Baile de Máscaras

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Por Andriolli Costa

Não há criança no subúrbio carioca que falhe em reconhecer essa misteriosa figura. Um festeiro mascarado, com trajes bufantes de cetim, tênis da moda e uma inconfundível bexiga — outrora de porco, hoje de borracha — quicando a cada passada. O Bate-Bola é rei do carnaval da periferia. Distorção da figura do clown, o "Clóvis", como também é conhecido, alimenta esse imaginário do palhaço com fascínio e medo. E o que aconteceria, então, se o Coringa, o palhaço psicopata mais famoso das HQs, fosse um Bate-Bola? É essa história que o Colecionador de Sacis apresenta.

Baile de Máscaras

Não havia mais riso, muito menos alegria. Havia um choro, sim, e ele podia escutar os soluços enquanto a cabeça volteava e os olhos se acostumavam com o escuro. Onde estava a multidão? A última coisa de que se lembrava era do esquenta para o bailinho na Zona Sul. Carnaval, um gole, outro, lantejoula, o colarinho da camisa aberta, um sorriso, mais um gole e então... Então aquilo.

Tentou se levantar, mas as pernas não responderam. Sentia na pele o papel do confete grudado, o cheiro da bebida evaporando. Quis tirar os cabelos suados dos olhos e só então percebeu que as mãos estavam presas. Amarradas? Forçou o braço novamente, gemendo ante o solavanco inútil. O baque metálico da cadeira contra o concreto ecoou pelo lugar, marcando o fim daquele pranto sofrido.

— Você acordou! Que bom, que bom, que bom!

A voz era de uma arlequina que se revelou com um meio salto, vinda direto de suas costas. Thales estremeceu enquanto ela deslizava até uma cadeira disposta bem à sua frente.

— Socorro.  -  pediu, timidamente.  — Eu... Eu preciso sair daqui!

Ela cruzou as pernas e pousou as mãos sobre o colo como numa aula de etiqueta. Fingiu limpar a pintura escorrida de seus olhos antes de continuar; encenando para uma plateia invisível.

— Oh, querido... Estava tão preocupada com a sua soneca! Achei que não ia dar tempo, mas você se saiu muito bem!

— Moça...

— Vamos começar!

Bateu duas palmas curtas, daquelas só com a ponta dos dedos, e um facho de luz iluminou o espaço. Thales virou a rosto, fugindo do brilho. Quando tornou a abrir os olhos, notou uma câmera montada num trilho eletrônico bem à sua frente. Acima da lente, um leterring vermelho informava: Ao vivo.

— Mas que mer...

A moça abriu seu melhor sorriso e começou o programa com um beijo carinhoso ao seu fandom. Naquela noite, ela informou, o programa seria ainda mais interativo graças a participação de um convidado mais do que especial. Thales escutou uma claque metálica, com palmas e uivos de alegria, enquanto a câmera focava seu rosto desesperado.

— Thales, meu bem, o que você achou de ter sido escolhido para o programa?

Ainda chacoalhando na cadeira, incapaz de ouvir as baboseiras da apresentadora, o rapaz deu a única resposta possível e à plenos pulmões:

— Socorro!

O sorriso da arlequina se fechou de imediato. Antes de um terceiro grito, a mulher sacou do decote um pequeno controle remoto e apertou o botão em seu centro. Vermelho, como não podia deixar de ser. Thales trincou os dentes quando a corrente elétrica rasgou seu corpo, e sentiu a consciência voltar a abandoná-lo quando a dor parou.

— Resposta errada, docinho. Saiba que muita gente da audiência queria estar aqui no seu lugar, viu?

Ele piscou em silêncio, deixando o caleidoscópio a sua frente se fixar em uma única imagem novamente.

E se o Coringa fosse um Bate-Bola?Onde histórias criam vida. Descubra agora