Verdade

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Marta

 Não me lembrava de alguma vez ter chorado por um rapaz ou pelo menos não daquela maneira. Fiquei mesmo deprimida. A rejeição era algo que um dia me fora muito distante e a partir daquele dia ficou muito presente.

Na verdade, nunca encontrara um rapaz como o Lucas e por isso, doía tanto. Ele era diferente dos outros que conhecera. Atribuía uns sentimentos um valor incalculável. Era fiel mesmo depois da…morte. Mais uma vez, conviver com aquele sentimento de culpa tornava-se insuportável e nesse dia, nem eu sabia do pânico que se ia abater sobre mim. Um simples telefonema. Simples palavras. Uma simples data. E um encontro inevitável…

- Marta! – Chamou o Adriano pela quarta vez naquela manhã de Domingo.

- Agora não, Adriano! Deixa-me sozinha!

- Eu até deixava, mas os teus pais estão ao telefone. Já é a terceira vez que ligam. Fala com eles, por favor. Estão preocupados.

- Diz-lhes que liguem para o meu telemóvel… - Falei, afundando a cabeça na almofada.

- Então liga o teu telemóvel porque aposto que foi para aí que ligaram em primeiro lugar… - Ouvi o Lucas dizer.

- Vou dizer-lhes isso. – Falou o Adriano.

 Estiquei o braço e peguei no telemóvel que estava sobre a mesinha de cabeceira. Liguei-o. Aguardei a chamada, limpando a garganta para poder aclarar a minha voz.

- Filha, estás bem?

- Mãe…

- Sempre que te ligámos, nunca atendes! Não percebes como isso nos deixa preocupados?! O teu pai estava a pensar em…

- Em quê?! Desistir de fechar um negócio para vir ver como eu estava? Não me faças rir. Ele nunca fez isso e não o faria agora.

- Estás a ser injusta com o teu pai…

- Se é para discutir sobre o que eu penso sobre o meu pai, então estás a perder o teu tempo.

- Marta estás lembrada que tens que daqui a duas semanas, devemos ir...aquele lugar?

- Aquele lugar? – Perguntei sem perceber.

- Filha, nós até vamos por ti. O psicólogo diz que não tem a certeza se deves ou não ir a essa homenagem. Por falar nele, ele disse-me que nunca mais apareceste nas consultas!

- Não preciso dele para nada e…

 Nesse momento, lembrei-me de algo. Ergui-me rapidamente da cama e saí a correr do quarto. Entrei na cozinha. Procurei o calendário e observei a data que a minha mãe referira.

- Vai fazer um ano… - Murmurei, ainda segurando o telemóvel.

- Filha? Estás bem? Não precisas de ir. Nós é que mantivemos uns laços com os pais do rapaz e achamos que devíamos estar presentes. Eles iam gostar de te ver. Afinal, mesmo sem teres conseguido, tu tentaste ajudar. Eles estão gratos por isso.

 Desliguei a chamada. Desliguei o telemóvel.

 Pude ver-me na esquadra. Rodeada de policiais. Cercada por inúmeras perguntas. Apesar dos nervos, stress, confusão, culpa e todos outros sentimentos que podiam ter-me comprometido naquele dia, eu conseguira safar-me. Declarara-me inocente tantas vezes…

Os pais dele realmente, nunca me culparam mas o olhar da Carolina ainda me assombrava. Ela nada vira do acidente mas era como se soubesse da verdade. Vi ódio, amargura e um desejo de fazer-me mal. Um desejo que o tempo a fez esquecer visto que quando a vi, ela nem ao menos reconheceu o meu rosto.

És parte de mimWhere stories live. Discover now