Eu jovem

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Como é bom ser criança! Ainda mais quando você é uma criança entre um monte de outras crianças. Nasci em uma cidade que fica no limite entre o Brasil e o Paraguai, chamada Bela vista, na década de 50. Fui a 9ª gestação e a 2ª filha. Minha mãe tinha 34 anos quando eu nasci. Fui criada no município vizinho chamado Jardim. Vejam vocês que lugares com nomes  lindos : Bela Vista e Jardim!
Só isso já faz de mim uma pessoa adorável! Rsrs
Vivi minha infância entre meus irmãos e irmãs, meus primos, os afilhados da minha mãe, as crianças da vizinhança, e desse tempo eu tenho muitas lembranças. Tomar banho na chuva, andar sempre em grupo, sentar à tardinha em frente de casa, para contar e ouvir proezas dos irmãos, ouvir historias de lobisomem, saci, e dormir agarrada na irmã mais velha, de medo. A infancia em cidade do interior e muito rica! A infancia pobre, pelo menos!

Minha mãe era costureira e meu pai pedreiro. Casados, severos, mas amorosos.
Eu lembro de muitos dias da minha infância. Minha única irmã viva diz que eu invento. Ou diz que eu ouvi falar de alguma coisa, e fantasio. Mas não é verdade. Sei detalhes que ninguém me contaria.
Meus pais são de origem paraguaia e vocês podem imaginar o alvoroço que era a casa, a vida, a hora do banho, a hora do almoço, enfim. Jamais se pareceriam com as famílias europeias, tão frios e organizados.
"Guri, vem tomar banho"! O que vc está ainda fazendo aí, que não vestiu seu uniforme?" Vamos, vai fazer sua tarefa!" Assim era o dia a dia em minha casa.
Onde que em uma família grande de tal nacionalidade haveria discrição?
Tudo era intenso e todos participavam de tudo. Outro fato muito bom que existiu na minha infância era a convivência próxima com a família do meu pai. Minhas tias, meus tios, minha avó.

Não sei em que época ou idade eu fiquei tímida. Tímida daquelas que quer que se abra um buraco no chão para se esconder se alguém a percebesse.
Nesse período comecei a sonhar com o mundo.
Eu olhava o horizonte e me perguntava: o que há atrás daquela linha que parece separar o céu da terra?
Quem mora naquele mundo?
E meus olhos se enchiam de lágrimas. Era a adolescência chegando. Mas
eu não sabia.
O que eu sabia é que gostaria muito de ir além do horizonte, de ver o que havia no mundo.

E a minha infância indo embora e a adolescência juntamente com a timidez tomando conta de mim.
Daqueles dias a dois meses eu faria 15 anos. Morena, cabelos pretos, olhos verdes, tornei-me uma jovem bonita e comecei a ser observada pelos rapazes.
E foi nesse período que a nossa cidade foi escolhida por um grupo empresarial para a construção e implantação de uma grande loja de departamentos.
Isso movimentou a todos era uma novidade para a cidade, possibilidades de empregos, mais impostos para o município o que daria um impulso para o progresso.
O local foi delimitado, os proprietários trouxeram trabalhadores da cidade vizinha e deram início à construção do grande prédio que abrigaria a loja de departamentos, meus irmãos também se cadastraram para o trabalho, a cidade ganhou novos ares.

Pois bem, uma condução buscava e levava os trabalhadores ao local da obra, e entre esses, um rapaz loiro, de olhos azuis, na faixa dos seus vinte e poucos anos, um tipo bonitão me notou ao passar em frente da nossa casa todos os dias e, isso aflorou em mim um misto de orgulho e timidez.
Minha mãe espertamente notou que eu ia para a frente da casa nos horários que passavam os trabalhadores e já tomou suas providências.
Rezou uma ladainha na minha cabeça e de minha irmã mais velha. Que os rapazes eram estranhos, que estavam ali de passagem, que nós éramos mocinhas incautas e que não deveríamos dar confiança a eles.
Mas o rapaz que me olhava ao passar em frente de casa, já com seus 24 anos soube muito bem ficar amigo dos meus irmãos, supostamente paquerar minha irmã mais velha, até se aproximar de mim, e se dizer apaixonado. E eu? Eu estava na adolescência, com os sonhos na mente e os hormônios no corpo prontos a entrar em ação!
O rapaz falou com minha mãe, que lhe disse que eu recém fizera 15 anos, que não me proibiria de namorar, mas que exigia respeito, e tal.
Vou resumir, porque esta parte da história não foi como deveria ter sido.
Vocês sabem, como é uma autobiografia eu posso fazer isso! Rs
Fiz 16 anos em outubro e conclui o curso ginasial em dezembro de 1968.
E em 28 de dezembro do mesmo ano casei-me aos 16 anos e dois meses,  já grávida de minha primeira filha, com o bonitão que se tornara meu primeiro namorado.
                   Vida de Casada
Interrompi meus estudos, não vivi meus sonhos e saí da minha certeza de vida que era minha enorme família e, não foi para conhecer o mundo!
Foi para entrar numa vida de responsabilidades, de afazeres, de dificuldades, sem nenhuma experiência em cuidar de um bebê, de uma casa e sequer de mim.
O que mais posso dizer? Que me sentia inadequada, insegura, envergonhada, submissa, e todos os sentimentos que demonstravam que eu ainda não estava preparada para aquele casamento? Ou que eu mesma boicotei meus sonhos?
Tudo mudou bem rápido. De menina a mulher casada com uma enorme responsabilidade.
A minha juventude recém iniciada que eu poderia viver de forma livre e independente escapou entre meus dedos. E tive que encarar o que a vida me apresentou.
Sem nenhuma experiência  eu vivi o que havia para ser vivido ali, na minha pequena cidade. Contentei-me com o que eu tinha.
Ser mãe, por exemplo.
Ter orgulho ao carregar nos braços os bebês mais lindos e saudáveis que se possa imaginar.
Primeira filha: Gravidez de adolescente, total ignorância em pré natal, longe da mãe. Esse era o quadro quando chegou ao termo minha primeira gravidez. Data provável do parto? Baseada nas fases da lua. O primeiro parto com uma parteira desconhecida da família da minha sogra. A verdadeira parteira estava gripada e já sabia que via de regra primeiros partos são demorados. Demorou... do dia 21 ao dia 23, quando me levaram ao hospital para que o médico me atendesse. Desmaia e acorda. Uma toalha sobre o ventre para ajudar a empurrar o bebê! Força, força, já a estamos vendo. Os cabelos são loiros! E por fim, o nascimento! Uma menina! Viva, uma bebê enorme, saudável, linda, olhos cor de violeta! E aí começou meu aprendizado de que crianças dão mais trabalho que cuidar de bonecas!

Vem Viver Comigo? AutobiografiaOnde as histórias ganham vida. Descobre agora