Capítulo 2

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Sempre que possível, Angela acompanhava Polly em suas apresentações. Desta vez, no entanto, ela e Polly decidiram que seria melhor ela ficar em casa, pois estava se sentindo indisposta e toda aquela agitação do Festival, mesmo nos bastidores, poderia não lhe fazer bem.

Angela estava sentada em sua poltrona na bela casa que sua filha havia lhe dado, assistindo ao Festival pela TV. Estava ansiosa, pois sabia que Polly subiria ao palco dentro de instantes. Angela estava na faixa dos quarenta e poucos anos, era uma mulher esguia, cabelos e olhos castanhos e muito elegante com sua estatura mediana. Alguns acreditavam que as marcas de expressão do seu rosto denunciavam a sua idade. Poderia até ser, mas também era um reflexo de marcas mais profundas, marcas na alma. Angela começou a lembrar do que tinha passado e de como havia sido difícil chegar até ali. Lembrou-se do ex-marido, Sidney, o pai de Polly. Ele era um homem simples e trabalhador. Possuía uma oficina de marcenaria no quintal que ficava atrás de sua casa, onde produzia móveis como poucos. Viviam no município de Nova Iguaçu, na Baixada Fluminense. Ele fechava muitos serviços com pessoas e empresas locais. Serviços estes que o ajudaram a construir a casa onde morava com Angela, Polly e Vitor, seu filho caçula. Eles viviam bem e felizes até o dia em que uma tragédia aconteceu.

Sidney estava trabalhando na oficina e Vitor lhe fazia companhia, onde sempre gostava de brincar, mesmo com a insistência do pai de que o local não era apropriado para isso. Ele tinha oito anos na época, três a menos do que Polly, e já se sentia capaz de ajudar na marcenaria de alguma forma. Nesse dia, Vitor perguntou ao pai em que ele poderia ajudá-lo. Sidney, para não desencorajá-lo, pediu que ele subisse na escada móvel de madeira e pegasse um ferramenta que estava no mesanino a uns três metros do chão. Mas, antes mesmo de chegar ao topo, um dos degraus se partiu e Vitor caiu da escada, batendo a cabeça no chão e gerando um traumatismo craniano. Ele ainda ficou um mês em coma no hospital, mas não resistiu e veio a falecer.

Desde então, Sidney sentia-se culpado e entregou-se de vez à bebida. Antes do acidente, ele já bebia, mas só ficava embriagado quando passava por uma grande dificuldade. Após a morte de Vitor, porém, Sidney passou a beber e a se embriagar praticamente todos os dias. Não conseguia mais fazer os trabalhos com a qualidade de antes e muitos clientes o deixaram. Consequentemente, as dificuldades financeiras começaram a aparecer e não demorou muito para que as brigas surgissem e se acentuassem. Polly também culpava o pai pela morte do irmão, mas Angela tentava amenizar o fato dizendo para ela que tudo não passara de um acidente, mesmo assim, as brigas entre a menina e o pai eram frequentes. Em uma dessas discussões, ele disse que a filha nunca seria nada na vida. O máximo que conseguiria era ser uma prostituta e depois disso deu-lhe um tapa no rosto. Imediatamente, ela correu para o quarto e começou a chorar, mas naquele dia prometeu para si mesma que venceria na vida e provaria para o pai que era capaz.

Angela era cristã e sempre fiel aos cultos de sua igreja, fazendo questão de levar Polly consigo. Aos cinco anos, a menina já recebia oportunidade para cantar e todos percebiam seu talento. Após o acidente com Vitor, Angela precisou interceder ainda mais por sua família diante de Deus. A situação piorou quando Sidney decidiu abandonar a família. Ele não aguentou mais conviver naquele ambiente, e principalmente com as frequentes acusações da filha. Em uma tarde fatídica, simplesmente juntou suas coisas e se foi. Desde aquele dia, Angela e Polly nunca mais o viram.

Após a perda do filho e o abandono do marido, Angela prometeu que nunca abandonaria sua filha. Ela procurou buscar ainda mais clientes que precisavam dos seus serviços. Teria que trabalhar dobrado para sustentar a casa e dar um futuro melhor para a menina. Polly, por sua vez, guardou um ressentimento pelo pai, que a corroía por dentro todos os dias. Desde seus onze anos, culpava-o pela morte do irmão e, quando chegou aos quatorze, passou a culpá-lo também por abandonar a mãe e a ela mesma. Seu pai nunca a veria completar os tão sonhados quinze anos, uma data tão especial para todas as meninas. Ela chorou muito, não entendia como o pai pôde prometer ser fiel à sua mãe até o fim e agora a abandonar. E, embora Angela tenha permanecido fiel a Deus, Polly não tinha a mesma estrutura e terminou por abandonar a igreja.

Ali em sua casa, diante da TV, Angela se lembrara de tudo isso e as lágrimas começaram a rolar pelo seu rosto sofrido. Ela ainda amava Sidney e por isso nunca se envolveu com ninguém depois que ele partiu, não conseguia, ainda tinha esperança de que um dia seu amado voltaria e eles formariam uma família feliz novamente. Também se lembrou da promessa que tinha feito à filha, de nunca abandoná-la, no entanto, uma outra promessa, a que Polly não tinha cumprido, era que pesava mais no coração de Angela. Ainda mais agora, que sua filha tinha alcançado o tão almejado sucesso.


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