. h i p ó c r i t a .

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Jisung ficava com o coração acelerado quando tinha aulões, porque assim ele podia ver Na Jasmin de pertinho e, como praxe, o Na sempre solicitava o microfone e dava um glorioso discurso sobre como o capitalismo — apesar de funcionar de acordo com a tese — era um sistema explicitamente errôneo para a igualdade humana e a prática da hipócrita empatia lindamente mascarada na televisão.

É que ele dizia: não, ele não luta em prol da desigualdade e afirmava que podia comparar a sociedade com um esquema de pirâmide de uma maneira diretamente crítica.

Jaemin tinha cabelos rosados e meias longas. Ele saía com meninas e meninos, mas quase nunca namorava por sempre afirmar que ficava enjoado de todos. E Jisung se perguntava sobre a possibilidade do Na enjoar da sua pessoa numa única conversa.

Jaemin era a inspiração de Jisung: era radical, tinha opinião própria e um senso de humor totalmente sarcástico e cheio de referências. Amava quando o mais velho lançava um "cala a boca, homofóbico" no meio de uma discussão e, mais ainda, quando enfiava um vocabulário imensamente formal ao precisar defender a sua ideia.

Jaemin era o comunista favorito de Jisung. O Park gostava de Marx e Engels, mas, poxa, nada se comparava com aqueles lábios rosinhas se movendo ao pronunciar a palavra "cruel" ao se referir ao capitalismo. Cruel, cruel, cruel. O capitalismo era cruel. O sorriso de Jaemin era cruel. Aquele apertar de olhos era cruel. Aquele balançar de cabelo era cruel.

Jisung não gostava de cantadas, mas tinha tanta vontade de soltar uma: seu sorriso é perverso que nem a globalização, NaNa. Ele só não tinha coragem de dizer.

Só que, numa dessas suas tardes desocupadas, ele decidiu pincelar o seu Instagram em busca de algum sorteio idiota de celular ou um book de fotos numa agência famosa. Ele só não esperava uma imagem.

É que nas férias de verão, ele não sabia, mas havia ocorrido que o seu tão amado comunista NaNa, estava tirando foto com iPhone e tudo na Estátua da Liberdade, vestindo Balenciaga e calçando um Jordan vermelho. O queixo do Park foi ao chão ao vê-lo segurar a bandeira dos States.

Sim, Jaemin estava com as cores dos genocidas culturais, como sempre dizia. Estava com as cores do país que ele mais dizia abominar, pois era a cultura deles em cada canto do seu país e até a comida que comia vinha deles. Não gostava de pagar pau pra cultura alheia, dizia ele nos aulões. Não iria deixar o capitalismo em pessoa dominar a sua cultura, massacra-la como se ela não tivesse valor algum. É o que ele dizia.

Mas ele estava lá e era real. Era tal legenda que fizera Jisung tremer: "Coréia me sufoca, acho que achei o meu lugar." Como aquilo poderia ser verdade?

Quando as aulas voltaram, o assunto da escola tornou-se a viagem internacional e chique do Na. Os restaurantes chiques que frequentou, as postagens cheias de brilho e elegância e não a simplicidade que tanto falava no ano anterior. E, enquanto observava-o ser enaltecido e rodeado por todos, Jisung decidiu que se livraria daquela cantada ridícula de outrora.

Optaria por outra: seu comunismo é mais hipócrita que propagando política, NaNa. E, mais uma vez, Jisung decidiu guardar para si mesmo.

comunista « jae. sung »Kde žijí příběhy. Začni objevovat