Um mês inteiro. Cinco semanas. Tempo suficiente para colocar todas as séries em dia, ler grande parte dos livros da prateleira, comprar mais alguns, planejar um casamento, e procurar por uma casa. Foi assim que Caitriona preencheu seus dias, alternando entre o sofá e a cama. Eventualmente o tédio se instaurou, e por mais que Tony fosse uma presença alegre, era somente quando Sam chegava em casa, no fim do dia, que ela se sentia completa.
Ele tinha voltado a gravar na semana seguinte à seu retorno da Patagônia. A produção estava se desdobrando para adiantar tudo que fosse possível enquanto Cait não pudesse voltar ao trabalho. Se fosse necessário, atrasariam o lançamento da nova temporada, mas ela tinha fé que conseguiria voltar a tempo. Tinham sido obrigados a abrir o jogo sobre a gravidez com o alto escalão da Starz, por mais que Caitriona não quisesse, mas eles precisavam justificar o afastamento dela. A repercussão ao anúncio do noivado havia sido exatamente como Maril dissera: a Starz não teve coragem de fazer valer a cláusula contratual, o fandom ficou em êxtase. Pelo visto, todos torciam por eles.
Eles tinham decidido comprar uma casa juntos. Há anos viviam naqueles flats da produção, mas com o bebê a caminho sabiam que precisavam de um lugar só deles. Caitriona passava o dia vasculhando sites de imobiliárias, e como não podia ir visitar as casas, Sam ia sozinho e ligava pra ela via facetime pra mostrar como realmente eram as casas. Tinham algumas em vista, mas não tinham realmente se apaixonado por nenhuma.
O casamento era um assunto em suspenso, uma vez que Caitriona não sabia quando ia sair do repouso absoluto e poder efetivamente fazer alguma coisa, então apenas tinha olhado algumas revistas de noivas, recebido algumas propostas de grandes estilistas para seu vestido, mas nada muito certo ainda. Teria que lidar com isso quando realmente houvesse a possibilidade de um casamento. Nenhum deles fazia questão de se casar antes do bebê nascer.
As consultas com a médica eram semanais, para acompanhar o desenvolvimento do bebê. Além disso, ela essa passando com um hematologista, que estava cuidando da questão da trombofilia. As injeções ainda eram um momento delicado. Ela e Sam tinham decidido que iriam fazer juntos, todos os dias. Sam não gostava de ideia de ter de furá-la, assistir sua careta de dor, mas se ela pedira, ele faria sem hesitar. Juntos eles eram muito mais fortes.
*
Cait tinha um sorriso no rosto quando saiu do consultório. Sam a esperava na recepção. Tinha entrado junto com ela para o ultrassom, mas no final, a Dra pedira para falar a sós com Caitriona. Ele ficava todo bobo toda vez que ia junto com ela, a satisfação em ouvir o coraçãozinho do bebê, ou quando a médica apontava no monitor o contorno da cabeça, ou de um pézinho.
– Toma – ela lhe entregou um envelope branco, sorrindo, enquanto entravam no elevador.
– O que é isso? – Sam questionou, curioso, antes de abrir o envelope.
– O sexo do bebê – ela disse simplesmente – A Dra falou para eu te entregar, caso você esteja curioso. Pode olhar, mas não me conta, tá?
– Ah, isso – ele virou o envelope nas mãos, ponderando se deveria abrir ou não – Não, não quero saber – e então guardou-o no bolso da calça jeans.
Ele segurou a mão dela, acariciando de leve seus dedos, um sorrisinho de lado, aquele olhar que lhe tirava o fôlego. Ela puxou uma lufada de ar, lembrando-se de respirar antes que ficasse tonta, quando ele se aproximou e grudou seus lábios em sua nuca, num beijinho terno.
– Se você não quer saber, então também não quero – ele falou, bem perto do ouvido dela, sua respiração fazendo com que ela se arrepiasse.
– Eu estou liberada pra voltar a trabalhar – ela contou, e então Sam entendeu o motivo do sorriso – Ela disse que está tudo bem com o bebê, que está se desenvolvendo como deveria, e a placenta já se estabilizou.
– Mas... – ele temia que ela voltasse a trabalhar e algo ruim acontecesse, mas não ousou dizer. Caitriona já alimentava seus próprios temores e não era ele que iria assustá-la ainda mais – Tem certeza?
– Sim, ela disse que tá tudo bem – Cait confirmou, enquanto se dirigiam para o carro, que estava estacionado do outro lado da rua. Sam abriu a porta do passageiro para ela e dirigiu-se para o lado do motorista – Mas falou pra eu pegar leve. Nada de cavalos, nada de aviões, nada de sexo... por enquanto.
– Vou ter que arrumar outra forma de te entreter então – ligou o carro – Isso quer dizer que não precisamos ir direto pra casa agora?
Ela confirmou com um aceno de cabeça, tentando entender o que ele queria dizer com isso. Até onde sabia, não tinham nenhum plano, além de avisar a equipe que poderia voltar a gravar no dia seguinte... e talvez planejar o casamento, mas nada imediato.
– Onde estamos indo, Sam? – ela notou que ele saiu da rota habitual para casa. O caminho do apartamento para o consultório era bem familiar, uma vez que eles iam lá toda semana.
– Tenho uma surpresa pra você – ele sorriu, olhando-a de esguelha por uma fração de segundos antes de se voltar para o trânsito.
– Lá vem você com essa história de surpresa de novo– ela disse, revirando os olhos.
Ela tentou não ficar muito ansiosa com a tal surpresa, então se ocupou em mandar mensagem para Maril avisando que voltaria a gravar. Eles já tinham combinado tudo: se fosse alguma cena mais intensa, usaria dublê e a barriga ainda não estava aparente para atrapalhar nas roupas de Claire. Sabia que a carga horária não poderia ser a habitual, para não se forçar muito, mas isso não seria um empecilho – segundo a própria Maril.
Ela olhou pela janela e notou que estavam na rodovia, saindo da cidade. As montanhas se amontoavam ao longe, o céu num azul tão intenso que quase a cegava. Era um dia ensolarado e incomum, mesmo para o verão escocês. Sam dirigia em silêncio, enquanto tocava uma música qualquer no som do carro. Os dois tinham gostos musicais bem distintos, mas Caitriona não reconhecia aquela que estava tocando. Ele tinha uma das mãos no volante, a outra sobre sua coxa, como de costume, alternando com o câmbio.
Deixaram a rodovia, entrando numa estrada secundária. Ela serpenteava uma montanha, até o topo. Ele estacionou no meio de um gramado, e sem dizer nada, desceu do carro e abriu a porta para ela.
Ele segurou a mão dela e puxou-a para a frente do carro. O horizonte se abria em frente a eles. Verde, azul e branco. O verde das encostas cobertas de grama e árvores grandes e pequenas, novas e antigas. O azul intenso do céu, que se refletia no olhar intenso que Sam lhe lançava, analisando-a com cuidado. O branco das nuvens, fofas como algodão que se amontoavam sobre suas cabeças.
O vento era gelado e fazia com que seus cabelos soltos lhe açoitassem o rosto. Ela apenas abraçou a si mesma, num movimento involuntário. Percebendo que ela estava com frio, Sam puxou-a contra si, ficando atrás dela e envolvendo-a com seus braços quentes.
– É lindo, Sam – ela disse, por fim, aproveitando o ronronar de sua respiração em seu ouvido. Ele estava encolhido junto a ela, apoiando o queixo em seu ombro.
– O que você acha? – ele perguntou, virando-a para si, face a face, mas ainda naquele abraço.
– Como assim?
– Podemos construir a casa bem ali, onde está o carro – ele apontou, em seguida soltando-a e caminhando até o carro – Aqui poderia ser a varanda, com a vista para o horizonte, e mais ali atrás, nosso quarto... aqui do lado, o quarto do bebê – ela continuava parada no mesmo lugar, observando conforme ele gesticulava – E lá no canto podemos fazer uma piscina.
Ele parou por um segundo e encarou-a, esperando uma resposta, uma reação, qualquer coisa. Ela continuava parada, boquiaberta.
– Cait? – ele atravessou o espaço que os separava em algumas passadas rápidas, parando bem pertinho dela – Não gostou? – sua expressão mudou de empolgação para preocupação em uma fração de segundos.
– Não – ela disse, por fim, tentando organizar os pensamentos e transformá-los em palavras – E-eu só não imaginava.
– Se não quiser, querida, tudo bem – ele a abraçou de volta – Eu sei que é meio retirado, longe da cidade. Não fechei negócio ainda, queria te trazer aqui antes.
– Eu nunca me imaginei num lugar assim, Sam. Nunca me vi entre as montanhas. Sempre me imaginei sobre um monte de cimento, com o barulho da cidade e o cheiro de poluição. Eu nunca nem sonhei com um lugar assim – ela falou de uma vez, erguendo o rosto para encará-lo – Isso aqui é muito mais do que eu jamais sonhei.
– Isso... isso quer dizer que gostou, então? – ele perguntou, confuso.
– Agora eu consigo imaginar o bebê correndo por aqui. E lá onde você mostrou, imagino uma enorme janela de vidro, talvez a parede toda, nós três, sentados à mesa, observando a neve caindo do lado de fora – ela sentiu as lágrimas escorrendo por sua face – Eu não acredito que estou chorando de novo! – sorriu, enquanto ele secava delicadamente suas lágrimas.
– Agora eu tenho quase certeza que você gostou – Sam sorriu, pousando uma das mãos sobre a pequena protuberância que começava a despontar em sua barriga.
– Sam, eu amei – ela falou finalmente, colocando a mão sobre a dele.
– Tenho um pressentimento de que vamos ser muito felizes aqui – ele disse, puxando-a para um beijo lento, quente, e demorado.