Babá por Acidente

By brunakubik

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Dizem que nada está tão ruim que não possa piorar, certo? Certíssimo! A conquista do mestrado na área dos son... More

Prólogo
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
Capítulo 20
Epílogo
Extra - Birthday Cake
Extra - Casados por Acidente

Capítulo 19

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By brunakubik

Talvez ela estivesse mais bela do que ele se lembrava. Talvez ela continuasse a mesma e a distância e o tempo que ficaram sem se ver que pregava peças em sua mente. Ou talvez fosse o simples fato de que, na última vez em que se viram, ela possuía os olhos inchados e o rosto vermelho e úmido pelo choro incessante. Ou ainda, talvez fosse o fato de que nas últimas vezes ela o olhava com mágoa e dor, enquanto que agora era apenas algo que Jeremy nem mesmo conseguia descrever.

- Charlie! – exclamou ele assim que seu cérebro processou a presença da mulher ali.

Talvez fosse um sonho, considerou ele enquanto se preparava para perguntar o que ela fazia ali. Mas antes que as palavras pudessem se formar e sair por seus lábios, Charlie o surpreendeu, provando que aquilo era completamente real. A mulher eliminou a distância entre eles, entrando na casa e fechando o portão sem nem mesmo pedir licença, então suas mãos tomaram o rosto de Jeremy delicadamente, ela ficou nas pontas dos pés e, quando o ator percebeu, seus lábios estavam sobre os dele. Foi um beijo tímido, calmo e receoso. Um simples tocar de lábios, o suficiente, entretanto, para fazê-los desejar mais. E quando ela ameaçou se afastar e interromper aquele contato, Jeremy reagiu a envolvendo com seus braços e impedindo seu afastamento, aprofundando aquele beijo e eliminando toda e qualquer dúvida do resultado que aquela noite teria.

Apenas se separaram porque precisavam respirar, e mesmo assim se mantiveram perto, com as testas coladas e os rostos separados por ínfimos centímetros. Ela estava ali, em seus braços. Era real, estava acontecendo mesmo. Talvez, afinal, o pedido de Ava havia se concretizado e ela havia trazido Charlie de volta para a vida deles. Jeremy não sabia que podia amar sua filha ainda mais, mas ele viu que era possível e agora sentia uma gratidão sem tamanho em relação a ela.

Sim, ele estava preparado para voltar a sua vida como era antes da chegada de Charlie; ele estava preparado para seguir em frente e tocar sua vida e sua carreira sem a mulher ao seu lado. Ele havia aceitado seu destino e não reclamaria quando ele próprio havia sido o causador de tanta dor e sofrimento. Ele havia aceitado e no dia seguinte viraria uma nova página em sua vida, e aquilo tudo ainda podia acontecer. Mas a próxima página já tinha uma cor diferente, um estilo diferente. Era mais clara, mais ampla e não envolvia apenas ele e sua filha. Não, aquela página era a definição de alegria.

Apesar de relutar muito, Charlie quebrou o contato entre eles. Seus olhos se abriram para focar nela, e Jeremy não conseguia imaginar quando ela estivera tão linda antes. Os olhos dela brilhavam e havia a sombra de um sorriso em seus lábios, apesar de ela estar séria. Charlie parecia ponderar as palavras, o que diria a seguir e Jeremy a esperou pacientemente. Estava frio, mas nenhum dos dois se importava, a presença do outro era suficiente.

- Sabe – começou Charlie, sem ter qualquer consciência do efeito que sua voz provocava em Jeremy – quando eu trabalhei no café eu precisei aprender a ler as pessoas e tenho muito orgulho em dizer que hoje eu posso fazer isso facilmente. Fiz isso com a Ava quando cheguei aqui e até mesmo com você. Mas nos últimos meses eu... Eu não conseguia mais te ler – disse ela. Jeremy a observava em silêncio, levemente confuso com onde ela queria chegar com aquilo. – Eu não sei o que aconteceu com a gente. Nós estávamos bem, tudo estava se encaixando, e então você me afastou. – Aquelas palavras doeram, e não só elas, mas a forma como Charlie parecia machucada. – Na época, quando eu fui embora, eu achei que nós conseguiríamos resolver as coisas entre nós. Achei que você iria me ligar e dizer que gostaria de conversar, mas você estava assustado demais para se abrir comigo, e me deixar entrar de novo em sua vida. – Lágrimas já tomavam todo o rosto de Jeremy e ele não conseguia entender como ela não estava chorando na mesma intensidade que ele, apesar da voz da mulher entregar o nó que devia ter se formado em sua garganta. – Eu queria que você soubesse na época, e quero que perceba agora, que eu não queria, e não quero, nada além de amar você e a Ava com cada pedaço de mim. – E lá estava, afinal, a primeira lágrima caindo, escorrendo lentamente pela bochecha dela. – Eu não vou, e nem quero, machucar você... Vocês.

Uma onda de alívio percorreu o corpo de Jeremy e ele imitou o que ela fizera instantes antes, eliminando a distância entre eles e a abraçando com força. O coração dos dois batendo no mesmo ritmo acelerado, se reconectando como ansiavam há semanas. Charlie levantou o olhar para encontrar o dele, um sorriso trêmulo, mas de pura felicidade, em seus lábios. Ela encarou os lábios do ator e voltou a encontrar os olhos azuis.

- Eu te amo, Jeremy – disse ela num tom baixo, o suficiente para ele ouvir.

- Eu te amo, Charlie – devolveu ele, seu coração parecendo prestes a explodir tamanho foi o sorriso que ela deu antes de envolve-lo e unir novamente seus lábios.

Ela se impulsionou para cima e envolveu a cintura dele com as pernas, sorrindo entre o beijo quando ele a ajudou e lhe deu apoio. Eles estavam juntos novamente e parecia um sonho, mas nenhum dos dois pediria para acordar. Seus corpos estavam colados e seus lábios encaixados perfeitamente, como sempre o fizeram. Um tsunami poderia passar por eles, e os dois nem perceberiam, concentrados demais naquele momento para se importar com qualquer outra coisa. E eles não desperdiçariam aquele momento com amenidades. Haviam perdido muito tempo, e estavam determinados a não fazê-lo mais.

Às cegas, Jeremy entrou na casa, com a mulher ainda em seu colo e se debatendo várias vezes, causando risos nos dois. Pareciam dois adolescentes apaixonados, mas pouco se importavam com aquilo. A única preocupação era não acordar Ava, mas aquilo se mostrava cada vez mais impossível, então Charlie quebrou o beijo e o encarou, logo depois franzindo o cenho ao passar a mão pelo cabelo do ator.

- Você está cheio de glitter – observou ela.

- Você também – disse ele, apontando para o colo dela, que agora estava todo brilhante por ela ter mexido no cabelo dele. – É isso o que acontece quando você deixa sua filha brincar com um pote de glitter perto de você só por ser aniversário dela. – disse ele e Charlie riu.

- Sabe... Tomar um banho é uma ótima forma de se livrar deles.

- É mesmo? – perguntou ele, sorrindo antes de voltar a beijá-la.

Para bom entendedor, meia palavra basta, e Jeremy entendia perfeitamente o que ela implicava. Os dois ignoraram o caos que estava a casa após a festa e seguiram, parcialmente às cegas, até o quarto do ator. Jeremy a puxou para dentro e fechou a porta, logo depois prensando a mulher contra a mesma. Seus lábios não se desgrudavam por mais de dois segundos, transmitindo toda a saudade e desejo que sentiram e reprimiram pelo outro naquele tempo em que ficaram afastados. Charlie desceu as mãos pelos ombros do ator, passando por seu peitoral até chegar à barra da camiseta que ele usava. Suas mãos ainda estavam frias pelo tempo que ela ficara fora da casa reunindo coragem para tocar a campainha, e causou arrepios nele quando ela tocou seu abdômen, sorrindo deliciada quando ele contraiu a barriga com o contraste de temperaturas. Ela sorriu no beijo, sentindo-o morder seu lábio inferior em resposta. Se afastaram o suficiente para que ela tirasse a camiseta dele, fazendo uma leve nuvem de glitter se espalhar pelo quarto, e ele aproveitou para tirar a jaqueta e blusa que ela usava.

Dessa vez, seus lábios decidiram explorar outros cantos do corpo do outro, se deliciando com o sabor da pele do outro, e explorando o que antes conheciam como a palma da própria mão. Fazendo aos tropeços o caminho até o banheiro do ator, e deixando uma trilha com as peças de roupas que aos poucos eram removidas. Uma vez no banheiro, Charlie o puxou até o box, virando o registro enquanto sentia ele espalhando beijos por seu pescoço e continuando até chegar à sua cintura, onde a calça que ela usava começava. Jeremy subiu, espalhando mais beijos, e voltou a unir seus lábios ao dela, desafivelando o cinto de sua própria calça com a ajuda da mulher. Não demorou muito para o banheiro estar completamente tomado pelo vapor da água quente e os dois totalmente nus, com Jeremy novamente a pegando no colo e entrando no box, colocando os dois embaixo da água, onde seus corpos voltaram a se unir como há meses não faziam no auge do amor que sentiam um pelo outro e que agora não ficava mais às escondidas. Era exatamente como eles se lembravam e mais, muito mais. Não havia apenas o amor que reprimiram e que agora estava exposto, mas a saudade, a distância que só fizera aquele desejo todo crescer. E havia a promessa, aquela que ninguém precisava verbalizar para saber que estava ali: agora era para sempre.

Já era tarde da noite, a casa estava em completo silêncio. Charlie e Jeremy não precisavam falar mais nada, apenas sentir a felicidade que transbordava por eles, o calor do corpo um do outro, o toque delicado dele em sua pele, a respiração cadenciada dela em seu peito. Os lábios já doíam pelos sorrisos que deles não saiam, mas nenhum dos dois se importava. O que era uma leve dor comparada àquele torpor de felicidade que os dominava? Estavam onde nunca deveriam ter saído: os braços um do outro.

Mas claro que a realidade tinha outros planos e não demorou muito para eles ouvirem um choro característico vindo do quarto em frente ao de Jeremy. Os dois soltaram um gemido resignado e, muito a contragosto, Charlie saiu de cima do ator, deixando-o se levantar e procurar por uma calça. Quando ele estava prestes a chegar à porta, a mulher o chamou.

- Não diga que estou aqui.

- Mas...

- Por favor – pediu ela, fazendo uma cara que se tornou impossível de levar uma negativa.

Charlie esperou pacientemente enquanto Jeremy ia acalmar a filha, vítima de mais um pesadelo, e que só por um milagre não pediu para ir dormir junto com o pai. Quando o ator voltou ao quarto, meia hora depois, encontrou a cama vazia e franziu o cenho, mas a brisa fria que soprou em seu quarto entregou que ele não alucinara as últimas horas e que sua companhia estava ali ainda. Em frente à janela, envolta no lençol da cama que antes os cobria e tomada pelo brilho da lua. Jeremy aproximou-se lentamente, surpreendendo-a quando seus braços envolveram sua cintura, e ele apoiou o queixo no ombro dela, depositando um beijo no pescoço dela e sorrindo ao ver a pele se arrepiando.

- Ainda não acredito que está aqui, parece um sonho – disse ele baixinho, e logo depois soltando uma exclamação de dor e surpresa quando ela o beliscou.

- Viu, não é sonho.

- Suas unhas nas minhas costas já tinham provado isso antes – devolveu ele, sentindo-a subir um braço e embrenhando os dedos da mão em seus cabelos, enquanto ele voltava a distribuir beijos e algumas mordidas pelo pescoço dela, que já mostrava algumas marcas de antes.

- Ava está bem?

- Hmhm, pesadelo... – disse ele, sem perder muito tempo, mas logo uma dúvida voltou. – Por que não quer que ela saiba que está aqui?

Era uma pergunta genuína e que fazia Jeremy temer a resposta. Ele fez com que Charlie ficasse de frente para ele e encarou os olhos dela, esperando a resposta. A mulher sabia o que ele temia e só conseguiu sorrir afetuosamente com o medo dele. Charlie tocou o rosto do ator e depositou um beijo delicado em seus lábios.

- Não se preocupe – pediu ela, o tom de voz baixo e suave, o acalmando. – Mas quero fazer uma surpresa para ela.

- Uma surpresa?

- Fiz uma para você, não fiz?

- Uma muito boa – disse ele, sorrindo de lado e Charlie revirou os olhos, apesar de manter o sorriso em seus próprios lábios.

- Então, quero fazer uma para ela... Compensar não ter vindo no aniversário dela.

- Não queria estragar nosso clima, mas ela realmente sentiu sua falta hoje.

- Eu sei e queria ter vindo, cheguei aqui há horas, me escondi no apartamento da Erin.

- Mas ela disse...

- Ela não sabia – garantiu Charlie, sorrindo divertida. – Mas tenho as chaves por causa da última vez, e ela não pediu de volta, então... – A mulher abaixou o olhar e respirou fundo, Jeremy esperou pacientemente. Mais cedo ou mais tarde aquele assunto voltaria, a bolha não podia existir para sempre. Mas ele sabia que, independente do que havia ainda a ser dito, não arruinaria em nada. – Eu queria ter vindo antes. Na verdade, eu nem queria ter deixado você ir embora naquele dia, mas...

- Você precisava de um tempo – concluiu ele, sabendo perfeitamente como ela se sentia. – Eu sei, Charls. Eu entendo.

Eles se olharam, tanta coisa sendo dita naquele simples olhar. Os dois estavam completamente transparentes um para o outro, sem mais segredos, sem mais receios e hesitações. Nada mais os impedindo de ficar juntos, como deveria ser desde o começo. Jeremy a puxou para um abraço, gostando da sensação de tê-la em seus braços, do perfume dela o envolvendo, do toque delicado contra sua pele, os dedos traçando suas costas, tocando os arranhões que havia provocado mais cedo e sorrindo, mesmo sem ele ver.

- Eu sei que na primeira vez não deu certo, mas... – Charlie começou, sem se afastar para olhá-lo, temendo perder a coragem caso o fizesse. – Não me afaste mais. – Sua voz era um mero sussurro, mas Jeremy a entendeu com perfeição. Ele se afastou o suficiente para poder tocar o rosto da mulher e fazer os olhos dela encontrarem os seus.

- Nunca mais – garantiu ele. Charlie sorriu entre algumas lágrimas, e Jeremy enxugou cada uma, antes de tocar os lábios da mulher, vendo-a ceder sob seu toque. – Eu te amo.

O poder que aquelas palavras tinham. Ela nunca se cansaria de ouvir e ele de dizer. E o contrário também era verdadeiro. Não havia nada daquele sentimento de dizer demais e acabar perdendo sua veracidade, porque os dois sabiam que ali não era exagero. Era compensação pelo tempo perdido. E, sim, eles teriam o resto da vida para compensar aqueles meses, mas ambos eram ansiosos e mais que dispostos a acabar com aquela dívida naquele momento. E quem os culparia realmente?

~ * ~

Apesar de terem ido dormir quando já era quase manhã, Charlie acordou cedo. Não estava cansada e tinha que colocar em prática seu plano antes que fosse tarde demais. Jeremy acordou enquanto ela terminava de vestir a camiseta que havia roubado dele e sorriu ao ouvir os planos da mulher, se oferecendo para ajudá-la e até mesmo aperfeiçoando um pouco.

Charlie entrou na cozinha como se ali fosse seu domínio, algo que ela sentia antes, e voltava a sentir agora. Nada mais justo e correto, pensou Jeremy, enquanto via a mulher se movendo de um lado para o outro para pegar os ingredientes que usaria para o bolo que pretendia fazer. Não era nada monumental como o do ano anterior, mas não deixaria dúvida alguma de quem o havia feito. Ele a ajudou onde ela permitiu, mas Jeremy sabia que não estava fazendo muita coisa. Charlie queria estar presente no máximo que conseguisse, compensando a ausência que causara na vida de Ava.

Foi um bolo simples e pequeno de um andar, com recheio de morango, mas a decoração não fora nada simples. Charlie o enfeitou com a maestria de uma decoradora de mão cheia e Jeremy invejou aquela habilidade nata que a mulher possuía. Enquanto eles se ocupavam, conversavam vez ou outra sobre algumas amenidades, como os trabalhos do ator e o futuro dela na faculdade – um assunto que ela sempre tentava fugir. Terminaram em cima da hora, faltando pouquíssimo tempo até Ava acordar. Jeremy ficou encarregado de buscar a filha, enquanto Charlie arrumava os últimos detalhes na mesa do café da manhã.

- Bom dia, princesa – disse o ator assim que a filha abriu os olhos, fazendo um pouco de manha.

- Bom dia, papai.

- Eu tenho uma surpresa para você – disse ele, logo atraindo a atenção da menina, que arregalou os olhos e se sentou na cama.

- Cadê?

- Lá na cozinha.

Ava pulou no colo do pai e ele explicou que ela precisava fechar os olhos, com o próprio ator colocando a mão sobre os olhos da filha para prevenir qualquer tentativa dela de espiar um pouco. Ao chegarem na sala de jantar, a mesa estava toda posta, com o bolo no centro e uma vela de cinco anos acesa. Charlie não estava em nenhum lugar e Jeremy entrou em pânico, até ela surgir atrás dele e fazer um sinal de silêncio. Charlie ocupou o lugar de Jeremy tampando os olhos de Ava, e o ator apenas sorriu, colocando a filha em pé em cima de uma cadeira.

- Pode abrir os olhos, Ava – disse o ator, enquanto Charlie afastava as mãos.

A menina levou seu tempo analisando tudo a sua frente, das panquecas servidas, ao suco e a decoração da festa do dia anterior. Mas logo sua atenção ficou focada no bolo. Não era o mesmo do seu aniversário, era completamente diferente e a menina sabia reconhecer aquele padrão. Seu coração se acelerou e ela arregalou os olhos, a boca se abrindo em um "O" perfeito, enquanto ela se virava para trás na intenção de encarar o pai, mas o que encontrou foi mil vezes melhor.

- Charlie! – gritou a menina, ao ver a mulher atrás dela com um sorriso de orelha a orelha. Ava pulou no colo da ex-babá e a abraçou com força, sem se importar com o fato de quase tê-las levado ao chão. – É você mesma!

- Claro que sim, meu anjo – disse Charlie, abraçando a menina com intensidade. – Feliz aniversário.

- Meu desejo se realizou! – exclamou Ava, pegando Charlie de surpresa.

- Que desejo?

- Ontem eu pedi para você voltar.

Charlie não sabia porque ficara tão surpresa com aquilo, mas ela ficou e rapidamente foi tomada pela emoção e seus olhos encheram-se de lágrimas. Voltando a abraçar Ava com força, enquanto lágrimas escorriam por seu rosto e ela encarava Jeremy, que apenas deu de ombros e sorriu, antes de envolver as duas em um abraço.

- Tá tudo completinho agora – comentou Ava, sorrindo ao sentir o abraço do pai.

Charlie e Jeremy se encararam, incertos sobre o que a menina queria dizer com aquilo, mas logo concluindo que só havia uma possibilidade. A família que Ava sempre sonhara em ter finalmente estava completa e nada mais os atrapalharia.

~ * ~

As caixas e malas estavam espalhadas pela sala do apartamento. As três pessoas que as haviam carregado estavam jogadas no sofá, suadas e ofegantes, enquanto a criança de cinco anos sentava em uma das caixas. Fazia um belo dia de primavera e todos estavam muito tristes por aproveitarem fazendo aquilo ao invés de um belo piquenique no parque.

- Bem, eu não sei vocês, mas eu com certeza amaria um sorvete agora – disse Erin, rapidamente recebendo a aprovação de Ava, que se levantou e segurou a mão da estilista após receber a aprovação do pai.

Charlie esperou as duas se retirarem do apartamento para se virar em direção ao ator, que a abraçou imediatamente. Faziam duas semanas desde o aniversário de Ava e o retorno de Charlie, e os dois pareciam ter voltado àquela fase da lua de mel. Parecia até estranho o fato da mulher ter resolvido aceitar a proposta de Erin de morar com a estilista. Jeremy ainda não havia se convencido, mas não negaria a decisão da mulher, sabendo que ela estava fazendo o melhor para ela.

- Tem certeza mesmo? – perguntou Jeremy, sorrindo ao sentir Charlie rir contra seu peito. A mulher suspirou e se afastou, se levantando do sofá.

- Meu deus, Jeremy, quantas vezes vou ter que dizer?

- Eu sei, eu sei... – Jeremy a imitou e a ajudou a mover uma das caixas. – Mas, não sei... Me acostumei a ter você em casa. E não quero ter que contratar outra babá.

- Nós já conversamos sobre isso – disse a mulher. – Eu vou continuar cuidando da Ava, e vou passar tanto tempo lá que nem vai parecer que estou com a Erin.

- Não parece a mesma coisa – disse o ator, a abraçando pela cintura e forçando a mulher a soltar o livro que havia pescado da caixa. Charlie revirou os olhos e se virou de frente para ele, seus braços rapidamente se apoiando nos ombros do ator, um sorriso divertido brincando em seus lábios.

- Você vai sobreviver, querido – disse Charlie, sorrindo quando ele fez um bico.

- Acho que não.

- Sobreviveu... Quantos meses foram? Quatro? Agora pode sobreviver por mais uns anos.

- Uns anos? Vai me fazer sofrer por tanto tempo?

- Se contenha, sr. Renner – disse a mulher, sorrindo divertida quando ele tomou seus lábios em um beijo.

- Não posso... – disse ele, olhando-a nos olhos. O clima entre eles parecendo mudar um pouco, mas para melhor. – Eu te amo.

Borboletas era pouco para descrever o que acontecia em seu estômago. Charlie sentia como se estivesse caindo em queda livre. Seu corpo inteiro parecia flutuar e lágrimas preencheram seus olhos. Ele havia dito aquelas palavras antes, mas Charlie sabia que nunca pararia de se sentir daquela forma. A forma como ele a olhava, como seus braços a envolviam e suas mãos se firmavam em seu corpo, como seus lábios a tocavam, e seus olhos a transmitiam toda a calma e serenidade... Tudo aquilo ela conseguia se acostumar, mas ao poder que aquelas simples três palavras tinham, Charlie não sabia como reagir e se algum dia aprenderia a lidar com aquilo.

- Eu também te amo – disse ela de volta, sabendo que o sorriso dele se espelhava ao dela. Jeremy roubou um beijo rápido dela e então voltou a encará-la, a expressão completamente mudada, mas que Charlie ainda conseguiu reconhecer como de pidonha. Idêntica à de Ava quando queria pedir algo.

- Dorme lá em casa hoje?

Charlie riu com aquele pedido, se afastando do homem e começando a organizar algumas caixas pelo cômodo. Ela não estava surpresa por aquele pedido, havia até demorado para acontecer, e ela já estava tentada a aceitar, mas antes queria pelo menos organizar aquela bagunça que suas coisas haviam feito na sala de Erin. Ninguém iria visita-las tão cedo, mas Charlie não queria que a estilista tivesse uma má impressão dela tão cedo.

- Me ajude a arrumar essa bagunça toda e eu penso no seu caso.

~ * ~

Ela corria pela rua deserta, seu coração disparado e a respiração ofegante. Seus olhos vasculhavam cada canto da rua mal iluminada procurando por qualquer um dos dois. Ela não conseguia acreditar que aquilo estava acontecendo de novo. Que mais uma vez eles escorregavam por seus dedos. Que mais uma vez ela os perdia. Ela abria a boca para gritar, mas nenhum som saía e seu desespero só aumentava. Eles estavam ali há poucos instantes, na sua frente, sorrindo para ela, prestes a abraça-la. E num piscar de olho, sumiram.

- Charlie – uma voz ao longe gritou e ela virou a cabeça em direção ao local. Seu coração perdeu uma batida diante a expectativa de finalmente mudar aquela situação. Mas não havia ninguém. – Charlie! – A voz gritou de novo, dessa vez mais próxima, e ela sentiu o desespero aumentar por não conseguir encontrar ninguém. – Charlie!

Seus olhos se abriram e ela se viu em um cenário diferente. Seu coração estava ainda disparado, sua respiração ofegante e seu corpo suava. Ela reconhecia o teto acima dela, a colcha que a cobria e o colchão que a acomodava. Mais que isso, ela conhecia o perfume que a envolvia, e o braço que pesava em sua cintura. Os olhos azuis de Jeremy logo entraram em sua visão e a expressão preocupada dele fez com que ela engolisse em seco. A mulher se desvencilhou dele e se sentou na cama, uma ardência estranha em seus olhos deixando-a confusa até ela perceber que chorava.

- Meu deus, Charlie – exclamou Jeremy, a puxando para um abraço apertado, deixando-a afundar o rosto em seu peito e aspirar com força o perfume que ele exalava. – Shh, shh... Está tudo bem.

- Não... Não – soluçou Charlie, a voz abafada e as mãos agarrando a camiseta que Jeremy usava como se sua vida dependesse daquilo. – Eu não posso perder vocês de novo.

- Não vai – disse Jeremy, extremamente confuso com aquilo, mas não querendo questioná-la naquele momento.

Ele não queria força-la a nada, deixaria ela chorar o que precisasse e depois a ouviria caso ela quisesse contar o que estava acontecendo. Estava preocupado, afinal acordara com a mulher se mexendo de modo mais agitado que o normal. Ele tentou acordá-la de todas as formas, mas ela estava num sono profundo e não conseguia sair tão cedo. Ele se viu suspirando aliviado quando ela, enfim, acordou, apesar de demorar um pouco para reagir ao que acontecia ao seu redor.

Demorou, mas enfim Charlie conseguiu controlar suas lágrimas, e se afastar de Jeremy, apesar de se sentir muito confortável naquele abraço dele. Ela sabia que ele estava curioso para saber o que havia provocado aquele surto, e Charlie não queria esconder nada do ator. Por isso, começou a contar tudo sobre os sonhos que tinha, e como eles haviam aumentado no tempo que ficaram afastados. Quando ela retornou para Los Angeles e para a vida dele, os sonhos deram uma trégua, mas desde que havia aceitado morar com Erin, eles haviam retornado. E pelo jeito, nem mesmo a presença de Jeremy ao seu lado agora era capaz de afastá-lo.

- Por que não me falou antes, Charls? – perguntou ele, acariciando o rosto dela para enxugar mais algumas lágrimas.

- Eu achei que ele iria embora – disse ela, dando de ombros. – Mas eu acho que o medo ainda está aqui.

- Medo?

- De perder vocês de novo – disse ela, sem saber o quanto aquilo havia causado dor em Jeremy. O ator já havia estranhado o que ela dissera antes, agora parecia fazer mais sentido e doía ainda mais. Era culpa dele ela sentir aquilo, e ele era o único que poderia sanar aquele problema.

- Charlie – disse ele, sua mão emoldurando o rosto da mulher, enquanto ele mantinha seus olhos conectados. – Charlie, não precisa temer nada disso.

- Eu sei, mas...

- Charls, não, por favor. Eu sinto muito por tudo o que te fiz passar, mas não pretendo fazer você passar por isso mais uma vez. Não quero que nenhum de nós passe por isso outra vez. – Havia tanta certeza em sua voz que Charlie não ousou interrompê-lo, sentindo aquela confiança preenche-la. – Eu te amo, Charlie, e quero te ajudar a realizar muitos sonhos, mas esse definitivamente não é um deles.

- Eu também te amo – disse ela, não reclamando quando ele a puxou para um beijo, sentindo o sal das lágrimas dela se infiltrar no beijo. Ela o abraçou com força, sentindo Jeremy retribuir na mesma intensidade.

Era um momento frágil para ambos. Haviam passado por tanta coisa, haviam sofrido tanto. Era normal aquele sentimento de que poderiam perder tudo num piscar de olhos, já haviam perdido antes. Poderia ocorrer de novo, ainda mais facilmente. E ambos sabiam que lutariam com unhas e dentes para abandonar aquela sensação e fazer com que aquele relacionamento desse certo, sem permitir que mais ninguém os separasse.

~ * ~

A faculdade estava exatamente como ela se lembrava, mas algo parecia diferente. Charlie sabia ser ela a única diferente ali, mas não estava disposta a refletir sobre aquilo naquele momento. Ela estava nervosa, sentia um aperto na boca do estômago diante o que estava prestes a acontecer. Logo que decidira se mudar com Erin, ela mandou um e-mail para o professor orientador de seu mestrado, pedindo desculpas pela demora em dar uma resposta ao homem, e perguntando se havia a possibilidade de marcarem uma reunião para conversarem. O professor havia aceitado, claro, e o dia finalmente havia chegado.

- Respira fundo – disse ela, parada a porta do gabinete do professor. – O máximo que vai acontecer é ele dizer não e você ter que recomeçar tudo.

Aquela possibilidade era mais assustadora que tudo, mas Charlie não iria desistir naquele momento, não podia. Havia prometido a Erin e Jeremy que viria para essa reunião e só sairia após ela e o professor chegarem a um acordo favorável para ambos. E caso não fosse possível ela retornar, então que fosse por um bom motivo.

- Entre – ela ouviu o professor dizer após dar duas batidas tímidas na porta.

- Com licença, senhor Donnelly. – Charlie nunca se vira tão nervosa quanto naquele momento, poderiam mandar apresentar mil seminários e ela não ficaria tão nervosa. Mas não eram mil seminários, não, era seu destino. Seu futuro. O futuro que ela havia escolhido.

- Senhorita Davis, por favor, entre – disse o senhor, sempre sorridente e simpático. – Como está?

- Muito bem, senhor, obrigada – disse a moça, sentando-se em uma cadeira em frente à mesa.

- Fico feliz em saber disso – disse o professor. – Em que posso ajuda-la?

- Eu sei que estou muito atrasada no programa, professor – disse Charlie, encarando o homem a sua frente e tentando parecer muito mais confiante do que se sentia. – Mas eu gostaria muito de retornar e finalizar o curso. Se isso foi possível, claro.

- Sabe, senhorita Davis, eu sempre gostei da senhorita. Uma das melhores alunas que já tive, e meus colegas parecem concordar – disse o professor. Charlie se sentia orgulhosa de si mesma, mas não deixou transparecer, não querendo se iludir. – Sempre com as melhores notas e entregando os melhores trabalhos. Ficamos muito surpresos com o seu sumiço.

- Desculpe por isso, senhor – disse a mulher.

- Quando respondeu ao meu e-mail, eu contatei seus professores – disse o senhor. – Todos eles disseram a mesma coisa... A senhorita está atrasada, mas ninguém tem dúvidas de que conseguirá acompanhar com facilidade.

- Professor, isso é... É o que eu acho que é?

- Aqui estão as tarefas que seus professores passaram para a senhorita acompanhar o curso – disse Donnelly. – A senhorita tem até o final do mês para entregar tudo, e então espero vê-la para o último semestre.

- Sim, senhor, eu... Eu não vou desapontá-lo – disse Charlie, pegando a quantidade considerável de papeis que o professor lhe entregava. – Muito obrigada pela oportunidade, senhor.

- Aproveite, pois não haverá outra chance.

Charlie saiu do escritório e sentiu como se uma tonelada tivesse saído de seus ombros. Ela teria mais uma chance, e sabia que não iria desapontar ninguém. Talvez tivesse mais algumas noites sem dormir no meio do caminho, mas ela sabia que tudo valeria à pena. Tudo voltava a se encaixar em sua vida, e ela não pretendia perder uma peça que fosse daquele quebra-cabeça.

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n/a: vocês tão sentindo o que eu to sentindo? o gostinho do fim? tô nem acreditando que meu bebê tá quase acabando, só mais um capítulozinho, quero chorar já.

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