Capítulo 47-Verdade e Consequência

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-O quê?- digo em meio a uma crise de tosse que me acomete de repente.

Mabel olha para mim e depois desvia o olhar para mirar sua própria xícara de chá. Seu toque reconfortante me deixa e ela segura a xícara delicada com ambas as mãos, seu polegar contorna os pequenos desenhos na porcelana chinesa. Seus olhos se fecham e ela respira fundo. O peito da ruiva sobe e desce devagar enquanto ela inala o ar que entra tremulando as cortinas da sala.

-Ela está morta Adaline. – sua voz soava dura, áspera aos meus ouvidos. Os olhos verdes da ruiva estão frios e escuros.

Tenho plena certeza de que as palavras dela entraram pelo meu ouvido esquerdo e saíram pelo direito. Não é possível.

-Ela morreu esperando que a neta mimada voltasse para casa. –disse e agora seus olhos me fulminavam com ódio. Nem ao menos parecia que havíamos nos cumprimentado como amigas a instantes atrás. – Você matou ela.

-Não, eu não matei, eu...Eu voltei, estou aqui afinal.- digo numa tentativa parca de me defender do seu tom ríspido.

Um sorriso de escárnio apareceu em seus lábios e ela revirou os olhos em um sinal claro de desprezo. Senti meus olhos marejados com as suas palavras e com o que elas verdadeiramente significavam.

-Você matou sim.- ela retrucou incisiva com o tom de voz elevado, quase gritando. – Acho que iria voltar pra cá e todos iriam te receber de braços abertos de volta?- ela soltou uma gargalhada amarga. – Adaline você sempre foi mimada e egocêntrica. Sempre se colocou na frente de tudo e todos. Você sempre é a vítima da história e mais ninguém. Você fugia das aulas, perdia as matérias, me colocava em situações constrangedoras...Você, querida, larga sempre todas as pessoas que te querem bem. Adaline, você abandonou a sua avó sem nem pensar duas vezes. Sabe por quê? Pra satisfazer seus ensejos egoístas.

As lágrimas escorriam pelo meu rosto e mesmo assim eu não conseguia dizer uma palavra sequer.

-Tu nunca consegue enfrentar os teus problemas sozinha. Fugiu daqui quando as coisas ficaram feias pra você. Fugiu da Terra do Nunca, se é que isso existe mesmo, quando a situação ficou complicada. Agora, deixou o navio porque simplesmente não aguentou a realidade. Adaline Darling, você não passa de uma covarde. Acha que o mundo gira ao seu redor não é mesmo? Pensa que pode abandonar a sua casa e voltar quando quiser. Talvez quando se cansar você pode decidir onde vai passar as próximas férias: no navio com o namorado pirata ou na Terra do Nunca brincando de casinha. Então, pensa que pode trocar no momento em que achar mais conveniente. Você tem que crescer.

Não consigo parar de chorar. O pior de tudo é que eu tenho plena consciência de que mereço estar ouvindo isso. Cada palavra é como um soco no estômago. O pior tipo de tortura e eu mereço. Mereço ouvir tudo isso e calada. Não deveria nem estar chorando mas sou fraca. Tenho que enfrentar as consequências das minhas ações mesmo que elas doam.

-Eu vim todos os dias que pude pra cá, fazer companhia pra ela. Tudo o que sobrou dela hoje foi a casa. – completou enquanto acalmava seu próprio tom de voz. – Resolvi vim morar aqui pra não deixar o lugar abandonado e também, em partes, porque sai de casa já que briguei com os meus pais. Eles queriam que eu cursasse engenharia e eu resolvi cursar história. Comecei a fumar e fiz uma tatuagem e isso já foi motivo o suficiente para trair os bons costumes.- disse e apontou-me o papel na minha frente. - O que eu quero dizer, é que a casa é sua. Jane deixou pra você como herança. Caso queira que eu vá embora é só dizer.

Meus olhos vagaram para o papel. Ela havia me deixado a casa e a herança. Aliás chegou a apostar que eu voltaria em cerca de cinco anos. Jane Darling pensou em mim mesmo depois da morte.

Me Leve Para A Terra Do Nunca ( EM REVISÃO)Onde as histórias ganham vida. Descobre agora