Seiji Matsuno.
- Eu entendo que foi algo completamente inesperado e chocante, mas Elay precisa de você. - O encaro de modo interrogativo, as palavras se formam na minha mente mas não saem pela minha boca, são tantas perguntas projetadas que me deixa atordoado.
- Ele sabe que eu sou pai dele?
- Sim ele sabe. - Seu tom tem um pesar. - Nara chegou a enviar fotos suas para ele. - Pisco sentindo-me mais ridicularizado ainda. Em que momento que Nara tirava fotos minhas? - Seiji, sei que não foi certo esconder...
- Você e meu pai estavam juntos nessa. - O corto. - Juro que se fosse somente você eu entenderia, mas porra meu próprio pai me traiu dessa forma, não entendo porquê, a troco de quê? - Ele abaixou a cabeça.
- Nunca soube os motivos de Hiroki, para mim era apenas um pedido da própria Nara. - Respiro fundo, tentando buscar na minha cabeça algo que faça sentido.
- E porquê agora? - Ajeito minha postura na cadeira, tentando parecer menos abalado. - Qual é a razão disso?
Don tosse e puxa o oxigênio com mais força, parece buscar alguma razão que me convença.
- Não vou durar muito mais, Elay se tonaria meu herdeiro após completar a maior idade, porém ele também é seu herdeiro legítimo por isso eu precisava saber quais seus planos para ele, Elay precisa de você para protegê-lo, com a minha morte Mattia o matará.
- Mattia não pode fazer isso.
- Se você não tivesse noção da existência dele, Mattia faria isso sem empecilho nenhum, mas agora que tem conhecimento, acredito que ele pensará três vezes antes de chegar perto do menino.
O entendimento chegou a mim e consegui pensar com clareza. Gostando ou não, Elay seria um bastardo que comandaria a máfia calabresa, ele jamais seria aceito.
Respiro fundo, me levanto aproximando-me da janela.
- Seiji. - Viro-me, e vejo o Don estender um envelope vermelho na minha direção. - Nara deixou uma carta, caso algo acontecesse com ela.
Olho do seu rosto para sua mão estendida, na dúvida se pego ou não aquele envelope. Se eu pudesse ressuscitar a Nara apenas para mata-la com minhas próprias mãos, eu faria.
Maldita Nara!
Por fim o pego de sua mão, dobro e guardo no bolso sem nem olhar para o papel.
- Peço que me dê licença Don, preciso fazer uma ligação importante. - Saco o celular do bolso.
- Sinta-se a vontade Matsuno. - Aponta para a porta, e eu quase saio correndo para fora.
Sigo o corredor até chegar no jardim lateral, paro próximo a piscina, sem coragem alguma de ligar para minha mulher disco o número de Diogo, e encaro a água cristalina enquanto chama.
- Matsuno?
- Sim Saito. - Confirmo que realmente sou eu, o chamando pelo seu sobrenome. - Como Aisha está?
- Preocupada mais bem, não se preocupe, você já terminou por ai? - Olho para cima, e engulo seco.
- Ainda não, na verdade irei demorar mais tempo do que eu queria.
- Aconteceu alguma coisa?
- Aconteceu Diogo, descobri que Nara teve um filho. - Digo irritado.
- Que porra você está dizendo Seiji?
- Isso mesmo o que você ouviu, Nara estava grávida quando veio para Itália. - Despejo logo a merda de uma vez.
- Puta que pariu Matsuno. - Sua voz parece tão chocada e surpresa, quanto imagino ser sua cara nesse momento. - E o que pretende fazer? O que devo dizer a Aisha?
- Pretendo encarar a situação de frente, já a Aisha, diga que precisarei ficar alguns dias a mais.
- Ela não vai gostar nenhum pouco disso.
- Eu sei. - Sussurro chateado, Aisha vai me matar.
- Me deseje sorte para dizer a ela, assim como desejo a você quando voltar para casa.
- Boa sorte para nós. - Se eu tivesse uma bebida aqui agora, levantaria o copo em forma de brinde, por que realmente estamos fodidos.
Desligo e guardo o celular no bolso, faço o mesmo caminho que fiz para chegar aqui retornando ao escritório.
- Quero um DNA. - Don me olha com alívio.
- Eu ficaria decepcionado se não pedisse.
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Aisha Beatriz.
É difícil dormir quando Seiji não está, os gêmeos não param quietos.
Faz três dias que ele viajou, e mesmo conversando todas as noites por vídeo chamada, eu sinto que tem algo errado.
Estava tão absorta, que não vi quando Yuna entrou no quarto.
- Desculpe-me Senhora, eu bati mas a senhora não reapondeu. - Sorri mostrando que estava tudo bem. - Vim preparar seu banho. - Ela se curva brevemente e vai direção ao banheiro.
Todas as manhãs quando Seiji não está em casa, Yuna prepara um banho de banheira para mim.
Seiji me proibiu de tomar banhos em pé, e de me esforçar mais que do que apenas descer os degraus.
- Não era necessário vir Yuna, eu poderia muito bem colocar a banheira para encher.
- Não senhora, esse é o meu dever, além de que eu gosto de ver a senhora bem, e o senhor Matsuno me mataria.
Solto uma gargalhada altamente divertida com sua resposta, Yuna e eu nos damos super bem, ela se tornou uma mãe para mim.
- Tira esse "Senhora" dai. - Faço aspas com os dedos. - Seiji jamais faria algo contra você.
- Você é a dona desse Império Aisha, um mínimo deslize perto de você já é motivo para o chefe matar qualquer um, até mesmo a mim.
- Acha que ele chegaria a tanto? - Questiono preocupada, enquanto faço um coque de qualquer jeito nos cabelos mais compridos.
- Tenho certeza, apesar de não acreditar para ele é Deus no céu e você na terra, nada nem ninguém está acima da senhora e os bebês, nem mesmo ele.
Yuna fala de uma forma tão carinhosa, que aquece meu coração. Pensar que essa mulher teria motivos o suficiente para me odiar, e mesmo assim abriu espaço no coração para mim.
- Está pronto, vamos? - Ela estende as mãos para me ajudar a levantar da cama. - Enquanto a senho... você estiver no banho, eu vou separar um vestido confortável.
- Muito obrigada. - Ela junta as mãos e faz meia reverência, antes de me deixar sozinha relaxando.
Quando termino coloco um dos roupões de Seiji, quando voltei ao quarto Yuna ainda estava me esperando, sobre a cama já de lençóis trocados estava um dos meus vestidos brancos de algodão cru, e no chão uma sandalia de salto baixo da Dakota, que Liz trouxe do Brasil para mim.
Penteei os cabelos e fiz uma maquiagem básica apenas com base, delineador, rímel, e um batom rosa nos lábios. Desci para o café e me sentei na mesa, onde Carlos e Diogo já me aguardavam.
- O que está acontecendo? - Encarei de um para o outro, que pararam de falar abruptamente quando entrei na cozinha. Eles se entreolham e vejo um certo pânico. - É o Seiji? Aconteceu alguma coisa? - Me levantei.
- Ei Aisha, não precisa se agitar, Seiji está bem. - Carlos segura meu ombro.
- Então porquê esses comportamentos estranhos perto de mim? - Sou mais ignorante do que queria.
Eles se entreolham novamente, decidindo quem é que vai me dar a notícia ruim, por fim Diogo fecha os olhos e respira fundo.
- No dia seguinte a viagem, ele me ligou pedindo que eu te avisasse que ele vai demorar mais tempo para voltar.
Meu coração erra uma batida, e abraço minha barriga em forma de proteção ao meus filhos.
Seiji está a quase 10.000 quilômetros de casa, dentro do território da máfia rival, em posse deles.
- Mas porque ele faria isso? Porquê ele aceitaria isso, nos falamos na noite passada e ele não disse nada. - Gritei exasperada.
- Aisha, por favor. - Diogo pede. - Está tudo bem, é apenas um pequeno imprevisto.
- Eu vou para lá imediatamente. - Pego o celular.
- Aisha, pelo amor de Deus. - Carlos tenta.
Mando uma mensagem ao Benjamim, pedindo sua presença urgente.
- Yuna, arrume minha mala por favor. - Ela concorda e sai. Benjamim aparece na porta. - Quero o jato pronto em uma hora. - Ele concorda.
- Aisha não tem necessidade de você ir até lá, acredite em mim, se Seiji tivesse em perigo já teríamos ido com todas as nossas tropas, você sabe disso. - Diogo tenta me fazer mudar de ideia.
- Não me importa. - O encaro furiosa. - Vocês não estão me contando tudo.
- Aisha daqui a pouco você fará sete meses, não é recomendável viajar nesse período. - Direciono meu olhar mortal a Carlos.
- Então chamem o médico para ir comigo, façam a merda que for mas ninguém irá me impedir.
- Mas...
- Eu disse ninguém. - Rosno em alerta, e eles abaixaram a cabeça. - Diogo consiga a permissão para minha aterrissagem na Calábria.
Me sentei novamente a mesa, meu apetite foi para o espaço mas ainda sim, preciso alimentar os dois anjinhos que carrego.
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Assim como eu disse, meu médico e duas enfermeiras embarcaram comigo, junto com Tasuo, Benjamim, e mais meia-duzia de soldados.
O doutor optou me dar um remédio para dormir, levando em conta o meu estado de ansiedade. A aeromoça foi caprichosa com a minha alimentação, salmão ao molho rose, filé de frango grelhado com legumes cozidos ao vapor no prato principal, pedaços de abacaxi e uma barrinha de cereais com castanhas de sobremesa.
Fui acordada quando faltavam 15 minutos para pousar, passei uma água no rosto e me preparei mentalmente para o que quer que estivesse acontecendo.
Ao sair do avião, alguns homens "Acredito ser do Don" estavam na pista provavelmente nos aguardando.
- Senhora Matsuno? - O que estava no meio estendeu a mão. - Sou Mattia, o subchefe da Ndrangheta, o Don já aguarda pela senhora, seus homens não seram mais necessários.
Quando estendi a mão para cumprimenta-lo, Tasuo e Benjamim entraram na frente sacando suas armas, e os outros montaram uma barreira ao nosso redor.
- Benjamim.
- Ordens do chefe. - Ele simplesmente responde, advinhando que eu estranharia.
- Eles estão aqui somente pela minha segurança e a dos meus filhos, garanto que eles não causaram problemas. - O homem que se apresentou como subchefe, me olhou de cima a baixo de maneira estranha.
- Se realmente é só por isso tudo bem, até porque o Don não falou nada sobre isso. - Ele se virou na direção dos carros, e mandou que um dos mororistas saisse. - Então um dos seus "seguranças" pode nos seguir. - Jogou a chave para Tasuo que rosnou.
Os portões se abriram, havia uma grande fonte de água no centro do gramado verde e bem aparado, que se estendia até os pés das colunas em pedras antigas da mansão italiana.
E a frente da fonte aguardando minha chegada, estava o lindo e imponente Seiji Matsuno, o meu marido vestido impecávelmente em um terno de 3 peças cinza, seus cabelos foram penteados para trás, e seu rosto estava sério.
- Amor. - Fui para abraça-lo enquanto os seguranças se espalhavam, e a equipe médica era levada para dentro da casa.
- Oi linda, o que está fazendo aqui? - Havia preocupação na sua voz, mas também havia algo mais que não consegui descobrir.
- Vim saber como posso te ajudar, o que está acontecendo para que você adiasse a volta para casa?
- A saúde do Don piorou drasticamente, e tem algo que eu preciso conversar com você. - Um movimento atrás dele me chamou a atenção.
Desviei o olhar, e nos observando de trás de uma das colunas havia um garoto. De repente eu já não ouvia mais o que Seiji falava, não conseguia desviar meus olhos dele.
Devagar fui me desvencilhando dos braços de Seiji, e caminhando até o garotinho de cabelos escuros e semblante sério, que mantinha o olhar fixante em mim.
- Aisha, eu preciso... - Ignorei sua fala, alguma coisa me puxava na direção daquela criança.
Parei diante do pequeno homem e abaixei apoiando um joelho na grama, sem deixar que desviasse os olhos dos meus. Conforme eu mostrava curiosidade, ele ia saindo do seu esconderijo.
Deus! É a criança mais linda que já vi.
- Oi. - Falei baixo, e sorri. - Como se chama? - Sua expressão não mudou, mas estava claro que ele tinha medo misturado com curiosidade.
- Elay. - Falou baixinho e olhou na direção do Seiji.
- Ah, não precisa ter medo dele, ele é grande e assustador a primeira vista, mas é uma ótima pessoa. - Balancei a cabeça positivamente também olhando para o meu marido, que nos assistia de modo interrogativo. - Elay, que nome lindo.
- Grazie, Senhora Matsuno. - Falou de jeito tímido mas com firmeza na voz.
Minha nossa! Estou completamente encantada com o mini cavalheiro.
- Pode me chamar de Aisha. - Ele confirmou e repetiu meu nome, testando como ficava a pronúncia com sua voz. - Isso, quantos anos tem Elay?
- Seis, perto dos sete.
- Ti ho trovato, pranziamo per i'allenamento. (Achei você, vamos almoçar para o treino.) - Uma mulher que acredito ser a babá o chama.
- Agora eu fiquei curiosa, o que você treina?
- Arco e flexa, são meus favoritos. - Devo ter aberto a boca num pequeno "o" pois ele riu, e confesso que fiquei embasbacada com a cena. - Tenho que ir Senhora Aisha.
Me levantei e o observei se afastar aos poucos, antes de sumir no corredor, ele olhou para trás uma última vez.
- Vamos para o meu quarto, deve estar cansada da viagem e nós precisamos conversar. - Seiji beijou minha testa e abraçou minha cintura, me guiando pelo lado contrário do corredor.
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