❤ Prólogo

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A fumaça cinza invade o carro e, automaticamente, começo a tossir

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A fumaça cinza invade o carro e, automaticamente, começo a tossir. Não gosto desse cheiro, sempre fico com falta de ar e os olhos ardendo. Encaro meu pai por um minuto, implorando, em silêncio, para que jogue isso fora, mas ele sequer percebe. Continua cantarolando uma música barulhenta do rádio, a atenção fixa no monte de veículos à nossa frente.

Também não gosto dessa música, ela me dá dor de cabeça.

Sem paciência para ouvir as buzinas do lado de fora ou esse som de gosto duvidoso aqui dentro, tampo os ouvidos e encosto no banco, observando as nuvens do céu. Meu passatempo favorito.

Parece que hoje teremos uma corrida por aqui.

Nomeio os concorrentes e dou a largada, imaginando o barulho das patas batendo firme no chão e a torcida empolgada, gritando em volta.

— Vai, Alazão! — encorajo, baixinho, meu preferido para vencer.

Eu queria me divertir de verdade. Ter alguém para jogar bola, empinar pipa, brincar no videogame. O pessoal da escola não vai muito com a minha cara, acho que porque sou quieto demais. Fico na minha. Meu irmão mais velho praticamente não para em casa e o caçula ainda nem sabe andar. Mamãe trabalha fora e diz não ter cabeça para isso depois de um dia cheio.

Esse aqui ao meu lado, então, nem preciso dizer. Só lembra que eu existo quando me pega depois da aula e me deixa quase seis horas por dia debaixo de sol ou chuva, vendendo balas no sinal.

Só me restam as nuvens mesmo.

— Aêeeeeee, isso aí! — comemoro, sussurrando a vitória de Alazão, ao perceber que chegamos ao destino.

— Para de falar sozinho, moleque! — Meu pai bate na minha cabeça, acabando com a diversão. A fumaça vem com tudo no meu rosto e tusso, mais uma vez. — Depois não sabe por que as pessoas acham que você é estranho.

Fico em silêncio. Não gosto de falar com meu pai. Se eu pudesse, nunca dirigiria a palavra a ele. Ele só sabe gritar e ficar bravo.

Pego a caixinha de balas no banco traseiro e seguro na maçaneta para sair, é melhor fazer o que ele manda, sem reclamar.

— Que caralho é esse!?

Por falar em ficar bravo...

O que será que eu fiz agora? Viro a cabeça e o encaro, ainda em silêncio. Ele está sério e batendo as mãos no volante, impaciente.

— Pode tirar aquela pivete dali agora, Pedro! — Sigo seu olhar e vejo uma garotinha de cabelos longos e negros sentada no meio-fio, bem perto de onde estacionamos. Ela parece triste e carrega uma sacola nas mãos. — Nada de distrações ou companhia aqui, me entendeu? Vai lá e manda ela dar o fora já.

Continuo o encarando, é só uma garota. Nem parece que está vendendo alguma coisa. Por que pode ser tão ruim? Penso em argumentar, mas seus gritos me barram novamente.

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