Capítulo 1

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  Sabe aqueles dias em que tudo parece dar errado e que qualquer coisa que você vá tocar corre o risco de se desintegrar na sua frente? Hoje é um desses dias.

  A maré de azar começou logo quando levantei. Literalmente.

  Quando fui sair da cama, assim que coloquei o pé no chão, pisei em um brinco que estava caído com a ponta pra cima e que, para minha dor, se alojou no meu calcanhar. Depois enquanto fui mancando procurar algum remédio, esbarrei na luminária, a única que tínhamos, que ficava no que poderia ser chamado de sala caso fosse uma casa normal, ela se espatifou no chão.

  Cacete. Não é meu dia de sorte. Acordei com o pé esquerdo e ainda consegui fura-lo. E se já não bastasse tudo isso, minha bunda está doendo.

  – Viu o Nilson por aí? – Gerda, uma loira de farmácia com as raízes pretas, de mais ou menos trinta anos, perguntou colocando a cabeça pra dentro do quarto.

  As outras meninas que dormiam no mesmo quarto que eu estavam na "sala" compartilhando informações sobre a noite anterior e sobre os melhores clientes.

  – Acho que ele saiu. – respondi deitando de bruços.

  Minha bunda realmente está doendo. Não sei o que esses homens veem de interessante em fazer sexo anal. Para eles é tudo ótimo, mas para as mulheres é uma merda. Ainda mais quando eles parecem estar enfiando um bambu em um cano a fim de desentupi-lo.

  – Se esbarrar com ele por aí fala que eu quero falar com ele. – diz e sai andando mascando um chiclete de um jeito que me faz lembrar uma vaca mascando capim.

  Espero que não encontre Nilson tão cedo. Ainda mais hoje que estou com a bunda doendo. Ele me assusta. Não só pelo cabelo preto ralo e a cicatriz do lado esquerdo do rosto, mas também pelo seu jeito. Ele me olha de um jeito estranho que me faz ter a impressão que de uma hora pra outra ele vai me agarrar de novo. Não quero que isso se repita porque a primeira vez foi horrível.

  Quando cheguei aqui faltavam cinco dias para eu fazer 18 anos. Era menor de idade e nunca tinha transado antes. Não fazia a mínima ideia de como ia conseguir ganhar dinheiro com sexo já que não tinha experiência alguma. Ele, muito solidário, comprou uns filmes pornôs e algumas revistas com posições de sexo para eu ver. Pensando bem, acho que foi um gasto desnecessário já que ficava no quarto com as outras enquanto elas trabalhavam. Eu estava proibida de fazer qualquer tipo de serviço. Até boquete.

  No dia do meu aniversário ele me chamou até a sala dele. Um cômodo minúsculo que tinha um sofá cama rasgado e uma mesa de madeira descascada. Na minha cabeça, ele ia me dar os parabéns ou algum documento que ia permitir que eu trabalhasse, sei lá. Não entendia nada sobre o trabalho e não sabia se era necessário algum tipo de autorização para exercer a, bem, profissão. Mas seus planos eram outros. Assim que entrei na sala, ele trancou a porta e começou a me agarrar e me beijar, sua barba nojenta esfregando no meu rosto enquanto ele enfiava a língua na minha boca.

  – Quietinha. Se você der um pio, você nem vai chegar a começar a trabalhar. Entendeu? – ameaçou.

  Meus olhos estavam cheios d'água, mas não podia chorar e muito menos me dar ao luxo de ser demitida antes mesmo de começar a trabalhar. Ainda mais porque não tinha para onde ir.

  Concordei com a cabeça, engolindo em seco.

  – Boa garota. – falou descendo uma das mãos até a minha saia.

  Até hoje quando me lembro dessa cena tenho vontade de vomitar. Filho da puta!

  Quando tinha cerca de onze anos eu já sabia alguma coisas sobre sexo e imaginava minha primeira vez com meu primeiro namorado. Um cara lindo e forte, que fosse carinhoso e que gostasse de mim. Imaginava que não iria sentir dor, como estava escrito em um livro, e que iria ser lindo. Como era estúpida! A única coisa linda, isso na visão de um vampiro, foi a quantidade de sangue que ficou no sofá cama.

EscarlateWhere stories live. Discover now