Parte X

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Acordar naquela casa deixou de ser um alívio em aproximadamente dois dias

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Acordar naquela casa deixou de ser um alívio em aproximadamente dois dias. A perspectiva de não ver mais minha família e de não ter de volta aquela parte da minha vida me consumia cada vez mais, e eu nunca fui muito boa em lidar com fantasmas.

A boa notícia é que as ervas e remédios de Theo pareciam milagrosos, pois em poucos dias não restava nada de meus ferimentos antigos a não ser pelas finas cicatrizes brancas nas pernas. Me perguntava o que ele colocava naquelas misturas, que eram tão boas que deveriam ser vendidas para o mundo todo.

Eve aparecia poucas vezes por dia, me chamando para comer e me ajudando a cuidar dos ferimentos. Ela, assim como Theo, agia de maneira calma e silenciosa, totalmente diferente de uma criança normal. Eles me assustavam, e eu não sabia exatamente o porquê.

O tédio chegou sem nem bater na porta. Eu ficava em casa, sem fazer nada, o tempo todo. Não sei para onde iam ou o que faziam, mas Eve e Theo raramente se encontravam na casa. Eu precisava de algo para me distrair, para não perder a cabeça. Sem esperar muito, levantei da cama.

Vesti a muda de roupas brancas e monótonas que Eve deixava para mim todos os dias, e aquilo acionou um clique no meu lado artístico com uma nova ideia. Me lembrava perfeitamente de um documentário que havia assistido sobre a origem das tintas, que ensinava a fazer tintas com coisas naturais. Seria uma atividade ótima para me distrair, e eu poderia talvez até tentar algum padrão nessas roupas sem graça. Parecia perfeito.

- Bom dia! - Passo por Theo na cozinha enquanto me sirvo de uma tigela do mingau de toda manhã.

- Bom dia! - Ele responde, de boca cheia.

- Dormi demais?

- Não, acordei mais cedo. Vou caçar algo para abastecer o estoque hoje.

- Da última vez que eu chequei, o estoque estava cheio.

- Está cheio para duas pessoas, mas não estamos mais aqui sozinhos. - Ele disse, olhando-me com um sorriso simples e acolhedor.

A ideia de ter um desconhecido cuidando de você a ponto de sair e se arriscar para te trazer comida era muito estranha para mim.

- Obrigada. - Digo, me sentando à sua frente e começando a comer.

Sem falar mais nada, terminamos nossa refeição. Não demorou muito para que Theo pegasse uma lança pontiaguda, seu cinto com pontas extras e um pequeno rolo de arame, e saísse de casa.

Pela primeira vez desde que cheguei, estava animada com alguma coisa. O silêncio era intenso, apesar dos sons vindos da floresta ao redor da casa. Me ocorreu, novamente, o quanto isso tudo era estranho. Um cara morando sozinho com uma criança que raramente aparecia, numa casa que ele construiu numa ilha deserta? Como ele sobreviveu por tanto tempo? Como arrumou todas essas coisas? Será que eles só foram vítimas de acidente aéreo, como eu, mas que deram sorte de vir parar aqui com algumas bagagens? Nem tudo aqui vinha diretamente da floresta. Havia quadros e vasos de planta espalhados pela casa. Como ele os havia achado?

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