100 Cuecas!

By FabioLinderoff

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Toda história tem um começo, meio e as vezes precisa ter um fim. Após uma década de espera, Fábio Linderoff e... More

Vem aí...
Dedicatória
Nota do autor
Prefácio
Fábio Linderoff apresenta
100 CUECAS!
Momento 1
Momento 2
Momento 3
ALMEJANDO OS HOLOFOTES
ATO I - CRAVING FOR THE SPOTLIGHTS
Capítulo 1
Capítulo 2
Capítulo 3
Capítulo 4
Capítulo 5
Capítulo 6
Capítulo 7
Capítulo 8
Capítulo 9
Capítulo 10
Capítulo 11
Capítulo 12
Capítulo 13
Capítulo 14
Capítulo 15
Capítulo 16
Capítulo 17
Capítulo 18
O SHOW CONTINUA
ATO II - THE SHOW GOES ON
Interlúdio 1
Capítulo 20
Capítulo 21
Capítulo 22
Capítulo 23
Capítulo 24
Capítulo 25
Capítulo 26
Capítulo 27
Capítulo 28
Interlúdio 2
Lições de vida
100 Cuecas! Book Soundtrack

Capítulo 19

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By FabioLinderoff

1.

A terceira campainha soou alta e estridente. Algumas pessoas ainda estavam se acomodando quando as luzes perderam a intensidade. Os corredores se esvaziaram rapidamente. Era possível ver algumas pessoas andando de lado nas fileiras estreitas pedindo licença, segurando sacos de pipoca e copos de refrigerante enquanto se dirigiam aos seus assentos. Um ou outro vulto passava correndo procurando seu lugar para não ouvir comentários desagradáveis daqueles que já estavam a postos no aguardo do espetáculo recomeçar.

O teatro Somnium era tão grande quanto a imaginação de uma criança e estava repleto de espectadores de lugares diversos só esperando para assistir o que eu tinha para contar. E aquilo estava bem longe de ser um conto de fadas onde príncipes terminam sempre ao lado de sua amada donzela a frente de um futuro monogâmico de eterna felicidade e prosperidade. Aos poucos o burburinho foi diminuindo. Até que tudo ficou em silêncio. Tudo ficou escuro.

As cortinas vermelhas se abriram lentamente ao mesmo tempo que o som da música soou pelas potentes caixas de som do teatro.

Eu estava de frente para uma arquibancada em U e de costas para a plateia. Os degraus cheios de luzes se acenderam e percebi que estavam lotados de homens seminus. Eram 68 para ser exato. Eu estava parado no centro do palco enorme vestindo apenas uma sunga dourada. Quando a deixa surgiu, virei o corpo, apontei o dedo para a plateia cantando:

If I, I got to know your name —(Sim, eu, preciso saber seu nome)

Enquanto isso um telão retangular no fundo do palco, acima da arquibancada, mostrava cenas em cortes rápidos de todos os anos que morei fora do Brasil.

Well if I, could trace your private number baby — (Bem, e eu, poderia rastrear seu telefone, querido) — Cantei fazendo gestos com a mão.

Luzes vermelhas e amarelas banharam o palco. No centro dele havia uma enorme estrutura de metal e no meio havia um objeto.

All I know is that to me — (Tudo que eu sei é que, para mim)

You look like you're lots of fun — (Você parece muito extrovertido)

Open up your lovin' arms — (Abra seus braços do amor)

I want some, want some — (Eu quero um pouco) — cantei ao mesmo tempo em que Kevin (o albino) e Brian (o ruivo), os dois primeiros homens com quem — infelizmente — transei depois que cheguei nos Estados Unidos, caminharam da coxia a esquerda e a direita até onde eu estava. Ambos estavam mascarados. Kevin usava uma máscara de borracha no formato da cabeça de um urso e Brian uma máscara de borracha no formato de um gato. As máscaras tapavam a metade dos rostos, as bocas ficavam a mostra.

Apontei para eles e cantei:

I set my sights on you — (Bem, eu... Eu fixo meu olhar em você)

(And no one else will do) - (E mais ninguém vai fazer) — Eles responderam.

Ambos não vestiam nada exceto uma sunga prateada, assim como os outros cuecas que nos rodeavam. O objeto que havia sobre a estrutura metálica era uma cama redonda com lençóis brancos cheia de travesseiros.

And I, I've got to have my way now, baby — (E eu, eu tenho que fazer do meu jeito agora, querido) — entrelacei meus dedos atrás da cabeça e permiti com que que os rapazes, agachados, lambessem meu corpo com desejo. — All I know is that to me — (Tudo que eu sei é que, para mim)

You look like you're havin' fun — (Você parece estar se divertindo)

Open up your lovin' arms — (Abra seus braços do amor)

Watch out, here I come — (Tome cuidado, aqui vou eu)

As luzes ficaram multicoloridas, a cama começou a girar em sentido horário e todos puderam nos ver de todos os ângulos enquanto minhas mãos deslizaram para dentro da sunga de ambos. O refrão começou acompanhado de palmas pela plateia. Em uma mão eu segurava o pau de Brian e com a outra a bunda de Kevin e cantava:

You spin me right round, baby - (Você me faz girar, querido)

Right round like a record, baby - (Girar como um disco, querido)

Right round round round - (Dando voltas e voltas)

You spin me right round, baby - (Você me faz girar, querido)

Right round like a record, baby - (Girar como um disco, querido)

Right round round round - (Dando voltas e voltas)

Enquanto cantávamos e dançávamos o refrão da música, pelas portas do fundo do teatro foram descendo mais rapazes. Eu reconhecia o rosto da maioria deles, dos que estavam no palco e dos que estavam entrando no teatro. Eram todos os caras que eu "peguei" durante os 7 anos que morei nos Estados Unidos. Um seguido do outro, os rapazes foram descendo os largos degraus em declive do teatro e dançando no ritmo da música. Duas longas fileiras com 15 rapazes cada uma se formaram. Todos de sunga prateada. As mulheres da plateia olhavam para eles com olhos sedentos e sorrisos tímidos. Os rapazes gays estavam adorando todo aquele jogo de luzes, som alto e a visão paradisíaca daqueles homens seminus enfileirados. Os héteros presentes pensaram "que porra é essa que está acontecendo? O que eu ainda estou fazendo aqui?".

I, I got be your friend now, baby - (Eu, eu devo ser seu amigo agora, querido) — Uma voz conhecida ecoou pelo teatro. No telão ao fundo avistei o rosto gigantesco do Daniel. Me virei de frente para a plateia, ergui o braço para a fileira de boys a minha direita. Eles imitaram o mesmo movimento que eu do primeiro da fila até o último no fundo do teatro. O mesmo se repetiu quando fiz o mesmo movimento para a fileira a minha esquerda. Cantei: — And I would like to move in - (E eu, gostaria de chegar em você)

Just a little bit closer - (Um pouquinho mais perto)

(Little bit closer) - (Um pouquinho mais perto) — Todos os meus "peguetes" cantaram em coro.

I want your love - (Eu quero seu amor) — Cantei de olhos fechados, vendo rostos em minhas lembranças.

He wants your love - (Ele quer seu amor) — As fileiras repetiram. E todos os rapazes de sunga dentro e fora do palco apontaram na mesma direção. Todos apontaram para o Daniel que surgiu do lado direito do palco vestindo uma sunga dourada semelhante a minha.

All I know is that to me - (Tudo que eu sei é que, para mim) — ele cantou e eu empurrei Brian para longe de mim. — You look like you're lots of fun - (Você parece muito extrovertido) — Daniel continuou e eu empurrei Kevin também. Olhei para o Daniel, apreensivo. Lembrei dele dizendo que ia morar com o Fabiano. Abri os braços para os cuecas da plateia que eu ainda não havia pegado e cantei: — Open up your lovin' arms - (Abra seus braços do amor). — Em resposta alguns aqui e lá ergueram os braços na minha direção e eu falei no ritmo da música: — Watch out, here I come! - (Tome cuidado, aqui vou eu!)

Foi nesse momento que a enorme estrutura de metal embaixo da cama em que eu estava começou a girar novamente e a se erguer. Um a um os rapazes enfileirados nos corredores começaram a dançar em direção ao palco. A estrutura continuou a subir e erguer outras camadas junto. Todos cantamos a plenos pulmões para a plateia.

You spin me right round, baby - (Você me faz girar, querido)

Right round like a record, baby - (Girar como um disco, querido)

Right round round round - (Dando voltas e voltas)

A estrutura continuou a girar e a subir e os rapazes das filas se posicionaram nas camadas subjacentes movimentando o corpo de maneira sexy enquanto o enorme carrossel de macho se erguia. A estrutura parecia um enorme bolo de casamento comigo no topo.

Quando eu olhei para baixo me vi vestindo a sunga dourada. Fechei os olhos e ao abri-los eu estava no chão e no topo do meu bolo de casamento recheado de memórias de cuecas do passado estava o Daniel cantando:

You spin me right round, baby - (Você me faz girar, querido)

Right round like a record, baby - (Girar como um disco, querido)

Right round round round - (Dando voltas e voltas) — Cantamos todos em uníssono. Meus olhos não desgrudaram dos de Daniel até a música terminar.

Todos erguemos os nossos braços para o alto e recebemos logo em seguida os aplausos da plateia.

Os assobios e as palmas logo começaram a ficar mais distantes e tudo assim como começou, desapareceu em uma névoa de lembrança e fantasia.

2.

América do norte. Canadá. Toronto. Aeroporto Internacional Lester Bowles Pearson. Aeronave Boeing 777-200. Assento K27.

— Fábio. — Alguém chamou me tirando do meu momento de transe. — Vamos?

Os anos que passei longe de casa vieram junto com o rosto de todos os caras que haviam cruzado meu caminho nesse período. Olhei para o lado e vi Roger em pé no corredor do avião completamente nu. Meus olhos se arregalaram e o meu queixo caiu. Ele estava lindo. Cada detalhe do corpo dele ainda era o mesmo de sete anos atrás.

— Fábio! — Ouvi novamente e dessa vez acordei de verdade. Dani estava parada, em pé com o corpo curvado sobre mim. O avião já havia pousado em Toronto e a maioria dos passageiros já haviam desembarcado.

Olhei para fora do avião e notei que o tempo estava péssimo. As aeronaves estavam sendo banhadas com propilenoglicol, um fluido anticongelante aquecido para que o gelo não comprometa a aerodinâmica dos aviões. É um procedimento obrigatório em dias de nevasca.

— Já chegamos? — Perguntei pegando a minha mochila que ela tinha colocado sobre o assento. A senhora que estava sentada ali anteriormente já tinha ido embora. Me levantei oferecendo: — Quer ajuda?

Perguntei por educação porque sabia que Dani não gostava de receber gentilezas de cuecas. Ela achava que essas gentilezas tinham dois fundamentos básicos. Primeiro, iniciar uma conversa fiada que terminaria com alguém pedindo seu telefone. Segundo, achar que ser mulher é ser frágil e indefesa. Ela não era nem uma coisa e nem outra. Pelo contrário, quase nunca necessitava de ajuda.

— Não precisa. — Ela disse com peso na voz ao tirar sua bagagem do compartimento e colocá-la no chão. — Chegamos na metade do caminho. — Vamos ver como está a situação dos voos com essa merda de tempo. — Ela abriu passagem e seguimos pelo corredor do avião em direção a saída.

A minha desconfiança se confirmou quando começamos a ver as notícias na internet. Uma tempestade de gelo acumulou entre 10 e 30 milímetros de gelo na área metropolitana de Toronto e deixou milhares de pessoas sem luz. Como bem soube nos anos que morei nos Estados Unidos, ficar sem luz no inverno é complicado pois as casas ficam sem aquecimento e também a água pode congelar e quebrar os canos da casa. Era raro, mas não era impossível de acontecer.

Quando chegamos em Toronto não acreditamos no que vimos, ou melhor, sentimos. A temperatura era de -17C com sensação de -26C. E quando achamos que aquilo era ruim, o pior já havia acontecido, o dia anterior registrou temperaturas de -23C e sensação térmica de -35C. Era a temperatura mais fria registrada em Toronto em 9 anos.

Toronto costumava ser uma cidade mais amena, até onde eu sabia, com temperaturas médias em janeiro não passando dos -5C. Os Canadenses de outras regiões costumam fazer piadas sobre o inverno de Toronto, mas não desta vez.

O ideal nessas circunstâncias é que as pessoas permaneçam em casa e se for necessário sair tomar muito cuidado, pois a pele exposta a este frio pode congelar em menos de cinco minutos. Extremidades são as partes mais vulneráveis. Pés, mãos, orelhas e nariz. Aquela estória de orelha quebrar no frio não é brincadeira, a gente não sente a orelha congelar. Então aprendi a não subestimar o gorro. Pés pedem vários pares de meia, de preferência "thermal", feitas com tecido especial ou lã. Aprendi a colocar a thermal primeiro, pra entrar em contato com o pé. Se os pés ainda estiverem frios com quatro, cinco pares de meia, aprendi a colocar jornal como palmilha dentro do sapato ou tênis. É sério, e funciona. E quando chegava em casa, ia direto para a banheira ou fazer um escalda-pés. Não há muito o que se fazer com o nariz, exceto tentar esquentá-lo de vez em quando, cobrindo-o com o cachecol ou a mão.

Algo que aprendi em um desses anos de frio rigoroso é nunca colocar luvas fora de casa. Se as suas mãos estiverem geladas, a luva cria uma espécie de "bolsa térmica" e mantém a temperatura que está. É preciso esquentar as mãos primeiro e colocar as luvas antes de sair. Aliás, nunca "ache" que não precisa de luvas. Um dia não achei as minhas na mochila, desencanei, e cheguei em casa com o dedinho azul. Medo.

Beber muito líquido é essencial e comer coisas quentes também.

Depois de um tempo morando fora aprendi a tomar muito cuidado com gelo. Se o chão reflete é porque tem gelo. Se não reflete, ainda assim pode ter o chamado "black ice", que é o que você não vê. Não há muito o que fazer, você vai escorregar, patinar e cair. Um tombo pode ser muito perigoso. Usar sapatos com "grips" é o ideal, sem sola lisa. Sola lisa é morte. Ou então considere comprar umas chuteiras. É preciso andar devagar, muito devagar e tentar se equilibrar. Não há mais nada a fazer. E se cair, ria. Eu não conseguia resistir, ria de todos que eu via caindo, desde criança até gente idosa.

Em dias ruins os programas de tv alertam para não sair de casa, escolas cancelam as aulas, aeroportos fecham para pousos e decolagens. Tudo vira uma bagunça depois de uma tempestade de neve. Se for sair de carro, é preciso deixar cobertores e casacos extras no porta mala e levar sempre água e comida com você. Pessoas ficam presas nos carros, nas estradas congeladas, por mais de 10 horas (com a temperatura negativa).

Céu azul passou a ser uma ameaça para mim. Nunca acredite no sol morando em lugares com inverno rigoroso. Um solzinho lá fora pode ser propaganda enganosa. Sol de inverno não esquenta.

Se você sentir que fica tonto durante o inverno, pode ser que tenha labirintite irritativa ao frio. Eu tenho. E só descobri indo ao médico depois que passei meses andando torto.

Por fim, aprendi a não ficar desesperado quando não conseguia enxergar direito no inverno. Passei a usar óculos de grau depois de um tempo, mas no inverno era foda porque eu sentia que a visão ficava estranha e só então descobri que o grau dos meus óculos não havia aumentado, a falta de incidência solar que contribuia para essa sensação.

O tempo de voo entre Nova Iorque e Toronto era a mesma da ponte aérea entre Rio e São Paulo, 40 minutos. De carro demoraria mais de 7 horas para percorrermos as 491 milhas, ou 790 Km, de distância, fora o combustível.

Nós estávamos voltando via Air Canada e tínhamos uma conexão em Toronto antes de seguir para a o Brasil. Pegamos nossas bagagens, passamos pela imigração e fomos até o saguão principal. Ali percebemos que a nossa viagem iria levar mais tempo do que o planejado para ser concluída.

— Cancelado. — Dani leu no painel de voos.

— Talvez isso seja um sinal de que não deveríamos voltar para o Brasil. — Falei colocando a mochila nas costas.

— Talvez seja um sinal para você não falar merda. — Dani retrucou. Pelo tom e sutileza das palavras desconfiei que estava nervosa.

— Já vi que souberam da notícia. — Ouvimos uma voz dizer atrás de nós.

Eu e Dani viramos simultaneamente e nos deparamos com Daniel. Pelo menos aquilo deixou ela feliz momentaneamente. Era com aquele brilho no olhar e com aquele sorriso que ela me recebia antes de irmos morar juntos. Viver como um casal e passar por tudo o que passamos e ainda estarmos conversando não era para qualquer um.

O fato é que alguns amigos servem para sair uma noite, uns poucos para uma viagem de final de semana e é raro encontrar amizades que sobrevivam depois que as pessoas moram juntas e enfrentam dificuldades financeiras e o desafio de lidar com a rotina da convivência, das tarefas, de aturar as chatices uns dos outros.

Meu pai ainda me alertou dizendo "o certificado de garantia vence quando se passa a morar juntos". No início achei que morar com a Dani ia ser muito tranquilo, já que eu já tinha tido a experiência de morar na goma junto com os caras da faculdade. O problema é que quando se mora fora do seu país tudo parece conspirar para complicar as coisas. Seja no aspecto financeiro ou cultural. Morando fora, não tinha como ir passar um tempo na casa dos meus pais, não tinha como me abrigar na casa de amigos sem ter que pagar caro por isso. E não foi só isso. Dani tinha motivos para nunca mais ter voltado a falar comigo. Eu era sortudo de ainda tê-la ao meu lado. Essa viagem serviu também para enxergarmos um ao outro com outros olhos. "Você só conhece realmente uma pessoa quando comem no mesmo prato", já ouvi minha mãe dizer. Ela estava certa.

Dani se jogou nos braços do Daniel e ele correspondeu ao abraço de olhos fechados inicialmente. Depois os abriu e me mediu de cima embaixo por cima do ombro dela.

Eu senti naquele momento algo que eu não tinha sentido até então. Uma estranha sensação de conforto. Sete anos se passaram. Sete anos sem ver o Daniel e ali estava ele diante dos meus olhos novamente. Não foram sete dias ou sete meses sem vê-lo, foram sete anos, porra! Isso é tempo demais. E ele parecia não ter envelhecido um dia. Obviamente os traços já não eram os de moleque, minha memória sempre trazia o rosto dele exatamente como ele era quando morávamos juntos. Mas ali estava ele, mais maduro e mais bonito, se é que isso é possível. Estava com os cabelos bem curtos, seus ombros pareciam mais largos e os braços mais definidos. O tempo tinha tirado um pouco do viço da juventude de sua pele, mas em contrapartida tinha deixado ele tão bonito quanto era mais novo.

— E aí, Manezão? — Ele disse quando se desvencilhou do abraço da Dani. Ele ainda me chamava de "mané", depois de todo esse tempo.

Inconscientemente estendi a mão esperando uma troca de aperto. Depois de tanto tempo sem se ver, parecia que estávamos nos conhecendo pela primeira vez. Ele olhou para a minha mão, empurrou-a de lado e me deu um abraço apertado.

— Que saudade, caralho! — Ele me disse ao pé do ouvido. Fechei os olhos, senti seu perfume, senti o calor do seu corpo e abracei ele também. E só então senti algo que há muito não sentia. Me senti em casa. — Nunca foi me visitar, cara.

Era verdade. Depois de saber que ele ia morar com o Fabiano, minha mente bloqueou o Daniel. Era como se ele tivesse traído a nossa relação. Como ele teve coragem de simplesmente ir embora para morar com outro cara? E ainda queria a minha visita? Lá no fundo admito que eu gostava de sentir aquela dúvida que algo entre a gente ainda podia acontecer. Porém, todas as vezes que eu me lembrava do dia do picnic no Parque do Ibirapuera e da forma como ele tratava o Paulo enquanto tomávamos sorvete, aquilo me fez acreditar que tudo o que aconteceu entre a gente não passou de uma experiência que me ajudou a tomar coragem para assumir a minha homossexualidade. Somente.

Falando em Paulo, ele era outro que sumiu. As únicas pessoas com as quais eu me comuniquei com mais frequência, apesar dos longos intervalos de tempo (anos) foram Bianca, Jean e Lucas e agora mais recentemente com o Daniel. Não queria saber da relação do Paulo com o filho dele, que já devia estar com 7 anos de idade. Muito menos queria saber quão felizes Tábata e Fernando deviam estar.

Na verdade, a ida para os Estados Unidos foi justamente uma fuga daquele lugar, daquelas pessoas, daquela vida que eu tinha. Eu precisava sumir e foi justamente isso que eu fiz. No início até usava as redes sociais para manter contato, mas as areias do tempo cobrem as marcas da caminhada que deixamos na vida dos outros. Se você não procura, as pessoas desaparecem.

Meus pais chegaram a me visitar. Nunca vieram juntos e nunca trouxeram seus cônjuges. Sete anos depois meu pai ainda estava com a Edna e minha mãe com o zelador Marcos, que nem era mais zelador. Até a minha avó ainda estava viva, infelizmente.

Roger era uma brisa do verão que esquentava meus pensamentos em dias de solidão. Nunca quis saber como ele estava, tampouco as pessoas falavam sobre ele comigo, mas sempre que havia um assunto sobre namoro inevitavelmente seu nome surgia. Primeiro namorado a gente nunca esquece já me disseram. Por mais conturbada que fosse a nossa relação, por mais que não houvesse sexo gostoso, ainda assim ele foi um cara legal e honesto. Diferente de mim. E isso me fazia sentir inferior, isso me fazia olhar para trás com vergonha. Eu tinha sido fraco e covarde. E é difícil admitir isso. No final das contas, a imagem que ficou dele foi de um cara que por conta de traumas e inseguranças só conseguiu se libertar das correntes que impediam ele de seguir em frente quando a história do abuso que sofreu veio a tona e nosso namoro terminou. A minha insensatez impediu que nós seguíssemos juntos quando tudo pareceu entrar nos trilhos na vida dele, sequer amizade entre a gente restou. E como em cima de carniça sempre tem um urubu, lá estava a ex dele, Carol - o raio de sol, pronta para atacar quando teve a chance. Nunca mais soube dele. Sete anos se passaram e a única lembrança que levei comigo dessa época era um pedaço de papel. A fotografia de nós dois abraçados no mirante quando descemos juntos pela primeira vez ao litoral junto com a Érica e a Dani.

A impressão que eu tinha era que todos tinham se dado bem, exceto eu. E a fuga para os Estados Unidos surgiu como uma oportunidade para que eu pudesse voltar a ser eu mesmo. Eu faria dinheiro, daria um upgrade no meu Inglês e voltaria ao Brasil tão bem quanto Tiêta voltou para Santana do Agreste na obra de Jorge Amado. Esse era o plano, mas isso não aconteceu. A história de superação e resiliência que eu tanto imaginei contando em palestras pelo Brasil com o meu rabo cheio de dinheiro nunca se concretizou.

Assim que nos afastamos, Dani perguntou:

— Faz tempo que você chegou?

— Faz uma hora mais ou menos. De Vancouver para cá foi bem tranquilo. — Ele respondeu colocando um braço ao redor do pescoço dela.

Continuava o mesmo carinhoso de sempre.

— Quanto tempo de viagem? — Ela perguntou ainda com aquele sorriso besta no rosto.

— Quatro horas e pouco. — Ele disse voltando a me medir. — Engordou, hein Mané.

A distância entre Toronto e Vancouver era mais longe do que de Porto Alegre ao Maranhão. O avião dele podia ter caído no meio do caminho só para não me fazer escutar aquilo, ainda mais depois de 7 anos sem me ver. Fiquei com vergonha, óbvio.

"Isso é da sua conta?" — Pensei em dizer, ao invés disso apenas abri o meu sorriso "pois é".

— Pintou o cabelo... — Ele continuou.

"Isso porque não sabe o estrago que fiz no meu cu." — Pensei e não falei. Ao invés disso puxei a franja longa e loira até a frente e reparei na palha que estava. Cabelo loiro e bigode, cavanhaque castanhos. Estava uma beleza. Talvez Dani estivesse certa. Eu devia estar parecendo a versão GG do Kurt Cobain, gay e gordo.

— Vamos resolver como vai ficar a nossa situação já que o nosso voo foi cancelado? — Mudei de conversa.

— Vamos. — Dani disse abraçando eu e o Daniel. — Mas antes disso, quem está com fome?

3.

Há sete anos Dani tinha feito a mesma pergunta para mim abrindo a porta do banheiro do nosso apartamento. Eu tinha acabado de chegar nos Estados Unidos, ela tinha me mostrado o apê e me deu uma toalha para que eu tomasse um banho. Eu estava parado em frente ao espelho, com o rosto molhado, me olhando, absorto em pensamentos e com a torneira da pia aberta.

— Fábio? — Ela chamou mais uma vez. — Está tudo bem?

Fechei a torneira, parei de ver minha história no fio de água que vanescia ralo abaixo e me virei completamente nu e respondi:

— Agora está.

Ela segurava duas garrafas de cerveja long neck. Mediu meu corpo e disfarçou ao olhar minhas intimidades. Não liguei, afinal de contas, se a gente ia morar juntos, me ver pelado seria parte do cotidiano de nossas vidas.

— Está com fome, bee? Eu vou preparar alguma coisa para gente comer enquanto você relaxa. Vai tomando uma cerveja enquanto isso. — Ela saiu do banheiro e voltou só para dizer: — Eu adorei a cabeça raspada. Me lembra quando eu peguei você pra ser meu bicho na faculdade.

Aquilo tinha acontecido há tanto tempo e tanta coisa tinha acontecido desde então que nem parecíamos mais as mesmas pessoas.

— Valeu. — Disse sorrindo e abrindo as torneiras para encher a banheira de água.

Ela bateu com a garrafinha dela na minha e saiu do banheiro tão rápido quanto entrou. E ali eu devia ter reparado o quanto pequenos detalhes de vida a dois podem incomodar. Ela não bateu na porta do banheiro para entrar, simplesmente entrou. Os caras na goma faziam isso também. Enquanto um tomava banho o outro estava se barbeando e ficavam trocando ideia. Mas eu sabia que lá não era a minha casa, era uma república cheia de cuecas fedidos e mal educados, aquilo era temporário, até aí tudo bem. Mas agora era diferente. Eu ia morar ali naquele apartamento, eu teria que trabalhar para pagar as contas e por na cabeça que ali era o meu lar de agora em diante, já não era mais uma república de estudantes. Eu não ligava de Dani me ver andando pelado pela casa, mas me irritava ela não respeitar o meu espaço. Sim, eu continuava egoísta para algumas coisas.

O detalhe de não bater na porta foi um episódio entre vários outros que me irritaram muito durante os anos.

4.

Vento e neve fustigavam as vidraças do aeroporto de Toronto. Lá dentro a temperatura estava agradável. Um som ambiente bem calmo contrastava com as notícias que chegavam pela boca das pessoas e pelos meios de comunicação.

Fomos para uma cafeteria popular em Toronto chamada Tim Hortons. Sentamos ao redor de uma mesa no saguão, fora do estabelecimento. Eu pedi um chocolate quente e Dani preferiu um cappuccino. Daniel, para variar, não sabia o que escolher e acabou optando pelo mesmo que a Dani pediu. Em outros tempos ele teria pedido o mesmo que eu.

Enquanto aguardávamos Daniel contou sobre os seis meses que passou morando em Vancouver. Ele ficou hospedado na casa do Rusty, ex dono do saudoso Coffee Club. Ele e Daia, sua esposa, acabaram abrindo um restaurante de comidas típicas brasileira chamado Brazuca - Authentic Brazilian Cuisine. Mostrou fotos de um ambiente aconchegante com mesas de madeira e as paredes pintadas de verde e amarelo. Daniel também fez o papel de babá levando Darice à escola de vez em quando. A garota estava já com dez anos de idade, mas mantinha aquele mesmo olhar tímido de quando pequena oferecia aos clientes os biscoitos de banana com passas que Daia fazia. Daniel contou que trabalhou durante seis anos e usou a rescisão para aprimorar seus conhecimentos, aproveitou sua ida ao Canadá para estudar Inglês durante esse tempo. Aprimorou o idioma em uma escola de intercâmbio localizada no centro da cidade, próxima aos bairros de Yaletown e Chinatown. Ele contava com animação na voz e mostrando inúmeras fotos que carregava em seu celular.

Eu comecei a me sentir um estranho no ninho. O que eu fiz durante esses sete anos? Comecei a pensar. Cheguei a uma conclusão, só me fodi.

— Não olhem agora, mas tem um cara ali que acabou de piscar para mim. — Daniel comentou enquanto disfarçava um sorriso com o celular na mão.

Dani ergueu o olhar dissimuladamente. Pelo visto o cara devia estar bem atrás de mim. Eu nem me dei o trabalho de me mover.

— Ele é lindo. — Dani comentou.

Senti uma leve vontade de pegar o celular da mão do Daniel e quebrá-lo na cabeça da Dani. Mas depois de lembrar que ele era casado com o tal do Fabiano, resolvi ignorar o comentário e mudar de assunto dizendo:

— Está demorando esse chocolate quente, hein.

— Calma, já devem estar trazendo. — Daniel falou colocando a sua mão quente e macia sobre a minha. Olhei para a mão dele enquanto Dani dizia:

— Isso daí é uma draga. Não vencia fazer mais comida. Come até pasta de dente se deixar. Ele também era assim quando morava contigo, Dan?

Daniel apenas riu e não respondeu.

— Vão tirar o dia para ficar me zoando mesmo? — Falei cruzando os braços.

— Você sabe que eu te amo, bobo. Não devia, mas te amo.

As bebidas chegaram e enquanto Daniel ajudava a garçonete a tirar as xícaras da bandeja, falou:

— Vocês dois fizeram as pazes então, depois daquilo tudo que Fábio me contou por email.

— Sim. Ele reconheceu que foi cuzão e disse que não ia mais acontecer, né amor? — Disse Dani despejando dois sachês de açúcar em seu cappuccino.

Sim, havíamos conversado, mas para mim a amizade nunca mais pareceu ser a mesma de antes.

— Jamais imaginei que algum dia vocês dois fossem se desentender. — Daniel disse pegando o último sachê de açúcar.

— Viver a dois não é fácil. — Falei antes de assoprar meu chocolate para esfriar um pouco.

— Concordo. — Daniel falou despejando o último sachê de açúcar em sua xícara. — Filho da puta, ele namora e piscou para mim!

Dani e Daniel ainda estavam prestando atenção no cara atrás de mim. Virei a cabeça disfarçadamente para o lado esquerdo e vi os dois se afastando de mãos dadas. Não os vi de frente, mas pelo cabelo grisalho, desconfiei que tivessem mais de quarenta anos.

— Vai ver eles têm um relacionamento aberto. — Dani supôs.

Falar sobre relacionamento aberto me fez lembrar de Brian e Kevin.

5.

Depois de ficar por quase meia hora dentro da banheira, quando saí a ponta dos meus dedos das mãos tinham a textura de uma uva passa. Me enrolei na toalha e fui para o meu quarto. Abri minha mala e senti o cheiro do amaciante de roupas. Lembrei de casa, da minha mãe, me bateu uma leve saudade.

Durante o intercâmbio que fiz na adolescência ou mesmo quando morei na goma na época da faculdade, nunca senti necessidade de estar perto dos meus familiares. Eu sabia que eles estavam lá e eu queria só curtir. Agora, depois da depressão, depois de tudo o que eu e meus pais enfrentamos com a separação e com o surgimento de novos cônjuges, eu me sentia jogado de lado. Era como se a missão deles comigo já estivesse cumprida e agora eu que me virasse. De certa forma, eles não estavam errados, eu já era maior de idade. Obviamente eu não conseguiria morar em Nova Iorque sem a ajuda financeira dos meus pais, por isso usei o dinheiro da moto que eu compraria para tentar amenizar a dívida que eles teriam comigo. Eu não queria ser um fardo a distância. Por conta disso eu estava ansioso para conversar com a Dani sobre os acordos que ela havia feito para que eu chegasse já com alguma coisa garantida para trabalhar.

Joguei a toalha sobre a cama e vesti uma cueca, uma bermuda e uma camiseta. Lentamente comecei a guardar minhas roupas na cômoda. Entre as cuecas encontrei uma foto que me remetia a um passado turbulento. Era a minha foto com o Roger. Reparei no nosso olhar e pude sentir através do tempo o quanto aquele cara tinha gostado de mim, o quanto se esforçou para fazer o nosso namoro dar certo. Tivemos contratempos como todo namoro tem. Quem nunca meteu os pés pelas mãos tentando fazer uma coisa dar certo? Eu carregava uma culpa surreal por ter sido o pivô do término do nosso namoro. Peguei a foto e a guardei no fundo da primeira gaveta da cômoda.

— Está pronto, vamos comer? — Disse Dani entrando no meu quarto.

— Já estou indo. Só vou terminar de organizar essas coisas aqui.

— Beleza. E essa toalha molhada em cima da cama, bee? — Ela disse pegando a toalha e a garrafa de cerveja vazia que eu tinha colocado no chão ao lado da cama.

— Desculpe, mãe. — Falei já dando a "deixa de ser besta".

— Foi mal, amore. Muitos anos trabalhando como babá dá nisso. Mas falei para o seu bem. Não vai querer passar sua primeira noite aqui dormindo em uma cama molhada, vai? Estou te esperando.

Dani saiu e eu olhei para fora da janela, para a cidade nova que me abrigaria por um tempo indeterminado e suspirei fundo. Sabe aquela sensação de não saber se você está fazendo a coisa certa? Então, era isso isso que eu sentia. Me esforcei muito para tudo dar certo para eu ir embora do Brasil, mas ali naquele momento me bateu a dúvida se aquilo era mesmo o que eu queria.

Sentei a mesa. Dani havia feito espaguete.

— E de mistura? — Perguntei.

— Que mistura? — Ela perguntou abrindo o armário e trazendo um ralador e um pedaço de queijo parmesão nas mãos.

— Mistura, ué. Comer só macarrão é igual comer só arroz ou só feijão. — Falei abrindo a garrafa de vinho que estava sobre a mesa.

— Querido, morando nos Estados Unidos você terá que se adaptar ao modo americano de se alimentar. E tendo em vista os nossos recursos financeiros limitados, teremos que optar pelas coisas mais baratas. Hoje é só macarrão que eu fiz com todo o carinho. — Ela disse ralando o queijo sobre o prato dela e do meu.

— Devíamos ter pensado melhor. Deveríamos ter ido para uma cidade mais barata, sei lá. — Enchi duas pequenas taças de vinho, dei um gole e coloquei a taça da Dani perto de seu prato.

— Xííí, mal chegou e já está reclamando. Não há lugar no mundo como Nova Iorque, querido. Isso aqui ferve de cultura pop, moda e extravagância. Nova Iorque está na vanguarda do desenvolvimento humano. Você iria odiar morar em D.C. cheio de republicanos conservadores que te olham como se quisessem te queimar em uma fogueira em praça pública. Estamos em um lugar legal. Depois da ponte o bicho pega. — Ela disse enquanto enrolava o espaguete no garfo.

— Onde? — Falei enquanto mastigava.

— No mundo real, bobinho. — Dani disse levantando para pegar um rolo de papel toalha para eu limpar a boca. — Isso aqui é surreal. Você vai ver. Hoje a noite vou sair com umas amigas babás, vamos?

— Estou cansado. Acho melhor ficar e arrumar minhas coisas. — Falei tomando a taça de vinho.

— Você terá todo o tempo do mundo para arrumar isso, Fábio. Larga a mão de ser chato, vamos dar um volta. Deixa eu te mostrar a cidade. — Ela disse cruzando os braços feito uma menina mimada.

— Você terá todo o tempo do mundo para me mostrar a cidade. Posso descansar?

— Desculpe. Você tem razão. — Ela disse pegando na minha mão. — Quando eu cheguei aqui também fiquei deslocada, assim como você está se sentindo. O pior é que eu não tinha ninguém. Aqui você tem a mim. Sei que passou por um bocado de coisas esses últimos tempos, mas tudo ficou para trás. Tem um novo mundo a sua frente agora. — Ela disse abrindo os braços.

— Isso é bom ou ruim? — Perguntei enchendo mais uma taça de vinho.

— Não podemos apagar as coisas que fizemos, temos que olhar para trás e aceitar nossos erros. Somos apenas responsáveis pelas escolhas que fazemos no presente. Se você tem um foco lá na frente, fica mais fácil fazer as escolhas certas. — Ela disse bebendo todo o vinho e estendendo a mão para que eu enchesse sua taça novamente.

— Eu não consigo me livrar do meu passado.

— Cicatrizes das nossas batalhas, meu amigo. Todos temos. Perdoe a si mesmo e tente esquecer as coisas que você não pode mudar. Foque no que você pode mudar, no que você pode fazer para crescer pessoalmente, profissionalmente. Foque no que te dá prazer.

— Acho que o Roger me daria...

— Ah não! Não quero ouvir o nome desse cara aqui. — Ela disse largando os talheres ruidosamente no prato. — Esse cara só te fez mal, Fábio! Você tem sorte de ter se livrado dele. Faz mais de um ano que vocês terminaram e você ainda está nessa?

— Mas foi eu quem o traiu. Foi por minha causa que tudo deu errado.

— Não se culpe, chuchu. Uma relação é feita de duas pessoas. Ele teve uma boa parte de culpa em tudo isso também. A questão é, você estava infeliz e solitário e pulou a cerca. Fim. Você não está mal por ter traído, está mal porque ele descobriu a traição. É diferente. E cá entre nós, eu já tinha previsto que toda essa merda ia acontecer, mas você não me deu ouvidos, como sempre...

— Você não estava lá para saber, Dani.

— Érica me contou tudo, Fábio. Amigo, somos seres humanos. O mundo é uma selva. Quando o momento chega você pensa no seu rabo primeiro antes de pensar no dos outros. Eu não te condeno pelo que fez. A sua relação estava fadada ao fracasso porque a qualidade do tempo que vocês tinham na relação não gerava um prazer mútuo. Entende? Não foi pela traição em si. Era um relacionamento abusivo demais. Ninguém merece isso.

— Ouvindo você falar agora até parece que você está dizendo que eu poderia ter traído, mas da forma certa.

— Não existe trair da forma certa. Traição é traição. Existe omissão e acordos. Isso sim é importante em um relacionamento. Não é tudo que a outra pessoa precisa saber. Pra quê deixar a pessoa com pulga atrás da orelha ou com ciúmes? Instigar no outro a raiva dela não "te possuir" literalmente. Ninguém é de ninguém, isso é fato. Por isso existem acordos. Se for bom para ambas as partes, bola pra frente.

— Eu e Roger tentamos ter acordos. Foram tantos que eu me sentia preso, tá ligado?

— O acordo que eu quero dizer é em reciprocidade. Não existe felicidade a dois sem que haja essa troca. É isso. — Ela deu um gole no vinho e completou: — É como nós aqui, eu cozinhei, agora a louça é sua.

Depois que terminamos, como era justo, lavei a louça. Enquanto eu fazia o serviço tentava me adaptar às diferenças que havia nas casas americanas.

É grande a diferença que existe entre as casas e apartamentos que temos no Brasil, tanto com relação ao tamanho e estrutura como na disposição. A maioria não tem cerca, parede, portão, grade, fiação elétrica do lado de fora. No máximo, algumas pessoas adicionam uma cerca baixa em volta da casa para "marcar seu território" e ainda assim elas precisam de uma autorização oficial para fazerem isso. Geralmente casas muito grande ou de celebridades, possuem portões e cercas mas dá pra entender o porquê né? Outra curiosidade é que eles são obcecados em manter a grama em ordem – tem quem apare a grama todos os dias, só para deixar melhor e mais bonita que a do vizinho. Quando você compra ou aluga uma casa nos Estados Unidos, é muito comum que já venha junto máquina de lavar louça, geladeira, fogão / forno, forno de micro-ondas, armários de cozinha embutidos, armários da lavanderia embutidos (quando há lavanderia), máquina de lavar roupa, máquina de secar roupa. São itens comuns, mas não obrigatórios de se encontrar.

As casas são muito espaçosas, não apenas dentro mas também fora, com quintais e jardins enormes. É claro que em cidades como Nova Iorque, Chicago (downtown), São Francisco ou outras metrópoles, a realidade é outra e você encontrará apartamentos minúsculos e por um preço altíssimo, mas como a maioria das cidades americanas são mais retiradas, com populações menores e consequentemente, mais espaço, é possível se morar em uma residência incomparavelmente maior do que as casas brasileiras, mesmo em periferias.

Outra diferença interessante é que nos Estados Unidos de uma forma geral, não se usa luz (lâmpadas) no teto dos quartos, mas sim abajures nas laterais da cama. Existem as pessoas que optam por instalar a luz no teto mas não é comum. É obrigatório que todas as casas tenham detectores de fumaça, principalmente na sala, nos quartos, sótão e porão. As regras sobre quantidade mínima e locais variam de estado para estado mas de uma forma geral, os quartos são obrigatórios e o mínimo de um detector por andar.

Outro item muito presente nas casas americanas é o carpete. Ele é muito comum na sala, quartos, às vezes até no sótão e porão porque ajuda a esquentar a casa durante o inverno.

É muito comum eles construírem um pequeno cômodo a parte dentro dos quartos, com barras presas para as camisas e algumas prateleiras e fazer de guarda-roupa. É claro que você pode comprar um armário à parte ou ainda transformar um cômodo maior apenas para ser um closet mas em muitas casas, você vai encontrar somente isso.

Dois cômodos muito presentes nas casas dos americanos é o sótão e o porão. O porão é base da casa, então muitos utilizam para guardar tralha, bagunça ou equipamentos sazonais mas muitos formam um quarto extra conforme suas necessidades. A real função do porão é abrigar as pessoas dos tornados, já que este é um desastre que acontece com frequência no país. Já o sótão é muito conhecido por ser transformado em um quarto extra (quando há mais que um filho) ou também, guardar o que não se usa lá.

Dentro do banheiro, ralo é luxo. Ralo só nas pias e na banheira ou box. Eles não têm o costume de lavar banheiro/cozinha como nós no Brasil. As pessoas limpam estes lugares com panos umedecidos descartáveis que já vem com produto de limpeza neles.

Apesar de hoje ser mais comum, a maioria das casas ainda possuem banheiras (com um chuveiro) ao invés de box só com um chuveiro. Existe uma cortina, geralmente de plástico, para não molhar o banheiro todo enquanto você toma uma ducha e esta cortina, deve ser colocada para dentro da banheira.

Exceto as casas que ficam bem ao sul, longe do frio e das nevascas durante o inverno, todas as casas possuem o que eles chamam de heaters, ou seja, aquecedores. Eles são instalados na casa toda de forma que, quando a temperatura bater – 20 graus Celsius, por exemplo, você vai estar aquecido em casa. Ficar com frio quando sai do chuveiro? Jamais! Até o banheiro é aquecido. Outro detalhe é que todas as torneiras tem água quente e a conta de energia elétrica não fica mais cara por causa disso. Uma curiosidade muito interessante, é que dificilmente falta água ou luz nas casas, salvo em situações de desastres naturais.

Uma outra característica dos americanos, é não pendurar roupa em varal! Pois é, você não costuma ver aquele monte de fio entrelaçado no quintal inteiro com roupas penduradas para todo lado, exceto em casas do interior. De uma forma geral, quase todos têm secadora de roupas. Luxo? Não, o preço de uma secadora é absurdamente mais em conta – com $250.00 você já consegue comprar uma. Quando o apartamento ou a casa não possui lavadora ou secadora, basta levar a uma lavanderia. As lavanderias, geralmente têm circuito interno de câmeras de segurança em caso de alguém tentar roubar ou danificar as máquinas. Elas funcionam com moedas. Na primeira vez que fui paguei 60 cents para rodar uma lavagem na máquina de lavar e isso ainda me deu direito a secar. As máquinas são grandes e comportam até 20 kg de roupa de uma só vez.

Depois de organizar a cozinha e tirar minhas roupas da mala e colocá-las na cômoda, consegui deitar na cama e tirar um bom cochilo. Acordei já era noite e com sirenes de ambulância fazendo jus a cacofonia da música da cidade que vemos em filmes e séries de televisão. Pelo silêncio, percebi que estava sozinho.

Fui até a janela e fiquei observando as pessoas, os carros diferentes, vozes aleatórias dos pedestres conversando em inglês. Meus olhos se fixaram mais nos casais que passavam de mãos dadas ou abraçados. Olhei para a minha cama e pensei em voltar a dormir, olhei para a poltrona verde que mais parecia um trono e pensei em sentar ali e ler algum livro da Dani. Porém, o fogo no cu falou mais alto.

"Perdoe a si mesmo e tente esquecer as coisas que você não pode mudar. Foque no que você pode mudar, no que você pode fazer para crescer pessoalmente, profissionalmente. Foque no que te dá prazer.

Foque no que te dá prazer

Foque no que te dá.

Foque.

Fuck!"

Lembrei das palavras da Dani e do fato de estar de abstinência sexual há muito tempo. O ano anterior eu foquei em fazer dinheiro para que a minha ida aos States desse certo. Pois bem, agora eu estava nos States. E não era em qualquer lugar dos Estados Unidos, eu estava em Nova Iorque, porra! Dani tinha razão.

"Isso aqui é surreal." — Ela disse. Quantas pessoas não queriam estar no meu lugar?

A cidade me chamava.

— Vamos ver o que a noite desse lugar tem a me oferecer. — Pensei alto enquanto caminhava até o banheiro para começar a me arrumar.

Nesse momento um carro passou na rua tocando uma música que deu para ouvir de dentro do apartamento. A letra dizia:

"If you see us in the club we'll be acting real nice

If you see us on the floor you'll be watchin all night

We ain't here to hurt nobody

So give it to me, give it to me, give it to me

Wanna see you work your body"

***

Músicas que inspiraram esse capítulo:

Give it to me - Timbaland/Nelly Furtado/Justin Timberlake

Lyrics:

Is it going is it going is it going is it going?

I don't know what you're looking for

[nelly]I'm the type of girl that'll look you dead in the eye (eye)

I'm real as they come if you don't know why im fly-y-y-y-y

Seen ya try to switch it up but girl you ain't that dope

I'm the wonderwoman let me go get my robe

I'm a supermodel and mami, si mami

Amnesty international got bangkok to montauk on lock

You love my ass and my abs and the video for promiscuous

My style is ridiculous-s-s-s-s

[chorus]If you see us in the club

we'll be acting real nice

If you see us on the floor

you'll be watchin all night

We ain't here to hurt nobody

So give it to me give it to me give it to me

Wanna see you work your body

So give it to me give it to me give it to me

[timbaland]When timbo is in the party everbody put up their hands

I get a half a mill for my beats you get a couple grand-d-d-d-d

Never gonna see the day that i ain't got the upper hand

I'm respected from californ.i.a. way down to japan

I'm a real producer and you just the piano man

Your songs don't top the charts, i heard em, i'm not a fan-n-n-n

Niggaz talkin greasy im the one that gave them they chance

Somebody need to tell em that they can't do it like I can

[chorus]If you see us in the club we'll be acting real nice

If you see us on the floor you'll be watchin all night

We ain't here to hurt nobody

So give it to me give it to me give it to me

Wanna see you work your body

So give it to me give it to me give it to me

Could you speak up and stop the mumblingI don't think you came in clear.

Sitting on the top it's hard to hear you from way up here.

I saw you tryin to act cute on tv just let me clear the air.

We missed you on the charts last week

Damn that's right, you wasn't there.

If sexy never left, then why's everybody on my shi it it?

Don't hate on me just because you didn't come up with it.

So if you see us in the club go on and walk the other way'cause our run will never be over; not at least until we say

If you see us in the clubwe'll be acting real nice

If you see us on the floor you'll be watchin all night

We ain't here to hurt nobody

So give it to me give it to me give it to me

Wanna see you work your body

So give it to me give it to me give it to me

Tradução:

Mostra para mim

Tá dando certo, tá dando certo, tá dando certo, tá dando certo, não tá?

Eu não sei o que você tá olhando

[Nelly]Eu sou o tipo de garota, que te mata com o olhar (olhar)

Eu sou tão real como eles, se você não souber, porque eu sou tão estilosa-a-a-a

Vejo você tentando causar estrago, garota, mas você não consegue

Eu sou a mulher maravilha, deixa eu colher os frutos do meu prazer

Eu sou uma super modelo, e muito gostosa, si gostosa

Caridade para as mulheres feias (eu não preciso disso, tenho tudo sobre controle)

Você ama minha bunda, meu abdômen e o vídeo que se chama Promiscuous

Meu estilo é muito perfeito-o-o-o-o

Se você vir a gente na boate, estaremos mandando ver

Se você vir a gente na pista, ficará assistindo a gente a noite inteira

Nós não estamos aqui pra provocar ninguém

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

Quero ver você mexer seu corpo

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

[Timbaland]Quando o Timbo, tá na festa, joga as mãos pro alto

Eu ganho milhões pelo meu som, você ganha só uns trocados-s-s-s-s

Nunca vai ver o dia que eu não vou comandar tudo

Eu sou respeitado da Califórnia até o Japão

Eu sou um ótimo produtor, e você só toca piano

Sua música, até que é boa, eu ouvi o que eles falaram, eu não sou um fã-ã-ã-ã-ã (como eu disse antes, você sabe o que eles dizem aqui)

Fala sério, eu dei uma chance pra eles

Alguém precisa fala pra eles, que eles não podem fazer como eu faço

Se você vir a gente na boate, estaremos mandando ver

Se você vir a gente na pista, ficará assistindo a gente a noite inteira

Nós não estamos aqui pra provocar ninguém

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

Quero ver você mexer seu corpo

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

[JT]Você poderia falar mais alto, e parar de resmungar

Eu não acho que você está sendo claro

Tô no topo, é difícil ver você, daqui de cima

Eu sei que você tá querendo paga de humilde, deixa eu clarear pra você

Nós não vimos você, nas paradas, semana passada

É, pode crê, você não tava mesmo

Se Sexy nunca sai do topo, porque todo mundo tá ouvindo só o meu som?

Não fique brava comigo, só porque você não conseguiu ficar no topo

Então, se você ver agente na boate, aprenda como se faz

Porque, o nosso poder, nunca vai acabar; não pelo menos, quando agente dizer

Se você vir a gente na boate, estaremos mandando ver

Se você vir a gente na pista, ficará assistindo a gente a noite inteira

Nós não estamos aqui pra provocar ninguém

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

Quero ver você mexer seu corpo

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

Se você vir a gente na boate, estaremos mandando ver

Se você vir a gente na pista, ficará assistindo a gente a noite inteira

Nós não estamos aqui pra provocar ninguém

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

Quero ver você mexer seu corpo

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

Se você vir a gente na boate, estaremos mandando ver

Se você vir a gente na pista, ficará assistindo a gente a noite inteira

Nós não estamos aqui pra provocar ninguém

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

Quero ver você mexer seu corpo

Então, mostra pra mim, mostra pra mim, mostra pra mim

***

You spin me round (like a record) - Dead or Alive

Lyric:

If I, I got to know your name

Well if I, could trace your private number baby

All I know is that to me

You look like you're lots of fun

Open up your lovin' armsI want some want some

I set my sights on you(And no one else will do)

And I, I've got to have my way now, baby

All I know is that to me

You look like you're havin' fun

Open up your lovin' arms

Watch out, here I come

You spin me right round, baby

Right round like a record, baby

Right round round round

You spin me right round, baby

Right round like a record, baby

Right round round roundI, I got be your friend now, baby

And I would like to move in

Just a little bit closer(Little bit closer)

All I know is that to me

You look like you're lots of fun

Open up your lovin' arms

Watch out, here I come

You spin me right round, baby

Right round like a record, baby

Right round round round

You spin me right round, baby

Right round like a record, baby

Right round round roundI want your loveI want your love

All I know is that to me

You look like you're lots of fun

Open up your lovin' arms

Watch out, here I come

You spin me right round, baby

Right round like a record, baby

Right round round round

You spin me right round, baby

Right round like a record, baby

Right round round round

You spin me right round, baby

Right round like a record, baby

Right round round round(I want your love)

You spin me right round, baby

Right round like a record, baby

Right round round round(I Want your loveI need your love)

Tradução:

Você Me Faz Girar (Como Um Disco)

Sim, eu, preciso saber seu nome

Bem, e eu, poderia rastrear seu telefone, querida

Tudo que eu sei é que, para mim

Você parece muito extrovertida

Abra seus braços do amor

Eu quero um pouco

Bem, eu... Eu fixo meu olhar em você(E mais ninguém vai fazer)

E eu, eu tenho que fazer do meu jeito agora, querida

Tudo que eu sei é que, para mim

Você parece estar se divertindo

Abra seus braços do amor

Tome cuidado, aqui vou eu

Você me faz girar, querida

Girar como um disco, querida

Dando voltas e voltas

Você me faz girar, querida

Girar como um disco, querida

Dando voltas e voltas

Eu, eu devo ser seu amigo agora, querida

E eu, gostaria de chegar em você

Um pouquinho mais perto(Um pouquinho mais perto)

Tudo que eu sei é que, para mim

Você parece muito extrovertida

Abra seus braços do amor

Tome cuidado, aqui vou eu

Você me faz girar, querida

Girar como um disco, querida

Dando voltas e voltas

Você me faz girar, querida

Girar como um disco, querida

Dando voltas e voltas

Eu quero seu amor

Eu quero seu amor

Tudo que eu sei é que, para mim

Você parece muito extrovertida

Abra seus braços do amor

Tome cuidado, aqui vou eu

Você me faz girar, querida

Girar como um disco, querida

Dando voltas e voltas

Você me faz girar, querida

Girar como um disco, querida

Dando voltas e voltas

Você me faz girar, querida

Girar como um disco, querida

Dando voltas e voltas(Eu quero seu amor)

Você me faz girar, querida

Girar como um disco, querida

Dando voltas e voltas(Eu quero seu amor)(Eu preciso de seu amor)

***

HOMOFOBIA É CRIME SIM. DENUNCIE.

Polícia Federal: denuncia.pf.gov.br

Direito Homoafetivo: www.direitohomoafetivo.com.br

ABGLT: www.abglt.org.br

CVV | Centro de Valorização da vida: https://www.cvv.org.br/

DISQUE 100

***

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