Hunter acabou me chamando para trabalhar na academia dele, alegando que eu era muito boa, e me daria muito bem no ramo, mas eu não tinha certeza quanto a isso. Era muito impaciente, acabaria sendo mais rude do que o necessário. Na certa, seria demissão na segunda semana. No máximo.

Estive desde os dezoito anos no exército americano, e aos vinte e três fui afastada depois de um atentado contra o nosso grupo na Síria, onde sofri tortura (o joelho fodido era justamente por causa dessa missão). Me adaptar à nova vida não estava fácil, mas a minha avó dizia que a gente precisava passar por perrengues para amadurecer, e se Gianinna Castiglione dizia isso, não seria eu a dizer o contrário.

— Você já conseguiu o que queria, Leona. Não precisa mais fazer isso.

Lancei-lhe um olhar cético, e ele suspirou exasperado, sabendo perfeitamente que não adiantava insistir no assunto.

— Eu já disse que não vou mais lutar, X. E essa conversa acabou. — ajeitei a mochila nos ombros, girando os calcanhares e saindo da academia, ouvindo resmungos do treinador.

Agarrei o capacete da moto que consegui comprar com a grana que sobrou das lutas, subindo na minha bebê em seguida. Fiquei parada por um instante, respirando fundo. Eu estava completamente sem rumo. Desempregada e fodida fisicamente. Minha avó, a mulher que criou a mim e às minhas irmãs, tivera um AVC no último ano, e mesmo que alegasse estar bem, não queria pedir ajuda a ela. A coitada já teve muita dor de cabeça conosco, e merecia um descanso. Chiara, minha irmã mais velha, estava formando a própria família com o seu noivo e a enteada que morava com eles depois de ter sido comprovado que a mãe da garota não estava apta para cuidar de uma criança de sete anos. E Rox, irmã do meio, tinha a vida dela no meio da dança. Sem contar que a cabeça dela era louca, não dava para confiar.

Liguei a moto, mas não dei partida, pensando no que faria da vida. Eu gostava da adrenalina. Saindo do exército, me enfiei nas lutas clandestinas como uma forma de ganhar dinheiro fácil e sair da monotonia. Deu certo até minhas irmãs descobrirem. De alguma forma, elas conseguiram me convencer a parar com isso, e eu senti a necessidade de ceder um pouco por elas. Eram as únicas pessoas que importavam para mim, então... Por que não?

Ouvi meu celular tocar e desliguei a moto, tirando o acessório da mochila, franzindo o cenho ao reconhecer o número do general Boorman.

— Alô.

— Leona, como está? — a voz grave do general me deixou nostálgica. Por mais que tenha entrado no exército pelos motivos errados, sentia saudades de lá, e da carreira que estava construindo.

— Bem. E o senhor? — tentei soar desinteressada, porque Zachary nunca ligava. Nunca!

— Levando. As coisas não são a mesma coisa sem você. — ouvi um suspiro pesado. — Como está a sua recuperação?

— Ah... — que recuperação? Saí do exército, mas continuo me metendo em briga. — Bem. Meu joelho está bem melhor. — dei tapinhas no joelho esquerdo, fazendo uma careta ao senti-lo latejar. — Quase não sinto mais dor.

— Ótimo. O que você tem feito?

— Qual o intuito dessa ligação, senhor? — não gostava de enrolações. Ele com certeza não me ligou depois de tanto tempo só para saber como estava meu joelho.

— Sempre direta. — deu uma risadinha, e ouvi o barulho de papeis. — Você pode passar no quartel amanhã pela manhã? Gostaria de conversar com você.

— Hã... Claro. Aconteceu alguma coisa? — franzi o cenho, desconfiada.

— Não, filha. — ele riu descontraidamente. — Só preciso conversar com você pessoalmente.

Leona Castiglione (DEGUSTAÇÃO)Where stories live. Discover now