A Voz

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Acorde! Diz a doce voz de minha mãe. Já era tarde. Eu levanto me perguntando por quanto tempo dormi. Letras de músicas começam a fluir em minha mente. Sinto-me leve. Sinto que posso correr e não me cansaria. Sinto que posso gritar e não ficaria rouca. Sinto que posso voar e não cairia. Alguém está atrás de mim, e parece ouvir meus pensamentos. Viro-me. É alguém que eu conheço, mas não recordo do rosto. É um rosto belo, jamais visto. Não sei descrever suas vestes, muito menos sua face, pois é algo que não há palavras. Esse alguém se aproxima, com cuidado e preocupado. Sinto algo vir dessa pessoa. Algo maior que o mundo. Como explosões de emoções. Seus olhos. Quão belos são teus olhos. Estão próximos aos meus. Respiro fundo. Meus joelhos estão tremendo, eles querem cair. Mantenho-me de pé e de alguma forma sinto que esse alguém se preocupa comigo. De alguma forma esse alguém quer me ver bem. Minha respiração começa a fadigar. Sinto meus olhos se fecharem de repente.

Ainda de pé abro meus olhos. Já não estou em minha sala de casa usando meu pijama azul marinho com desenhos de estrelas. Estou usando um vestido preto, apertado na cintura com detalhes brancos nas bordas, que toca meus pés. Demoro a perceber onde estou. É estranha a tamanha sensação de querer sonhar. Estou numa sala em que as paredes são completamente brancas, exceto uma. Há algo escrito em outra língua e não entendo. Não estou sozinha.

Aquele alguém está ao meu lado. É estranho, eu quero ficar com medo, mas ao mesmo tempo é como se esse alguém fosse a única coisa que me protegesse, e fico incapacitada de sentir um milímetro de medo que seja. Essa pessoa está fitando seus olhos aos meus. Ela se aproxima. Aproxima sua boca perto aos meus ouvidos. Fico trêmula. Uma energia é passada de seu corpo ao meu. Esse alguém me fala algo assim:

"Não chores por quem terás que deixar. O livro mantém a promessa. E é esperada a hora de semear fogo".

Uma lágrima cai de um dos meus olhos. Não entendo direito o que isso significa. Sua voz é suave e acalma a maior das tempestades que há em minha mente. Esse alguém se afasta. Tento chegar mais perto, mas quanto mais perto eu tento chegar, um espaço maior se forma entre nossos corpos. Tento gritar. Eu grito. Minha voz falhara. De repente não me movo. Algo me prende. Algo me puxa para trás. Sem perceber começam a cair chuvas dos meus olhos. Eu não quero me afastar. Eu quero estar lá com aquele alguém.

Já não me sinto segura. Qualquer erro se torna um buraco negro diante da minha vida.

Por que isso aconteceu? Por que essa estranha sensação de que eu preciso de alguém para cuidar de mim? Por que esse alguém não ficou e me acolheu? Por quê?

Quanto mais perguntas eu faço, mais sem respostas eu fico. Quanto mais eu penso nas possibilidades de nunca mais encontrar aquele alguém, mais eu me sinto sozinha.

Repentinamente meus olhos se abrem. Tento me convencer de que aquilo foi um sonho. Foi tão real. Não foi ilusão. Olho a minha volta e não posso acreditar no que vejo. Não entendo. Como vim parar neste lugar? Então minhas memórias voltam. Eu estou na rua da minha antiga escola com meus amigos do Ensino Fundamental. Tem uma criança chorando atrás de um carro. Levanto-me e corro para ver se a criança está bem. Quando me aproximo vejo uma mão que provavelmente é de uma jovem menina. Enquanto chego mais perto, torço para que ela esteja bem. Assim que me viro para frente do carro, encontro uma mulher chorando por essa menina. Essa mulher é minha mãe. E essa menina sou eu. Sinto lágrima por lagrima descer. Sinto um vazio tão grande. O mundo fica cinza. Sinto-me sozinha. Ouço outras pessoas conversando e uma mulher agradecendo, agora, para o meu cadáver, dizendo "VOCÊ SALVOU A VIDA DO MEU FILHO". E então me sinto tão feliz. Não há palavras para o que eu sinto. Salvei a vida de alguém. Porém perdi a minha.

Alguém chama pelo meu nome. Eu já ouvi essa voz. Viro-me. Aquela face. Era aquele alguém. Pergunto-me quatro vezes se é minha imaginação e esse alguém diz:

"Eu sou tão real quanto o vento. E você é tão filha de meu Pai quanto de seus pais da Terra. Sua alma é pertencente a Ele agora e hoje te levo para a casa".

Meu coração dispara como jamais disparou antes. Sinto a adrenalina subindo. Eu quero falar algo. Eu quero gritar. Quero contar a todos que Cristo está comigo.

Meus olhos se enchem novamente. Eu corro em Sua direção. Quando Sua mão toca minha pele eu sinto todo o peso me sobrecarregando sendo tirando de mim em questão de milésimos de segundos. O que era tristeza em meu coração, agora é alegria. Eu caio de joelhos na sua frente. Ele oferece sua mão e me levanto. Então viramos para trás e seguimos caminhando. Quanto mais caminhamos, mais a claridade vai aumentando. Uma espécie de luz. Uma luz que não arde os olhos, mas que abre a alma. Sinto a vontade de olhar para trás. Mas um lado meu diz para seguir em frente, e que em algum dia eu encontraria aquelas pessoas novamente, e então me lembro do que o Senhor havia me dito horas atrás:

"Não chores por quem terás que deixar...".

Quando chegamos já não me recordo da minha vida passada. Sinto-me purificada. As trevas estão longe agora. Chegamos. Difícil colocar em palavras o que vejo. As pessoas estão felizes. Elas já não choram. Vejo anjos de longe. Eles cantam maravilhosamente. Fico maravilhada com tamanha beleza. Não é possível descrever um lugar que passei minha vida pensando em como seria e hoje vejo com meus próprios olhos. Aquela frase na parede daquela sala vazia de repente faz sentido. Ela dizia:

"Você foi escolhida".

Fecho meus olhos. Aquele vazio em meu peito se completou. Aquele abismo já não é tão alto. Aquela solidão eu sei que nunca mais sentirei. Agradeço. Agradeço mais uma vez. E mais uma terceira vez.

Então.

Uma voz diferente.

Uma voz também suave.

E ao mesmo tempo poderosa.

Direciona-se a mim.

Ouço a voz de Deus entrar em meus ouvidos.

Abro meus olhos.

Ele diz:

"Seja bem vinda minha filha".


-NS

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