Prológo

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Naquele tempo a devoção aos deuses era recompensada com prosperidade.

Tinha reinos que saudavam Cronos, o deus da agricultura e tinham sucesso nas suas colheitas. Outros, faziam oferendas para Ares, o deus da guerra ou Dionísio o deus do vinho. Mas Arcádia, se dedicava a Zeus..

O rei daquele lugar, construiu um templo no coração da cidade e era lá que ele oferecia presentes e sacrifícios aos deuses. Crianças eram queimadas vivas, mulheres pobres mutiladas e prisioneiros tinham seus órgãos arrancados, tudo a beira do altar.

Oráculos foram enviados para alertar o rei Licáon sobre a insatisfação de Zeus, com tamanha crueldade, mas o rei de Arcádia não dava ouvidos a nenhum dos avisos.

Então Zeus saiu do Olimpo, determinado a dar uma última chance ao rei e foi até Arcádia para visitar o templo que tinha sido construído para ele. Alguns habitantes, que permaneciam seguindo o caminho correto dos deuses, viram em seus sonhos que o grande senhor dos céus viria visitá-los e tentaram alertar ao rei Licáon, que mais uma vez ignorou cada um dos avisos. Até que Zeus chegou. — Disfarçado de camponês, ele pediu a hospitalidade do rei, que se lembrou dos alertas do seu povo e desconfiou do homem, que andava e falava como um nobre.

Os dias se passaram, festas foram oferecidas ao homem, visitas ao templo foram feitas e muitas virgens foram dadas de presente ao camponês, que em nenhum momento revelou sua verdadeira identidade.

O rei estava cada vez mais impaciente, já que a hora da partida do humilde camponês se aproximava, então como um último esforço mandou preparar um grande banquete. Os melhores cozinheiros foram contratados, os melhores temperos usados e muitos servos passaram horas polindo as melhores louças de prata e ouro, enquanto outros decoravam o salão de jantar.

Quando a noite do banquete chegou e os pratos começaram a ser servidos, a expressão do camponês se fechou, enquanto ele ficava a cada segundo mais bravo sem motivo algum.

Os próprios filhos do rei o serviram, até a chegada do prato principal, que a rainha serviu.

— Tem certeza de que esse é o seu presente? — O camponês perguntou e o rei riu.

— Sirva-se, nobre senhor!

— Está preparado para o que acontecerá, assim que eu pegar esses talheres de prata?

— Sirva-se, nobre senhor! — O rei disse pela segunda vez e balançando a cabeça entristecido, Zeus mostrou sua verdadeira forma, ali mesmo, na frente de todos.

— Mulher, sabe o que tem no prato que tu me destes?!— perguntou para a rainha, que tinha se ajoelhado como muitos outros dentro daquele salão.

— Carne do nosso melhor veado, grandioso Zeus — ela respondeu amedrontada.

— Licáon, o que tem no prato que tu ordenou que me fosse servido? — Zeus perguntou ao rei, que ria alegre pela visita do seu deus.

— Carne dos infiéis, grandioso Zeus! — ele levantou os braços, se aproximando do senhor dos céus. — Foram abatidas hoje pela manhã, todos os prisioneiros do palácio que seriam queimados no seu templo, foram usados neste glorioso banquete.

Zeus, que não tinha tocado em nenhum dos pratos que foram servidos, se enfureceu ainda mais com a confissão do rei, que tinha voltado a matar inocentes do jeito mais desonroso possível. E para castigar toda a degradação de Licáon e dos seus filhos, amaldiçoou o rei e os príncipes.

A lua cheia foi testemunha da cena, em que o rei e seus filhos se prostraram ao chão, gritando de terror quando suas peles caíram, dando lugar a pêlos grossos, e quando garras cresceram nas pontas dos seus dedos. Os outros, que também comeram do banquete de Licáon, foram transformados, mas era fácil diferenciar os culpados dos inocentes.

Os inocentes foram transformados em grandes lobos de quatro patas e pêlo macio, já os culpados se transformaram em bestas de pêlos ásperos que andavam em duas pernas e falavam com uma voz sibilante como de uma cobra. Os inocentes tiveram a oportunidade de continuar em Arcádia, convivendo com sua nova condição, enquanto que o rei Licáon e os seus filhos foram condenados a vagar pela escuridão, largados ao próprio destino e abandonados pelos deuses.

Séculos se passaram enquanto a maldição era passada de pai, para filho. Mas Licáon nunca esqueceu a humilhação e em algum lugar distante de todos, espera o dia em que poderá voltar para tomar o poder e o controle dos seus filhos e dos habitantes de Arcádia.

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