Dezenove

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Amanda andou o mais rápido que pôde esbarrando em algumas pessoas, sem pedir desculpa, procurando por Fernanda que agora também havia sumido. Chegou na cozinha, olhou em volta, nada. Avistou uma conhecida, Carolina estava sentada na sala, conversando com algumas pessoas e sorriu quando viu Amanda se aproximando.

- Oi, cadê a Fer? - Amanda falou rápido jogando o cabelo para trás, um sinal de nervosismo.

- Não sei, acho que ela entrou no quarto - Carolina falou se levantando e olhando Amanda, de novo - Você quer sentar? Beber alguma coisa? - Falou em um tom que ela conhecia bem.

- Talvez depois, obrigada - Amanda falou se virando e saindo com pressa.

Carolina deu de ombros, e depois de acompanhar Amanda com os olhos voltou para a conversa.

Amanda saiu mais uma vez em disparada, chegou na frente da porta e bateu várias vezes seguidas e com força.

- Quem é, porra? - Ouviu Fernanda gritar irritada.

- Sou eu Fer, a Maria tá aí? Você viu ela? Tô preocupada Fer, você não sabe o que aconteceu ela...

Fernanda abriu a porta, estava com uma expressão de preocupação - Ela tá aqui, no banheiro. Me pediu para eu não abrir a porta para ninguém mas já faz um tempo e eu tô começando a ficar preocupada, ela não quer abrir de jeito nenhum - falou calma mas obviamente abalada.

Amanda entrou no quarto, pediu licença e foi em direção a porta do banheiro.

- Maria Luiza? - Amanda disse encostando na porta - É a Amanda. Tá tudo bem por ai?

- Sim, me deixa em paz - Malu respondeu ríspida.

- Abre a porta, por favor. Eu juro que não vou te encher, só quero conversar.

- Não, eu quero ficar sozinha - falou quase em um sussurro - Só estou tentando melhorar antes de ir embora.

- Malu - Amanda se atreveu a usar o apelido que tinha sido proibido - Abre a porta pra mim? Preciso saber se você está bem.

Maria Luiza estava sentada no chão do banheiro, com as pernas esticadas e a cabeça baixa. Quando viu Eva começou a sentir uma vontade absurda de chorar, não conseguia segurar nem se tentasse muito, então resolveu ir até Fernanda e pediu para ficar no quarto da amiga, que logo percebeu que tinha alguma coisa errada e quis entrar junto. Malu chorou como a muito tempo não chorava, com todos os seus órgãos chorando junto, seus pulmões se abrindo e se contraindo para puxar o ar e despejar mais das lágrimas que ela estava segurando, sentiu cada pedaço do seu corpo doer, até que não aguentou e foi até o banheiro vomitar. Foi quando ela se trancou, precisava ficar sozinha, colocar os pensamentos em ordem, pelo menos por enquanto. Não queria ficar assim perto de Amanda, queria que a outra pensasse que ela era forte, odiava demonstrar fraqueza por mais sensível que fosse. Apesar disso, queria sentir aquela sensação de novo, sabia que Amanda era a única capaz de passar alguma segurança pra ela, e naquele momento era tudo o que precisava. Levantou, lavou o rosto agora vermelho e inchado, passou a mão no cabelo e foi em direção a porta.

Amanda já tinha se virado e estava sussurrando com Fernanda, dizendo que não iria contar o que aconteceu a menos que Malu quisesse. Virou-se rapidamente quando ouviu o trinco da porta.

Maria Luiza abriu a porta e voltou para a sua posição inicial, no chão. Viu quando Amanda abriu a porta devagar, colocando primeiro a cabeça, depois o corpo e fechando a porta logo atrás de si.

- Não vou perguntar se você está bem porque já sei a resposta - Amanda falou, com um olhar compreensivo no rosto.

- Que bom que você tem noção - Maria Luiza olhava para o lado, sem coragem de encarar Amanda.

- Eu não sei o que aconteceu, mas eu posso ter uma certa ideia - Amanda falou sentando de frente para Malu.

- Não quero falar sobre isso.

- Eu entendo - Amanda tocou a mão de Maria Luiza que olhou para ela na mesma hora.

Maria Luiza cruzou as pernas e abraçou Amanda, apenas a abraçou como se fosse a última coisa que pudesse fazer, apertou tanto que a outra soltou um grunhido, sentindo os braços apertando suas costelas. Malu não queria mais chorar, mas era inevitável, ela sabia que ainda se culpava pelo o que tinha acontecido, mas não sabia que era tanto. O que sentia por Eva estava longe de ser amor ou paixão, ela a fazia se lembrar de todas as noites que passou em claro pensando ser a pior pessoa do mundo por ter perdido a mulher que tanto amava, por ter sido trocada, por não ter sido o suficiente, por não ter sido corajosa, por não ter sido sincera.

- Amanda, eu... Suspirou saindo do abraço e olhando diretamente para os olhos que agora pareciam opacos - Eu não tô assim porque queria estar com ela, não pense que é isso, por favor.

- Eu não pensei nada Maria - Amanda falou passando o polegar na bochecha da outra, limpando uma lágrima teimosa - Só quero ver você bem, não importa se você gosta dela ainda ou não.

- Mas eu estou te falando, eu não gosto dela, não assim - Malu ergueu a voz mas logo se acalmou - Quando eu olho para ela eu vejo tudo o que eu tento esquecer todos os dias, eu vejo a pessoa que eu era, a pessoa que eu lutei para não ser mais.

- O que você fez de tão errado? Gostar dela e apenas não ter coragem pra dizer como se sentia foi tão ruim assim? - Amanda falava em um tom calmo mas sério, o tom que seu pai usava quando queria dizer algumas verdades para ela sem a magoar - Você acha que toda a pessoa que você é, tudo o que você representa é sobre o que você faz em um relacionamento? Você é mais do que isso Maria. Você trabalha, estuda no seu único dia livre, tem uma amizade invejável com a Fernanda, e ainda se esforçando tanto, sem ajuda, você não deixa de se importar com as pessoas que ama. Se você não soubesse se relacionar não teria tantas pessoas que te amam, eu não estaria aqui.

Malu ouvia cada palavra como se fosse um soco no estômago, sentindo seu coração acelerar, agora não porque queria chorar, mas porque era Amanda dizendo tudo aquilo, era o que ela pensava sobre Malu e ela estava ali, ela realmente estava. Maria Luiza era mesmo forte, ela sabia, era leal e companheira, mas quando Eva aparecia ela era apenas uma menina que não conseguia se expressar, ela odiava o efeito que Eva tinha, odiava se odiar por ela. Fez menção de se levantar e Amanda a segurou pela mão a ajudando.

- Eu quero voltar pra lá.

- Maria, eu não sei se é uma boa ideia, você não tá bem, nós podemos fazer outra coisa - Amanda falou olhando Maria pelo reflexo do espelho.

- Eu tô bem, já passou - falou lavando o rosto mais uma vez - Você sabe que eu não gasto look a toa.

Amanda riu, mas ainda estava preocupada. Ela sabia que quando elas saíssem Eva estaria lá, com Eloísa, o que complicava muito as coisas. Não sabia direito como ajudar, não sabia o que pensar, uma parte dela estava quebrada ao ver Maria tão triste, outra estava preocupada e uma bem pequena, lá no fundo, estava com ciúme.

Amanda e Maria LuizaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora