Os dias se passaram e Robert marcou o casamento para dali, mais ou menos, um mês e meio. Ele e Anne se falavam todos os dias por vídeo, mesmo nos dias em que se viam.
A noite da leitura do poema tinha chegado e ela passou um tempão treinando. Estava nervosa mas ao mesmo tempo animada em poder trazer um pouco do seu tempo para o século XXI.
A noite estava um pouco fria, e tinha archotes de fogo espalhado pelo jardim, iluminando e aquecendo os convidados, que para a surpresa de Anne, eram muitos.
Ficou de repente com a garganta seca e tremendo. Robert a abraçou sorrindo e prometeu que estaria por perto. "Olha só pra mim, se isso te fizer sentir mais confiante" ele sugeriu e ela assentiu suspirando.
Debbie a chamou e ela foi até o gramado. As pessoas pararam de falar e ela se apresentou.
"Olá, é um imenso prazer estar aqui hoje com vocês trazendo o melhor da Era Vitoriana" ela começou nervosa. Respirou fundo e continuou.
"Sabemos que foi uma época complicada em vários sentidos, mas não podemos negar que a arte foi importantíssima e tem características próprias de sua época, que eu vou tentar reproduzir aqui" disse procurando Robert, quando o encontrou ele assentiu dando forças pra ela continuar.
"Meu nome é Anne Birdwhistle e meus ancestrais tiveram ligações com a família que construiu essa casa, a família Pusset. Então é com essa aura familiar do passado que leio esse livro que encontrei aqui, na biblioteca".
Pigarreou e começou.
Inverno: meu segredo
Devo contar meu segredo? Não, de fato;
Um dia, talvez, quem o saberá?
Hoje não: ele congela, assopra, e neva,
É tu, tão curioso: calado!
Queres ouvi-lo? Bem:
Mas é meu segredo, não conto a ninguém.
Ou talvez, enfim, não há nenhum:
Suponha não ter nenhum, entretanto,
Só minha diversão.
Hoje, dia frisante, dia cortante;
Um em que se quer um manto;
Um véu, agasalho ou capa:
Não posso abrir a todo que bata,
E deixar os debuxos soarem em meu recanto;
Vinde a confinar e cercar-me
Vinde assombrar e surrar-me
A beliscar e tosar todos os meus mantos.
Mascaro-me p’ra aquecer: há quem revelesSeu
nariz nas russas neves
Para ser bicado por toda a brisa que corres?
Não irias tu bicar? Agradeço-te pela boa vontade
Credes, mas deves deixar improvada a verdade.
A primavera é expansiva: ainda duvido
Março a poeira se faz montículo
Nem abril e os arco-íris de suas rápidas chuvas,
Nem mesmo maio, cujas floradas
Podem murchar-se, no escuro das geadas.
Talvez em algum dia de verão indolente,
Quando aves apáticas bem menos cantam
E as frutas douradas sazonam tanto
Sem tanto de nuvens ou de céu luminoso
E o vento não estiver nem calmo ou ruidoso,
Meu segredo, talvez, eu comente,
Ou faze adivinhação.
Christina Rossetti
Enquanto lia ela trocou olhares com Anthony que estava em um canto ao lado de Amanda. Ela viu quando Amanda pegou na mão dele e se olharam como se trocassem um segredo, inspirados pelo poema.
Robert fazia um vídeo de Anne com seu celular. Percebeu que ela sorria e seguiu seu olhar, vendo a mesma cena espantado. Sentiu um alívio imenso em saber que Anthony estava se relacionando com alguém.
Quando Anne terminou foi aplaudida e convidou a todos irem até a biblioteca. Lá ela tocou uma música de sua época e foi aplaudida de pé.
Emocionada ela agradeceu e deu atenção a todos que vieram conversar com ela. Teve um pequeno coquetel com petiscos e vinho e a noite foi um sucesso tão grande, que agendaram mais algumas para depois do seu casamento.
Algumas pessoas deram a sugestão de Anne contar histórias sobre a Era Vitoriana o que ela adorou e foi incentivada por Anthony. "Só toma o cuidado para não falar como se estivesse lá" disse rindo e Anne concordou.
Robert chegou para parabenizar a noiva e cumprimentou Anthony com educação. Ficaram um tempo em uma rodinha conversando e depois Anthony saiu os deixando sozinhos.
"Parabéns meu amor! Foi um sucesso" ele disse a abraçando.
"Estava tão nervosa no começo!!" exclamou. "Mas depois foi tudo bem" suspirou. "Senti como se minha família estivesse aqui Robert " disse emocionada.
"Tenho certeza que estavam" Robert disse dando um beijo em sua testa.
.......
Anthony assistiu à leitura do poema emocionado. Quase pôde ver aquela casa em sua função natural, no século XIX.
Foi parabenizado por várias pessoas e adorou as idéias que receberam. Pensou em montar um bate-papo, sobre diferenças e similaridades do passado e futuro, ninguém melhor que Anne para fazer isso.
As idéias ferviam em sua cabeça e ele estava super entusiasmado. Amanda conversava com todos, como se fosse a dona da casa, recebendo seus convidados. Anthony a observava de longe e sorria, estava gostando dela, mais do que imaginava sentir.
A noite foi um sucesso, só não conseguia ainda ver Anne e Robert juntos. Não sabia se algum dia conseguiria. Suspirou e fingiu não notar sua presença para não estragar a noite.
……
"Dorme em casa hoje?" Robert perguntou quando a recepção acabou e eles foram para a edícula.
"Simmmm" ela disse se jogando no seus braços feliz. Robert riu e a rodopiou. "Então pega suas coisas pra gente ir" ele disse e ela começou a fazer sua mala.
"Posso entrar" ouviram a voz de Anthony na porta. Robert suspirou e não disse nada.
"Claro! Entra" Anne gritou.
"Vim me despedir, vou passar alguns dias viajando" ele disse pegando nas mãos de Anne.
Robert olhou para o outro lado, queria estrangular Anthony, mas tinha prometido tentar conviver bem com ele, então achou melhor não ver. "O que os olhos não vêem o coração não sente" pensou.
"Queria te agradecer pela noite maravilhosa que proporcionou pra essa casa Anne, fiquei emocionado e já estou tendo várias idéias que podemos discutir quando eu voltar" disse suspirando.
"Obrigada Anthony, fiquei tão feliz!" ela disse emocionada.
"Eu quase pude ver nossa família ali, você sentiu isso?" ele disse animado.
"Sim! Eu senti! De verdade Anthony, acho que eles estavam" suspirou e se abraçaram emocionados.
"Bom, vou indo, se cuida.. Tchau Robert" ele disse educadamente.
Robert fez um tchau com as mãos e assentiu com a cabeça, Anne o acompanhou até lá fora e voltou feliz. Viu a cara de Robert e voltou a arrumar sua mala.
……
Na casa de Robert, foram para a cama cansados. No outro dia acordaram tarde e Anne teve que se arrumar correndo para trabalhar.
"Por que não volta a trabalhar aqui?" Robert sugeriu. "Sei que lá o salário é melhor, mas aqui você terá mais liberdade para se dedicar às atividades do casarão" disse se arrumando para acompanhá-la até a loja.
"É.. Você tem razão. Achei que não queria que eu tivesse tempo para o casarão" Anne disse.
"Anne, eu aceito o que te faz feliz. Adoro toda a história que envolve o casarão e sua família, meu único problema é o Anthony. Não consigo engolir ele, mas estou tentando, não estou?" disse a puxando pela cintura.
"Sim, está e estou muito orgulhosa de você por isso. Você tem razão, vou conversar hoje com a gerente da loja" disse dando um beijo nele.
Robert a acompanhou e de lá saiu para encontrar Michael. Tinha marcado com o amigo, queria chamá-lo para o casamento.
Se encontraram em um café para comer um típico café da manhã inglês. Enquanto comiam Michael contou que Gabrielle tinha voltado para a França mas que eles mantinham contato. "Tem falado com ela?" ele perguntou a Robert.
"Não, nunca mais. Acho que ela deve ter certeza que não é meu" disse dando de ombros e Michael riu. "Isso quer dizer que é meu" falou divertido.
A história não o assustava mais, resolveu que assumiria o filho e estava feliz agora com a perspectiva. Sentia carinho por Gabrielle mas não sabia se gostava ao ponto de ter um romance.
"Bom cara, te chamei aqui pra te chamar pra ser meu padrinho" Robert disse sorrindo, "vou me casar" completou.
"Sério?! Parabéns cara!! Obrigado pelo convite!" Michael respondeu dando as mãos para o amigo. "É com a Anne suponho" disse rindo e Robert assentiu.
"Meu coração só tem uma dona" disse rindo e passaram um tempo agradável juntos.
Mais tarde em casa Anne contou a Robert que pediu demissão da loja. "Eu me ofereci para ficar até encontrarem um substituto mas eles disseram que não era necessário" deu de ombros.
"Eu gostava de lá e foi importante pra mim conseguir aquele trabalho, serei grata pra sempre" suspirou e Robert concordou.
"Agora seu chefe sou eu!!" disse indo até ela.
"E o que meu querido chefe quer que eu faça?" perguntou levantando uma sobrancelha.
"Vem aqui que vou te contar" disse a puxando pela cintura e lhe dando um beijo ardente.