Coelho de Tarpe • [taekook]

נכתב על ידי vantepwr

28.9K 4.2K 8K

JungKook era um garoto sonhador e perdido na grandeza do seu mundo pequeno. Almejava ser tudo e nada ao mesmo... עוד

Considerações
Epígrafe ❁ A vida é um rio
Capítulo 1 ❁ Maçãs e dúvidas
Capítulo 2 ❁ Relógios de bolso
Capítulo 3 ❁ Trouxe o amor para o vazio
Capítulo 4 ❁ Caminhos perdidos
Capítulo 5 ❁ Azul da noite, rosa da manhã
Capítulo 6 ❁ Ilha dos elefantes
Capítulo 7 ❁ Rosas vermelhas anoitecem depois do chá
Capítulo 8 ❁ Terra dos sonhos
Capítulo 9 ❁ Caminho de Alice
Capítulo 11 ❁ Torno-me cruel
Capítulo 12 ❁ Choro frágil e cortante
Capítulo 13 ❁ Escolhas do coração
Capítulo 14 ❁ Espada de vidro
Capítulo 15 ❁ Melodias malucas
Capítulo 16 ❁ Seja lua ou seja mar, isto é para o amor que não consegui salvar
Epílogo ❁ Lábios e ti
Conto de Natal

Capítulo 10 ❁ Eternamente, perdão

748 120 247
נכתב על ידי vantepwr

conteúdo sensível: ideação suicida, menção ao suicídio, fobia social e bullying.

⊱✫⊰

Cidade de Tarpe. 
Anos antes.

Park Jimin.

     
Eu não quero ser esquecido. Embrulha o meu estômago quando penso que as pessoas que estão à minha volta podem me ver, mas não me enxergar.
     
E eu estarei sozinho.
     
Sem ninguém.
     
Abandonado. 
     
Porque é o que acontece quando me relaciono com as pessoas, desde nascença. Meu pai foi embora para viver com outra mulher antes que minha mãe pudesse dizer que estava grávida. Com cinco anos eu era tão parecido com ele que ela não aguentava olhar nos meus olhos, e fui morar com a vovó.
     
Passei a infância naquela casa, e Tarpe era um lugar perfeito para mim. Desafiar Hoseok e Seokjin a passarem a madrugada na floresta comigo era divertido. Andar pelos bosques e pegar peças nos outros moradores em Gale era meu passatempo favorito. Quando deitava na cama, cansado, no fim do dia, a vovó me levava sopa na cama e cantava para eu dormir.
     
Mas ela se foi no meu aniversário de treze anos, e tive que procurar minha mãe para pedir ouro ou prata. Estava bem mais feliz do que quando vivia comigo. Ela me dava dinheiro suficiente para continuar sobrevivendo, tudo com a condição de não ver o meu rosto de novo ㅡ aquela casa não era mais meu lar, nunca foi.
     
Descobri o portal, e era o único mestiço capaz de me transformar em animal e viajar, de Tarpe para o mundo humano. Impressionantemente eu nunca fui afetado, não como as pessoas que tentaram ir embora e morreram.
     
Conheci Yoongi. Ele costumava parecer apático e triste, e meu coração se enchia de dor por ele, porque eu não podia entender aquela mágoa, não era nem parecida com a que eu sentia.
     
Quis levá-lo para Tarpe, não só por querer vê-lo feliz, mas também para poder ficar perto dele. Eu estava apaixonado. 
     
Mas fui um tolo egoísta quando o convenci. Percebi isso tarde demais. A sensação piorou em meu peito quando descobri a verdade ㅡ o que acontecia aos humanos sangue puro dentro do nosso mundo. 
     
NamJoon estava aqui na época, me contou sobre as memórias perdidas e eu entrei em pânico. Yoongi poderia, a qualquer momento, se esquecer de mim.
     
Meu maior medo estava ao meu lado, como uma sombra. 
     
ㅡ Ajude-o a não esquecer. Conte histórias que aconteceram entre vocês quando se conheceram ㅡ Disse NamJoon, calmo como a brisa, tocando a grama com as mãos enquanto respirava profundamente.
     
ㅡ Ele vai esquecer de mim, e então eu ficarei sozinho ㅡ Eu disse, olhando para meus pés que balançavam.
     
NamJoon parou, encarando meus olhos profundamente, eles tinham uma cor bonita, vacilavam entre o amendoado e o mel. Eu nunca soube o que essa cor significava, ninguém tinha aqueles olhos.
     
ㅡ Amor não se esquece, Jimin. Yoongi o ama e você também. Mesmo que as memórias se percam, o sentimento de carinho não irá embora ㅡ Sorriu fraco, tentando me acalmar ㅡ Será sempre como a primeira vez.
     
ㅡ Ele vai se esquecer de mim… ㅡ Eu disse mais uma vez, choramingando como um tolo. Não queria dar ouvidos a ele.
     
NamJoon me conhecia muito bem quando disse:
     
ㅡ Faça o que sua intuição diz, se ouvir sua insegurança poderá se arrepender para sempre ㅡ disse, deitando na grama. NamJoon era tão bom, mas nunca seguia os próprios conselhos.
    
Mesmo lidando com Vrai Moi dentro de si, seu próprio demônio, NamJoon ainda sorria. Ele vivia como se cada segundo importasse, como se cada vento fosse o último. Sempre admirei isso nele.
     
Deveria tê-lo escutado mais. Estava cego pelo o que temia. Nem mesmo ouvi o que Yoongi passou semanas tentando dizer.
     
Fechei meus olhos para tudo à minha volta. Não vi que Tarpe estava ficando cinza. Tudo o que me importava era que ele se lembrasse de mim. E isso acabou comigo.
     
NamJoon deu ouvidos a Vrai Moi e desapareceu em seu corpo. Não demorei para perceber que já não era mais ele, era Vrai Moi. Com a voz ridiculamente dócil e suave, nada hostil ou cruel, acreditei nele, estava desesperado, e ele mentia tão bem.
     
Me mandou ir atrás de poções, que de nada ajudaram Yoongi, na verdade aquilo secretamente aumentou o poder que tinha. Eu não estava preocupado em saber o que ele fazia com o que eu o entregava.
     
Só queria meu amor de volta.
     
Só queria que Yoongi se lembrasse de mim.
     
Enquanto isso, Yoongi tentava se adaptar ao mundo de Tarpe, buscava formas de se lembrar da própria família e do mundo em que nasceu. Desabou em mágoa e tristeza e dor, mas mesmo assim sorria para mim, nunca disse o que estava passando. 
     
ㅡ O mito de Moros diz que ele escondeu três flechas do Cupido em cogumelos da floresta. Elas podem trazer memórias de volta. Ache-as e as atire em Yoongi ㅡ disse Vrai Moi.
     
Fui um tolo alienado por buscar as flechas sem ao menos pesquisar. As três ao mesmo tempo iriam possibilitar um poder para fazer três mudanças no que quisesse.
    
Quando as atirei em Yoongi, Vrai Moi não relutou quando se colocou na frente de seu corpo magro ㅡ não tinha percebido quanto peso ele perdeu até olhá-lo daquela forma. Não esperou um segundo para ordenar o que queria.
     
Número um: teria o maior poder em cima de Tarpe. Maior que qualquer autoridade das Cortes.
    
Número dois: teria acesso ao trono de chamas e aos artifícios do destino.
     
Número três: baniu os sentimentos. Os que moram em Tarpe devem sorrir, sem demonstrar tristeza. 
     
O último foi como dar um soco no estômago de Taehyung. O garoto já se isolava dos outros e se auto condenava todas as vezes em que desabafava as mágoas à alguém. Quando eu o trouxe para Tarpe, pensei que conseguiria ajudá-lo com isso, mas não esperava que tudo desse errado. Com a terceira ordem, ele nunca mais foi o mesmo. 
    
Para que tivesse controle sobre mim, Vrai Moi transformou Yoongi em gato, amaldiçoando-o, sabendo do tamanho amor que nós tínhamos (afinal, ninguém arrisca a própria vida para recuperar memórias de quem não ama). Yoongi perdeu-se em seu corpo, assim como NamJoon, esquecendo de nossa história por completo.
    
Estive acorrentado aos ideais de Vrai Moi, acreditando que, um dia, poderia ter Yoongi de volta, e que Tarpe voltaria a ser meu mundo dos sonhos.
     
Verdadeiro e bonito.
    
Fiquei tomado por medo e arrependimento. Passando todos os meus dias pensando nele. Todos os dias querendo abraçá-lo e beijá-lo, apenas mais uma vez seria suficiente. Queria tocá-lo, ver seu rosto, mexer em seus fios lisos e pretos como ônix. 
     
Ver o gato é como sentir uma bala atravessando meu peito. Saber que aquele não é ele de verdade, dói. Saber que não tenho permissão para pedir ajuda também. 
     
Me machuca ter que sorrir e ajudar o mal a construir o mundo lotado de falsa felicidade. É como estar ligado ao inferno eterno.
     
O que me mantém vivo é acreditar que posso ver meu amor novamente. Quero me desculpar por meus erros. Quero abraçá-lo e dizer que nunca mais farei o mesmo. Quero dizer o quanto eu o amo.
     
A culpa foi minha.
     
Quem o deixou cair fui eu.
     
Quem o deixou sozinho fui eu.
     
Deveria ter feito mais, deveria ter engolido as minhas inseguranças e ouvido o que ele tinha para me dizer.
     
Hoje, me arrependo. Muito. Eternamente.
     
Me desculpe, Yoongi, me desculpe.

⊱✫⊰

Muito, muito tempo antes.
Birmingham, Alabama.

Min Yoongi.

Eu era uma criança que queria viver sozinha, que gostava do sentimento de solidão e odiava conviver com outras pessoas.
     
ㅡ Eu sou o ranger vermelho.
     
ㅡ E eu o azul ㅡ Enquanto todos os outros brincavam, eu me escondia dentro do antigo escorregador, aquele que ninguém gostava porque era velho e fazia barulho quando se mexia muito.
     
Nunca me senti confortável perto de ninguém. Odiava trabalhos em grupo e apresentações orais. Odiava quando me tocavam e resumiam meu desconforto à timidez. Odiava ir à escola e passar pelo inferno todos os dias.
    
Não gostava dos colegas de turma. Não mesmo.
     
Passaria a vida sozinho se pudesse.
     
ㅡ Olha, o garoto estranho ㅡ sussurrou Timothée, sem a intenção de soar maldoso, chegando perto do brinquedo em que me escondia. ㅡ Não quer brincar com a gente? ㅡ Perguntou simpaticamente para mim, eu acabei o encarando com frieza.
     
ㅡ Não ㅡ Respondi, umedecendo os lábios e mordendo o meu lábio inferior.
    
Não queria ser maldoso, ou tratá-lo com tanto desdém. Só queria que fosse embora.
     
ㅡ Tem certeza? ㅡ Agora foi Matthew quem perguntou, ficando logo atrás de Timothée, me vendo de relance.
     
Eu assenti com a cabeça, mas Matthew não aceitou um "não" como resposta. Empurrou Timothée para o lado, entrando no escorrega vermelho e me puxando pelo pulso. Poderia ser porque eu sou pálido demais, ou porque ele era forte demais, mas minha pele estava ficando vermelha onde sofria o aperto.
     
ㅡ Qual é o seu problema? Só queremos brincar com você ㅡ Resmunguei, tentando me soltar.
     
Era o pior de todos, sempre me provocando, me humilhando e machucando. Já chegou a me fazer tremer de ansiedade em uma aula de educação física ㅡ tentavam acertar a bola na minha cara.
     
ㅡ Deixa ele, Matthew ㅡ Disse Timothée. Ao ver que ele não me soltou, correu atrás de algum professor.
     
ㅡ Está sempre querendo chamar atenção, é patético ㅡ Matthew, vendo que eu não expressava mais reação alguma, irritou-se, empurrando-me forte e me derrubando no chão.
     
Eu levantei, sentindo minha visão turva (provavelmente por estar a algum tempo sem comer algo) e me aproximei dele, segurando-o pela gola da camisa e batendo forte em seu rosto.
     
Não queria machucá-lo, talvez só assustá-lo. Queria poder comer em algum lugar que não fosse o canto frio embaixo das escadas. Queria, por um dia, não ter medo de ir ao banheiro e encontrá-lo lá, com os amigos.
     
ㅡ Me deixa em paz ㅡ Senti meus olhos encherem de água e minhas mãos começarem a tremelicar. Eu nunca fui forte o suficiente para encarar brigas, ou qualquer outra coisa além do peso dos meus pensamentos.
     
ㅡ Agora você vai chorar? ㅡ Matthew levantou, limpando o sangue que manchava o canto de sua boca com as costas de sua mão ㅡ É por isso que você não tem amigos. Sua mãe deve ter ido embora por sua causa.
     
ㅡ Cala a boca! ㅡ Eu disse, um pouco mais alto, secando as lágrimas. Tocar no assunto da minha mãe sempre foi muito delicado para mim.
     
Ela nos deixou, a mim e a minha irmã. A ponte é o único lugar em que eu ainda consigo lembrar dela com uma clareza que me causa arrepios. Eu nunca soube o porquê, e papai não fala disso, na verdade, ele nunca fala sobre nada. 
     
Matthew sorriu de canto, vendo que aquilo me afetava, diferente dos outros xingamentos que já tinha dito.
     
ㅡ Não pode pedir ajuda para a mamãe, né?
     
Continuou, aproximando-se de mim cada vez mais e perfurando a zona de segurança imaginária que sempre existiu em minha volta.
     
ㅡ Ela conseguia olhar para um monstro como você? ㅡ ele riu em escárnio.
     
Eu o empurrei, fazendo-o cair no chão, para então bater em seu rosto novamente, até que o professor chegasse para nos separar.
     
Fui parar na diretoria pela primeira vez. Minha irmã foi chamada e, a seu pedido, fui liberado mais cedo para voltar sozinho para casa. Eu tinha doze anos de idade. 
     
O trem que eu pegava todos os dias só passava às sete da noite, e ainda eram quatro da tarde. Por morar no interior de Birmingham (tão longe do centro que haviam até florestas em volta da casa), poucos passavam por lá.
     
Eram três. Esse das sete, outro às duas ㅡ que já tinha passado ㅡ e um às cinco. Se pegasse esse último, daria para ir para casa a pé, mas andava lotado ㅡ me recusei a pegá-lo, de nada valia provocar o meu pânico para voltar mais cedo.
     
Pessoas me tocando sem querer e trombando em mim, ficando próximas demais. O pouco espaço, a conversa alta e a quantidade de gente. Tudo me enlouquecia como nada mais era capaz. Liguei para minha irmã do orelhão, dizendo que chegaria no horário de sempre. Tudo isso para pegar o trem vazio.
     
Não queria fazer Olívia deixar seu trabalho para vir até aqui me buscar. Também não queria deixá-la preocupada. Eu era um fardo em sua vida e ela era, para mim, a única família que me restava.
     
Naquela noite, cheguei antes da minha irmã. Deitei a cabeça no travesseiro, após tomar uma xícara de chá de limão e framboesa, e desejei que a estrela cadente me levasse com ela para a lua. Assim Olívia não iria se preocupar comigo, nunca mais.
     
Mas eu acordei.
     
Enfim, descobri que a floresta era um bom lugar para ficar aos dezesseis anos de idade. Era perto de casa, longe de Matthew, da escola e longe das minhas memórias. No meio do mato e em cima da ponte de madeira era apenas eu, o som da minha respiração e das águas do rio e as páginas do livro.
     
Gostava de me sentir em paz. De ouvir os sons dos pássaros. De não sentir meu corpo tremer de medo, ou sentir que tudo estava prestes a desmoronar em cima de mim. Isso me fazia agradecer à estrela por não ter me levado.
     
Eu estava sempre à procura de um pedaço de terra firme que pudesse parar o velejar de meu barco incerto.
     
Foi Jimin a única pessoa que ultrapassou minha barreira protetora sem me deixar em pânico. O garoto loiro que usava roupas largas e presilhas me trouxe um porto para parar o meu barco.
    
ㅡ Por que você está sozinho de novo? ㅡ Disse Jimin, sentado ao meu lado na ponte.
     
ㅡ Não gosto de ficar perto de outras pessoas ㅡ Respondi, olhando para seus olhos.
     
ㅡ Mas você está perto de mim… E eu sou uma pessoa ㅡ Dei risada.
    
ㅡ Você é diferente, Park. Eu não quero esquecer você. Mas quero esquecer todo o resto.
     
ㅡ O que há? Você parece triste ㅡ Fez bico, virando de lado, para que pudesse olhar com clareza para mim.
     
ㅡ Ontem foi meu aniversário, e meu pai me mandou o mesmo cartão que manda todos os anos. Não vi Olívia desde que o relógio bateu meia noite, mas não é culpa dela, deve estar ocupada ㅡ Eu não sentia mágoa, na verdade, tentava me convencer de que não sentia nada.

Mas todos sabemos que eu sentia, e muito.
     
Jimin me abraçou. E eu não quis soltá-lo.
     
Queria permanecer ali, ao lado dele, por muito tempo. Eu não me sentia incomodado. Não queria fugir. Não queria evitar situações em que Jimin poderia me abraçar, pelo contrário, queria senti-lo em meus braços mais e mais, cada vez mais. Quando ele não estava comigo, eu sentia falta, tinha saudade a todo instante. 
     
ㅡ Eu devia ir para a escola hoje, mas não quero, odeio ㅡ Abracei Jimin apertado, escondendo meu rosto.
     
Após alguns minutos sem nenhum de nós dizer nada, ele se afastou, entrelaçando nossas mãos.
     
ㅡ Você deveria vir comigo. O meu mundo é bonito ㅡ Sorriu, referindo-se a Tarpe.
     
Falou muito de seu mundo. De como as comemorações das fadas pareciam ter saído de, bom, de um conto de fadas. Dos dragões, dos castelos, das Cortes. Falou sobre os cogumelos e as borboletas de todas as cores, do rio que trocava de lugar. 
     
E eu aceitei, porque acreditava nele. Porque estava apaixonado. Jimin me mostrou sua casa porque confiava em mim, porque queria me ver feliz, assim como ele era.
    
Jimin me amava, me ama, com todo o seu coração. E durante dias, eu nunca me senti tão feliz. 
     
Até ele ficar cada vez mais distante quando comecei a esquecer da minha vida no Alabama. Não sabia onde morava, onde estudava, quem eram meus pais, se eu tinha irmãos… Tudo se perdia aos poucos. E até os dias em que o conheci estavam virando borrões.
     
Eu só queria passar mais tempo com ele, porque eu sabia que aquilo era o bastante para que eu não entrasse em crise enquanto pensava que me perderia de mim para sempre. Jimin nunca estava em casa, sempre com Alice ou Vrai Moi, correndo de um canto a outro.
     
Talvez o medo dele de ser esquecido fosse maior que o medo de me perder. Talvez ele se importasse mais com o que eu guardava do que com o que estava me tornando. Talvez, o que preenchia minha memória significasse mais para ele do que eu.
     
Ele me disse que via sentimentos pelas cores dos olhos, e que podia saber o que eu sentia apenas pela coloração da íris. Sua maior dor foi ver os meus olhos esverdeados outra vez. A cor da tristeza.
     
Quando Jimin começou a passar noites acordado fazendo pesquisas para me ajudar, decidi que nunca mais falaria sobre meus sentimentos para ele, porque isso estava o matando. A angústia estava o matando. A dor que eu trouxe estava o matando. Eu fui ficando, aos poucos, sozinho, como sempre quis ㅡ essa ideia, antes reconfortante, passou a me dar ânsia. 
     
Jimin passou a me ver, mas não me enxergava. Ele estava obcecado demais com o que eu não podia lembrar do Alabama. Tudo o que envolvia Jimin passou a machucar o meu peito, ardia e doía como se o meu corpo estivesse socando na minha cara o quão errado eu estava.
     
Doía não só pelas minhas memórias boas de meu sentimento de saudade sendo preenchido pelo sorriso dele, mas doía principalmente por eu ter deixado o meu silêncio ser uma solução. Eu deixei isso acontecer. Eu deixei que Jimin carregasse tudo sozinho e, no fim, eu o perdi. Nós dois nos perdemos.
     
ㅡ Estou cansado, por favor, para
     
ㅡ Essa fruta pode ajudá-lo, me deixe tentar
    
ㅡ Isso é veneno, eu vou morrer. Às vezes, é você quem esquece da minha natureza. Eu sou humano e mortal! Para com tudo isso antes que seja tarde.
     
ㅡ Eu quero ajudar!
     
ㅡ O silêncio entre nós está me matando mais do que qualquer outra coisa. Já parou para pensar que talvez eu queira me esquecer? Que talvez esteja gostando da magia de Tarpe? Nem todo mundo tem medo de ser esquecido como você. Pare, por favor, você está me sufocando ㅡ Com palavras duras, eu menti para ele. Eu menti como se fosse a verdade mais inquestionável dentro de mim. Olhando nos olhos dele, eu menti, e Jimin não viu a cor da minha mentira escorrendo pelos meus olhos.
     
Desde aquela noite, Jimin se acalmou por um tempo e passou a contar para mim nossas histórias, desde a primeira vez que me viu embaixo da árvore. 
     
Foram os melhores momentos que passamos juntos. Ali eu sentia as suas mãos enrolando os fios do meu cabelo enquanto dizia o quão apaixonado ficava quando eu falava sobre livros de fantasia mortais.
     
Todas as noites eu sorria, lembrando-me dos borrões, mas sempre soube que não duraria para sempre. Me forçava a dormir.
     
Na manhã seguinte eu fazia o café e tentava me lembrar de minha família, mas não conseguia. Na outra, tentei lembrar para onde ia no trem, e nada vinha. Depois, o escorrega, Matthew e Timothée. Nada.
     
Não contei para Jimin.
     
A escuridão da noite tomava o céu, e nós continuávamos com as nossas tentativas de sustentar um amor sincero em cima de mentiras. Eu dizia que não estava me esquecendo, e ele que não estava procurando uma cura. Eu dormia sem me lembrar da minha casa, e ele corria até Vrai Moi.
    
Tudo mudou quando eu não me lembrei da história. Não me lembrei da ponte, ou da árvore, ou da floresta. Não me lembrei das minhas lágrimas, de minha história. Dos meus livros favoritos, do meu walkman antigo ou das fitas cassetes perdidas que eu tanto adorava. Me esqueci do sentimento de ter Jimin me abraçando com tanto carinho quando eu nunca havia sentido nada igual.
     
Não me lembrei de tê-lo conhecido antes de Tarpe. Mas lembrava do depois. Lembrava das noites na floresta, da torta de morango e do cheiro de cravo e pitanga que vinha da cozinha sempre que Jimin errava o tempero. Eu nunca poderia esquecê-lo. Jimin é felicidade, é carinho, é amor e cuidado. Naquele instante, ele parecia ser tudo. Tudo. Menos meu. Tudo. Menos o Jimin que eu costumava conhecer.
     
Sei que o coração dele se quebrou em bilhões de pedaços, porque agora seu medo era real. Ele pensou que eu poderia me esquecer totalmente dele a qualquer instante. Eu não pude tentar convencê-lo do contrário, e Jimin não me ouvia, ele não quis me ouvir. Quando eu finalmente quis falar outra vez, seus ouvidos já não eram capazes de reconhecer a minha voz.
     
Estávamos gelados.

Tempo quente, pessoas frias.
     
ㅡ Eu não me lembro. Mas eu continuo amando você, não é o suficiente? ㅡ choraminguei. Quando tentei alcançá-lo com os dedos, se afastou. 
     
ㅡ Mas… Suas memórias… Elas são importantes. Isso é culpa minha, eu preciso trazê-las de volta. Eu vou trazê-las de volta, eu prometo ㅡ Respondeu e meus dedos se entrelaçaram aos seus.
     
ㅡ Eu amo você, Jimin. Com ou sem as memórias que tanto diz ㅡ Disse, beijando-o nos lábios.
     
ㅡ Eu amo você, Yoongi. Lembre-se de mim ㅡ Sorriu, arrumando os fios do meu cabelo.
     
Dias se passaram, e Jimin continuava indo longe demais. Até o instante em que eu não pude alcançá-lo e trazê-lo de volta.
     
Até o momento em que Tarpe se tornou sombria, e parou de ser o mundo dos sonhos.
     
Vrai Moi pulou na minha frente, antes que as flechas atingissem o meu peito. Eu fui amaldiçoado, e, assim como NamJoon, não consigo me soltar das correntes que me prendem dentro da minha própria cabeça. O gato me mantém aqui, acorrentado, e eu me sinto vazio a todo tempo. Do que adianta estar em um limbo que me torna capaz de me lembrar de meu passado, se eu sou tão insignificante quanto poeira? 

De nada me servem as memórias se elas já não me fazem sentir algo. 

De nada me serve lembrar, se não posso gritar.

De nada me serve lembrar do meu sentimento de saudade sendo preenchido, se eu não posso sentir outra vez.
     
Eu nunca mais pude abraçá-lo.
     
Matou a si mesmo por amor. Assassinou alguém por ele. Arrancou seu coração por ele. E agora sofrerá nas mãos de sua própria sombra. É o que as vozes me dizem todos os dias, me atormentando. Às vezes, elas me fazem chorar. De medo, de culpa e até mesmo de saudade. 

Se tivesse um instrumento, em Tarpe, que me permitisse voltar no tempo, eu não o usaria. Porém, se tivesse um que fosse capaz de me dar mais uma chance a partir daqui, eu o usaria. O usaria para sair da maldição e, pela primeira vez em muito tempo, abraçar Jimin.
     
Nem que seja por mais um dia, mais um segundo.
     
Eu quero ter a chance de fazer tudo diferente, e voltar a perceber que o amor não foi feito para doer.
     
Hoje, me arrependo. Muito. Eternamente.
     
Me desculpe, Jimin, me desculpe.

המשך קריאה

You'll Also Like

287K 13.8K 64
• Onde Luíza Wiser acaba se envolvendo com os jogadores do seu time do coração. • Onde Richard Ríos se apaixona pela menina que acabou esbarrando e...
74.5K 12.2K 32
Havia algo de muito estranho no ano de 1969. Não eram os foguetes sendo lançados no espaço, nem o fim dos Beatles e muito menos o modo de vida dos hi...
421K 42.6K 47
O que pode dar errado quando você entra em um relacionamento falso com uma pessoa que te odeia? E o que acontece quando uma aranha radioativa te pica...
1.8K 157 17
Bom...a um tempo jeon(omega) estava namorado Taehyung(alfa) porém a relação dos dois não era uma das melhores estava mais para a pior, Taehyung gosta...