O Codex 632 - José Rodrigues dos Santos

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O Codex 632

José Rodrigues dos Santos

Gradiva - Publicações, Lda

1ª edição: Outubro de 2005

Portugal

Formatado por SusanaCap

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À Florbela, à Catarina e à Inês, as minhas três mulheres.

Aviso

Todos os livros, manuscritos e documentos mencionados neste romance existem. Incluindo o Codex 632.

Prólogo

Quatro.

O velho historiador não sabia, não podia saber, que só lhe restavam quatro minutos de vida.

O elevador do hotel aguardava-o de portas escancaradas e o homem carregou no décimo-segundo botão. O ascensor iniciou a viagem e o seu ocupante admirou-se ao espelho. Achou-se acabado; viu-se calvo no topo da cabeça, apenas tinha cabelos por trás das orelhas e na nuca; e eram cabelos grisalhos, alvos como a neve, tão brancos quanto a barba rala que lhe escondia a cara magra e chupada, riscada por rugas profundas; arreganhou os lábios e analisou os dentes desalinhados, amarelos de tão baços, com excepção dos falsos que lhe tinham sido implantados, eram esses os únicos que respiravam uma saúde nívea de marfim.

Três.

Um tim suave foi a forma encontrada pelo elevador para lhe anunciar que tinham chegado ao destino, era favor o ocupante sair e ir à sua morte porque ele, o elevador, tinha mais hóspedes para atender. O velho pisou o corredor, virou à esquerda, procurou com a mão direita a chave no bolso e encontrou-a; era uma ficha branca de plástico com o nome do hotel num lado e uma fita escura no outro; a fita continha o código da chave. O velho colocou a ficha na ranhura da porta, acendeu-se uma luz verde na fechadura, rodou a maçaneta e entrou no quarto.

Dois.

Foi recebido pelo bafo seco e gelado do ar condicionado, os pelos eriçaram-se-lhe com o frio gostoso, pensou em como era bom sentir aquela frescura depois de uma manhã inteira sujeito ao calor abrasador da rua. Curvou-se sobre o frigorífico rasteiro, abriu a porta, tirou o copo com o sumo e aproximou-se da larga janela. Com um suspiro tranquilo admirou os prédios altos e antiquados de Ipanema; mesmo em frente plantava-se um pequeno edifício branco de cinco andares, sob o sol quente do início de tarde cintilava no terraço uma piscina de água azul-turquesa, convidativa e refrescante; ao lado erguia-se um prédio escuro mais alto, com largas varandas pejadas de cadeiras e espreguiçadeiras; os morros, lá ao fundo, formavam uma barreira natural que cercava a floresta de betão com os seus curvos contornos verdes e cinza; o Cristo Redentor acenava de perfil no Corcovado, figurinha esguia e ebúrnea a abraçar a cidade lá do alto, frágil e minúscula, equilibrando-se sobre o abismo do maciço arbóreo do mais alto morro da cidade, pairando na crista do miradouro acima de um pequeno tufo esbranquiçado de nuvens que se colara ao topo do promontório.

Um.

O velho levou à boca o copo e sentiu o líquido alaranjado descer-lhe suavemente pela garganta, doce e fresco. O suco de manga era a sua bebida favorita, especialmente porque o açúcar fazia sobressair o travo meloso do fruto tropical; além do mais, as sucarias produziam um sumo puro, sem água, com a fruta descascada na hora, e o sumo de manga vinha compacto, os fios do fruto misturados no líquido espesso e revigorante. O velho engoliu o sumo até ao fim, de pálpebras cerradas, saboreando a manga com vagarosa gula. Quando terminou, abriu os olhos e observou prazenteiramente o azul resplandecente da piscina no terraço do prédio à frente do quarto. Foi a derradeira imagem que registou.

Chegaste ao fim dos capítulos publicados.

⏰ Última atualização: Mar 15, 2009 ⏰

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