Capítulo 10 - O Lugar Ao Qual Pertenço

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O Passe foi colocado n'O Elevador. Luna acionou uma manivela, que a faz subir na direção da cidade dos Evoluídos. Ao longe, as chamas consumiam uma parte do castelo, o chamariz perfeito para que não a vissem chegar até ali. Nas ruas, alguns Albas gritavam por socorro, enquanto todos os guerreiros marchavam para castelo.

O Elevador aportou em um morro íngreme. Luna sentiu um cheiro incomum, similar ao odor daquela orquídea. A grama ali era escura, árvores mortas decoravam a paisagem lúgubre. No chão haviam espadas, lanças e outros tipos de armas. Não existiam prédios, nem Albas, nem ninguém. A pouca iluminação dificultou para que Luna prosseguisse, rumo ao desconhecido. Com a chave no bolso e a caixa na mão, ela andou, seguindo seu instinto.

Luna acelerou o passo ao encontrar uma trilha. A cada pisada algo quebrava no chão, fazendo estrépitos, possivelmente pedras.

Mais à frente, um objeto reluzente forneceu luminosidade, permitindo que Luna enxergasse ao seu redor. No mesmo instante, ela desejou não ter feito aquilo. Foi nesse momento que Luna viu o primeiro cadáver.

Ela correu, assustada, percebendo que os estalos sob seus pés eram ossos de sua raça. Pilhas de Hyacinthums mortos por todos os lados.

Um corpo. Dois corpos. Dez corpos. Cem corpos. Mil corpos.

Luna paralisou, cedendo sobre os joelhos. Um grito angustiado irrompeu do seu ser. 

Urubus sobrevoavam amontoados de corpos, alimentando-se dos restos. Ratos devoravam o interior dos crânios. Corvos carnicentos grasnavam ao bicar cadáveres em valas.

A cidade Celestial era uma mentira.

Uma cova coletiva para o povo de Luna.

A garota andou em direção a luz. O corpo tremendo, os olhos cheios de lágrimas. Lá constatou que a iluminação pertencia a uma engenhoca de ferro, cheia de engrenagens, tubos de ferro e fios que se conectavam ao solo. A garota sentiu palpitações periódicas no chão. 

A Máquina estava viva — um enorme coração pulsante, bombeando líquido azul para Soberania, mantendo a cidade flutuando, preservando o estilo de vida dos Albas.

No centro do engenho, cinco Hyacinthums estavam acorrentados ao maquinário com tubos intravenosos inseridos em braços, pernas e pescoços, drenando cada gota de sangue azulado. Luna virou de lado, vomitando.

A Salvadora do Rei ligou todas as pontas soltas de sua jornada.

Hyacinthums servem como combustível para A Máquina, pensou ela, horrorizada. Nosso sangue alimenta a existência dos albas, ela compreendeu o propósito de sua raça.

As últimas palavras do Hyacinthum suicida voltaram na mente de Luna: "não coma, não beba. Nada nessa cidade foi feito para nós".

Luna seguiu os tubos da máquina, percebendo que eles se conectavam ao sistema de água. O sangue da raça dela corria por toda Soberania, na água que os Albas bebiam, no solo que eles pisavam, nas flores que cresciam, nas árvores que davam frutos, nos alimentos preparados em belos banquetes e no ar que respiravam.

Luna correu até A Máquina, tentando salvar os Hyacinthums que estavam presos, mas era tarde demais. Os olhos deles estavam vidrados, a pele seca e pálida.

Não posso salva-los! lamentou ela, virando o rosto. Mas, posso proteger os outros, vingando os que se foram...

Após algumas horas lutando para assimilar tudo, Luna pegou a chave em seu bolso, destrancando a caixa. No interior, cinco estranhos e improváveis objetos: maquiagem, um espelho, um belo vestido preto, uma peruca e uma adaga.

Os primeiros raios da alvorada surgiram no céu, anunciando o dia do aniversário do rei. Sobre os cadáveres de sua raça, Luna reprimiu os tremores de seu corpo. Enxugou suas lágrimas e tomou uma decisão.


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