Eu não consegui dormir, não mais. Como eu poderia? Então passei a noite toda encarando o teto, provavelmente com uma expressão de terror e choro, perdida em pensamentos dolorosos. Revivendo cada momento da conversa com meu pai. Cada palavra que ele me disse sobre o Heitor foi como um tapa doloroso na minha face. E a sua condição de refém da mulher com quem se casou, me faz ter pena dele. Tudo isso ecoando na minha mente de uma maneira que não consegui silenciar.
Tudo tão perturbador, tão frustrante e um pouco confuso.
Ele parecia tão instável, cansado...
Fiquei pensando, ruminando a difícil situação em que ele se encontra há anos, a injustiça com ele e com a minha mãe e só consegui odiar ainda mais aquela mulher, Alessandra.
Ela é a culpada, ela é a origem dos vários problemas.
Que ela morra!! Ela podia morrer, seria uma benção. Esse é um pensamento horrível, egoísta, eu sei, mas acho que isso não me torna vil como ela e também aquela arrogante da filha dela.
Não gosto da Natalie, assim como ela também já deixou nítido que não gosta de mim.
O nojo que estou sentindo do Heitor... Às lembranças daquele beijo, das coisas que ele fez no meu corpo, eu as odeio. Por que me sinto tão magoada, ferida por causa dele? Eu chorei de raiva, frustração e temor, por mim, por meu pai, por tudo.
Percebi que essa situação, de uma forma ou de outra, me envolve também. Não há como fugir, eu não vejo escapatória. Mesmo quando eu não compreendia nada, qualquer nuance, já estava inserida nela. Aquela conversa trouxe à tona uma série de reflexões sobre minha própria vida, sobre quem eu sou e o papel que é meu por direito nesse emaranhado de desafios. Foi como se uma luz nada agradável mas real, iluminasse os cantos mais escuros da minha mente, revelando verdades ocultas que eu preferia não encarar.
Eu vou ter que fazer sacrifícios, que seguir caminhos que talvez eu não deseje de fato. Eu farei o que é necessário.
Minha mãe sempre foi uma mulher forte, determinada. Ela estava disposta a fazer o que fosse necessário e viver da melhor maneira possível com isso. Nunca se acovardou diante das decepções que enfrentou na vida, seja com a família que a abandonou, meu pai que esteve ausente, ou qualquer outra coisa. Como ela costumava me dizer, aprendeu certas lições um pouco mais tarde do que gostaria, mas aprendeu.
E se eu puder aprender mais cedo?
Mesmo amando profundamente meu pai, mesmo diante de todo o caos que ele trouxe a ela, ela construiu seu próprio caminho, viveu sua própria independência sem depender dele ou de qualquer outra pessoa.
Hoje eu vejo, ela foi extraordinária.
Quero ser forte assim, ter clareza sobre a vida que desejo dentro da minha realidade e ser o mais sensata possível. Não posso deixar os meus sentimentos me dominarem. Eu tenho que conseguir, não posso simplesmente fechar os olhos e seguir o caminho que meu coração insensato mandar, pois nós mulheres somos na grande maioria das vezes, o elo mais fraco, eu sou o elo fraco. Não sob o olhar do meu pai, ele se recusa a ver isso, mas eu vejo.
Meu pai tem total convicção de que o casamento entre Heitor e Natalie vai acontecer, e portanto, não posso duvidar. Ele parece conhecer Heitor relativamente bem, está ciente de seus defeitos, de seus comportamentos sujos. Por essa razão, não consigo compreender seu raciocínio. Então, Heitor é podre demais para ser marido da filha legítima, mas serve para ser protetor da bastarda? Mesmo ciente desses aspectos deploráveis, ele assinou um contrato no qual aquele homem sínico se responsabiliza pela minha segurança.
Quanto mais eu penso, menos eu entendo.
O que eu não estou vendo agora?
Porque, em minha percepção é como se estivesse entregando minha vida nas mãos de um lobo disfarçado de cordeiro. Esta situação me deixa profundamente inquieta, pois vejo claramente o perigo que isso representa.
Tudo isso é mais do que consigo suportar e compreender.
Essa situação me leva a questionar os riscos que estou correndo. Me faz analisar o nível de cinismo do Heitor, ele é nitidamente alguém capaz de manipular e enganar sem pestanejar, ele não parece se importar com limites, e junto da Natalie aquela criatura mesquinha e a mãe cruel dela... O que os três em conjunto representam, é um show de horrores.
Será que Natalie sabe que seu então noivo tem um contrato com nosso pai que garante minha proteção? Será que o Heitor é tão sujo, imoral, que mesmo sabendo da proposta de noivado que o Adam, seu irmão, seja lá por qual for o motivo fez, ainda assim se portou daquela forma comigo?
Sinto que devo temer pela minha segurança, e não acreditar que estou segura com aquele homem.
Será que meu pai não percebe o perigo que isso representa? Ou será que ele está tão perdido que não vê mais nada com clareza?
Ao tentar garantir minha segurança, pode ser que tenha causado mais problemas do que soluções na minha vida. Heitor não será um muro de proteção em volta de mim, contra a sua esposa e sua sogra, será?
Ele chamou ela de vacassandra, disse coisas que demonstraram naquele momento um sentimento de discórdia entre eles, mas isso com certeza foi para me ludibriar naquele momento de fragilidade em que eu me encontrava, pra assim realizar seus desejos lascívos.
As dúvidas me consomem, é como tentar encontrar respostas em um labirinto sem saída. E no meio disso tudo, sinto-me vulnerável, como se estivesse à mercê de forças que fogem ao meu controle.
“ Ah deus... Eu estou a mercê de coisas que fogem ao meu controle.”
Unido a tudo isso, está o nojo e a vergonha que não paro de sentir por mim mesma. Estou com muita raiva do Heitor, nojo daquele homem sujo, imoral. Raiva por ter me deixado tocar por ele daquela forma tão íntima. É quase como se eu ainda pudesse sentir seus dedos em mim, seu cheiro, seu gosto... Às sensações que ele provocou em mim, são as doces lembranças de um erro.
Eu me responsabilizo pelo meu erro e me condeno por isso. Eu já havia me arrependido antes mesmo de ouvir aquelas coisas sobre ele de meu pai, por saber que a minha atitude foi a pior possível. Eu sabia que ele era noivo, comprometido, mas tudo é ainda pior.
Ele é deplorável segundo o meu pai, e também segundo a minha análise a cerca de seu comportamento comigo.
Portanto, eu não posso permitir que nada daquilo se repita nunca mais. Ele claramente não tem limites, deve estar acostumado a fazer o que fez comigo com outras mulheres, sem se preocupar com dignidade, reputação ou caráter. Não! O que ele fez comigo deve ser muito menos do que ele faz com elas, pois comigo ele não teve tempo o suficiente.
Com elas, ele deve transar mesmo, e o sentimento que me consome ao constatar isso, é nauseante, amargo demais.
“ como eu me arrependo ”
Como eu vou lidar com tudo isso? Como
??
Ainda não consigo acreditar que aceitei ser noiva do Adam... Meu Deus, eu aceitei! Parecia tão importante, vi nos olhos do meu pai, quase uma súplica.
Naquele momento, suas palavras pareciam carregar todo o peso do mundo, como se a minha anuência fosse lhe trazer algum alívio. Senti como se estivesse sendo arrastada por uma correnteza poderosa, incapaz de resistir e me vi dizendo sim.
Por que aquele rapaz de sorriso fácil, cheio de ironia e sarcasmo, teria interesse em se casar comigo? O que eu não percebi ainda?
Será que tudo não passa de um jogo muito maior, onde eu sou apenas uma peça descartável? As dúvidas me chicoteiam a incerteza sobre os verdadeiros motivos por trás dessa união me assombra, me sufoca.
Meu pai disse que aceitar ficar noiva de Adam Greco, mesmo não sendo algo convencional, é uma atitude prática e, necessária, e considerando a realidade da minha inegável posição de desvantagem, acho que é a escolha certa, não?
Ser também a noiva de um Greco, pode ser alguma fonte de proteção. Eu posso conquista-los, a Helena parece gostar de mim... Eu acho.
Minhas emoções oscilam de forma angustiante, eu me sinto mastigada. Talvez eu precise dormir um pouco, só um pouco, desligar a minha mente, só por um instante.
Acaricio o Miau que está deitadinho ao meu lado, com certeza a única criatura viva e satisfeita nesse lugar tão cheio de requinte.
O sol parece nascer lá fora, iluminando o mundo, mas eu não vou sair da cama. Como eu gostaria de andar... Poder sentir o cheiro da grama verde e o orvalho pela manhã. Saudades da Inglaterra, da minha mãe gritando por mim.
As lágrimas voltam a brotar, molhando o meu rosto.
__ Querida, que bom vê-la. Conseguiu descansar?
Ergo o olhar para encontrar o meu pai. Ele se aproxima, um tanto ofegante e suado, vestido com roupas típicas de alguém que pratica exercícios físicos. Nota-se que o fato de que ele tem mantido frequência quanto a isso tem tido bons resultados, seu físico tornou-se mais robusto, combinando com sua altura imponente.
Seus olhos, tão familiares me observam com muita atenção, como se buscasse ler cada detalhe do meu rosto em busca de algum sinal de preocupação ou cansaço.
__ Um pouco. Eu... __ Eu não sei se mentir é mais um caminho viável pra nós, acho que isso só vai servir para nos distânciar. __ Eu não consegui dormir mais após nossa conversa.
__ Eu deveria confortá-la, fazê-la se sentir segura, feliz. __ A voz dele transmite lamento e tristeza. __ Essa é a função de um pai. E o que eu fiz? Atraí ainda mais tormentos para você na noite anterior. Aurora...
__ Papai. __ O interrompo. __ Quero ver o Adam.
__ O quê? __ Sua expressão torna-se confusa.
__ Ele pode vir aqui? Ou podemos ir lá. Mas quero vê-lo. Acho que se vamos nos tornar noivos, eu preciso, ao menos, conversar com ele. __ Sou eu que falo, mas ainda assim é tão estranho.
__ Querida, eu apenas informei a você sobre essa possibilidade na noite passada. Não é algo que já foi firmado. Como eu disse a você, eu não concordaria com nada, a não ser que desse sua anuência.
__ Eu já dei e estou dando novamente. Podemos fazer isso pessoalmente. __ Transmito segurança, ou tento pelo menos.
__ Meu bem... __ Ele se aproxima mais, e senta na outra ponta do sofá, como se não quisesse me atrapalhar com os cadernos e livros enquanto faço os exercícios. __ Você não tem que fazer isso. Entendeu? Me perdoe pelo meu desequilíbrio na noite passada. O medo faz isso __ Ele não parece se envergonhar de admitir sentir medo. __ Eu amo tanto você e a sua mãe, temo tanto que possam ser feridas de alguma forma que as vezes eu me desespero.
Ele precisa de mim!
Meu pai precisa de alguém que possa estar ao lado dele, que possa fazer algo por ele. Isso é tão evidente. Por mais que os Grecos, Helena e Hector, sejam seus amigos, mas eles tem suas próprias vidas e família.
__ Eu entendo. Que horas podemos ir?
Ele me encara com certa incredulidade.
__ Sua mãe... Quando ela acordar irá me xingar de todos os piores nomes se eu for em frente com isso.
__ Talvez. __ Ela vai bater nele, se conseguir. Mas até lá, ela ainda não pode bater nele e nem me ajudar, e eu não posso abandoná-la, nunca! Eu farei tudo por nós.
Heitor é um hipócrita, Natalie também é, sua mãe é uma mulher cruel tanto quanto também deve ser hipócrita, e eu... bom, eu estarei prestes a me tornar uma. Não sei ao certo o que me impulsiona, se é a raiva, a determinação ou um certo desejo de vingança. Heitor nunca mais irá me tocar. Tudo o que sei é que não ficarei parada e permitirei que façam o que quiserem comigo.
Meu pai precisa de uma parceira, alguém que esteja disposta a enfrentar as adversidades ao lado dele, enquanto minha mãe não sai de seu estado vulnerável e inerte. E eu serei essa parceira.
É isso, eu estou com raiva e a raiva é sim uma excelente motivadora.
O trajeto até a mansão Greco já não é desconhecido para mim, mas ainda consegue ser impressionante, espetacular. Observo a paisagem através do vidro do carro que segue em alta velocidade. Somente pessoas com enorme poder de fato, poderiam manter tantos quilômetros de terra verdejante inóspita, enquanto mantém sua fortaleza, seu lar inalcansavel para meros mortais.
Como alguém consegue algo assim? Acho que preciso descobrir. Quero saber mais sobre a história deles, e de meu pai. Afinal, o que está por trás de toda essa grandiosidade?
__ Filha? A qualquer momento que quiser desistir, agora ou depois, não importa, apenas me diga. __ Ouço as palavras de meu pai enquanto sinto sua mão tocar a minha.
Ao desviar meu olhar da paisagem lá fora, para olhar meu pai, de alguma forma meus olhos acabam se encontrando através do retrovisor com os olhos do segurança que me encara, Charles.
Ele imediatamente desvia sua atenção. Sinto um incômodo, um alerta claro. Ele está sempre em nossa companhia ao sairmos, sempre ao lado de William. Ele não faz parte da equipe do meu pai, pois lembro do rosto de cada um deles. É claro, ele é um funcionário novo, claramente da equipe do Heitor.
__ Tudo bem, eu direi, prometo! __ Respondo, sem entrar em detalhes.
“ Será que ele sabe? Será que o Heitor sabe que o irmão dele tem interesse em ficar noivo de mim? Não! Eu não quero pensar nele. Eu não vou pensar nele, não mais! ”
Alertarei o meu pai para a importância de conversamos apenas em particular. Não vou confiar em quem trabalha pro imoral do Heitor.
Capítulo concluído ✅
Mores, repetindo gentilmente mais uma vez, votem e comentem, é importante e eu agradeço. 💖
Aurora, está em um momento de muitas reflexões, ela foi bem certeira em algumas análises. Temos que concordar que tendo em vista o fato de que ela não sabe o que habita o coração do Heitor (Ele tem um coração haha?) ela está certa em temer que ele não seja exatamente um muro de proteção contra vacassandra e sua cria. 😬
Prontas para ver o próximo encontro desses dois? Quais as expectativas?
Beijinhos 😘 e até o próximo capítulo 💗🤗
Ah, última coisinha 🤭😁... Preparem seus corações para os próximos capítulos, 💗❤️🎭