Capítulo 8 - Miguel

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Quando deixo Clara em casa, sinto todos os meus músculos que antes estavam tensionados, relaxarem. Não sei por que estou tão tenso, mas só o fato de estar tão próximo dela, com as pernas em volta de mim, os braços em meu abdome, o cheiro do seu perfume, tudo me dá um certo desespero, como se fosse errado. Talvez seja pela visão no banheiro, não sei, mas a partir de agora vou ter que me acostumar com sua presença.

Odeio-me por ter aceitado esse acordo de Enrico, mas sendo bem racional, ele tem razão. É uma oportunidade única, e fiz tudo o que podia para convencer Clara, apesar de nossa proximidade não ser sempre agradável, pois trocamos farpas o tempo todo. Só consegui convencê-la depois de aceitar sua proposta de manter a confusão que ela mesma inventou no hospital, mesmo ela não me explicando o motivo de toda essa baboseira. Ela é uma mulher bem-sucedida, com uma carreira independente, por que precisa de mim para isso?

No entanto, como não estou em uma posição de poder questionar muito, acabei aceitando e deixando para ver como será. Enquanto subo de elevador para meu apartamento, mando uma mensagem para Enrico, contando que a maluquice dele deu certo.

Abro a porta de casa e levo um susto com minha irmã, Maria Isabel, sentada no sofá de entrada.

— Mabel?

Ela dá um sorriso amarelo.

— Irmãozinho... — Ela fica de pé e me abraça apertado.

— Está tudo bem? Ninguém me avisou que você viria... — comento, tirando os sapatos e seguindo com ela para dentro do apartamento.

Mabel é minha irmã mais velha, e mora em Teresópolis, região serrana do Rio. Por isso, quando ela chega sozinha no meu apartamento sem avisar, a impressão que tenho é que algo aconteceu.

— Mais ou menos, vim pra uma consulta e quis passar aqui para conversar com você...

— Claro.

— Mas antes de qualquer coisa, quem é aquela tenista, hein? Não aceito nenhuma namorada que você não tenha me apresentado antes para passar pelo crivo exigente da irmã mais velha — ela fala, com um ar de brincadeira e se senta no sofá da sala junto comigo.

— Ah, viu aquilo? Você não faz ideia de como já me estressei. Mas não é nada, foi só uma confusão. A maluca me deu uma bolada na cabeça.

— Sério? — Mabel dá uma gargalhada espontânea.

— Juro. É doida de pedra. Depois te conto melhor o que aconteceu, agora quero saber de você, que normalmente não aparece sem avisar e ainda mais sozinha, sem aquela pestinha... — brinco, falando de minha sobrinha.

— É... foi uma surpresa para mim também.

Ela dá um suspiro profundo e a encaro. Seus cabelos castanhos estão presos em um rabo de cavalo, ela está sem maquiagem alguma, como normalmente sai mesmo, mas dessa vez as olheiras estão aparentes. A última vez que a vi com essa expressão foi quando estava exausta.

— Estou fazendo algumas consultas há uns meses e hoje peguei o resultado de uma biópsia...

— Biópsia? — Arregalo os olhos e algo parece me sufocar. — Quando você fez uma biópsia?

Ouvir essa palavra me traz uma enxurrada de memórias. Idas e vindas do hospital, tratamentos invasivos e dolorosos...

— Um mês atrás, não quis falar com ninguém.

— Nem comigo? — Fico de pé, passando as mãos agitadas nos cabelos, sem entender. — Por quê?

— Não queria te preocupar, eu sei que você odeia hospitais e não queria criar alarde sem ter certeza de que...

Jogo de sorte: um romance por contratoWhere stories live. Discover now