Um Passo

Bởi GrettaKim_

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[VENCEDORA DO WATTYS 2022 🏅] PRÉ-VENDA LIBERADA! VERSÃO ORIGINAL Desde a perda daquele a quem mais amei, min... Xem Thêm

Capítulo I - Um Acordo
Capítulo II- Um Convite
Capítulo III- Um Pequeno Acidente
Capítulo IV - Uma Nova Rotina
Capítulo V - Um Deus
Capítulo VII- Um Beijo
Capítulo VIII- Um Aconchego
Capítulo IX- Um Artista
Capítulo X - Um Recomeço
Capítulo XI- Um Pedido - Parte I
Capítulo XII- Um Pedido- Parte II
Capítulo XIII - Uma Festa
Capítulo Final- Um Fim
Epílogo- Dois Passos
Capítulo Extra - Uma Aventura
EXTRA II - Um Baile
LIVRO FÍSICO

Capítulo VI - Um Favor

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Bởi GrettaKim_


— Porra, Na-moo! Você entrou na frente bem na melhor parte!

Hansan estava em choque, Satoru e Luo se aproximavam a passos apressados e Na-moo estava parado, sem reação. Benjamin tomou a iniciativa para prestar o socorro, enquanto Kwan, mais ao longe, reclamava por ter seu vídeo arruinado.

A reação inesperada do fisioterapeuta foi premeditada pelo vizinho, que assim que viu a primeira queda do rapaz, e seu rosto pálido olhando fixamente para Na-moo, imaginou o que vinha a seguir e pegou rapidamente o celular para gravar a cena.

— Esse ia fazer sucesso na internet!

— Dá para algum de vocês me ajudar aqui?! — Benjamin tentava levantar Dae-ho, que ainda estava desacordado. — Você não, Hansan!

— Calma aí, campeão...

A mente do artista, em desacordo com seu corpo, esqueceu de lembrá-lo de sua momentânea incapacidade na urgente necessidade de prestar socorro. O que lhe fez tombar para frente quando sua muleta se enroscou nas pernas de Dae-ho, que estava estirado no chão, fazendo Na-moo segurá-lo pela cintura e puxá-lo para trás, arrumando novamente a sua postura.

Nesse momento, Hansan se deu conta de que ali, nada podia fazer, a não ser sair do caminho de quem realmente podia ajudar.

Sentir as mãos do primo lhe auxiliando em um momento em que não era ele quem realmente precisava de auxílio, fez a raiva explodir em seu peito enquanto se afastava e se desvencilhava bruscamente dos braços de Na-moo.

— Olha o que você fez! — bradou com ele.

— Eu?

O palestrante já estava acostumado com a rispidez do primo, eles sempre tiveram suas desavenças, porém, depois do acidente as coisas pioraram consideravelmente.

— Você!

— Posso saber por qual mazela do mundo estou sendo acusado de ser autor agora? — Retirou os óculos escuros que já estavam despencando de sua cabeça e o guardou no bolso da camisa aberta.

— Você quebrou o garoto, olha lá! — Apontou para o caminho que Satoru e Benjamin faziam, carregando Dae-ho para dentro da casa — É o Deus da destruição mesmo!

Na-moo achou graça do mais novo apelido, abrindo um sorriso largo de covinhas que só o deixava ainda mais relaxado diante da postura afrontosa do primo. Hansan odiava como achava lindo aquele sorriso, a ponto de querer reproduzi-lo em alguma de suas artes, porém nunca cederia a um desejo desse tipo. Seu orgulho não permitiria.

— Sei que sou meio desastrado, Bae, mas...

— Mas foi a minha perna que você arrancou! — As veias de seu pescoço já estavam ressaltadas, as pupilas dilatadas e as carnes do corpo trêmulas.

— Ei, ei, ei! Vamos com calma, Hansan! — Luo se aproximou com Kwan ao lado, tentando acalmar os ânimos do amigo. — Não vamos começar essa discussão outra vez! Você sabe que, ou era você, ou a droga da perna. E o Na-moo só estava fazendo a porra do trabalho dele, que era te manter vivo!

Luo odiava como Hansan algumas vezes parecia ingrato diante de tudo que aconteceu. Afinal, apesar das perdas, ele estava ali, vivo, podendo usufruir de muito mais do que a maioria. Sabia que todo aquele processo foi, e continuava sendo, difícil para ele. Foi o primeiro a estar com Hansan no hospital, estava ao seu lado quando acordou e se deu conta de que a decisão tomada no carro, quando ainda estava preso às ferragens, foi real e que havia perdido um membro.

Luo o segurou firme em seus braços, acolhendo seu choro e garantindo que ele não passaria por aquilo sozinho e, apesar dos meses difíceis, em que o artista sequer lutava para obter uma pequena melhora, ele não ficou só, pois mesmo que não tivesse total ciência, os amigos sempre estavam lá no hospital, buscando informações sobre seu estado de saúde e de meios de fazê-lo, ao menos, tentar dedicar-se um pouco para sair daquele leito.

— Eu vou ver como o garoto está. — Na-moo suspirou derrotado. Em todos os seus encontros com o outro Lee, em algum momento, aquele assunto sempre vinha à tona. E dessa vez havia sido bem mais rápido do que esperava, não tinham nem almoçado ainda.

Na casa, assim que chegaram à sala, Satoru e Benjamin colocaram Dae-ho deitado no sofá.

— Deixa de graça e abre o olho, Dae-ho — Benjamin falou, ficando de pé e olhando-o por cima.

O fisioterapeuta, franziu o cenho e abriu só o olho direito.

— Ele estava fingindo? — Satoru estava incrédulo.

— Ele teve uma queda brusca de pressão e apagou, mas nada que durasse tanto — explicou, tentando segurar o riso.

Sabia que o aluno era fã do palestrante, mas não àquele ponto.

— Tudo isso desencadeado pela visão do meu ex-marido.

— Também, o Na-moo tá um puta gostoso, parecendo uma geladeira duplex de tão grande — enxugou o suor imaginário na testa, abanando-se em seguida —, até eu passo mal, nossa.

Benjamin rolou os olhos para o exagero do amigo, sabia que o ex-marido estava malhando, mas jurava que ele só estava tão dedicado à academia para lhe tirar dos eixos e fazê-lo ceder.

— Ele assinou o divórcio?

— Nem ouse, Aikyo Satoru!

— Mas eu nem disse nada! É somente a nível de informação, se quer saber.

— Esse tipo de informação serve para você e seu marido proporem experiências corpóreas envolvendo nudez e troca de fluidos, então, não se atreva!

— Eu não entendo, por que se separaram se ainda agem como se fossem casados?

— Não é da sua conta.

— Tudo bem, mas, a nível de informação, podemos estender a proposta para você também. Sabe como é, na cama onde cabem dois, cabem três... quatro pode até ficar mais gostoso. O Luo sempre quis experimentar, mas nunca encontramos pessoas que confiássemos para algo do tipo.

Benjamin já ria da cara de pau do mais novo. Dos anos que conhecia Luo, jurava que seria difícil para ele encontrar alguém que compartilhasse dos mesmos gostos não convencionais que possuía, todavia, quando foi apresentado a Satoru, entendeu que na vida há gosto para tudo e sempre haverá alguém que os compartilhe consigo.

— Já te vi tantas vezes pelado, garoto, que não tem nem mais graça.

— Mas ainda não viu o que esse corpinho nu é capaz de fazer...

Dae-ho acompanhava a conversa tentando se situar, não podia acreditar que seu professor favorito era ex-marido do Deus da ortopedia. "Ex-marido... Ex-marido..." sua cabeça repetia e não se conformava. Como alguém se separa de Lee Na-moo?!

Ainda mantinha só um olho aberto. Sentia o corpo um pouco fraco e frio, resquícios da queda brusca de pressão.

— Alôôô! Desmaiado aqui! — chamou a atenção dos dois, que olharam para baixo recordando-se do estudante que passara mal.

— Pronto, você já está melhor. — Benjamin diagnosticou.

— Não! Vocês precisam me ajudar! — Levantou parte do corpo e agarrou o tecido da bermuda do médico, impedindo que ele saísse. — Vocês precisam me tirar daqui! — Seus olhos estavam enormes, como os de um coelho assustado. — Essa foi a maior vergonha que já passei na minha vida! Eu preciso sair do país! É isso! Satoru, me ajuda a fazer minhas malas!

Não tiveram nem tempo de zombar do desespero do futuro fisioterapeuta, pois quando ouviram o barulho da porta de acesso à área da piscina ser aberta, ele se jogou de volta no sofá, com os olhos cerrados e braços largados, fingindo um novo desmaio.

— Ele continua desacordado?

Dae-ho sentiu o corpo arrepiar-se quando ouviu aquela voz; já tinha assistido todos os vídeos de suas palestras, e até sabia de cor alguns trechos da sua biografia publicada, mas ali, com sua audição capturando ao vivo o som da sabedoria, era como se anjos cantassem em seus ouvidos.

Apesar dos olhos fechados firmemente, podia sentir uma presença onipotente no ambiente, que fazia seus nervos agitarem-se; era quase divino.

Continuou largado no sofá, tentando regular a respiração para que ela não o entregasse, apesar de ter quase certeza de que a percussão que estava sendo criada pelas batidas do seu coração poderia ser ouvida lá de fora por qualquer um que estivesse até submerso na água da piscina.

— Ele só precisa descansar — ouviu a voz do seu professor já um pouco distante, logo depois o barulho da porta de correr ser aberta novamente e a voz dele soar um pouco mais alta — Francês! Seu marido está me fazendo propostas indecentes!

Excellent! Você aceitou?

A resposta do outro foi abafada, a porta estava fechada novamente.

Silêncio.

As únicas coisas que ouvia eram seu frenético coração e sua mente em profusão, bolando uma possível rota de fuga.

— Quando se sentir melhor, estarei aqui para finalmente conversarmos. Estou muito curioso para conhecer a pessoa que fez meu primo quebrar seu voto de silêncio de quase um ano.

Dae-ho não tinha escapatória, teria que enfrentar sua vergonha. Abriu os olhos, deparando-se com o sorriso mais lindo que já vira.

"Meu pai... eu vou desmaiar de novo..."

— Meu deus! Todos os Lees dessa família tem sorriso bonito?

Nem sentiu os lábios mexendo, deixando escapar as palavras que deveriam ter permanecido só no seu pensamento.

— O quê?

— Que o quê?

Na-moo sacudiu a cabeça ainda com um sorriso brincando nos lábios, o garoto era mesmo uma figura.

— Está melhor?

Dae-ho suspirou derrotado e sentou-se corretamente no sofá, cruzando os braços rente ao peito, tentando cobrir parte da sua nudez.

— Estou, só foi uma queda de pressão — fazia um enorme esforço para falar naturalmente e para que sua pequena mentira colasse, e não falasse tanta besteira na presença do outro, o que era muito difícil considerando seu histórico. — Acho que não foi uma boa ideia pular o café-da-manhã. Sabe como é, adoro churrasco, queria deixar mais espaço para a carne.

Pela reação de Na-moo, percebeu que havia falado a primeira bobagem da conversa,mas ele parecia estar se divertindo, então não se reprimiu tanto.

— Sei sim — segurava o riso —, mas é uma pena, achei que eu tinha sido a causa, seria uma boa história para quebrar o gelo no início das minhas palestras.

— Oh!

Na-moo começava a entender o motivo do primo abrir mão do orgulho e ter lhe telefonado. O estudante de fisioterapia estava extremamente fofo com aqueles olhos estrelados bem abertos e a boca em um perfeito "o". Seria bem difícil encontrar alguém que não quisesse lhe dar um mundo de opções por conta de sua fofura.

— Se não se importar, posso contar a história desse jeito? — Sentou-se na poltrona em frente a Dae-ho. — Tenho certeza que vai fazer o maior sucesso.

— Sim, claro! O que vossa m-, o que o senhor quiser!

Por pouco não mordeu a língua.

Na-moo novamente sorriu, achando graça de sua afobação.

— Então você foi o motivo do Hansan me ligar.

— Se isso for algo ruim, quero deixar claro que eu não sabia de nada! — apressou-se em se defender.

— Não é...

O sorriso se desfez aos poucos.

— Foi bom falar civilizadamente com o Bae por cinco minutos, depois de tanto tempo.

Ficaram em silêncio. Dae-ho sabia que era algo pessoal, mas precisava saber.

— O que aconteceu entre vocês dois?

Suas mãos tremiam, ainda estava nervoso, sempre admirou o trabalho do homem sentado à sua frente. Por anos fantasiou como seria finalmente participar de uma de suas palestras e, quem sabe, conseguir um autógrafo, e agora estava ali, tendo uma aparente conversa informal com ele no sofá de casa.

— Na noite do acidente, eu estava de plantão na ala de traumas. Não tinham informações da pessoa presa nas ferragens, então fui levado ao local e me disseram que o estado era grave, a vítima estava oscilando entre estágios de consciência...

"— Acidente de trânsito com trauma na via para Songdo! Homem, cerca de quarenta anos, semi consciente. Ele está preso nas ferragens, precisam de um médico no local!

— Eu vou!"

— Minha relação com o Hansan não era ruim, mas também não era boa, entende? — Seu desconforto ao contar aquele fato era visível. — Sempre fomos muito diferentes, o Bae sempre foi uma alma livre.

Sorriu nostálgico.

— Era uma criança agitada, sempre aprontando, se atrasando para a escola, enquanto eu era mais focado. Sou só um ano mais velho e isso contribuiu para que a família começasse com as comparações. Sempre ouvia minha tia falar: olha para o seu primo, já vai fazer faculdade, enquanto você fica aí, brincando com tinta! Sei que foi difícil para ele crescer ouvindo isso, porque foi difícil para mim também, porque eu via a alegria do Bae em fazer o que ele gostava e me questionava se eu era o errado da história.

— Espera... Então o senhor não queria cursar medicina? — Seus olhos piscaram rápido. Sua audição o confundia às vezes, jurava que não havia compreendido corretamente.

— Não — tentou esboçar um sorriso, recordando-se da pilha de expectativas que foram postas sobre seus ombros quando estava decidindo qual carreira seguir. — Sempre quis ser professor, tanto que hoje me dedico mais a ensinar do que a atuar como médico, mas, segundo minha família, lecionar seria um uso limitado da minha massa encefálica.

— A minha vida foi uma mentira... — Estava levemente atordoado.

— Você é realmente um fã, garoto? — questionou, realmente surpreso e lisonjeado. — Isso é meio incomum... não me diga que é daqueles que coleciona as revistas para as quais dei entrevista.

— Não! — sua mente o repreendeu pela mentira. — Quer dizer, posso ter uma ou duas, só... — confessou, passando a mão pelo pescoço, envergonhado.

— Hansan deixou escapar na ligação que eram doze, mais a edição limitada que contém meu discurso para o Conselho Mundial de Medicina, ano passado.

— Velho linguarudo! — praguejou baixo, mas não o suficiente para não ser ouvido, causando uma gargalhada alta em Na-moo.

— Você deve fazer um estrago no ego do meu primo chamando ele de velho.

— Eu estou tentando parar — revelou sorrindo sem graça, como se aquilo fosse equivalente a se livrar de um grande vício.

— Se te serve de conforto, foram as revistas que me convenceram... nem o Benjie tem todas! Sinto-me lisonjeado por apreciar o meu trabalho.

— Falando nisso...

Precisava saber como uma pessoa, em sã consciência, poderia ter se divorciado dele. Ainda não podia acreditar, tinha que perguntar.

— Não vamos falar sobre isso.

Ou não.

— Ok... — voltou ao assunto anterior. — Então, basicamente, o Hansan não vai com sua cara porque o primo que todo mundo elogiava não era ele, era o senhor. Mas o senhor disse que o atendeu no dia do acidente e, pelo que eu sei, o senhor salvou a vida dele...

— Na-moo! Por favor, só Na-moo! — Estava ficando zonzo de tanto ouvir falar a palavra senhor. — Até meu ego tá começando a ficar machucado.

— Certo! — Assentiu rapidamente, colocando sutilmente a mão no peito, na tentativa falha de acalmar seu pobre coração. — Na-moo — falou pausadamente, saboreando as palavras, contendo o repuxar insistente de seus lábios.

Queria deixar o sorriso largo escapar, mas temia parecer uma cópia barata do Coringa.

— Não entendo, você salvou a vida dele. Ele está sendo muito ingrato te tratando dessa maneira. — Sua testa estava franzida e as sobrancelhas unidas. — Vou conversar sério com o senhor Lee!

Por um instante Na-moo ficou curioso a respeito da relação deles, o pedido quase insistente de Hansan no celular, a ponto de agradecê-lo mais de uma vez no final da chamada, foi surpreendente. A forma como as expressões de Dae-ho mudavam quando o primo era citado, e os constantes comentários de Benjie a respeito do avanço do tratamento dele, começaram a lhe intrigar.

— Dae-ho, você é gay?

— Oi? — Outra vez seus olhos piscaram rápido. — Não! Quer dizer, não sei, nunca provei — tentou explicar.

— Nunca provou? — captou a confusão em seu olhar.

Tinha algo mais escondido nas entrelinhas daquela resposta.

— Não, tipo, é igual a sorvete de chocolate com menta; nunca provei, mas já tive vontade uma vez... — recordou-se dos acontecimentos das últimas quarenta e oito horas e dos recentes questionamentos que vinha fazendo.

Não era mais nenhum garoto, era um adulto e entendia tudo que estava acontecendo, sem contar o fato de sempre ter sido uma pessoa bem curiosa e determinada. Não era do tipo que ficava postergando seus desejos, mas com a chegada das responsabilidades de uma vida adulta, aprendeu a conter-se e não deixar que sua curiosidade lhe levasse a agir de maneira impulsiva e imprudente. E era exatamente isso que lhe fazia recuar.

Aquela havia sido a primeira vez que algo lhe despertou o real desejo de beijar outro homem, todavia, o que estava disponível para sanar seu desejo e por fim a curiosidade de saber se era algo que realmente gostava, ou se havia sido só calor do momento, revelou gostar de si, e algo que nunca faria seria beijá-lo como se seus sentimentos fossem um experimento social.

E se no fim não gostasse? Se confirmasse que o fato de sempre se relacionar com mulheres não era fruto só do seu comodismo, mas resultado do que sempre foi?

Não poderia fazer isso com Hansan, não se sentiria bem se algum dia fizesse algo do tipo, principalmente com ele.

— Dae-ho, vai por mim, sorvete de chocolate com menta é horrível.

— Eu gosto do chocolate e a menta...

Na mesma hora pensou nos lábios de Hansan se abrindo lentamente, naquele movimento que era fruto de sua mania de raspar a língua pelos lábios enquanto conversa.

— Parece ser bem atrativa...

— Ainda estamos falando de sorvete? — questionou ao perceber que o estudante já estava em outra dimensão.

— Ah, sim, claro, sorvete... — Arrumou a postura, colocando o cabelo atrás da orelha. — Como eu disse, posso gostar de chocolate com menta, só preciso provar para ter certeza.

— Certo...

Entendeu em que ponto estava a relação deles e claramente Hansan se encontrava muitos passos a frente.

— Então, acho melhor provar e ter certeza, antes de chamar o Bae para um passeio na sorveteria.

Sua espinha gelou. Estava sendo sutilmente ameaçado pelo Deus da ortopedia?

Cogitou ser possível ele deduzir que algo estava acontecendo, ou poderia acontecer, dado que Hansan é assumidamente homossexual e, aparentemente, ele estava sendo a motivação para a quebra de uma barreira familiar consolidada há alguns anos. Era só juntar A mais B e encontrar um resultado óbvio, havia um relacionamento estabelecido, no caso uma amizade, porém aparentemente para os de fora, poderia ser facilmente outro tipo de relação.

E mais uma vez constatar que aquilo lhe soava indiferente foi um indicativo de que, se o fato de ter conhecimento que outro homem estava apaixonado por si, e que da mesma forma, saber que os outros podiam vê-los facilmente como um casal não lhe causava nenhum tipo de repulsa, a única coisa que lhe restava era saber se o "sorvete" era tão bom como aparentou ser quando degustado por Hansan e Kwan noites atrás, ou se aquele sabor seguia sendo só mais um que, apesar de não ser ruim, não se tornaria seu preferido.

Até lá, tinha uma certeza, teria que descobrir essa nova preferência com alguém que não fosse o Lee.

— Não, senhor! Quer dizer, Na-moo... — corrigiu-se rapidamente.

Apesar de ter um porte físico atlético, o palestrante chegava a ser quase duas vezes maior que Dae-ho, não seria nada prudente pagar para ver.

— Sem passeios na sorveteria.

— É perceptível que o fato de eu estar aqui é porque o Hansan tem um carinho especial por você. E, depois de tudo que aconteceu com o Sora, o acidente em seguida... Eu não quero vê-lo quebrado novamente.

— O senhor Lee nunca me contou com detalhes tudo o que aconteceu. Na verdade, eu acabei de me dar conta de que não conheço a pessoa com quem divido o teto há meses.

— Você não é o único.

Saber que Dae-ho e Hansan estavam morando juntos lhe intrigou, mas sabia que não valeria a pena pôr o assunto em em pauta, então prosseguiu.

— Mas posso te contar a parte da história que me cabe. Sobre o Sora, acredito que só o Hansan poderá te contar quando ele achar que mereça saber. Entretanto, antes preciso ver sua pesquisa, afinal, foi para isso que vim. Ou não está precisando mais de um orientador?

— Estou! Claro que estou!

Se pôs de pé de imediato. Tão rápido, que as vistas escureceram por frações de segundos, antes de começar a caminhar apressado em direção ao quarto. Porém, acabou mudando a rota e entrando uma porta antes, no quarto que pertencia ao artista, e saindo logo depois, segurando algo e indo para o próprio quarto, retornando em seguida com uma pasta em mãos.

— Aqui — Estendeu a pasta, percorrendo os olhos pela sala. — Essa é uma cópia de toda a minha tese. Aí dentro tem um pendrive com as fontes de pesquisa e imagens que ainda irei anexar.

— Ótimo! Pelo visto, você é bem organizado — falava já abrindo a pasta e folheando alguns arquivos. — Interessante. Deveria ter imaginado qual seria o foco da sua pesquisa, é bem-

Na-moo interrompeu a própria fala assim que percebeu não ter mais a atenção do rapaz, que se encontrava de costas para si, procurando algo debaixo do sofá.

— Pode me dar licença por um instante, preciso fazer algo muito importante.

Antes mesmo de obter uma confirmação, Dae-ho saiu a passos duros em direção à cozinha. Alguns poucos segundos depois de ouvi-lo aparentemente vasculhar as gavetas do cômodo, seu novo orientador ouviu-o comemorar.

— Achei!

Na-moo ficou parado, com as páginas da encadernação aberta, assistindo Dae-ho sair da cozinha segurando uma prótese, andar praguejando a cada passo até a sala, capturar os itens que deixou em cima do sofá e sair em direção à área da piscina sem nem lhe olhar.

Sacudiu a cabeça, sorrindo ladino. Claro que a coisa tão importante que precisava fazer teria relação com o Hansan. O que mais lhe faria agir assim?

Acabou por ouvir a conversa, já que ele não deu muitos passos além da porta e a manteve aberta.

— Cadê o Hansan?

— Foi com o Kwan na casa dele, disseram que já voltam.

Ouviu Satoru responder.

— Me faz um favor?

Pensou em chamá-lo e alertá-lo, mas já era tarde demais.

— Depende, vou ganhar o quê lhe fazendo um favor?

— Fico te devendo uma.

— Ok, manda!

— Vai lá nos Song, entrega isso ao senhor Lee e diz que é bom que ele volte pra cá usando, ou eu vou dobrar os exercícios dele! E diz também que, se ele quiser continuar com essa palhaçada, é para pensar em um esconderijo melhor.

— Se ele der na minha cara com isso, o peso do favor dobra — alertou, já se afastando e fazendo o que foi pedido.

O ortopedista disfarçou para não ser pego ouvindo a conversa alheia e voltou seus olhos para as folhas outra vez, erguendo novamente o olhar quando percebeu Dae-ho sentar-se outra vez à sua frente, agora com o rosto sério e braços cruzados.

— Não te alertaram para nunca ficar devendo um favor ao-

— Seu primo é muito teimoso! — falava entre dentes, nem havia ouvido o que o outro tentou lhe alertar.

Na-moo fechou a pasta e lhe direcionou total atenção.

— Acredita que ele tá dando pra esconder a prótese? E não é de hoje! Só para não ter que usar com frequência, porque ele sabe que, se eu vejo ele sem, vou obrigá-lo a usar. — Levantou as mãos na altura do rosto, contorcendo os dedos, demonstrando sua frustração.

"— Cadê a prótese, senhor Lee?

— Quem? Tá falando comigo?

— Hansan... Cadê a prótese, Hansan?

— Não está com você?

— E por que estaria comigo? Não vou fazer cosplay de centopeia.

— Juro que não sei."

— Ele às vezes parece criança! Custa entender que, quanto mais tempo ele passa com a prótese e faz os exercícios certinhos, mais rápido ele vai se adaptar e voltar a ter uma vida normal? Já foi tão difícil fazer ele se livrar daquela bendita cadeira. Mas, sempre que eu penso que estamos dando um passo pra frente, ele inventa alguma arte e voltamos todo o caminho.

— Ah, eu achei o seu método extraordinário!

O riso que escapou com as palavras era a evidência de algo.

— Eu vi o vídeo revelou.

"Claro que viu! Você e mais uns trinta mil coreanos."

— Dae-ho, deixa eu te dizer uma coisa. — Suspirou. — Sinta-se um vitorioso. Você em, o que, quatro ou cinco meses, teve mais conquistas com o Hansan do que qualquer outro profissional.

O olhar de surpresa do fisioterapeuta foi a deixa para Na-moo compreender que tinha pontos da história que ele precisava saber e que poderiam auxiliar, e muito, em sua relação profissional com o primo.

— A noite do acidente do Hansan foi a pior noite das nossas vidas.

"— O médico chegou!

— Qual o estado da vítima?

— Nada bom, doutor."

Ainda lembro dos olhos da socorrista ao me dizer aquilo. Eu nunca fui de acreditar em divindades, mas no momento que pus os olhos no estado do veículo, eu pedi para que, se a pessoa que estivesse lá acreditasse em um Deus, que ele lhe ajudasse.

Apertava as mãos uma na outra, toda aquela noite era uma lembrança terrivelmente dolorosa.

Era impossível identificar o carro e a cada instante que eu ficava mais próximo, eu sentia que não devia ter atendido aquele chamado... mas no fim tinha que ser eu, tinha que ser...

"— A vítima se encontra consciente no momento, mas pode apagar a qualquer instante.

— Gravidade da lesão?

— Fêmur direito dilacerado. Ele está preso ao veículo por uma placa de metal que atravessou a região, não sabemos as extensões dos danos no restante da perna. A equipe de bombeiros achou melhor um médico avaliar a situação antes de tentar removê-lo."

— Eu já estava me abaixando para ficar na altura do veículo, quando ouvi... Ele delirava, chamando pelo Sora. Foi naquele momento que eu soube que tinha que ser eu.

"—Hansan! Bae... consegue me ouvir?

Tentava orientá-lo enquanto avaliava a gravidade da lesão, pondo em cheque todos os seus anos de treinamento, para que seu choque inicial e emocional não lhe guiasse. Precisava manter-se racional.

— Vamos te tirar daqui.

— Não... não... eu não aguento mais... — As lágrimas e os murmúrios de dor saiam rasgados junto a voz. — Me deixa aqui, me deixa encontrar o meu anjo... me deixa... morrer..."

— Eu não entendo. — Segurava o nó que se formava em sua garganta. — O senhor Lee me contou que ele quem teve que decidir-

— Ele já tinha desistido — revelou com pesar. — O que o meu primo lembra daquela noite são fragmentos que ele juntou para corroborar uma versão. Tem uma razão para mantermos o protocolo de não operarmos parentes, principalmente vítimas de traumas, para não afetar o nosso julgamento. — Puxou o ar com força, buscando nas partículas de oxigênio um pouco mais de forças. — Aquela noite foi a primeira vez em que quebrei esse protocolo, e a última em que entrei em um centro cirúrgico.

"— Chamem a equipe de bombeiros, vamos retirar ele daqui! — gritou na direção dos socorristas que o assistiam a alguns metros de distância.

— Meu anjo... me perdoa..."

— Ele pedia perdão por desistir de viver. Eu não podia permitir que ele acordasse da cirurgia e tivesse que conviver com essa culpa de ter decepcionado o Sora.

Seus olhos demonstravam uma compaixão tamanha que só fez a admiração de Dae-ho aumentar.

— Eu o tirei de lá, eu o levei para cirurgia e fui eu quem decidiu salvar sua vida. E mesmo com todas as perdas que todas essas decisões ocasionaram, eu não me arrependo.

— E toda essa culpa que ele joga sobre seus ombros...

— A verdade é que ele me culpa porque, quando o salvei, o sentenciei a uma vida de constantes momentos em que ele sente decepcionar o seu anjo.

Já não queria mais falar sobre aquele assunto, então voltou sua atenção novamente para a pasta em seu colo, lhe dando um último conselho.

— Então, sinta-se orgulhoso sim! Porque, em quase um ano, você foi o único capaz de fazer o Hansan voltar a lutar pela própria vida.

👨🏻‍🦽🚶

Depois daquela conversa, ambos não tiveram mais como continuar a manter o assunto, tampouco tratar de imediato sobre a orientação do trabalho de conclusão de curso de Dae-ho.

Na-moo aproveitou que Hansan ainda estava fora para se despedir de todos, usou a velha desculpa de que havia lembrado que tinha mais um compromisso naquela tarde e precisava ir. Agradeceu a Dae-ho pela confiança e lhe garantiu que daria um retorno sobre seus textos o mais breve possível, beijou os fios do topo da cabeça de Benjamin e saiu assim que o celular lhe informou a chegada do carro que havia solicitado pelo aplicativo.

— A branca de neve despertou?

Hansan, que ainda não havia recuperado seu bom humor por completo, analisou Dae-ho de cima a baixo quando se aproximou do grupo reunido na beira da piscina.

— Espero que o seu príncipe tenha virado um sapo.

Dae-ho o olhou e sorriu. Um belo e largo sorriso que fez seus olhos sumirem, ruguinhas se formarem nos cantos e os dentes branquinhos ficarem todos à mostra. Assim como todos os sentimentos de Hansan ficaram visíveis ao vê-lo sorrindo daquela forma para si, enquanto caminhava em sua direção e o acolhia em um abraço inesperado e tão gostoso, que teve de soltar as muletas e agarra-se às suas costas para não despencar no chão quando sentiu a perna fraquejar.

E para deixá-lo ainda mais exposto e vulnerável, as palavras sussurradas em seu ouvido lhe banharam de um sentimento bom e indescritível.

— Eu sou muito grato por você estar vivo, Bae...

A emoção foi tanta que não segurou a lágrima solitária que escorreu por sua bochecha, colhida pelo fisioterapeuta na altura do seu queixo.

Perdeu totalmente as palavras. Estavam frente a frente, ainda um nos braços do outro, Dae-ho percorria todo o seu rosto com olhos de ternura e não conseguia nem criar um comentário sequer a respeito da forma com que finalmente o outro lhe chamara em alto e bom som.

— Vem... — Dae-ho foi o primeiro a desfazer aquela bolha particular de carinho — Você precisa comer, ainda está magrinho demais — brincou.

Os outros desviaram o olhar, pigarreando para disfarçar o fato de que estavam todos compenetrados e hipnotizados na bela cena que acabara de acontecer.

— Ganhei a aposta, pode passar a grana.

Satoru comemorou baixinho ao lado de Luo que por sua vez, bufou irritado.

— Você podia ao menos disfarçar essa cara de pateta né, Hansan! — reclamou alto, fazendo o amigo lhe olhar sem entender do que se tratava, porém, logo depois que o viu abrir a carteira e entregar algumas notas ao marido, se tocou.

Mas não era como se precisasse realmente disfarçar, afinal, quem lhe interessava já estava ciente dos seus sentimentos.

Depois do almoço permaneceram ali, jogando conversa fora, até Satoru se levantar e avisar que iria nadar um pouco mais, já arrancando todas as peças que tinha sido obrigado a vestir.

— Pode ir parando, Satoru!

Hansan o fez parar com a mão no cós da sunga. Ele olhou-o provocativo, fazendo uma dancinha sensual enquanto baixava lentamente a peça.

— Nem termine de tirar.

Puxou a sunga de volta para o lugar.

— Mas o Na-moo já foi embora! — tentava argumentar, encontrar explicações que fizessem Hansan sair do seu pé.

Olhou para o lado e agarrou o braço de Dae-ho, que passava por perto segurando duas taças de sobremesa.

— E o Dae-ho disse que ia nadar pelado também, não foi?

— O quê?! — Sua voz saiu alta e assustada

— Sabe aquele favor que você tá me devendo? Tô cobrando ele agora! Tira a roupinha, gracinha. Tô em desvantagem aqui.

Os olhos do fisioterapeuta se arregalaram ainda mais. Satoru parecia terrivelmente ameaçador, falando aquilo com um sorrisinho no rosto tão inocente, que mal podia enxergar seus olhos, que sumiram em dois risquinhos. Olhou para Hansan, que havia recostado-se na cadeira e cruzado os braços, esperando o desfecho da situação, assumindo clara postura de que não moveria um dedo ou falaria uma vogal sequer para livrá-lo daquela encrenca.

A verdade é que o artista estava ansioso para ter uma visão privilegiada da cena.

— Porra! — Benjamin já se encontrava vermelho de tanto rir. — Ninguém te avisou que nunca, em hipótese alguma, deva, aposte ou prometa nada ao Satoru, Dae-ho?

— Não tivemos a oportunidade. — Kwan, que acompanhava as risadas de Benjie, falou. — Vai por mim, Dae-ho, você tá ferrado nessa. Se rende logo, ou ele vai te atormentar pelo resto da sua vida.

Dae-ho voltou-se novamente para Satoru quando se deu conta de que, dos outros, não teria ajuda, e se deparou com ele de braços cruzados atrás das costas, balançando o corpo nas pontas dos pés e ainda sustentando um sorriso nem um pouco condizente com o favor pedido.

Não teria mesmo escapatória.

Colocou sua sobremesa na mesa e entregou a que buscara para Hansan, semicerrando os olhos quando viu em seu olhar que ele estava gostando bastante de tudo aquilo. Ele nem ao menos tentava esconder o riso.

— Tudo bem — falou convicto, se afastando da mesa.

Mas antes de segurar a barra do short que usava, teve seu pulso segurado por Hansan.

— Você sabe que se não quiser, você não pre-

— Está tudo bem, eu sei — assegurou-lhe e se inclinou para falar próximo ao seu ouvido. — Nem finja que não está doido pra ver meu corpinho pelado, velho tarado.

Hansan gargalhou alto, gritando um "velho é seu pai", como sempre fazia ao ser chamado abertamente de velho pelo mais novo, e continuou a rir quando Dae-ho se aproximou de Satoru e o jogou sobre os ombros antes de pular na água de roupa e tudo, dizendo que estavam quites a partir dali. Mas o artista por pouco não se engasgou com a sobremesa quando as peças começaram a ser retiradas e jogadas na borda da piscina.

— Cuidem do Hansan, ou ele vai infartar — Luo passou por ele, lhe dando tapinhas camaradas no ombro. — Forças, meu amigo. Eu vou dar um mergulho também — avisou se desfazendo das roupas —, mas alguém vem?

— Muito homem pelado por metro quadrado pro meu gosto — Benjamin rejeitou a oferta e direcionou sua fala a Hansan, que tinha os olhos presos a piscina. — O Kwan vai me levar para casa, Bae. Na-moo viaja amanhã e eu preciso garantir que ele não vai deixar nada fora da mala, ou perder o passaporte outra vez.

— Ainda o lance do divórcio? — perguntou, tentando não demonstrar interesse.

— Isso mesmo, mas já está perto do fim, só restam alguns papéis para assinar.

— Hum... boa sorte.

— Obrigado.

— Bae, me empresta um capacete, eu só estou com um. — Kwan pediu, já caminhando em direção à garagem.

— Você sabe onde fica — respondeu por alto.

Estava curioso para saber o que aqueles três conversavam tão distraidamente, apoiados na borda da outra ponta da piscina.

— Não vai nadar?

— Como? — Percebeu que Benjie falava consigo. — Ah... não, eu vou entrar pra descansar um pouco.

Hansan levantou e acompanhou o amigo em parte do caminho, voltando para próximo dos outros três que estavam dentro d'água assim que ouviu a buzina da moto de Kwan na entrada da casa.

— Rapazes...

Tentou a muito custo não guiar seus olhos para a parte dos corpos submersa nas águas.

— Fiquem à vontade, eu vou deitar um pouco.

— Está sentindo alguma coisa? Quer ajuda? — Dae-ho se prontificou.

— Não, estou bem. Só preciso tirar a prótese e esticar um pouco a coluna.

— Nós também já estamos indo — Luo informou já saindo da água.— Vamos, bebê?

— Tudo bem. Quando quiserem voltar, não precisam nem pedir, vocês têm a chave mesmo. — Deu de ombros, se afastando e entrando em casa.

Dae-ho ficou um pouco mais na água, pensando na recente conversa que teve com o casal e na proposta que lhe foi feita.

Sua cabeça estava ficando pesada, pois, nos últimos dois dias, o que mais fazia era pensar, pensar e pensar. Todavia, no fim não chegava a nenhuma conclusão que lhe ajudasse o mínimo sequer. E para completar, depois de juntar a informação de que Hansan gostava de si, suas reações aos sons da noite em que ele dormiu com Kwan e tudo que Na-moo lhe contou, o artista não saia da sua cabeça.

Eram três situações completamente distintas, mais que somadas às suas recentes dúvidas, lhe fizeram criar coragem para agir e deixar os achismos para trás. Estava na hora de provar o sorvete e saber se era realmente tão bom quanto aparentava ser.

Saiu da água, vestiu um roupão e chamou pelo casal, antes deles alcançarem o beco de acesso à frente da casa.

— Eu topo.

— Ok. Qual dos dois? — Luo perguntou animado, já se preparando.

Dae-ho intercalou o olhar entre os dois.

— Satoru — escolheu. — Me desculpa, mas você me intimida, seria estranho.

— Tudo bem, esse é o meu charme mesmo. — Passou as mãos pelos fios desbotados do cabelo, se colocando atrás do marido e apoiando ambas as mãos em seus ombros. — Você fez a melhor escolha. Se, depois de provar essa boquinha gostosa, você não gostar nem um pouco do beijo, pode se considerar cem por cento hétero com todas as certezas desse mundo! Porque não tem um beijo mais gostoso do que o do meu bebê, e-

— Tá, chega de propaganda, francês! — Satoru deu um passo a frente, ficando a centímetros de distância de Dae-ho.

Ficou na ponta dos pés para olhá-lo nos olhos e segurá-lo firme pelas bochechas.

— Está pronto?

O fisioterapeuta respirou fundo.

Era agora.

— Estou.

A textura dos lábios não era tão diferente dos que já havia provado. O encaixe era bom, suave e envolvente, mas, até então, nada novo. Sentiu-o sugar seus lábios antes de invadir sua boca com a língua.

Arrepiou-se.

Sua mente de imediato lhe fez lembrar que, naquele momento, aquela língua que deslizava quente e úmida sobre a sua pertencia a outro homem.

E ali estava o gostinho de novidade que fez todo seu corpo se arrepiar mais uma vez e lhe levar a aproveitar com mais desejo e intensidade o beijo, soltando suspiros e gemidos baixinhos de satisfação.

Assim que Satoru se afastou, dando uma leve mordida em seu lábio inferior, precisou de uns dez segundos para voltar à órbita.

— Caralho... — Arfou.

— É, meu amigo, acho que já temos a resposta para suas incertezas.

Luo sentenciou, depois de beijar o ombro do marido com desejo, tendo certeza de que aquele beijo excitara a Satoru tanto quanto havia mexido consigo.

— Boa sorte com essa nova descoberta e, se quiser repetir a dose ou, sei lá, quiser experimentar algo mais íntimo, para ter mais certeza, estamos aí. Agora, se me der licença, vou correndo para casa.

O beijo lhe rendera algumas ideias para a noite com o marido.

Dae-ho sorriu sem jeito, compreendendo a pressa do casal. Se aquele beijo durasse mais alguns segundos, também teria um probleminha fálico para resolver. Agradeceu aos dois pela "ajuda", dando-lhes as costas quando o casal praticamente correu em direção à saída, porém, hesitou quando viu Hansan parado na soleira da porta, lhe olhando fixamente.

Teve certeza de que ele assistiu tudo.

— Nem fale nada — disse quando passou por ele. — Não foi nada, o Satoru só estava me fazendo um favor.

— Procurando suas cáries com a língua? — Seguiu-o até a sala. — E você ainda não entendeu que Satoru e favor, na mesma frase, é sinônimo de furada?

— Primeiro. — Levantou o indicador, retorcendo o rosto com nojo. — Eca! Segundo, não foi troca de favores.

— Só de saliva — Rolou os olhos, irritado.

Dae-ho não pretendia esconder aquele beijo de Hansan, uma hora ele saberia, porém, queria ter mais certeza do que havia sentido ao beijar pela primeira vez outro homem, antes de contar e fazê-lo criar esperanças. Mas viu que não teria tempo para poupar explicações.

— Esquece — O artista girou o corpo para sair do cômodo. — Eu não tenho direito nenhum de agir assim, me desculpa.

— Senhor Lee, não faz isso — pediu choramingando. — Eu só precisava ter certeza de uma coisa.

— E tinha que ser logo com o Satoru?

Sabia que aquele beijo tinha um motivo plausível por trás, mas o que lhe chateava era que estava ali, pronto para sanar todas as dúvidas de Dae-ho de bom grado, e ele escolheu a outro.

— Era ele ou o Luo — explicou com tamanha simplicidade, que Hansan se segurou muito para não dar com a muleta nas pernas dele.

— Ah! Ótimo saber que nem na lista de espera estou incluído! — respondeu verdadeiramente ofendido. — E você escolhe logo o boquinha de ouro — Bufou irritado. — Minha raiva é que, no seu lugar, eu faria a mesma escolha. O filho da puta beija bem.

— Como você-

— Longa história!

— E o pai dele?

— Longa história, Dae-ho!

— O Sora beijava bem? Porque o filho dele... minha nossa... beija bem pra caramba! — afirmou, com os olhos bem abertos e desfocados, perdido em lembranças, fazendo Hansan lhe fuzilar pelo canto dos olhos.

— Te faço mudar de opinião em dois tempos, vem aqui! — chamou-o com o indicador, desajeitadamente por estar segurando as muletas.

— Eu não vou te beijar, Sr. Lee — Caminhou e parou em frente a Hansan. — Eu não posso fazer isso, não seria certo. Não quando você gosta de mim e eu ainda não posso corresponder todos os seus sentimentos.

— Ainda?

Aquela possibilidade lhe encheu de esperança e não conteve o sorriso mínimo que despontou em seus lábios.

— É... ainda — Espelhou seu sorriso, enfatizando a palavra que abria um portal para um novo mundo de possibilidades. — Eu te respeito, Hansan, e respeito o que você sente. E até eu ter certeza de que não vou pirar se embarcar nessa, eu não vou te beijar. Por isso beijei o Satoru. Se a experiência não fosse legal e eu não quisesse repetir, o clima entre a gente, se fosse você no lugar dele, ficaria muito estranho.

— E foi legal a experiência?

— Deu até uma tremidinha nas pernas.

— Dan-ah...

Arrumou a postura para ficarem mais próximos. Aquela resposta, apesar de lhe arrancar mais uma pitada de irritação, foi a confirmação de que, se investisse corretamente como lhe foi aconselhado, ele não só entraria na lista de espera, mas assumiria o topo dela.

— Eu não sou nenhum adolescente, nem você. Não precisamos de toda essa complicação. Eu entendo que foi sua primeira vez beijando outro homem, mas foi bom, não foi? — viu-o confirmar com a cabeça. — Existem todos os indícios de que você repetiria sem problemas, não é?

Dae-ho sorriu largo, balançando a cabeça em negativa, achando graça do esforço que Hansan estava começando a fazer para ganhar um beijo também.

Havia gostado de beijar Satoru, muito, mas aquela fora somente uma experiência. Não poderia se basear somente naquilo para afirmar com todas as letras que estava pronto para ingressar em um relacionamento com outro homem, pois era isso o que Hansan lhe demonstrava ser, o sinônimo de compromisso. A maturidade de um homem que já possuía anos de experiência e não tinha mais idade para perder com dilemas de um jovem que recém descobrira que homens podem ser, para si, tão atrativos quanto mulheres.

Em sua conversa com o casal, na piscina, descobriu que não existe fórmula a seguir para esse momento. A forma como Satoru entendeu que gostava de pessoas, no geral, foi completamente diferente da maneira conturbada que Luo entendeu ser bissexual, assim como a sua está sendo totalmente diferente também. Cada um em idades e fases diferentes da vida.

Lembrou de Sora, quando Satoru lhe contou que o pai se viu apaixonado por outro homem depois de certa idade, e imaginou como foi esse momento para ele. Teria sido natural? Tranquilo? Havia chorado? Jamais saberia. Mas uma coisa podia afirmar, no fim, não existe forma ou padrão a seguir, cada um cria sua própria fórmula em meio a novos entendimentos e descobertas.

De maneira única e indivisível.

— Existem — confirmou.

— Então...

A distância diminuía a cada segundo. Dividiam o mesmo ar quente das respirações mescladas. Os lábios de Hansan já formigavam, ansiando o contato.

— Então...

Hansan fechou os olhos quando ouviu a voz do fisioterapeuta soar rouca e baixa. Suas bochechas queimaram quando ele lhe beijou ali.

— Quando eu achar que está na hora de repetir, você estará no topo da lista.

— Não fode, Dae-ho! — praguejou decepcionado.

O fisioterapeuta cruzou os braços, lhe repreendendo pelo palavrão e achando graça da cara feia que o artista fazia. Não ia beijá-lo, não no mesmo dia em que dera seu primeiro beijo gay e que nadou pelado com outros homens!

Havia sido um dia agitado e precisava por todos os pensamentos em ordem.

Hansan respirou fundo e se recompôs, olhou fixamente para Dae-ho de forma tão penetrante, que ele se sentiu despido outra vez. Chegou até a segurar o nó que fechava o roupão para ter certeza de que ele estava ali, cobrindo seu corpo. Assistiu ao outro sorrir ladino, de um jeito provocativo, e serpentear a língua pelos lábios de forma tão torturantemente lenta, que foi impossível para Dae-ho não focar os olhos em seus lábios umedecidos e engolir em seco.

— Tudo bem, Dan-ah... — Inclinou-se, deixando a aproximação perigosa outra vez. — Vamos ver quanto tempo esse discurso dura, até você pedir, ou melhor, implorar um beijo meu.

— E qual a lógica disso?!

Jogou os braços para o ar, para depois pousá-los na cintura, batendo o pé direito no chão e expressando toda a falta de lógica de Hansan.

— Se é exatamente isso que você já deixou mais do que claro que quer? Se eu pedir, vai ser bom pra você, não vai?

— Muito.

Estava tão próximo que a ponta de seu nariz resvalou na bochecha dele, quando aproximou os lábios de seu ouvido ao lhe responder. Dae-ho já estava respirando com dificuldade, seu corpo ainda estava agitado pelo recente beijo e toda aquela aproximação gerava uma tensão palpável, mas não podia deixar que ela afetasse seu julgamento.

— Sabe por quê?

Hansan continuava a lhe provocar.

— Porque aí eu vou ter o prazer de fazer você experimentar o melhor beijo da sua vida, a ponto de te fazer implorar para que eu nunca mais pare. Ah, Dan... Você vai desejar que eu beije cada pedaço desse seu corpinho...

"Meu santo Na-moo, me socorre..."

— E-eu a-acho que isso não vai acontecer.

Nem se importou por gaguejar, já começava a repensar todo o discurso que os levara até ali.

— Do mesmo jeito que achava ser hétero?

Aquelas palavras lhe roubaram o pouco de ar que restava em seus pulmões, lhe fazendo puxar outra lufada com força e soltar de vez quando sentiu o calor dos lábios de Hansan beijando-lhe logo abaixo da orelha, na linha da mandíbula. Seu corpo ferveu de uma forma que em nada se comparava com as fagulhas causadas pelo outro beijo que recebera naquele dia. Naquele momento, desejou deixar para trás todo aquele discurso e provar aqueles lábios, que agora se abriam em um sorriso sacana que lhe irritou e incitou como nenhum outro.

Percebeu que havia perdido a oportunidade ao ouvi-lo lhe desejar uma boa noite com a voz baixa e sedutora, antes de caminhar em direção ao quarto.

Fechou os olhos e praguejou baixinho por saber que ele tinha razão, agora não tinha muita credibilidade para manter seus achismos. Não quando mordera a língua, ou melhor, chupara a língua de outro homem, acabando de vez com o fato de se achar hétero.

Agora que dera abertura, teria que aturar todas as investidas do Lee. Porém, se tinha uma coisa que seu orgulho não iria permitir, era...

"Mas nem fodendo que eu vou implorar!" 

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