Parte 2

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Alguns dias depois, Joaquim se encontrava na mesa de um bar tomando uma dose de aguardente.

Ela parecia aliviar as dores que ainda persistiam.

Daquela terrível noite tinha apenas pequenos vislumbres de memória.
Alguém recolhendo o seu corpo do chão...Um hospital com cheiro de alvejantes e sua esposa, Maria, chorando sob o seu leito.
Miguel ele não tinha visto desde então.
Mas para sua total surpresa o gajo, já com roupa de marinheiro, vinha entrando no bar justamente naquele momento.
    - Como andas, meu caro amigo? -cumprimentou Miguel ao avista-lo.
Sentou-se no banco ao lado de Joaquim e pediu uma dose de Rum.
Joaquim olhou para ele, incrédulo.
   - Como ando gajo desgraçado? -disse, levantando-se ainda com o copo na mão. - Por acaso esqueces que me largou a própria sorte com um bicho dos infernos no meu encalço? Que me deixou para trás morrendo enquanto fugia feito uma gazela assustada?
Miguel pareceu não se alterar.
    - É verdade. Não me recordavas disso-diz ele, tirando a boina e coçando a cabeça por um instante. - Como ando esquecido últimamente. Mas conte me gajo, porque não fugistes como eu? Quisestes bancar o corajoso e vejo que não se deu muito bem.
Joaquim,enfurecido,pegou o homem pela gola da camisa e o atirou ao chão.
    - Vais ver agora porque não fugi -diz ele e se lança para cima do homem desferindo socos e pontapés.
Miguel, mesmo assustado com aquela reação, também revidou. Golpeando-o duas vezes com um soco no rosto.
Os outros frequentadores do bar apenas olhavam aquela cena, assustados, e alguns até mesmo incentivavam o embate.
     -Pra fora do meu bar os dois. - gritou, de repente, o dono do bar, um velho alto e gordo com uma espingarda na mão.
Joaquim largou sua vítima e, jogando algumas moedas no balcão,seguiu para a porta de saída.
Miguel, sangrando no chão, tentava se levantar, mas voltava a cair de novo.
   - Você não deveria ter feito isso, gajo-disse com a voz fraca e limpando o sangue do rosto - Eu vou acabar com a sua vida.
Mas Joaquim não deu ouvidos e seguiu para casa.
Morava em um pequeno casebre em meio a uma mata fechada. Sempre gostou de viver isolado.
Ao entrar, Maria estava na sala de estar, entretida com um crochê,e ao vê-lo todo machucado correu para ajudá-lo.
    -Andastes se metendo em briga de novo, Joaquim? -diz ela. - Você não toma jeito mesmo.
     - Ora não me avexes,mulher -grita ele, carrancudo, passando a mão pelo canto da boca onde escorria um pouco de sangue.
Seguiu na direção do quarto do casal e, ao entrar,sentiu todo o seu corpo estremecer.
Uma rajada de vento frio fez ele se arrepiar completamente.
     - Diacho, quem deixou essa janela aberta? -grita ele e segue na direção dela.
Já estava quase fechando-a quando os seus olhos deram com a reluzente lua cheia.
Desde criança gostava de passar horas e horas a contempla-la e ficar imaginando o que havia lá.
O que escondia aquele planeta majestoso e sombrio que brilhava imponente e parecia estar a poucos metros deles.
E ali ficou um bom tempo a contempla-la.

         *                     *                        *

Ao acordar no dia seguinte,estava em meio a árvores altas e deitado em um chão de terra.
Levantou-se de um salto e percebeu que estava completamente nu.
Mas isso não era nada comparado ao sangue...Estava banhado em sangue.
Rapidamente procurou algum ferimento em seu corpo,mas não havia nenhum.

    - O que está acontecendo aqui?

Ainda assustado,  rumou na direção de casa e já ia se aproximando quando percebeu que algo estava errado: Todas as portas estavam escancaradas.
 Como isso era possível se Maria tinha todo o cuidado do mundo com relação a segurança? Vivia sempre com as portas trancadas. O tempo todo.

Mais assustado do que nunca, correu para casa e a adentrou gritando pela esposa.
Ali tudo estava revirado, móveis, mesas e cadeiras e no centro da sala, próximo ao velho sofá, estava Maria.
Caída de rosto para o chão em meio a uma poça de sangue e com o corpo todo mutilado.
Boa parte da pele dos seus braços e pernas parecia ter sido arrancada do corpo a mordidas. Deixando visível uma parte dos brancos ossos.
Seus olhos estavam abertos e arregalados e no seu rosto se mantinha uma expressão de terror.
Joaquim ao ver aquela cena sentiu as pernas bambearem, caiu de joelhos no chão da sala e, pela primeira vez em muito tempo, chorou.
Abraçou-se ao corpo da falecida esposa e a beijou intensamente enquanto chorava.
E foi nesse momento que percebeu algumas pegadas. Um rastro de sangue que seguia na direção da cozinha.
Ainda chorando, largou o corpo da mulher no chão, e pôs-se a seguir as estranhas pegadas.
Realmente elas seguiam até a cozinha e depois de cruzar a porta tornavam-se pegadas na areia.
Ele as seguiu e não demorou muito para encontrar o que procurava.
Ali, junto a entrada da mata, para onde as pegadas seguiam, estava um objeto branco com um pingente brilhoso.
Antes mesmo de pega-lo do chão ele já sabia o que era: uma boina de marinheiro.
    - ah, gajo maldito. -gritou, sacudindo a boina. - Eu vou matar você, seu desgraçado. Você vai pagar caro por isso.
Com o corpo tremendo, agora de raiva, ele seguiu para casa e começou a preparar o enterro da esposa.
Que foi sepultada ao fim daquela tarde nos fundos da propriedade do casal.
Quando a última lágrima caiu sobre o túmulo da falecida, Joaquim tinha o seu plano de vingança formado.

O DESCOBRIMENTO DA FERA Där berättelser lever. Upptäck nu