Grano e Gelato

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O sol das duas da tarde brilhava no céu azul, tinindo em toda sua força no Vale do Café. No entanto, aparentemente o calor não estava tão insuportável como em tantos outros dias do verão. E especialmente naquele dia, havia uma brisa morna que diminuía o incomodo perante ao tempo.

Os trigos balançavam junto com o ritmo da brisa, em um campo aparentemente tão simples e escondido do centro da cidade, mas que guardava uma beleza peculiar na fazenda de um desconhecido em que ambos os rapazes repousavam alheios a rotina sendo vivida pelos moradores do Vale, assim como eram totalmente alheios aos amigos de ambos, preocupados e procurando-os em todos os lugares possíveis devido ao desaparecimento repentino e inexplicável.

Mas, o fato é que Luccino e Otávio estavam tão absortos naquele momento de paz, que qualquer sugestão que ameaçasse o término daquela experiência era distante de acontecer. Otávio, deitado em cima dos grãos de trigo tirou a sua atenção do sol radiante acima deles para observar o homem ao seu lado, que permanecia sentado, aparentemente perdido em um mundo próprio. Assim, ao perceber que a atenção do desconhecido estava perambulando por algum lugar aleatório, deixou seus olhos viajarem sobre ele, ansiosos, querendo, buscando algo que ele não sabia o que era.

Os olhos tentavam captar o máximo de detalhes nos quais não prestara atenção na primeira vez que haviam se encontrado no quase acidente. Otávio tentava dizer a si mesmo que era só por precaução, por cuidado, caso aquele homem fosse uma ameaça, mas algo nele contra argumentava ao tentar se enganar e distorcer o sentimento crescente de admiração.

De apreciação.

Observava concentrado os fios bagunçados dos cabelos curtos e negros mexerem-se contra a brisa, os detalhes do nariz, as pálpebras dos olhos que o perseguiram desde quando saíra apressado e assustado do Jeep de Randolfo ao achar por breves minutos que tinha cometido um homicídio, para depois pensar que provocara alguma desregulação da sensatez do desconhecido que achara graça do seu próprio desespero. Seus olhos passearam pelos ombros largos, a camisa branca esticada, já que o outro abraçava suas pernas, quieto.

Pelo menos era o que ele pensava, se distraindo em algum ponto fixo nas costas largas do outro que agora, o observava com os olhos entrecerrados e um sorriso pequeno nos lábios.

Quando Otávio levantou os olhos novamente, sobressaltou-se levemente ao ver-se sendo observado, causando um riso divertido em Luccino.

-A vista é boa não é?

Otávio arregalara os olhos, sentando-se nervoso, tentando acuar-se do questionamento de Luccino.

-O q-que, do que está falando?

- A floresta, e o campo de trigo. – Luccino comentou, esticando as pernas e voltando seu olhar em volta dos trigos. – O que mais seria?

-C-claro, o que mais seria! Que bobo que eu sou. – Otávio sorriu nervoso ao fechar os olhos e sentindo o seu coração voltar a bater no ritmo quase correto. – Eu moro há anos no Vale do Café, mas eu jamais imaginaria que encontraria algo assim por aqui.

-Nem eu. Quero dizer, eu nasci e cresci na Itália, e acredite em mim, lá existem muitos cenários de tirar o folego, dignos de pintura. As comidas, as pessoas, a nossa cultura, tudo lá é tão...

-Belo? – Otávio sussurrou, concentrado no homem ao seu lado.

-Sim! Mas, aqui no Vale do Café eu sinto que há algo a mais? Eu estive aqui por menos de 24 horas e tanto já me aconteceu. E apesar de não ter conhecido o resto da cidade, parece que eu já conheço, e mesmo se não conhecesse, eu não me importaria em me perder por aí.

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