Capítulo 1: Sócrates é contrário à religião nacional?

267 16 4
                                    


Ao caminhar pelas largas ruas de Brasília, Sócrates se surpreende ao ver um coletivo lotado de pessoas em um calor drástico e seco do verão.

Enquanto os termômetros da cidade batiam 42 graus, afloravam questionamentos no filósofo: Se o Brasil é um país sem escravos, por que todas aquelas pessoas se submetem voluntariamente a conglomerarem num desconfortável espaço físico?

Pelo horário, o final da tarde, tampouco entendia os motivos dos brasileiros não se banharem nas fontes da Esplanada do Planalto para aliviar o calor! A rápida experiência antropológica incitou-o a tomar um ônibus para compreender de perto aquele estranho fenômeno.

O filósofo, assim, entra em um automóvel que se dirigia para o centro da cidade. Além dos 46 assentos ocupados, 50 passageiros em pé disputavam o que restava de espaço para respirar. O "empurra-empurra" por espaço e a múltipla funcionalidade do motorista, que ainda cumpria a função de cobrador, permitiu que Sócrates passasse pela catraca sem ser solicitado em apresentar a carteirinha de idoso.

O forte calor, inclusive maior dentro daquele veículo do que nas ruas de Brasília, não parecia incomodá-lo, já que se distraia com as imagens que via pela janela esquerda do seu assento.

Observava que o congestionamento causado pelo excesso de veículos, em sua maioria, era formado por carros que carregavam apenas um passageiro. Indagara, então, os motivos das pessoas do futuro não utilizarem de um princípio básico da matemática: a proporção.

Sendo cidadãos livres, poderiam resolver facilmente a superlotação do ônibus e do trânsito se realizassem a redistribuição equitativa entre veículos e passageiros.

O monólogo mental o colocou em paralisia, interrompida somente quando o assento ao seu lado direito foi ocupado por uma senhora de 54 anos.

Sentada, a mulher ajustou no rosto os suados óculos de miopia, respirou aliviada e murmurou um baixinho "Glória a Deus" pelo privilégio daquele lugar... Diferente do habitual, aquela viagem de volta para sua casa não seria mais em pé.

Tudo parecia força do destino, pensara, já que poderia retirar os seus apertados sapatos e aliviar as fortes dores de varizes que a perseguiam pelos últimos anos.

De aparência simples, usava cabelo Chanel, tingido de cor negra. Mantinha, ainda, sobre sua saia evangélica uma pequena bolsa repleta de folhetos que transbordavam para fora do zíper.

Sócrates, ao observá-la por alguns instantes, viu a oportunidade de estabelecer um diálogo. O filósofo colocou o aparelho de tradutor de idiomas da Google ofertado pelo governo brasileiro e inicia a conversa.

SÓCRATES: - Olá minha senhora, tudo bem?

SENHORA: - Graças a Deus!

SÓCRATES: - A Zeus?

HOMEM: - Não! Deus mesmo!

SÓCRATES: - Me desculpe, imagino que meu tradutor de idiomas não fez a codificação exata da palavra! Posso saber o seu nome?

SENHORA: Claro, sou a Demores Alves.

SÓCRATES: - Vejo que carrega alguns manuscritos em sua bolsa...

SENHORA: - Sim, aqui eu tenho um manual de estudos bíblicos. Já vou deixar um com o senhor...

SÓCRATES: - Obrigado! Do que se trata?

SENHORA: - É um roteiro de como ler corretamente a palavra de Deus.

SÓCRATES: - O texto orienta como podemos interpretá-los?!

Tudo que você precisa saber para ser um ignorante: Sócrates no BrasilWhere stories live. Discover now