Capítulo 17

1 0 0
                                    

Foi a vez de Amália usar o carro para chegarem até o trabalho, naquela fria manhã de maio, já às portas de junho. No caminho, a moça e Ramon perguntavam sobre o sábado à noite. Os rapazes responderam sem mentir, mas omitindo. Ainda que não houvessem combinado, sabiam as regras daquele jogo: era como se Patrick não tivesse contado nada para a garota na boate, o resto podia ser tudo contado.

Assim que adentraram a casa da colina, puderam ouvir o doutor no laboratório.

– Andem logo, não quero perder tempo! – Ordenou Ernesto, sem nem cumprimentar a equipe.

Cada um tomou uma folha com checklists e orientações para o procedimento. De cara, Pedro sentiu-se incomodado, vez que percebeu o estetoscópio e o esfigmomanômetro prontos, ao lado da maca de Katetiras. Ele vinha treinando há dias e tinha evoluído muito, mas não estava cem por cento, ou seja, a chance de insucesso ainda existia e o assombrava. Pensou em conversar com o chefe, deixar claro que estava inseguro, mas o homem parecia outro, naquela manhã. Desde que haviam chegado, a expressão dele era de irritação, não olhara no rosto dos funcionários uma única vez.

Pedro decidiu encarar o desafio. Poderia dar errado, mas as chances de dar certo eram, de longe, maiores. Tinha de confiar em sua capacidade para aumentar ainda mais as chances de uma PC, logo na primeira tentativa.

– Deite aí, Pedro. E vê se não falha.

O doutor estava mesmo alterado, jamais havia pressionado daquele jeito. Com o ultimato, Pedro desestabilizou. Foi necessário imenso esforço para retomar o processo de relaxamento, controlando a respiração, permitindo-se quase adormecer, mas mantendo a consciência. Logo, estava deitado na maca, e nem os ruídos vindos dos colegas, nem o barulho do gerador e, tampouco, os movimentos do doutor na preparação das ferramentas de monitoramento o atrapalhavam.

– Vamos começar. – Anunciou o chefe. – Pedro, você estará bem em frente ao banco. Ramon e Patrick o levarão para dentro da agência. Os funcionários estarão em uma reunião. Tente captar tudo o que puder, entenda o que estão dizendo, seja observando o movimento dos lábios ou ouvindo quaisquer falas, se conseguir.

O agente captou a missão e, de tão concentrado, não estranhou a demanda. Amália, Ramon e Patrick, todavia, ficaram receosos.

– Patrick, aumente oito posições de frequência do canhão x, uma por segundo. De y, aumente doze posições, na mesma proporção. Ramon, olho nos relógios! Mantenha os ajustes finos estabilizados, enquanto o Patrick leva Pedro para dentro do banco.

Amália, que ficou responsável pelo gerador e pelo ajuste prévio de alguns módulos, observava tudo, incomodada quando o doutor novamente mencionou o banco, como se estivessem pondo um assalto em andamento. Ela pôde ver quando Ernesto pôs a mão no ombro de Pedro e, embora a experiência tenha avançado, começou a chamá-lo, cada vez com mais intensidade, até que o rapaz retornou.

– Terminamos? – Perguntou Pedro.

– Claro que não! Você dormiu, droga! – Esbravejou o chefe, levantando-se do banco ao lado da maca e jogando uma prancheta com papéis no chão.

– Não senhor! Não dormi, não! Eu estive lá no banco! Porque diz que eu dormi?

– Dormiu, sim! Acha que estou fazendo o quê, aqui do seu lado? Cantando canções de ninar?

– Doutor, desta vez eu não dormi! Ou, se dormi, fiz a PC mesmo assim. Tenho certeza de que não foi sonho.

– Pois bem, rapaz! Então, conte o que viu.

– Como se estivesse lá fisicamente: na rua, com carros passando, o carrinho de cachorro-quente próximo... Daí, fui levado para o interior da agência, mas não tinha ninguém lá. Só um vigilante.

KatetirasWhere stories live. Discover now