V - Preciso de Tempo

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Sai do transe em um solavanco. Minha conexão com o Céu foi interrompida bruscamente. Eu estava me sentindo dividido, meio sonolento e demorei um pouco para voltar a mim. Quando abri os olhos procurei por Diana. Ela tinha dado a volta no carro, aberto a porta do carona e se posto ao meu lado. Assim que percebeu que eu estava com os olhos abertos, Diana fechou os olhos por um momento e deu um suspiro de alívio ao me ver respirando e completamente acordado.

— Achei que você estava morrendo. O que aconteceu? Você estava brilhando, gritando e... por que você está chorando?

— Muriel. – Passei o polegar embaixo dos olhos secando as lágrimas.

— Quem?

— Muriel, minha Tenente. Está morta.

— Eu sinto muito… – Diana colocou a mão no meu ombro – como você sabe disso?

— Eu a vi morrer. Vi o céu na verdade e as coisas não estão boas por lá. Droga, preciso da minha graça de volta.

Saí do carro e me senti fraco. Os efeitos do Transporte de Conciência surgiram rápido demais. Se eu ainda fosse 100% anjo estaria normal, sorrindo com minhas asas por ai, e matando algum demônio por puro tédio, mas eu havia sido derrubado em combate e Diana teve de me segurar contra o carro para me ajudar a ficar de pé.

— Ei, você pensa que vai aonde?

— Penso que vou achar um jeito de restaurar minha graça.

— Pensou errado. Você vai entrar no carro e sossegar um pouco.

— Não posso. Você não entende...

— Não entendo várias coisas no momento, mas uma das únicas coisas que entendo é que você não pode sair assim.

— Diana...

— Lucas, se você sair assim vai morrer na metade do caminho.

Ela estava ficando brava. Sei disso porque ela me pressionava com mais força contra o carro.

— Não posso esperar até amanhã, Diana.

— Você quer calar a boca e entrar logo na porcaria do carro?!

Ela estava prestes a me bater e eu odiava admitir mas aquela humana tinha razão. Não chegaria a lugar nenhum no estado que estava e não cumpriria a missão. Precisava me recuperar primeiro, então, contra a minha vontade, fiz o que ela havia me pedido. Diana deu a volta pela frente do carro, entrou nele e rapidamente deu a partida. Tinha certeza que ela me levaria para o hospital novamente mas ela dirigia na direção oposta que viemos.

— O hospital é para atrás. – Olhei fixo para o parabrisa.

— Não vou levar você para o hospital. Você sairia de lá antes que eu chegasse a recepção.

— Está me levando para onde então?

— Vou levá-lo… – ela suspirou – vou levá-lo para a minha casa.

— Isso não é considerado perigoso por aqui?

— É, muito. Aliás meu pai me mataria se descobrisse que levei um cara que conheço a algumas horas para dormir na minha casa mas...

— Mas...?

— Eu vi. Vi sua queda. Senti seu desespero, sua raiva. Sei o que você é. E se não se recuperar você vai morrer e – olhos de Diana vieram de encontro ao meu – eu não posso deixar isso acontecer.

Diana ligou a música do carro, o que indicava que a conversa tinha acabado e sinceramente eu fiquei aliviado por não precisar responder mais nenhuma pergunta ou explicar nada sobre o Céu.
A cena da morte de Muriel ficava em um looping na minha cabeça,  como se fosse mais um dos castigos de meu pai, porém eu não podia sentir a dor do luto agora. Por mais que a dor de perder Muriel diante dos meus olhos fosse muito grande, eu tinha que me concentrar no último pedido dela. O problema era que eu não fazia ideia de como diria a Diana que ela era descendente de Caim, e por causa disso poderia se tornar um Cavaleiro Infernal de Lúcifer. Eu não poderia simplesmente chegar e dizer a ela: “Hey Diana, você é descendente de Caim um dos demônios primordiais. Ah,  e a propósito, você pode se tornar um demônio a qualquer hora. Te vejo por ai” isso a deixaria ainda mais traumatizada, eu precisava prepará-la primeiro. Precisava de tempo.

Anjo MeuWhere stories live. Discover now