Segredos

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A noticia da morte da rainha se espalhou muito rápido. Os médicos concluíram que ela foi envenenada, mas não fizeram perguntas para mim, acharam que foi um rebelde que se infiltrou no castelo e envenenou seu chá, porque ela não tem muitos fãs. Selena ficou arrasada, ficou uma semana trancada no quarto, chorando. Eu consolava ela e contava mentiras falando que ela foi uma ótima mãe. Não é culpa da garota ela ter tido um diabo como mãe, Lena a amava. Mas logo eu teria de tratar de assuntos sérios. Como a rainha morreu, eu sou sua sucessora por direito. Tenho 18 anos, sou mais velha que Lena, portanto sou a herdeira do trono. Minha coroação seria daqui a dois dias e hoje eu teria uma reunião com o conselho, onde eles relatariam todos os problemas do reino.

Depois de um banho de sais, chamo Lena para me ajudar a me arrumar, não quero que as empregadas me vejam como estou, com medo, fraca.

- Esse vestido ficaria ótimo em você – Selena fala tirando um vestido azul com mangas compridas e uma saia justa longa do armário.

- Pode ser – eu falo sem prestar atenção.

Selena pega a escova e começa a pentear meu cabelo comprido e fino. Ela elabora um coque lindo e coloca uma tiara florida que era de minha mãe no meu cabelo. Depois passa para a maquiagem, ela sempre foi melhor do que eu nessas coisas. Espalha um pó pela minha cara que me faz tossir, depois pega um batom vermelho e pinta meus lábios.

Você está linda – diz no fim. Me olhando no espelho, com aquele vestido e aquela mascara de maquiagem, não me sinto eu.

- Mesmo? – pergunto.

- Claro! Você será uma ótima rainha, que nem minha mãe – lágrimas escorrem pelo olho de Lena e ela desaba no meu colo.

- Calma, calma, sua mãe sempre vai estar com você – eu digo, embora odeie Gabrielle mais que tudo. – Quando eu voltar da reunião, vamos passar a noite inteira juntas, como fazíamos antigamente, a nossa noite das garotas - eu disse para minha irmã e ela abriu um sorriso, embora seus olhos estivessem longe de sorrir.

.....

Eu espero sentada em uma das salas de reunião o resto do conselho chegar. Ansiosa, começo a pressionar as minhas unhas na palma das mãos . Um habito não muito saudável meu. Quando todos chegaram, demos inicio a reunião.

- A rainha Gabrielle escondeu muitas coisas de vocês, mas agora vossa majestade precisa saber de tudo para governar – Charles, um duque de barba branca disse.

- Vamos ser diretos, a rainha falecida faliu o reino. Usou todo o dinheiro para fazer festas, comprar vestidos e joias caríssimas.

- Simples, vendemos todo o armário dela, vamos ganhar milhões – eu falo.

Os duques se entreolham.

- Mas também tem outro problema, um bem mais sério.

Os conselheiros me levam por várias escadarias até um andar do castelo que eu nunca tinha visto. Eles pegaram uma chave e abriram uma porta grande. Um fedor insuportável saiu de lá e moscas voaram. Olhando melhor, vejo um bando de mulheres amontoadas em uma sala. Todas elas estavam com furos nos braços, como se tivessem coletado o sangue delas.

- O que é isso? – pergunto em choque.

- Majestade, são bruxas, estamos coletando o sangue delas.

- Por força bruta? – digo.

- Não, elas estão mortas – outro duque diz.

Fico pasma. O que Gabrielle fez com o nosso povo?

- Mas por que? – pergunto com medo da resposta.

Os duques hesitam, mas finalmente falam:

- Estudiosos de vários lugares estão falando que o fim do mundo está perto. Bem perto. E que o sangue da noite, ou seja, o sangue das bruxas, é a única coisa que vai nos salvar.

Medo invade todo o meu corpo. O tão temido fim do mundo. O tema de todas as histórias para dar medo nas crianças. Mas é impossível que isto esteja acontecendo. Muitos acreditavam que só passava de uma história boba.

- Provas, eu quero provas.

....

Os duques descem mais um nível de escada e eu me vejo em um laboratório com aparelhos modernos que não entendo. Um homem de jaleco branco examina uma amostra de solo em uma mesa.

- Gold, mostre pra ela os indícios do fenômeno alfa – Charles fala.

O homem de jaleco faz uma reverencia para mim e fala:

- Muito prazer majestade, meu nome é Samos Gold. Vossa majestade deve ter percebido que a muito tempo o sol não está iluminando nosso reino. Chuvas ocorrem com muita frequência. Isso é só o inicio. É só uma questão de tempo para que as chuvas comecem a ser ácidas. Depois teremos tempestades, furacões. O fim do mundo está muito próximo, mais próximo que nunca. Tem alguma substancia no sangue das bruxas que é imune a radiação. Nosso plano é coletar o máximo de sangue delas para injetar nas pessoas importantes.

- E os plebeus? São todos descartáveis? E as bruxas que vocês estão matando. O que elas fizeram de tão grave? – eu falo com raiva.

- Luna, você tem que entender que tudo isso é para que a humanidade sobreviva – um duque diz.

- Tempo, eu preciso de tempo – eu falo.

- Majestade, receio que tempo esteja em falta.

.....

Deitada em minha cama, lendo um livro infantil sobre o fim do mundo, penso sobre tudo que descobri naquela manhã. Lágrimas começam a brotar dos meus olhos. Tudo aquilo era demais para mim. Vou até a minha varanda e admiro o céu nublado. Ouço um pio e vejo que um corvo pousou na varanda. Vou até ele e começo a acariciar sua pequena cabeça. Num gesto rápido, o corvo bica meu dedo e sai voando. Uma dor percorre minha mão. Maldito pássaro! Olho pro meu dedo e sangue sai da ferida. Mas não é sangue vermelho, é sangue negro. Sangue de bruxa.

Fiz um curativo as pressas e me olhei no espelho. Não, eu não era uma bruxa. Não é possível. Minha mãe não era uma bruxa. Então eu me lembro de como Gabrielle e o homem da vila morreram. Eu sou uma assassina. Matei duas pessoas! Preciso ir embora desse lugar antes que mate mais alguém. EU pego minha capa comprida, uma adaga e coloco minhas botas. Desço as escadas de serviço para ninguém me ver e vou até a baia pegar meu cavalo. Monto em Maven e saio em disparada do palácio. Quando já estou bem longe daquele lugar, olho para traz. Só consigo ver a torre mais alta do castelo. Aquele lugar já não é meu lar.  

Rainha das trevas Onde as histórias ganham vida. Descobre agora