Arkansas City

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     Era um dia normal de inverno, como todos os outros, na cidade de Arkansas City, com a sua minúscula população, cerca de 12 mil habitantes. Aquela manhã gelada, mas seguindo a rotina normal, os pais indo para o trabalho e as crianças correndo pelas ruas a caminho da escola. Acordei meio zonzo, a movimentação para mim estava mais intensa. Olhava pela janela, as pessoas estavam meio irreconhecíveis, embaçadas. Fui caindo lentamente pela sala, fui me arrastando até o banheiro, sentei no chão do box e deixei escorrer toda aquela água pelo meu corpo, consegui chegar até a sala de volta e adormeci por lá mesmo. 

     Quando acordei, era fim de tarde, mal conseguia visualizar a escola, de tanta neblina que descia ao redor do meu prédio. Resolvi ir até a rua, respirar e encontrar um amigo que vagava a toa pelas ruas da cidade. Fomos jantar, em um restaurante mexicano muito bom que tem em frente ao principal hospital da cidade . A comida descia mal. Comecei a escutar alguns burburinhos, vinham diretamente da minha mente, o rosto do meu amigo começava a ficar distorcido me deixando agoniado. Pedimos a conta, pois não aguentava mais ficar naquele lugar, saindo da mesa do restaurante fui me segurando nas paredes, respirando fundo, bem na saída havia a réplica da famosa pintura de São Sebastião, de Andrea Mantegna. A imagem parecia saltar em minha direção, estava sentindo na pele aquelas flechas. Thomás não estava entendendo o que se passava comigo naquele momento, se dirigia a mim e eu não conseguia responder, perguntou-me se eu precisava de ajuda e eu neguei.

       Horas mais tarde, esbarrei com um grupo de conhecidos na porta do Brooks, um pub, eles estavam indo embora. Ofereceram- me uma carona, eu aceitei. Entramos no carro, o motorista estava sob algum tipo de substância química pesada, trouxe de novo aquela agonia que me perturbava. A caminho da minha casa, tocava aquela música " Slippin' Into Darkness", do War. A energia ruim tomou conta de todos dentro do carro. Fazendo o retorno atrás da igreja, nos deparamos com uma mãe e um filho na porta do hospital. Saíram do carro e abordaram- os, pegaram a criança, de quatro anos, e colocaram do meu lado. A mãe ficou em prantos, eu via o desespero nos seus olhos e eu não conseguia reagir, nem ajudar e nem fugir. Fomos parar a vinte quilômetros da cidade, em uma área bem deserta. Colocaram a arma na minha cabeça e na do menino, ligaram para a polícia para receber uma quantia para não matá-lo. Ficamos por lá mesmo, quando olhei estavam todos dormindo e prenderam a criança dentro do carro, minutos depois, adormeci.

      No dia seguinte, assim que a claridade aparecia, eu acordei desnorteado. Não tinha ninguém mais ali. Comecei a chorar vendo aquele sangue todo escorrendo no chão, gritava, desesperado, não entendia o motivo daquilo estar ali. Muito sangue e a arma na minha mão. Estava drogado, a mercê daquela energia negativa. Me dominou.  A polícia chegou, estava segurando a arma e apontando-a para minha cabeça, todo ensanguentado. Saíram da viatura, ajoelhei no chão, larguei a arma e pedi ajuda. E a criança? Estava amarrada na árvore e o sangue? Era meu, me machuquei pela mata, quando estava alucinado.  A loucura me fez criar toda aquela cena imaginária na minha cabeça, as pessoas, o vitimismo, era eu mesmo sendo dominado pelo meu próprio corpo.


      



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⏰ Last updated: May 26, 2017 ⏰

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Noite de um crimeWhere stories live. Discover now