Incipiens - Completo

Capítulo 1

Quando completei dezoito anos eu já sabia o que me esperava, todos sabem depois de certa idade. Eu era uma órfã e não tinha ambições de encontrar uma família que me queria, já fazia muito tempo que não pensava nisso. Mesmo assim uma parte minha acreditava que as coisas podiam ser boas.

Sai do orfanato Maria Dulce com o endereço da casa de acolhimento para jovens na minha situação: sem dinheiro, sem familiares e que precisam de uma forma de se especializar em algo e quem sabe encontrar um emprego. Ofereciam cursos profissionalizantes e até tinham parcerias com algumas empresas para facilitar nossas possibilidades.

Tinha muitas esperanças de que as coisas ficariam bem, que de alguma forma eu encontraria meu caminho, uma vida decente e justa se me esforçasse. E estava decidida a esquecer meu passado, não importava quem fossem meus pais ou seus motivos para terem me abandonado.

Apesar de não ter sido bem recebida nem pelos responsáveis da casa de acolhimento e menos ainda pelas garotas com quem dividia meu quarto, mais duas, ainda sim esperava que as coisas melhorassem. Eu era sempre a garota nova e minha única amiga Giovanna, tinha sido adotada quase dois anos atrás.

Ela mantinha contato sempre me ligando, prometi que daria meu novo número assim que o tivesse, então quando a responsável pelas garotas entrou no quarto com a cara amarrada dizendo que estavam ligando para mim.

— Isso aqui não é hotel Alice, ligações somente em casos de extrema urgência.

— Sinto muito diretora. – disse a meia voz e fui atender – Alô?

— Aliceeeee! – uma voz toda alegre me saudou pontuando o e do final, era Giovanna, somente uma pessoa iluminada e para cima feito ela podia transmitir tanta alegria em uma única palavra.

— Oi Gio– sorri enquanto ela dava gritinhos de alegria do outro lado.

— Como você está? Como é sua nova casa? Já conseguiu amigas? E os garotos? – ela perguntava tão rápido que eu quase não conseguia pensar seriamente sobre nenhuma das suas perguntas.

— Estou... – duas garotas passaram por mim cochichando – me virando, vai ficar tudo bem.

— Alice, pode me contar? Foram maldosos com você? – Giovanna tinha aquele jeito de tentar cuidar de mim, sorri, mas como sempre guardei tudo para mim.

— Não. Ninguém fez nada, eu só estou me acostumando com tudo. Sabe como levo um tempo para aceitar coisas novas. – não era uma grande mentira.

— Somos amigas, não precisa mentir.

— Mesmo Gio, tudo bem. – a diretora me lançou um olhar irritado – Preciso ir, não precisa me ligar eu vou dar um jeito de comprar um celular para podermos nos falar. Okay?

— Alice? – suspirei.

— Sinto sua falta Gio, prometo dar notícias logo!

Desliguei o telefone e fui para meu quarto. No dia seguinte iria começar um curso de administração, receberia um certificado no fim que poderia me ajudar e muito. Precisava desesperadamente de um emprego e de um apartamento.

Fui dormir sem jantar e quando acordei me limitei a pegar uma maça na cozinha e sair comendo.

Apesar de me esforçar para entender o que o professor dizia, ele falava corrido e não se dava ao trabalho de voltar para explicar novamente, anotei os livros que ele tinha usado como base, precisava fazer uma visita a biblioteca, logo.

Sai com uma tremenda dor de cabeça e uma lista de livros que precisava ler para ontem, antes que me perdesse na matéria e fosse incapaz de ir bem naquele curso. Não podia me dar ao luxo de perder a chance de conseguir aquele certificado.