26. Alegria angustiante

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Partir foi mais difícil do que pensou, porém, por mais que se distanciasse, aquela suspeita o acompanhou em cada momento até ser obliterada pelo retorno. Foi muito ingênuo ao não insistir no pensamento paranoico.

Low e Mori entraram no carro, que estava no pequeno estacionamento deserto do hospital.

— Você sabe mentir? — Eles mal tinham sentado no banco quando Low jogou a pergunta e emendou: — De forma convincente.

A jovem ficou desconcertada. Existiu alguma situação em que ela precisou mentir? Era provável que não, ao menos, não que ela se lembrasse. Nem era questão de precisar mentir; mesmo que fosse necessário, ela acreditava que não o faria.

Sempre tentou ser uma garota certinha — a filha perfeita; e filhas perfeitas não podem mentir, porque mentir é errado. Surpreendeu-se ao constatar que suas definições de "mentira" ainda eram as mesmas que usara na infância, no entanto não achou que deveria mudar o argumento quando apenas amadurecer seu embasamento parecia ser o suficiente. Mentir, então, era proibido; o máximo que ela podia fazer era omitir uma informação, como fez ao visitar Sílvia. Se a enfermeira tivesse formulado um questionamento preciso sobre o que ela não podia falar, não teria escolha a não ser contar a verdade.

— Entendo. — Low respirou fundo e usou um tom conformado perante o silêncio dela. — Preste atenção e não faça nenhum barulho.

Mori estava prestes a contar sobre a vez em que mentiu para os pais sobre seu dever de casa, quando as palavras de Low registraram em sua mente. Prensou os lábios, empenhando-se na tarefa de ficar em silêncio. Tinha expectativas de sanar algumas de suas dúvidas com o que se seguiria.

Observou Low conectar o celular no painel do carro. O som do telefone do veículo começou a tocar em seguida. Ele estava mesmo ligando para o Dr. Ray? Era o que aparentava. Mori arregalou os olhos e quase teve o ímpeto de tapar a boca com as mãos, com receio de que sua respiração pudesse ser ouvida, entretanto logo percebeu que isso era um exagero. Low realizara a ligação por meio do celular, e não direto do carro, portanto o som seria enviado pelo microfone do aparelho e recebido pelo automóvel — com a vantagem de que o doutor nem desconfiaria que a ligação seria ouvida por outra pessoa... talvez.

— Você sabia, não é? — O painel do carro emitiu o som da voz acusadora do doutor Ray.

O tom ríspido pegou Mori de surpresa. Low sorriu, divertindo-se.

— Tudo bem com você também?

— Poderia ter nos poupado de toda essa perda de tempo se tivesse me contado.

— Não me culpe. Não importa o que eu diga, você nunca acredita em mim. — O sorriso de Low se alargou — Pretende elucidar sobre o que estamos falando?

Três segundos de silêncio. Mori imaginou o doutor bufar antes de responder.

— Harmínions não produzem elixir.

— Sim, eu já sabia. — Low vislumbrou Mori de relance; a jovem ficou intrigada com a última fala de Raymond. — Poderia ter nos poupado de toda essa perda de tempo se tivesse me perguntado antes.

— Muito engraçado. — Dr. Ray relaxou a voz, injetando uma dose de veneno. — Mas qual o motivo da ligação? Mudou de ideia? Ainda há tempo para fazer algo por Elliot e o seu tio.

— Acertou em parte. — Low alterou o tom para demonstrar seu divertimento. — Realmente mudei de ideia.

— Assim como o Crow. Nenhum de vocês sabe o que é ter um objetivo na vida.

— Decidi dificultar seus planos. Ou melhor, tornarei sua vida mais difícil. — Low continuou sem prestar atenção no que o outro dissera. — Para alguém como eu, sem muitas opções de futuro como você disse certa vez, isso será suficiente. Não cairei na sua chantagem.

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