jamais, meu caso foi apenas uma caridade que ganhei, ou ao contrário, já que minha mãe tinha dificuldades para conceber e poucas esperanças de conseguir. Isso, isso não importava mais.

Nesse desgraçado mundo, esse lado da muralha que apenas era protegido pela promessa dos Grão-Feéricos há cinco séculos, nesse mundo, no qual nem mesmo sabíamos direito os nome dos deuses, promessa era lei; uma promessa era moeda de troca; uma promessa era garantia. Havia momentos em que eu a odiava por ter me pedido que prometesse isso. Talvez, delirante de febre, nem soubesse o que estava exigindo. Ou talvez a morte tivesse dado a ela alguma clareza sobre a verdadeira natureza das filhas e do marido; incapazes, inúteis diante da pobreza... Talvez ela soubesse.

Respirei fundo e observei as chamas da lareira minguada dançarem pela lenha restante, aos poucos deixei minha perna esquerda se estender para frente. Virei o rosto para minhas irmãs. Como sempre, Nestha reclamava dos aldeões que não tinham modos, que não tinham traquejo social, ou não faziam ideia de quanto o tecido de suas roupas era inferior, embora fingissem se tratar de seda fina ou chiffon. Desde que perdera a fortuna, as antigas amigas passaram a ignorá-las incontestavelmente, mas ainda sim, elas agiam como se os jovens aldeões fossem um círculo social de segunda classe. Tomei um gole da xícara de água quente,  nem mesmo tinha condição para pagar por chá ultimamente, eu me acomodei e ouvi o restante da história.

— Bem, eu disse a ele: "Se acha que pode simplesmente me pedir de modo tão indiferente, senhor, vou recusar!” E sabe o que Tomas disse? — Nestha falava para Elain e Feyre que ouviam com atenção total.

Franzi a testa com isso, olhando para o pai das garotas, ele perdido em qualquer lembrança enevoada que o havia tomado, Vittório sorria gentilmente para a amada Elain, a única de todas que se esforçava para falar com ele de verdade. Mas parou quando recebeu um olhar vazio de mim.

— Tomas Mandray? — interrompi me voltando para Nestha. — O segundo filho do lenhador?

Os olhos azuis de Nestha se semicerraram.

— Sim — disse ela, e se voltou para Elain e a caçula de novo.

— O que ele quer? — Olhei para Vittório, uma das raras vezes em que olhava para ele sem vazio ou que dirigia uma palavra. Nenhuma reação, nenhum sinal de alarme ou de que sequer ouvia.

— Ele quer se casar com ela — disse Elain, sonhadora. Minha boca se abriu em choque, Nestha inclinou a cabeça. Para mim, uma pessoa acostumada com a caça, já havia visto predadores fazerem esse movimento antes. Às vezes imaginava se sua determinação irredutível teria ajudado a sobreviver melhor, a prosperar, inclusive se não estivesse tão preocupada com status rico perdido.

— Algum problema, Elle? — Nestha disparou o nome como um insulto. Embora eu soubesse que era estupidez reagir às provocações, falei:

— Você não pode cortar lenha para nós mas quer se casar com um filho de lenhador?

A Quarta Archeron | ᵃᶻʳⁱᵉˡOù les histoires vivent. Découvrez maintenant