Prólogo - Onde todos os finais terminam

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Por mais que tentasse lutar contra aquilo, era inevitável.

Adam sabia que estava morrendo.

Aos poucos, sentia como se a vida esvaísse junto com todo aquele sangue, que escorria sem parar pelo corte em sua barriga. Ele arriscou olhar para trás, onde a monstruosidade que o havia atacado ainda permanecia imóvel, com o mesmo sorriso distorcido de quando o atacara. Mesmo ao longe, ainda podia ouvir aquela respiração sussurrante, como se estivesse colada em seu rosto, acompanhada de um hálito adocicado e quente.

Tentou em vão apressar o passo, mesmo sabendo que aquela coisa poderia interceptá-lo num piscar de olhos. Adam não sabia o que ela era e nem mesmo se importava com isso, tudo que a dor e o cansaço lhe permitiam pensar era em fugir dali, fugir para qualquer lugar onde poderia conseguir ajuda, onde alguém pudesse lhe dizer que tudo ficaria bem mesmo sabendo que não ficaria. Era esse tipo de piedade mentirosa e reconfortante que ele precisava naquele momento.

Saber o que o havia matado não faria a menor diferença.

A rua estava deserta e ele tinha a impressão de que ela se esticava à medida que ele se arrastava, fazendo qualquer possibilidade de alcançar ajuda parecer inexistente. Sua boca estava cheia de sangue e tudo o que saía por entre seus lábios semiabertos era um chiado rouco, indistinguível – mais um sinal de que a morte apoiava uma mão fria em seu ombro.

O seu corpo estava desistindo, mas, ainda assim, ele se forçou para ir adiante, um passo atrás do outro. O sangue agora jorrava livremente, como se um psicopata de algum "filme B" tivesse instalado uma torneira em sua barriga. Naquele ritmo, não duraria nem meia hora.

E então, sua visão periférica captou a coisa novamente, agora a menos de cinco passos de distância. Seu corpo esguio era negro como uma sombra, mas refletia a luz fraca dos postes assim como um cristal lapidado fazia. Onde deveriam ficar as mãos, haviam garras curvadas e afiadas como navalhas, cobertas de sangue, o seu sangue.

De frente para a monstruosidade, Adam deu um doloroso passo para trás, seus olhos tentando encontrar um sentido no rosto sem feições à sua frente, apenas aquele sorriso doentio exibindo fileiras de dentes pontiagudos, de orelha a orelha – se possuísse uma. Um desespero o acertou tão friamente quanto aquela sensação que descia pelas pernas, as quais ele começava a não mais sentir. Foi ao chão de uma vez só, batendo a cabeça na calçada fria e poeirenta. Morreria sozinho naquela rua suja, num lugar esquecido por Deus, mas talvez não pelo Diabo. As luzes dos postes ao redor se tornaram um borrão luminoso que ficava cada vez mais claro, assim como a dor constante.

Morrer não era como mostrava os filmes.

Em sua mente, vieram dois pratos vazios, sobre uma mesa igualmente vazia. Na parede acima, um relógio marcava sonoramente horas das quais ele não conseguia distinguir e em algum lugar daquela sala de jantar, sua irmã o esperava como fazia todas as noites.

Mas naquela noite, Adam não voltaria para casa.

Usuário FinalOù les histoires vivent. Découvrez maintenant