–O que fiz foi algo de calor do momento.

–Sim, sim, pelo calor do momento eu também retribuí.

–Deve ter algo relacionado com a viagem.

–Com certeza.

–Ficamos confinados com outras poucas pessoas em uma viagem de vários dias, devemos ter ficado confusos por isso.

–Sem dúvidas.

Ao falar por último, não ouvi mais sua voz vindo do outro lado dos livros, agradecendo aos deuses pela razão ter descido sobre nós. Fora calor do momento depois de uma viagem confusa, nada mais.

Não poderia ser mais

Ao finalmente focar-me em trocar minhas vestimentas vermelhas chamativas e nada práticas aos meus objetivos como ladra, comecei a lutar contra os laços, fitas e fechos complicados demais vindos de um modelo de vestido que eu nunca usara. Amaldiçoei-me pelo quanto havia perdido minha independência.

Quanto eu poderia ter me deixado ser mimada em média de um mês?

Ah, o que eu faria para ter Cordélia ao meu lado agora, suas mãos habilidosas me desatando.

Com um suspiro, entreguei-me à vergonha e à desistência, cansada de perder para um vestido bonito.

–Nikolai. –Chamei-o apenas, meu tom pouco mais alto que um sussurro, minha boca quase encostando nas lombadas dos livros a fim de que ele me escutasse.

–Sim? –Sua voz veio baixa, rouca, grossa.

–Pode me ajudar? Estou tendo dificuldades com minhas vestes. –Depois de perguntar hesitantemente, por um momento, o silêncio dominou, me fazendo pensar que ele não havia escutado ou que, simplesmente, não viria em meu auxílio até ouvir passos lentos, relutantes, vindo da estande da frente até onde eu estava.

Não gostaria de encará-lo, estava cheia de reações vergonhosas e desajeitadas por hoje, então se eu pudesse evitá-las apenas não olhando-o, tentaria, minhas costas apontando por onde ele entrava entre uma estante e outra, quase um corredor de livros.

–Qual o problema? –Ele já soava perto, centímetros de mim, quase podendo sentir o quente de sua respiração contra meus ombros, meu corpo já sentindo o calor dele próximo à mim.

–Não consigo desfazer-me de algumas fitas e laços. Apenas afrouxando-os para mim já me ajuda. –Mais um momento, eu pude sentir sua hesitação e relutância, seus movimentos lentos em conflito com o fato de que não queria fazer aquilo.

Mas, por fim, mexera-se, seus dedos quase não me tocando, pegando meus cabelos e afastando-os, colocando meus cachos com cuidado sobre o ombro esquerdo.

Quase não me tocando.

Quase.

Porque no momento que a ponta de um dos seus dedos roçaram a pele em minha nuca movendo meu cabelo, em uma ação involuntária, meu corpo arrepiara-se, soltando um suspiro baixo, na esperança de que fosse imperceptível.

Seu toque congelara, como se ele tivesse, de fato, reparado no que aquela situação provocava em mim, apenas para voltar sua atenção ao tecido problemático.

Após ter conseguido ter sucesso em sua tentativa de afrouxar o que eu vestia, não senti seu corpo afastando-se e eu não queria virar-me com ele tão perto de mim.

E mais perto ainda, aproximando-se pouco mais, seu corpo encostando no meu, um novo calafrio percorrendo-me ao mesmo tempo que ele passava sua mão pela minha cintura, seu toque eletrizando-me, queimando-me mesmo sobre o vestido.

Não me virei.

Não me afastei assim como não queria que ele se afastasse.

Estava paralisada.

Paralisada ainda mais quando seu rosto veio de encontro ao meu pescoço, paralisada quando sua boca começara a beijar minha pele, paralisada quando sua mão agarrava-me.

–Peça-me para parar que eu o farei. –Sua voz era tão grave e rouca que senti como ele lutava em dizer aquelas palavras.

Ou talvez não tão paralisada quando pensava ao notar minhas pálpebras fechando-se em prazer, minha cabeça sendo jogada para trás, em sua direção, deixando mais do meu pescoço exposto para ele, minha mão esquerda sobre sua mão na curvatura da minha cintura enquanto a direita agarrava-lhe os cabelos, desejando-o mais.

Sabendo como seu toque fazia minha pele inteira arrepiar-se em resposta, com seus dedos livres, traçava caminhos deliberados pelo meu braço, como ele fazia com seus mapas o tempo todo, subindo até minha cabeça, girando-me para encará-lo finalmente.

E perceber que não era calor do momento. Seu desejo era sólido.

O fato de que ele me queria era tão claro quanto o dia.

E eu temia que o meu fosse pouco mais que um espelho do mesmo sentimento.

Seus olhos exploravam-me com calma, paciência, querendo gravar-me, a boca entreaberta, a respiração afetada.

Mas eu não queria ser estudada. Queria ser beijada.

–Não pare. –Minha voz saiu cortada, quase sem ar.

Então, reciprocamente, puxei-o até mim, seus lábios nos meus, famintos, assim como eu.

Suas mãos desciam e subiam pelo meu corpo (não me incomodei em ser estudada assim), meu toque variando entre seus cabelos, pescoço, tronco, puxando-o para mim, mesmo que fosse impossível estar mais perto até que suas mãos passaram pelas minhas coxas, apertando-as e levantando-me do chão, minhas pernas entrelaçadas em seu corpo, minhas costas contra uma das estantes, minha cabeça agora na mesma altura da sua, nossos gostos se misturando, ele mordendo meus lábios, o que me ensinou a fazer isso com os dele, beijando meu pescoço mais uma vez, mordiscando-o de forma que me fazia estremecer colada ao seu corpo, o que o retesava e o deixava mais firme, mais ansioso por mim, o que fazia com que eu ficasse mais ansiosa por ele, meu corpo em combustão internamente.

Aquilo era bom.

Aquilo era tolice.

Estávamos ali em missão.

Não poderia me deixar levar pelo prazer.

Ou, talvez, pudesse apenas um pouco.

O nome da sombra - Crônicas de sombra e luzWhere stories live. Discover now