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              A tarde estava realmente quente naquele dia e era difícil manter a concentração, mesmo para alguém aplicado como Ryo. Ele esfregou a testa, uma pequena gota de suor se formando, olhou ao redor, alguns da classe estavam ociosos, conversando baixinho ou rabiscando qualquer coisa no caderno. O sinal estava perto de bater, quando ele notou o garoto de cabelo azul escuro que dormia na carteira atrás dele, o mesmo garoto que roubava seus bentos e o qual ele nunca conseguia impedir de matar o treino. Era estranho ver ele daquela forma, sentia como se tivesse perdido uma pequena parte dele, algo que nunca notara antes. Ele o fitou por um momento, quase tentado a tocar no cabelo dele. Quase.

               Havia algo de sereno no seu rosto quando estava adormecido, com os olhos fechados ele percebeu como os cílios dele eram longos e inconscientemente esticou os dedos para tocá-los. Mas o sinal do intervalo o despertou de seu devaneio e o garoto abriu os olhos, encarando-o confuso, um rubor começou a se espalhar por sua face e ele se sentiu como uma criança que era pega fazendo algo que não devia. Então, como sempre fazia instintivamente, pediu desculpas e levantou da cadeira desajeitado enquanto agarrava suas coisas e saiu apressado.

             A confusão se espalhava em seu coração, o que diabos havia de errado com ele? O que ele pensaria dele cada vez que o visse? Precisaria encontrar uma forma de justificar suas ações, mesmo que soasse absurdamente sem sentido. Ele colocou a mão sobre o peito e respirou fundo, numa tentativa fracassada de se acalmar, mas a imagem do garoto adormecido, ficava sempre voltando aos seus pensamentos e só o fazia se sentir mais envergonhado.

Ele precisava se esconder em algum lugar. Caminhou devagar meio desorientado e se sentindo um pouco culpado, ele subiu até o telhado e se sentou, piscou com força, como se isso pudesse apagar as coisas que aconteceram. Precisava ir até a cantina comprar um lanche, mas seu estômago se recusava a aceitar qualquer coisa. Provavelmente estava fazendo tempestade em copo d’água, talvez o outro nem lembrasse mais de que era ele, não costumava chamar muita atenção, além do mais, era tímido demais, não fosse pelo clube de basquete talvez não tivesse nenhum amigo. Seu coração se apertou com esse pensamento. Ele se recostou na parede e fechou os olhos com uma calma que não sentia.

-Ei. –Seus olhos se abriram depressa, e ele sentiu seu coração dar um pequeno salto ao ouvir aquela voz.

-A- Aomine-San! – Ele engoliu em seco, pensando em todas as formas de explicar o que estava tentando fazer na aula. Mas a bem verdade, ele mesmo não sabia, então apenas ficou em silêncio enquanto o outro lhe dava um olhar enigmático.

-Você...– Ele o interrompeu bruscamente.

-Eu já estava de saída! Me desculpe! – Fugir. Parecia que tudo o que fazia ultimamente era fugir. Ele retirou o caderno que costumava rabiscar e foi para um lugar afastado, era uma espécie de ritual que fazia quando necessitava manter a calma.

            Daiki ficou parado enquanto Ryo saía rapidamente e sem jeito, teria sido engraçado em outra ocasião, mas por que ele sentia que precisava dizer alguma coisa? Ele se deitou, a cabeça recostada sobre as mãos e decidiu tirar um cochilo, mas não conseguia esquecer a forma como o garoto o encarava quando o sinal do intervalo tocou e ele abriu os olhos.

              Havia algo de terno e quente no brilho travesso dos seus olhos e no jeito que sua boca ficou levemente aberta quando tentou tocar seus cílios. Era diferente do garoto tímido que ele estava acostumado. E não importava o quanto se esforçasse, ele não conseguia afastar essa imagem do pensamento.

            Ryo retornou para a sala pensando em uma forma de mantê-lo afastado, embora esse pensamento o deixasse com um sentimento de melancolia. O restante da aula passou normalmente, depois do intervalo ele ainda não havia retornado, talvez o tivesse deixado mais irritado do que previra, pelo menos no treino ele não precisaria se preocupar em encontrá-lo, uma vez que ele nunca comparecia, ou mesmo que fosse, seria apenas por um ou dois minutos, o que daria tempo suficiente para ele se esconder, ninguém iria perceber.

CaminhosWhere stories live. Discover now