Capítulo 1

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Dandara

Grávida. Grávida. Grávida.

A palavra de apenas sete letras pulsava na minha cabeça no mesmo ritmo dos tênis de Lucas tocando ruidosamente o chão. Suspirei profundamente, sentindo aquele cheiro característico de hospital. Não sabia o que me irritava mais: a consulta iminente ou meu namorado ansioso. Não era como se não tivéssemos passado por isso antes. Ao meu redor, mulheres de trinta e poucos anos acariciavam suas barrigas estufadas. Todas pareciam bem-sucedidas e seguras de si. Muito diferentes de mim, que tinha acabado de entrar no meu primeiro emprego depois da faculdade e ainda morava com a família. Minha própria mãe já tinha dito como eu era irresponsável um zilhão de vezes. Ela tinha ficado tão chocada que ficara sem falar comigo por dias. Minha irmã e avó, pelo contrário, haviam ficado felicíssimas. Felizes até demais. Acho que era fácil para elas lidar com isso, mas eu era parecida demais com a minha mãe para agir naturalmente. Revezava momentos de calmaria e pânico, sempre pontilhados com uma dose de culpa e preocupação.

Descobrir a gravidez havia sido um baque, isso para dizer o mínimo. Se alguém me contasse que, aos vinte e quatro anos, eu estaria sentada em uma clínica obstétrica com meu namorado, esperando para fazer um ultrassom e saber se meu bebê estava bem, eu provavelmente teria rido na cara dessa pessoa. Lucas riu quando eu contei, achando que era mais uma das minhas piadas. Não era. Quando ele percebeu que eu não estava brincando, expliquei para ele que provavelmente eu fazia parte daquela pequena parcela de mulheres que engravidam com o uso do DIU e que os enjoos não eram resultado da quantidade de fatias de pizza ingeridas no rodízio a que tínhamos ido.

Achei que ele fosse surtar, mas até que levou melhor do que eu esperava. O resto dessa história é um verdadeiro borrão na minha cabeça, porque tudo aconteceu rápido demais: contar para as mulheres da minha família e ver a cara de choque da minha mãe e os sorrisos da minha avó e irmã; pensar se gostaria de manter aquela gravidez inesperada e acabar decidindo que sim, pois, apesar de tudo, eu não me colocaria em risco optando por um aborto clandestino; contar para a família de Lucas e ver seu pai se remexer de maneira incômoda na cadeira enquanto sua mãe abria um sorriso amarelo e olhava para todos os cantos menos para mim.

— Quanto tempo você acha que vai demorar? — Lucas me arrancou de meus pensamentos e eu olhei bem para ele. Sua pele branca brilhava na luz fosforescente da sala de espera, e ele ajeitava sem parar os óculos de aro grosso na ponta do nariz. Um sinal claro de que estava tão nervoso quanto eu.

— Pode ser que demore, Lucas. Não é a primeira vez que eu faço a consulta por aqui — retruquei, seca, enquanto respondia uma mensagem no grupo da empresa onde trabalhava. "Como está aí? Você não vai mesmo querer saber o sexo? A gente pode fazer um chá revelação!" Um sorriso brotou nos meus lábios. Meus colegas eram completamente doidos.

— Eu estou muito nervoso com tudo isso. E parece que estamos há horas aqui! Se você tivesse aceitado a oferta da minha mãe...

Meu sorriso morreu. Já tínhamos conversado sobre aquilo diversas vezes nas últimas semanas, depois de eu ter sido vetada no aniversário de noventa anos da avó dele. Uma grande cerimônia, caríssima, que reuniria todos os parentes. A mãe dele, Marilza, tinha dito que achava que eu não iria curtir muito a festa e insistira que, em outro momento, faria um almoço de aniversário também, que eu iria gostar mais. Ela havia dito tudo de forma muito sutil e Lucas tinha caído direitinho, alegando que seria uma solenidade chata mesmo e que só iria por obrigação. Mas eu sabia a verdade. Marilza não queria ter que me apresentar para todos os seus familiares importantes. Eu, a menina negra que havia engravidado de seu filho tão jovem e tão promissor. Depois disso, os pais de Lucas tinham oferecido a obstetra da família para cuidar de mim e do bebê, e eu havia prontamente recusado. Não queria ter que depender deles para nada.

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