Camila encara o teto escuro, escutando o som da respiração suave de Lauren, que estava deitada na cama do outro lado do quarto. Chega a ser um insulto. Lauren está tão perto e ao mesmo tempo tão longe.
Camila não faz ideia de que horas sejam e ela não consegue virar a cabeça para verificar no relógio. Que diferença faria? Ela não vai conseguir dormir por um bom tempo mesmo.
Lauren terminou com ela hoje mais cedo e a conversa que as duas tiveram está se repetindo em sua cabeça desde então. Ela perdeu Lauren e é tudo culpa dela. Se ela não tivesse afastado a mais velha e não tivesse lhe dito o que disse, talvez Lauren estivesse dormindo em seus braços essa noite.
Camila sabia que o relacionamento delas estava indo de mal a pior e que elas estavam perdendo uma à outra, mas o término acontecer de verdade dói tanto que está ficando difícil de respirar. Ela acabou de ganhar Lauren e já a perdeu. Camila tem muitos arrependimentos na vida, mas esse com certeza é o maior de todos.
E embora não estar mais com Lauren quase a mate, ela entende completamente o motivo por trás disso. Camila ama Lauren com todas as suas forças e só quer o melhor para ela, mesmo que isso signifique ter que sair da vida da mais velha.
Camila estava pronta e disposta a lutar por Lauren a noite inteira se fosse preciso. Ela estava preparada para rebater tudo que Lauren dissesse, mas ao mesmo tempo, tudo que Lauren estava dizendo era verdade. Elas não estavam felizes, o relacionamento delas não era saudável e permanecer juntas só causaria mais estrago. Por mais estranho que possa parecer, terminar talvez tenha sido a melhor coisa que já aconteceu com elas.
Mas certamente não é isso que parece.
Camila fecha os olhos com força e joga o cobertor sobre a cabeça, frustrada. Ela se odeia por não conseguir ser o que é melhor para Lauren. Isso não faz o menor sentido. Ela garante que não há ninguém no mundo que ame Lauren mais do que ela e nem isso é suficiente. Ela precisa lidar com suas batalhas internas antes de tentar consertar seu relacionamento com Lauren. Mas é mais fácil falar do que fazer, caso contrário, isso já teria acontecido.
Agora Camila também entende que não está pronta para estar em um relacionamento. Se ela não consegue aceitar a própria orientação sexual, então não tem como aceitar Lauren e isso não é justo com ela. Lauren merece mais e, infelizmente, Camila não se enquadra nessa categoria.
A mais velha se vira na cama de repente e Camila puxa o cobertor para olhar para ela. Ela está dormindo, mas seus braços estão abraçando o próprio corpo e Camila pode jurar que consegue vê-la tremendo.
Sem nem pensar, Camila pega seu cobertor e dá alguns passos em direção à cama de Lauren, colocando o cobertor sobre ela e puxando-o até o seu pescoço. Camila perdeu as contas de quantas vezes fez isso pela outra garota. É quase que por instinto.
O jeito que Lauren está posicionada permite que a luz fraca da lua que entra pela janela ilumine seu rosto calmo e adormecido. As pálpebras fechadas, os lábios carnudos, o contorno de seu nariz, o cabelo bagunçado, a respiração constante deixando o seu corpo. Camila não a via tão relaxada assim fazia semanas e uma pontada de culpa lhe atinge, sabendo que é por causa do estresse e da dor que ela mesma causou.
Para alguém que dizia que a amava, Camila a machucou sem dó nem piedade. E agora o carma a levou embora.
"Me desculpa." Camila sussurra tristemente para ela, apesar de Lauren ainda estar dormindo pesado. "Me desculpa por tudo que eu te fiz passar."
E ao olhar para ela uma última vez, Camila se vira e deita novamente em sua cama, sentindo-se triste demais para enxugar as lágrimas escorrendo pelo canto de seus olhos. Em um certo momento, ela adormece ao som da respiração ritmada de Lauren, que é algo que ela sempre esteve acostumada a fazer.
Ao menos uma coisa vai permanecer a mesma.
• • •
"Você está bem, Laur?"
Lauren ergue a cabeça ao ouvir a voz carinhosa de Dinah. "O quê?" Ela pergunta sem fazer ideia do que está acontecendo.
"Eu perguntei se você está bem." Dinah repete, franzindo o cenho. "Você só ficou olhando pras suas mãos e está estranhamente quieta o tempo todo."
Lauren suspira pesadamente ao passar os dedos pelo cabelo. Ela pediu para almoçar com Dinah hoje para ver se conseguia tirar Camila da cabeça, mas claramente não está funcionando. Mesmo com toda a movimentação das pessoas ao redor e o burburinho de suas conversas, a única coisa em que a cabeça de Lauren consegue pensar é Camila.
"Eu sinto muito mesmo, Dinah." Lauren se desculpa, colocando uma mão no pulso da mais alta. "Não era a minha intenção te chamar só pra ficar agindo estranho e te ignorar."
Dinah cobre a mão de Lauren com a sua e sorri de maneira tranquilizadora. "Não, não se desculpe. Está tudo bem. Acredito que algo esteja te incomodando, estou certa? Quer conversar a respeito?"
"Qual o sentindo em conversar?" Lauren murmura, segurando o canudo entre o polegar e o indicador, mexendo sua bebida e vendo os cubos de gelo mudarem de lugar. "Só vai tornar tudo mais real se eu disser em voz alta."
Dinah levanta do lugar repentinamente e dá a volta na mesa, sentando-se ao lado de sua amiga e virando todo o corpo em sua direção. "Ok, agora você está começando a me deixar preocupada." Ela diz com a voz baixa e séria, franzindo as sobrancelhas em preocupação. "Você sabe que não tem que me contar se não quiser, mas o que aconteceu? Você está bem?"
Lauren olha para as pessoas ao redor das duas. Ninguém está prestando atenção nelas, o que é uma coisa boa porque ela sente como se pudesse surtar e começar a chorar a qualquer momento, mas ao mesmo tempo, os sorrisos nos rostos das outras pessoas parecem lhe provocar. Ela está sentada aqui, mais triste do que nunca, e todo mundo ao redor dela parece estar vivendo o melhor momento de suas vidas. Ela sabe que está sendo estúpida por pensar assim, mas chega a ser injusto.
Dinah ainda está olhando para ela em expectativa, esperando por sua resposta. Não há razão para esconder. Lauren não pode esconder isso das garotas e de Dylan para sempre.
Então ela respira fundo e admite, não apenas para Dinah, mas também para si mesma. "Camila e eu terminamos ontem à noite."
O queixo de Dinah cai em choque e ela arfa. Mas então ela se recompõe e se inclina para abraçar Lauren, seu corpo quente causando uma sensação de extremo conforto na de olhos verdes. Lauren relaxa no abraço de sua amiga, permitindo-se aproveitar a sensação de consolo. Ela vem se sentindo muito sozinha nessas últimas semanas, mas hoje mais ainda.
Lauren pisca para afastar as lágrimas que começam a se formar rapidamente em seus olhos. Por alguma razão, sempre quando ela é abraçada ou confortada e está à beira das lágrimas, ela começa a chorar como se não houvesse amanhã. Ela pensou que tinha chorado tudo que tinha para chorar ontem, mas é bastante claro que a tristeza não conhece limites.
"Eu lamento ouvir isso." Dinah murmura sincera ao se afastar, mas deixando uma mão sobre o seu ombro. "Você... Você quer sair daqui e conversar ou algo assim?"
Porém Lauren não tem a chance de responder antes de Dinah agarrar sua mão e a arrastar para fora do restaurante, seu braço firme ao redor do ombro de Lauren de maneira protetora. Ela deve ter notado que a mais velha estava prestes a chorar.
Dinah pega suas chaves e aperta para destravar seu carro antes de entrar e sentar no banco de trás, trazendo Lauren consigo. Então a mais alta puxa a cabeça de Lauren para descansar em seu peito e segura seu corpo, passando calor para ela.
Lauren solta uma respiração trêmula e fecha seus olhos repletos de lágrimas, aconchegando-se à Dinah. Palavras não são capazes de descrever o quanto ela se sente grata por sua amiga nesse momento.
"Só se passaram doze horas e eu já sinto muita falta dela." Lauren expressa baixinho, a voz vacilando. "Só de saber que nós não estamos mais juntas me mata porque ela é a única pessoa que eu quero. Eu nunca senti algo tão forte e tão profundo por outra pessoa assim antes, mas eu só... Eu tive que deixar ela ir."
Dinah passa os dedos pelo cabelo de Lauren em um ritmo lento e constante. "Posso perguntar por que vocês terminaram? Tem algo a ver com ela se assumindo pra faculdade inteira algumas semanas atrás? Porque eu vi que ela estava passando por uma certa dificuldade depois daquilo."
Lauren acena com a cabeça em confirmação. "Foi exatamente por isso que nós terminamos. Ela me culpou por aquilo. Ela disse que..." Lauren fecha os olhos quando sua mente volta para a dolorosa lembrança. Ela consegue sentir seu coração doendo fisicamente. "Ela disse que, hum, que se apaixonar por mim foi a pior coisa que já tinha acontecido com ela."
Dinah fica tensa, mas apenas por um segundo. Ela limpa a garganta, como se estivesse espantando as palavras que queria dizer originalmente.
"Ela nunca deveria ter dito isso." Dinah afirma com severidade. "E pra ser bem sincera, eu estou muito chateada com a Camila por ela pensar desse jeito."
"Eu sei." Lauren funga, aumentando o aperto ao redor do tronco de Dinah. "Eu nunca me senti tão magoada na vida quando ela disse isso pra mim e foi isso que me forçou a terminar tudo. As coisas só estavam indo de mal a pior. Nada entre nós era mais a mesma coisa e é tudo culpa minha. Nós terminamos semanas atrás. Noite passada eu só tornei as coisas oficiais."
"Não, Lauren, você não pode se culpar por isso." Dinah a repreende levemente. "Nada disso foi culpa sua. Ela luta muito com a própria sexualidade, mesmo depois de não ter nada a esconder. Parece que ela não consegue se aceitar completamente, mas você tem que entender que nada disso tem a ver com você. Você nunca pediu por isso. Você nunca quis que ela lutasse tanto contra quem ela é. Tudo que você fez foi amá-la."
"Não foi o suficiente." Lauren murmura. "Você pode amar uma pessoa o quanto quiser, mas no final das contas, ela tem que aprender a se amar também."
Dinah solta um pequeno suspiro ao apoiar o queixo no topo da cabeça de sua amiga. "Eu concordo. E ela vai superar isso. Logo ela vai se dar conta de que você é muito mais importante que os pensamentos insignificantes das outras pessoas e vai perceber que o mesmo vale para ela mesma."
"Mas aí é que tá." Lauren começa. "Ninguém se importa com o fato dela ser lésbica. Só aquela Alexus, por exemplo, que é uma homofóbica idiota. Ela é a única que pega no pé da Camila. Ninguém mais parece se importar com isso. Eu a vejo andando por aí de cabeça baixa como se estivesse sempre com medo."
"Ela está paranoica." Dinah diz. "Eu sei que ninguém se importa, mas a Camila acha que sim. Ela acha que as pessoas falam dela e olham pra ela onde quer que ela vá, mas esse não é o caso. Ela só está assustada com a situação toda, sabe? Não é uma coisa fácil se aceitar às vezes, depende muito de como você foi criado e tal. Alguma coisa aconteceu quando ela era mais nova? Tipo... Como são os pais dela?"
Lauren para por um segundo para ponderar sobre a pergunta de Dinah e se dá conta de que não faz a mínima ideia. "Parando pra pensar nisso, de todos esses meses que eu a conheço, eu nunca a ouvi falar uma palavra sequer sobre os seus pais. Eu conversei com ela sobre a minha família e algumas vezes ela estava no quarto quando eu ligava pra eles, mas ela nunca me disse nada sobre a família dela." Lauren se ajeita no banco e franze as sobrancelhas em concentração. "Eu literalmente não sei nada sobre o passado dela."
Ela vira a cabeça na direção de Dinah, que está franzindo levemente o cenho. "E eu acho que tem uma razão pra isso."
Lauren comprime os lábios. E se Camila tiver sido criada em um ambiente que a forçou a pensar que ser gay, lésbica, bissexual ou transexual era uma coisa ruim? Ela não estaria tão receosa e envergonhada assim se nunca tivesse tido algum tipo de experiência negativa antes.
A de olhos verdes trava a mandíbula, sentindo-se com mais raiva a cada segundo que passa. Quem foram os babacas que a fizeram pensar que há um jeito errado de amar alguém? Que não é certo amar alguém do mesmo gênero que o seu? Quem a ensinou que é tão errado ser quem ela é?
"Meu Deus, eu odeio me sentir tão impotente." Lauren diz entre dentes, frustrada, desferindo tapas no banco do passageiro. "Eu disse pra ela que sempre a protegeria, mas como eu posso protegê-la de si mesma?"
"Eu sei que isso não é o que você quer ouvir." Dinah suspira. "Mas você não pode. Eu sei que você quer protegê-la porque você a ama, mas há certas coisas que estão fora do seu controle, Lauren. Tudo que você pode fazer é... Garantir que ela saiba que você está do lado dela. Ela vai precisar de alguém que esteja do lado dela."
Lauren vira a cabeça para olhar para Dinah. "Será que eu tornei as coisas piores pra ela ao terminar com ela?" A mais velha pergunta com curiosidade. "Ela provavelmente acha que eu desisti dela e a abandonei quando na realidade essa nunca foi a minha intenção. Eu digo pra ela que a amo em um segundo... Então termino com ela e vou embora no outro."
Dinah pensa sobre a pergunta de Lauren por um momento. Então simplesmente balança a cabeça. "Não. Você não teria terminado com ela se não achasse que devia. Talvez não fique muito claro nesse momento, mas foi o melhor a se fazer. Ela precisa disso e você fez a coisa certa. Ela sabe que você a ama. Terminar com alguém nem sempre significa que você não se importa mais. Em certas ocasiões, só mostra que você se importa e muito."
Lauren assente, entendendo perfeitamente as palavras de sua amiga. Ela terminou com Camila porque estava colocando-a em primeiro lugar. O relacionamento delas estava afetando Camila de um jeito ruim e Lauren pôs um freio nisso. Talvez a mais nova não entenda isso agora porque a própria Lauren não entende completamente, mas esse término talvez seja a salvação das duas.
Ela se inclina na direção de Dinah e a abraça ao redor dos ombros, agradecida. "Obrigada por isso, de verdade." Lauren murmura sincera. "Eu amo você."
"Eu também amo você, Lauren." Dinah responde com reciprocidade, um sorriso presente em sua voz. "Eu sinto muito que isso tenha que ter acontecido. O vínculo que vocês duas têm é muito forte. Como ela está lidando com tudo, a propósito? Ela está bem?"
Lauren se afasta do abraço, mas não sem antes dar um beijo rápido na lateral da cabeça da mais alta. Então ela puxa os joelhos até o peito e apoia a cabeça na porta do carro, de frente para sua amiga.
"Eu não sei, pra falar a verdade." Ela suspira. "Camila saiu do quarto hoje de manhã antes de eu acordar, então eu nem cheguei a vê-la. Mas eu acordei com o cobertor dela em cima de mim e ele não estava lá quando eu fui dormir, então foi ela que me cobriu no meio da noite."
"Isso é um bom sinal. Digo, ela ainda se importa com você e não está brava ou magoada, creio eu. Talvez ela esteja se sentindo do mesmo jeito que você."
Lauren balança a cabeça, não querendo mais conversar sobre esse assunto. Se Camila sente metade do que ela está sentindo, então ela não quer nem imaginar.
"Ei, desculpa pela minha falta de ânimo essa manhã. Eu me sinto melhor agora, obrigada." Lauren sorri para a amiga. "Mas vamos falar sobre coisas mais alegres agora. Como vão as coisas entre você e a Mani?"
Dinah e Lauren se sentaram nos bancos da frente do carro e Lauren ouviu a mais nova não calar a boca sobre Normani durante toda a viagem de volta para o campus, não se sentindo desconsolada ou até mesmo com inveja do relacionamento das duas. Na verdade, isso lhe deu esperança.
"Incríveis." Dinah sorri, as duas mãos no volante enquanto seus olhos prestam total atenção na estrada à sua frente. "Ela passou a noite de ontem no meu quarto e a gente só ficou conversando deitadas na cama por um tempo e eu achei que ela tinha dormindo uma hora, mas aí eu senti ela beijando meu pescoço e então..." Dinah para de falar por um momento por conta de suas bochechas que estavam doloridas de tanto sorrir. "Então ela sussurrou que me amava logo antes de cair no sono."
Lauren dá uma leve surtada e agora são as suas bochechas que estão doídas de tanto sorrir. Ouvir e ver Dinah agir desse jeito com relação a Normani é a coisa mais adorável que ela já testemunhou.
"Eu demorei um tempinho pra responder." Ela continua. "Não porque eu estava pensando sobre isso ou porque tinha dúvidas, mas porque eu não conseguia acreditar que ela se sentia desse jeito com relação a mim. Porra, eu ainda não consigo acreditar que ela é minha namorada. Eu acabei dizendo que a amava também, mas ela não estava acordada pra ouvir. Mas tudo bem." Dinah sorri orgulhosa. "Eu ainda posso dizer várias e várias vezes."
A pequena história de Dinah fez Lauren se esquecer por um momento da situação que estava vivendo com Camila e ela acabou sorrindo pela primeira vez em semanas. Ela passou muito tempo se lamentando por Camila que tinha esquecido como era rir e aproveitar a companhia de um outro alguém. Graças a Deus Dinah existe.
Elas chegam no campus logo depois e a mais velha dá um último abraço em sua amiga antes de elas pegarem o caminho para os seus respectivos dormitórios. No caminho, Lauren vê Dylan e Ally de mãos dadas a uma certa distância e sorri para si mesma. Pelo menos aqueles dois não precisam mais esconder o que sentem um pelo outro.
Lauren para diante da porta de seu quarto, hesitando por um momento. Ela olha para o relógio em seu pulso e calcula que todas as aulas de Camila já devem ter acabado, então a mais nova deve estar dentro do quarto.
A de olhos verdes morde o lábio inferior, pensando se deve ou não entrar. Ela não vê ou fala com Camila desde a noite passada e não tem certeza se Camila gostaria de estar no mesmo cômodo que ela nesse momento. Ela deveria ir para outro lugar?
Mas então ela balança a cabeça, desistindo da ideia. Que estupidez. Elas são colegas de quarto, pelo amor de Deus. Ela achou mesmo que as duas iriam conseguir se evitar pelo resto da faculdade? Elas são adultas civilizadas e completamente capazes de lidar com essa situação com maturidade.
Então Lauren destranca a porta e adentra o quarto. Mas no momento em que põe o pé para dentro do quarto, ela deseja não ter entrado.
Ela vê Camila sentada na beira da cama, no meio do processo de enxugar suas lágrimas. A mais nova tentava claramente esconder o fato de que estava chorando, o que não funcionou como o esperado.
Lauren dá passos lentos e hesitantes enquanto a observa, franzindo o cenho. Ela para a apenas alguns metros de Camila e suas mãos estão praticamente coçando para fazerem alguma coisa. Mas ela não pode. Então ela fica ali parada sem jeito, sentindo-se culpada e um tanto perdida.
Camila funga, usando as mangas de sua camiseta para secar os olhos. "Desculpa." Ela murmura baixinho. "Eu não sabia que você iria estar aqui."
"Eu-eu posso te deixar sozinha se você quiser-"
"Não." Camila balança a cabeça, interrompendo-a e rejeitando a ideia. "Não. Não, esse é o seu quarto também. Eu só... Eu tive um dia ruim."
Por Deus, se Lauren tivesse um pouco menos de força de vontade, ela teria envolvido Camila em um abraço no mesmo instante.
Lauren é o tipo de pessoa que consegue consolar melhor as pessoas através de carinho. Palavras nem sempre surgem para ela com facilidade nesse tipo de situação, e, às vezes, palavras não são suficientes. Então ela simplesmente abraçaria quem precisasse. Porém considerando a condição em que as duas se encontram no momento, seria estranho e apenas confundiria as coisas.
"Hum..." Lauren murmura, pensando no que fazer. Ela precisa fazer alguma coisa. Então seus olhos caem sobre sua cama, especificamente sobre seu cobertor preto e branco. Ela o tem desde que era um bebê e é a coisa mais macia e confortável que ela tem. Ela não consegue nem começar a contar quantas vezes se enrolou nele sempre que se sentia triste.
Noite passada foi um belo exemplo.
Então a mais velha pega o cobertor de sua cama e o enrola ao redor dos ombros de Camila com cuidado. A de olhos castanhos olha para o seu rosto e lhe dá um sorriso delicado e genuíno. "Obrigada, Lauren." Ela diz com a voz mansa, puxando o cobertor para si.
A mais velha sorri para ela em resposta, os olhos das duas nunca quebrando o contato visual. "Eu não sei se já te disse isso, mas eu tenho esse cobertor desde que eu nasci." Lauren explica, sentando-se em sua cama. "Eu lembro quando eu pensava que ele era a maior coisa do mundo, mas agora ele mal cobre minhas pernas."
"Nossa, dezoito anos?"
Lauren assente orgulhosamente.
Camila dá uma risadinha e o som doce é algo que Lauren não ouvia há mais de duas semanas. Ela temia que nunca mais fosse ouvir esse som novamente. "Conhecendo você, eu fico surpresa por você não ter perdido ele." A mais nova provoca. "Você não consegue passar mais que algumas horas sem perder uma caneta e vir atrás de mim pra pedir outra emprestada."
Lauren revira os olhos de brincadeira. "Tá, mas perder uma caneta é diferente. Essas coisinhas provavelmente saem do quarto por conta própria porque elas literalmente somem."
"Ou você que é boa em perder as coisas." Camila diz e coloca a língua para fora.
"Você não tem moral nenhuma pra falar." A de olhos verdes ri. "Preciso te lembrar quantas vezes você teve que me ligar pra eu vir abrir a porta porque você tinha esquecido a chave?"
Camila pisca algumas vezes, suas bochechas corando ao mesmo tempo em que instintivamente ela leva a mão até o colar em seu pescoço. Lauren observa a mão dela tocando o pingente em forma de coração e suas bochechas ficam tão vermelhas quanto as de Camila.
"Ai, desculpa. Eu-eu não..." Lauren tropeça nas palavras. Ela não sabe ao certo o que estava tentando dizer aqui. Ela sente que deve se desculpar por trazer esse assunto à tona, já que fazer Camila relembrar dessas coisas não era a sua intenção.
"Não, não. Está tudo bem." Camila diz tristemente com um sorriso amarelo, derrubando a mão e o olhar para o próprio colo. "Mas acho que vou, hum... Eu vou sair pra correr ou algo assim." Lauren faz uma careta ao ver Camila se levantar da cama, tirando o cobertor de seus ombros e devolvendo-o para ela. "Te vejo à noite."
A mais velha abre a boca para dizer alguma coisa, mas as palavras parecem lhe fugir. Então ela apenas observa em silêncio Camila reunir algumas roupas e um tênis, colocá-los em sua mochila e sair pela porta.
Lauren solta murmúrios tristes assim que a porta se fecha. Ela coloca as mãos na testa e fecha os olhos com força. Por que tudo tem que ser tão complicado? Ela não está culpando Camila. Nunca culpou, aliás. Não é culpa dela ser tão insegura e ter tanto medo. Lauren está puta com o mundo por fazer pessoas sentirem medo e às vezes vergonha de ser quem são.
Mas será que Camila vai conseguir ser completamente feliz consigo mesma algum dia? Lauren fica aterrorizada só de pensar na mais nova nunca se sentindo segura ou contente porque ela merece isso demais. Ela merece ser feliz. Não há muitas coisas que machucam mais do que ver alguém que você ama se sentir tão triste que seu peito chega a doer e você precisa chorar até pegar no sono. Essas últimas semanas foram um inferno. Lauren só espera que, ao terminar tudo entre as duas, ela não tenha piorado as coisas.
Mas as brincadeirinhas que elas trocaram há pouco foi a conversa mais amigável que tiveram em um bom tempo. Não teve lágrimas nem gritos, mas sim sorrisos tímidos e provocações, assim como as coisas eram antes de elas começarem a namorar. Tudo isso fez Lauren lembrar do que elas tinham e a fez ter a certeza de que tudo ainda está ali, dentro delas. Talvez isso seja o que elas precisavam.
Lauren não quer superar Camila em nenhum aspecto. Ela não quer nem pensar em tentar sair com outra pessoa porque simplesmente não há como esquecer da mais nova em um piscar de olhos. Lauren recorda de Camila lhe falando que, embora as duas não estejam mais juntas, ela será para sempre sua.
Bem, Lauren pode dizer a mesma coisa.