Capítulo 3

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Verão de 1992

Ali naquele momento, com a parte inferior da perna grudada naquela areia seca gelada, a tarefa mais importante era montar aquele castelo de areia. O que na mente dela era um castelo com quatro laterais bem definidas, com postos de guarda acima de cada uma delas e um jardim dividindo os muros do castelo da corte principal. Na corte existiam três picos altos, que de cima conseguiria ver todas as praias que quisesse.

A realidade era bem diferente. Estava difícil fazer aquele molde de copinho de plástico de água se transformar em uma das suas lindas laterais do castelo, ou o molde do balde maior se transformar na moradia de sua princesa. Os muros então nem se fale, toda vez que conseguia subir gota por gota de areia molhada até cinco centímetros, era só ela colocar a mãozinha redonda que caia tudo. Foi quando seu pescoço começou a doer na nuca, a dor como se uma mão invisível estivesse pressionando tudo envolta de seu pescoço fez com que ela levantasse sua cabeçinha. Seus cabelos iam até o ombro, castanhos escuros e armados, hoje estava uma mistura de areia, cabelo, mar e sol. Estava tão duro que nem ela queria mais mexer neles, mas colocou uma mexa de seu cabelo atrás da orelha. Seu rosto redondo aparentava o de uma menininha de cinco anos, as bochechas rosadas do calor, mas a pele mais branca que o leite se encontrava embaixo do guarda sol.

Da onde estava não conseguia ver seus pais, atrás dela, conversavam com um casal sentado em suas cadeiras de praia. Mas conseguia ver o mar, o que para ela era o mais importante. Aquela piscina gigante era o seu maior brinquedo, especialmente quando seu pai ia com ela fazer jacaré, uma espécie de brincadeira em que se é levado pelas ondas da praia até a areia. Seus olhos grandes de cor caramelizada se entretiveram com um menininho montando um lindo castelo de areia. Continuou sentada, mas seus olhos estreitaram e ficaram encarando como o menino fazia aquilo. Tentando imitar, mas sem sucesso algum, simplesmente sentou suas mãozinhas na pequenina perna e ficou encarando, enquanto o menino fazia o castelo. Quando, o que para ela foram horas, o menino acabou de fazer aquele castelo, que não era como imaginava, mas sua princesa iria ter que se contentar com aquilo, o menino sumiu. Era a sua chance de reivindicar aquele castelo para ela. Quando se levantou, tirou aquela incomoda areia do seu bumbum e das suas pernas, sua mãe perguntou aonde iria. Ela se virou e encarou a mãe. Quando disse que ia pegar o castelo para ela, a mãe se contentou em sorrir, aquele sorriso que sempre vinha com uma negação.

Por que ela não poderia ir pegar aquele castelo para ela? Virando a cabeça para olhar o lindo castelo, viu que o menino tinha voltado com um colega. Ela ficou parada em pé olhando os dois, sua mãe escutava a conversa do casal, mas sabia que ela estava com o rosto virado para a filha. O dono do castelo tinha cabelos negros e era magricelo conversava com o outro menino mais alto que ele, cabelos loiros, e também magrelo, pareciam irmãos. Ela não entendia o que conversavam, ou por que estavam deixando aquele castelo de lado. Quando o menino mais alto saiu correndo. Quando voltou estava com ele uma bolsa de plástico transparente, dentro havia soldadinhos iguais ao do seu primo mais velho. Cada menino pegou alguns soldadinhos, e quando ela não estava entendendo, eles começaram a destruir o castelo. O castelo de sua princesa. Com uma sensação de quando seu pai recusou comprar mais um cachorrinho para ela, ela saiu correndo em direção àqueles meninos.

Dirigindo ao de cabelos negros, a menininha disse:

- Por que você fez isso?

Os dois meninos estavam rindo enquanto acabavam de chutar o restante do que sobrou daquele castelo, quando escutaram a voz daquela menininha baixinha, o de cabelos negros olhou para o outro menino, franziu os olhos, mostrou a língua, e se voltou para a menininha:

- Você é gorda!

Uma sensação de agulhas dentro dela subiu até seu peito. Com lágrimas nos olhos, estava prestes a chorar. Não sabia dizer nada para aquele menino, mas ele falou a mesma frase que seus amigos na escola falavam quando brigavam com ela. Sua mãe chegou logo após o menino ter franzido os olhos para ela. E ai ela chorou. A mãe do menino percebendo que tinha uma mulher e uma criança com seu filho, também foi até lá. Ela contou que aquele menino a chamou de gorda, e o menino mostrou a língua para ela. Não importava o que estavam conversando as duas mulheres, ela perdera o castelo de sua princesa e um menino a chamou de gorda.

Ela saiu e foi até o colo de seu pai. Sua mãe voltou, e os dois a consolaram falando que iam comprar um castelo perfeito para sua princesa. Quando aquela sensação de que aquela piscina gigante estava dentro dela, os dois meninos chegaram até seu guarda sol. Com o rosto cheio de areia por que esfregou suas mãozinhas enquanto chorava. Seu nariz vermelho e sua boca pequena com o lábio inferior descido, ela olhou para eles. O menino de cabelo loiro falou que eles iam construir um castelo para ela, se ela parasse de chorar.

Ele sabia que ela iria parar, usava esse mesmo truque com sua irmãzinha quando ele não a deixava brincar junto com seus amigos. A sua mãe falou para ela se acalmar, enquanto ela colocava um chapéu claro de abas largas na cabeça da filha, disse que aqueles dois amiguinhos iam fazer o castelo da sua princesa. Ela saiu do colo de seu pai e eles foram para a parte em que a areia estava mais quente. Em silêncio eles começaram a fazer o castelo. Ela sentou na areia observando. O sol estava mais quente, e os dois meninos estavam soltando peles. O menino de cabelos escuros só conversava com o loiro, sem olhar para ela. O menino de cabelos loiros então se virou para ela e disse:

- Meu nome é Vitor, e esse é meu amigo Daniel, como você se chama?

- Bígida.

Antes Que o Verão AcabeWhere stories live. Discover now