Noah se encontrava entre dois grandes pilares que suportavam a estrutura do que seria um grande salão, acorrentado a eles de braços abertos, de forma que restringiram seus movimentos. Não conseguia ver toda a extensão do grande salão mal iluminado. Sentiu uma brisa gelada tocando seu corpo e se deu conta de que estava nu.
A sua frente, havia um altar coberto por um manto vermelho, com dois castiçais de ouro reluzente aos lados e outro ao fundo, cada um com seis bocais, em cada bocal, uma vela. Delas exalava um cheiro forte de enxofre. Nas extremidades do altar, dois cálices de bronze e, ao centro, uma bacia de prata, que Noah não sabia se estava vazia ou cheia, também seria sua última preocupação naquele momento.
De trás, podia-se ouvir o som de uma lâmina sendo amolada, as faíscas saltavam quando aquela pedra rústica era arrastada pela superfície reluzente do metal de uma adaga prateada. Ele não conseguia se virar para ver, mas sabia que aquilo não era uma faca para cortar a carne do churrasco com uma criatura amigável. Não era necessário ter uma mente gênial para deduzir que se tratava de um ritual.Quando o som das lâminas cessou, se ouviu uma voz rouca e aguda, em uma entonação mais máscula, cantarolando alegremente:
— "Durma, minha linda criança.
Não perca nunca as esperanças.
Contra mim não importa o que faça,
Sou um predador, e você é a minha caça." — Sua voz estava longe de ser bela, ouvir aquilo fazia Noah desejar a morte mais que tudo, pelo menos não seria obrigado a ouvir mais daquela cantoria horrenda. — Ora ora, vejam quem foi capturado como uma ovelha perdida! — A criatura encapuzada se colocou a frente de Noah. Sua capa toda rasgada tapava o rosto, deixando escapar apenas uma parte da boca nojenta que cuspia a cada palavra dita. O seu corpo era curvado e raquítico, seus longos braços facilmente chegavam ao chão. Se aquilo um dia foi um humano, não devia ser dos mais belos.— Quem é você? — Indagou. Noah percebeu que não tinha tantas forças para falar e mal conseguia raciocinar para formular uma frase curta.
— Ora, o que é isso, Noah? Assim me sinto ofendido! — A criatura gesticulava com as mãos enquanto atuava fazendo drama. — Você me deu um nome e me libertou! — O ser encapuzado se virou e ergueu os braços como se agradecesse aos céus.
— Você é a droga do Papão, não é? — Noah quase desmaiava tentando falar. Seus olhos se fecharam e ele lutava para mantê-los abertos.
O ser encapuzado começou seu monólogo, enquanto caminhava de um lado para o outro gesticulando:
— Sim, mas... Papão é um nome tão... Tão... Como é a palavra? — A criatura buscou a melhor definição em sua mente enquanto gesticulava. Parecia estar em um show ao vivo. — Simples! Simples e sem impacto. Eu odeio quando os pais dizem; "Cuidado com o bicho Papão, meu filho". É ofensivo! Parece que tenho um papo enorme ou algo assim! — Seus gestos eram exagerados e suas mãos espaçosas nos movimentos. — O nome mais apropriado a mim deve impor respeito! Ser grandioso. Por falar nisso, adorei o nome que me deu em meu sonho. Eu não sei quem colocou isso em suas memórias, mas ele é perfeito! — Fez uma breve pausa se engrandecendo. Logo depois voltou sua atenção para o rapaz. — Como era mesmo o nome? — Ele provocou.
— Vai pro inferno, Papão maldito. — Mesmo fraco, Noah não se abalou.
A criatura avançou e com ferocidade agarrou o queixo do rapaz. Os dedos magricelos e cumpridos eram ásperos. Suas garras arranharam a face de Noah.
— Vamos, Noah! Já esqueceu? — A criatura sorriu, exibindo os dentes pontiagudos mais podres e que Noah já viu em toda sua vida. Sem falar no odor que saia de sua boca, o cheiro de um cadáver em decomposição.
Noah sorriu como pôde e respondeu:
— Você é ainda mais feio de perto. — Com o que lhe restava de suas forças ele começou a rir.

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Occulta Tenebris
Mystery / ThrillerUm grupo de jovens híbridos de humanos com outras espécies, que cresceram juntos em um orfanato, depois de deixarem seu antigo lar, decidem se unir para formar um grupo de investigadores paranormais. Eles passaram a agir sob jurisdição de uma ordem...